Direitos fundamentais de liberdade

AutorFillipe Azevedo Rodrigues
Ocupação do AutorMestre em Direito Constitucional pela UFRN
Páginas15-51
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DIREITOS FUNDAMENTAIS DE LIBERDADE
2.1 CONSTITUCIONALISMO: EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA
LIBERDADE
O estudo a ser trilhado sobre direitos fundamentais de liber-
dade impõe a delimitação prévia de três conceitos basilares, quais
sejam constitucionalismo, constituição e direitos fundamentais. Como
será demonstrado, há uma necessária interdependência entre eles,
razão pela qual os três serão abordados conjuntamente para, enfim,
fixarem-se os elementos históricos, jurídicos, políticos e filosóficos
necessários ao desenvolvimento deste livro.
Definir por qual desses conceitos começar já é um desafio,
uma vez que não há consenso doutrinário quanto à precisão tem-
poral da origem de cada um, justamente em função da interdepen-
dência presente. É como ocorre no debate entre direito e sociedade,
afinal, quem teria vindo primeiro?
Apresentada a problemática acima, decidiu-se seguir a trilha
aberta pelos professores Dimitri Dimoulis e Leonardo Martins, para
os quais a tarefa de conceituar direitos fundamentais1 em sociedades
1 Veja-se: “a maioria dos autores sustenta que os direitos fundamentais têm
uma longa história. Há quem vislumbre suas primeiras manifestações no di-
reito da Babilônia desenvolvido por volta do ano 2000 a.C., quem os reconhe-
ça no direito da Grécia Antiga e da Roma Republicana e quem diga que se
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ANÁLISE ECONÔMICA DA EXPANSÃO DO DIREITO PENAL
humanas dependeria de conceitos previamente existentes de Esta-
do, indivíduo e constituição, este último genericamente tratado como
texto normativo regulador da relação entre Estado e indivíduos”.2
Portanto, antes de se falar em constituição e direitos fundamen-
tais – nessa ordem –, a sistemática eleita requer compreender o que
se trata por Estado. Tal pré-compreensão levará ao conceito de cons-
titucionalismo, conforme se verá.
Para Dimoulis e Martins, Estado é “um aparelho de poder cen-
tralizado que possa efetivamente controlar determinado território
e impor suas decisões por meio da Administração Pública, dos tri-
bunais, da polícia, das forças armadas” etc. De maneira que “sem a
existência de Estado, a proclamação de direitos carece de relevância
prática. Estes não poderiam ser garantidos e cumpridos e perderiam
sua função precípua, qual seja, a de delimitar o poder do Estado em
face do indivíduo”.3
Perceba-se que, ao conceituar Estado, os citados autores já
expressaram alguns apontamentos sobre o conceito de direitos fun-
damentais e, ainda mais importante, sua função lógica de limitador
do arbítrio estatal em face da liberdade do indivíduo. Eis a prova da
comunicação inevitável entre tais construções teóricas.
Pois bem, o conceito adotado confunde-se com a conforma-
ção política-institucional do Estado Moderno ocidental, ocorrida a
trata de uma ideia enraizada na teologia cristã, expressa no direito da Europa
medieval”. (DIMOULIS, Dimitri; MARTINS, Leonardo. Teoria geral dos di-
reitos fundamentais. 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 21). Um
exemplo de doutrina que admite a possibilidade de existência de direitos fun-
damentais em tempos civilizacionais mais remotos pode ser identificada nas
lições do constitucionalista português Jorge Miranda, mais precisamente em:
MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucionalTomo IV – direitos
fundamentais. 4 ed. Coimbra: Coimbra Editora, 2008, p. 16-23.
2 DIMOULIS, Dimitri; MARTINS, Leonardo. Teoria geral dos direitos fun-
damentais. 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 21-23.
3 DIMOULIS, Dimitri; MARTINS, Leonardo. Teoria geral dos direitos fun-
damentais. 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 21-22.
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DIREITOS FUNDAMENTAIS DE LIBERDADE
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partir do século XVII com a fragmentação do sistema feudalista me-
dieval, dando lugar ao processo de centralização do poder na pessoa
do soberano, em dimensão absoluta. Trata-se, pois, da construção
dos regimes absolutistas da Idade Moderna.
A legitimação do Estado Absolutista estava, segundo Grei-
ce Patrícia Fuller, na “formulação extremada do direito divino dos
reis com a consequente fundamentação dessa suposta teoria na afir-
mação de ter Adão recebido de Deus este poder que, ao longo da
história, foi sendo transmitido aos monarcas, considerados como
descendentes daquele”.4
O entendimento vigente durante o contexto absolutista era de
que o homem não é um ser livre em essência, nasce, contudo, escra-
vo e, portanto, não possui a liberdade cívica para escolher a forma de
governo e de sociedade em que pretende se realizar como indivíduo.5
A relação imposta na época era Estadoindivíduo, a qual,
diante da legitimação divina do rei, confundia-se com soberano
indivíduo. Aqui, cabe lembrar a frase “L’État c’est moi” (“o Estado sou
eu”), atribuída ao monarca absolutista francês Luís XIV de Bourbon,
cujo reinado durou de 1643 a 1715.
Entretanto, a relação descrita se inverteu em um dado mo-
mento, revolucionando todas as estruturas sociais vigentes.
Isso se tornou possível, pois, consoante exposto por Norberto
Bobbio na obra a “Era dos Direitos”, “a relação política – ou a rela-
ção entre governantes e governados, entre dominantes e dominados,
entre príncipe e povo, entre soberano e súditos, entre Estado e ci-
dadãos – é uma relação de poder que pode assumir três direções”,
quais sejam: (i) “conforme seja considerada como relação de poder
4 FULLER, Greice Patrícia. A contemporaneidade do pensamento de John
Locke no contexto do século XXI. In: Revista de Direito Constitucional e
internacional, n. 49, p. 139-144, 2004, p. 140.
5 FULLER, Greice Patrícia. A contemporaneidade do pensamento de John
Locke no contexto do século XXI. In: Revista de Direito Constitucional e
internacional, n. 49, p. 139-144, 2004, p. 140.
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