Do Processo da Cassação do Mandato de Prefeito

Autorde Araujo Lima Filho, Altamiro
Páginas412-424

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suas vezes fizer; e tendo, como sujeito passivo, a Administração do Município. O seu objeto jurídico é a dignidade e o decorro da função pública. A infração, in casu, é comissiva; de ação única, ou seja, proceder; de perigo; unissubjetiva e própria.

DO PROCESSO DA CASSAÇÃO DO MANDATO DE PREFEITO

Art. 5º O processo de cassação do mandato do Prefeito pela Câmara, por infrações definidas no artigo anterior, obedecerá ao seguinte rito, se outro não for estabelecido pela legislação do Estado respectivo:

Novamente, neste ponto, o Decreto-Lei nº 201, de 27 de fevereiro de 1967, retorna ao trato de assunto processual, resguardado pelo preceito constitucional da legislação concorrente sobre a matéria, estatuído no inciso XI, do artigo 24.477Torna-se evidente, em decorrência do rito estabelecido daqui em diante, que ficam devidamente asseguradas todas as formalidades do devido processo legal, com obediência à amplitude de defesa e ao contraditório — tudo de exigência constitucional —.

477. Constituição da República, artigo 24: “Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: (...) XI – procedimentos em matéria processual;”

Ante o preceito constitucional visto acima torna-se claro o sofisma contido no silogismo proposto pelo ilustre Advogado Wongran Junqueira Ferreira, procurando atribuir as regras processuais para cassação de mandatos às Leis Orgânicas. Diz ele: “O Decreto-Lei nº 201 atribuía aos Estados competência para modificarem o rito processual, pois eles é que tinham competência para editar as Leis Orgânicas; ora, a atual Constituição transferiu a cada município competência para elaboração da sua Lei Orgânica; Logo, compete à Câmara Municipal, através da Lei Orgânica fixar o procedimento do processo de cassação do mandato.” Como se vê, a premissa menor — “a atual Constituição transferiu a cada município competência para elaboração da sua Lei Orgânica — é falsa, à luz do item XI, do artigo 24 da Lei Maior. Logo, a conclusão acerca da competência torna-se não verdadeira. É a aplicação da velha regra da lógica: premissas verdadeiras, conclusão verdadeira; premissas falsas, conclusão falsa; uma premissa verdadeira e outra falsa, conclusão falsa ou apenas aparentemente verdadeira.

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PREFEITOS E VEREADORES - CRIMES E INFRAÇÕES DE RESPONSABILIDADE

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Não será demais registrar, com José Nilo de Castro, o fato de que, para instauração regular do “processo de cassação de mandato de Prefeito ou de Vereador, impõe-se como conditio sine qua non a existência de ato que, por sua natureza, configure, objetivamente, uma infração, havendo, pois, correspondência lógica entre o supedâneo fático e a norma jurídica invocada. Faltando isto, o que ocorre é o abuso e o desvio de poder como decorrência do puro querer da maioria. Trata-se, portanto, da qualificação jurídica dos fatos. Não se pode nem se deve prescindir do exame da legalidade ou não relativa aos motivos da decisão da cassação de mandato de Prefeito ou Vereador, que implica necessariamente o controle da exatidão material dos fatos ou atos e sua qualificação jurídica. Isto é, esse controle exige que os atos ou fatos, que a Câmara Municipal entendeu serem irregulares, que o tenham sido realmente. Compete ao Juiz verificar se existiram os motivos invocados pela Câmara e se eles eram suficientes e inteiramente capazes de justificar uma deliberação cassando mandato. Se não confirmados, à saciedade, inferi-se daí ser, supinamente, ineficaz, írrita e nula a medida punitiva. Havendo, de conseguinte, má aplicação da lei, imputação errônea, ou qualquer processo interpretativo viciado ou por extensão inexata, da parte da Câmara, o julgamento e a cassação do mandato devem, sob o prisma da legalidade formal e material, serem submetidos, in integrum, ao Judiciário. Caso contrário, a invocação, em casos não incomuns, das questões de mérito ou interna corporis empanaria ou esconderia ilegalidades e arbitrariedades, resultantes de retaliações políticas inconfessáveis. Ora, se ao Judiciário se declarasse preclusa essa via de exame, ficariam abertas as portas do abuso e do desvio de poder. Ao nosso estado de direito refoge, por completo, essa possibilidade de ilegali-dade judicialmente irreparável.” Em outra passagem, o mesmo preclaro autor adverte: “... porque a Constituição atribuiu ao Judiciário (art. 5º, XXXV, CR) o poder de proteger (art. 5º, LXIX, CR) direito subjetivo, líquido e certo, lesionado ou ameaçado de lesão, seria absurdo inadmissível constatar que faltem ao titular deste direito mais imediatos e prontos para a paralisação de prática de ato lesivo de seu direito, como sói acontecer com os processos de cassação de mandatos eletivos locais, notadamente de Prefeitos Municipais, diante de Câmaras que lhe são hostis politicamente. O controle judicial há de alcançar até, por razões de vícios procedimentais, a suspensão dos trabalhos, quer investigatórios, quer de deliberação. É dizer: o Judiciário tem o poder de suspender sessões, seja da Comissão processante, seja de julgamento, por vícios de origem formal constatados

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de plano. Caso contrário ter-se-á a negativa de acesso ao mesmo Judiciário, circunstância inadmitida em nosso Direito (STF, Mandado de Segurança nº 21.689-1, DJU 7/4/95, p. 8.877). Por fim, em questão de perda de processo e de mandato de Prefeito, há de se deslocar a competência para este impetrar mandato de segurança contra ato do Presidente da Comissão processante e da Câmara Municipal, para o Tribunal de Justiça. Não se pode olvidar, por fim, a participação democrática, no processo administrativo, como assinala Sérgio Ferraz (Processo Administrativo e Constituição de 1988, Revista Trimestral de Direito Público 1/1993, p. 86) que ‘representa a verdadeira contraface do autoritarismo. É dizer, o tema radica-se, fundamentalmente, na dramática e emocionante tensão dialética autoridade x liberdade. Em suma, o caminho da democratização não se perfaz somente com o regramento isonômico do processo administrativo, mas dele não prescinde. É curial que não basta, contudo, simples arranjo formal que simule um processo administrativo com equilíbrio de faculdades entre seus participantes: imperioso é que em seu próprio cerne material se reflitam tais propósitos éticos, tudo de molde a tornar o processo um verdadeiro bastião potencial de defesa do cidadão contra o Estado.”478JURISPRUDÊNCIA:

Prefeito – Crime de Responsabilidade – Pronunciamento da Câmara – Extinção do Mandato.

“O STF já se pronunciou no sentido de que ‘os crimes denominados de responsabilidade, que deverão ser julgados pelo Poder Judiciário, independentemente do pronunciamento da Câmara de Vereadores (art. 1º), são de ação pública e punidos com pena de reclusão e de detenção (art. 1º, § 1º) e o processo é o comum, do CPP, com pequenas modificações (art. 2º)’. No art. 4º, o DL 201, de 1967, cuida das infrações políticoadministrativas dos prefeitos, sujeitos ao julgamento pela Câmara dos Vereadores e sancionadas com a cassação do mandato. Essas infrações é que podem, na tradição do direito brasileiro, ser denominadas de crimes de responsabilidade. A ação penal contra prefeito municipal por crime tipificado no art. 1º do DL 201, de 1967, pode ser instaurada...

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