Eficiência e direito penal

AutorFillipe Azevedo Rodrigues
Ocupação do AutorMestre em Direito Constitucional pela UFRN
Páginas207-247
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EFICIÊNCIA E DIREITO PENAL
5.1 EFICIÊNCIA E ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO
5.1.1 Processo de Constitucionalização da Eficiência: Eficiên-
cia como Norma Jurídica
Assim como os indivíduos reagem a incentivos e buscam satis-
fazer de forma mais conveniente – ou menos custosa – seus interesses,
transportam para o Estado a mesma finalidade essencial.1 Tais indiví-
duos, na condição de contribuintes, destinatários de serviços públicos
e cidadãos em geral, clamam por uma Administração eficiente, cujo
agir comporte resultados esperados e baixo custo ao Erário.
Apesar da convergência mais expressa entre Direito e Eco-
nomia ser recente, a perspectiva de eficiência há algum tempo2
1 Premissas teóricas oriundas da economia clássica, exaustivamente analisa-
das neste trabalho. De todo modo, para mais estudos sobre o assunto, ver:
BITTENCOURT, Maurício Vaz Lobo. Princípio da eficiência. In: RIBEIRO,
Marcia Carla Pereira Ribeiro; KLEIN, Vinicius (coord.). O que é análise eco-
nômica do direito: uma introdução. Belo Horizonte: Fórum, 2011, p. 27-37.
2 Para Edilson Nobre Pereira Júnior, tal período corresponde ao advento do
pós-positivismo. Observe-se: “superado o positivismo estrito ou legalista, as
Constituições promulgadas a partir da metade do século XX aderiram ao que,
na cultura jurídica, convencionou-se chamar de pós-modernismo ou pós-
-positivismo, de maneira a ajustara ideia de legalidade à conformidade com o
Direito, movimento a grassar no direito administrativo, o qual passa a fundar-
-se em preceitos oriundos dos tradicionais princípios gerais do direito e, mais
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ANÁLISE ECONÔMICA DA EXPANSÃO DO DIREITO PENAL
se imiscuía no seio das ciências jurídicas, sobretudo no Direito
Administrativo.
Nessa linha, Alvacir Correa dos Santos afirma que “o princí-
pio da eficiência achava-se implicitamente incluído entre os deveres
do administrador público, significando que este deveria atuar com
presteza, perfeição e rendimento funcional”.3
Celso Antônio Bandeira de Mello, a seu turno, consigna que,
antes da adoção do termo eficiência, de origem econômica, seu con-
teúdo já estava abrangido pelo conceito de boa-administração, tido,
entre as obras clássicas de Direito Administrativo de outrora, como
princípio da Administração Pública. In verbis:
O fato é que o princípio da eficiência não parece ser
mais do que uma faceta de um princípio mais amplo já
superiormente tratado, de há muito, no Direito italiano:
o princípio da ‘boa administração’. Este último significa,
como resulta das lições de Guido Falzone, em desenvol-
ver a atividade administrativa ‘do modo mais congruente,
mais oportuno e mais adequado aos fins a serem alcança-
dos, graças à escolha dos meios e da ocasião de utilizá-los,
concebíveis como os mais idôneos para tanto’. Tal dever,
como assinalava Falzone, ‘não se põe simplesmente como
um dever ético ou como mera aspiração deontológica, se-
não como um dever atual e estritamente jurídico.4
Entretanto, a preocupação com a racionalidade do aparato
estatal e do Direito, em geral, não vem desses dias. Não obstante, o
Poder Público sempre foi mais afeto ao desperdício de recursos e à
instabilidade institucional do que à eficiência.
recentemente, daqueles resultantes dos imperativos da vida coletiva, como é o
caso da eficiência na ação administrativa”. (NOBRE JÚNIOR, Edilson Pereira.
Administração pública e o princípio constitucional da eficiência. In: Revista
de Direito administrativo, n. 241, p. 209-240, 2005, p. 239).
3 SANTOS, Alvacir Correa dos. Princípio da eficiência da administração
pública. São Paulo: LTr, 2003, p.183.
4 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 27
ed. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 122-123.
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Isso, p orque, ao contrário do que sustenta Celso Antônio Ban-
deira de Mello, a construção doutrinária do princípio da boa-admi-
nistração não trazia consigo o aporte científico ao qual se dedicou a
Economia para conceber as várias implicações da eficiência.
Não obstante às aparentes semelhanças no campo propedêuti-
co, a distinção entre os conceitos de eficiência e boa-administração se
encontra no fato de que: este não se desenvolveu além do campo pres-
critivo do dever-ser, muitas vezes ancorado apenas em construções re-
tóricas; ao passo que aquele se prestou a estudos interdisciplinares, em
vieses teóricos e empíricos comparados exaustivamente. Por isso, a re-
cepção do conceito econômico no Direito é, em potencial, um avanço
metodológico, agregando ao mundo jurídico diversos conhecimentos
e técnicas de otimização das normas que o integram.
Também não se deve confundir eficiência com os conceitos de
eficácia e efetividade, de conteúdos mais restritos. Enquanto a eficiência
se preocupa com a relação ótima de custos-benefícios para o alcance
do resultado programado, a eficácia limita-se à obtenção do resultado
devido e a efetividade restringe-se à repercussão da decisão política na
comunidade demandante.5 A abordagem eficiente, ao ser programada
para atingir demandas de eficácia e efetividade, abrange-as e agrega
o elemento de economicidade – tratando-se, pois, de uma abordagem
mais sofisticada. Em síntese, segundo Alvacir Correa dos Santos, “ava-
liar eficiência é saber como aconteceu [e como pode acontecer melhor];
a eficácia, o que aconteceu; a efetividade, que diferença fez”.6
O primeiro passo dado nesse sentido pôde ser identifica-
do no Decreto-Lei n. 200, de 25 de fevereiro de 1967,7 cujo teor já
5 Ver sobre o tema: CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito
administrativo. 25 ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 31.
6 SANTOS, Alvacir Correa dos. Princípio da eficiência da administração
pública. São Paulo: LTr, 2003, p. 189.
7 “Dispõe sôbre a organização da Administração Federal, estabelece diretrizes
para a Reforma Administrativa e dá outras providências. (BRASIL. Decreto-
Lei n. 200, de 25 de fevereiro de 1967. Disponível em: <http://www.planalto.
gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del0200.htm>. Acesso em: 8 de maio de 2013).
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