Estatuto do nascituro - avanço ou retrocesso na proteção aos direitos humanos?

AutorJoão Felipe da Silva/Ricardo Pinha Alonso
Ocupação do AutorBacharel em Direito, Professor Universitário de Direito Civil e Direito Internacional no Curso de Direito das Faculdades Integradas de Ourinhos, Advogado/Doutor em Direito do Estado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo ? PUC/S
Páginas205-229
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eSTATUTo Do NASciTUro –
AVANÇo oU reTroceSSo NA ProTeÇÃo
AoS DireiToS HUMANoS?
João Felipe da Silva(*)
Ricardo Pinha Alonso(**)
4.1. Introdução
O Sistema Jurídico brasileiro busca através do Projeto de Lei n. 478/2007
garantir direitos ao nascituro de forma que o ser humano seja efetivamente
protegido desde a sua concepção, armando-se que já neste estágio imedia-
tamente posterior ao ato conceptivo existe vida que deve ser juridicamente
protegida contra quaisquer espécies de abusos.
Sabendo-se que nascituro é o ser humano concebido, mas ainda não nasci-
do, é evidente que tal expectativa de vida futura merece a dita proteção jurídica.
Contudo, insta salientar que o ordenamento jurídico brasileiro já con-
fere à gura do nascituro a devida assistência, de forma que um novo di-
ploma legal, embora de conteúdo altamente ampliativo de tais prerrogativas
jurídicas não pode ao mesmo tempo promover a redução de direitos, sobre-
tudo daqueles atinentes aos direitos humanos da mulher gestante, já que o
(*) Bacharel em Direito, Professor Universitário de Direito Civil e Direito Internacional no
Curso de Direito das Faculdades Integradas de Ourinhos, Advogado.
(**) Doutor em Direito do Estado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo –
PUC/S, p. Mestre em Direito pela Universidade de Marília – UNIMAR. Professor na
graduação em Direito das Faculdades Integradas de Ourinhos – FIO, e Centro Uni-
versitário Eurípides de Marília – UNIVEM e no programa de mestrado desta última.
Procurador do Estado do Estado de São Paulo.
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RICARDO PINHA ALONSO / LUIZ FERNANDO KAZMIERCZAK (
Orgs.)
sistema jurídico pátrio não permite a desproporção e falta de razoabilidade na
valoração e solução de conitos entre direitos constitucionalmente previstos.
Visa o referido Projeto de Lei abolir peremptoriamente quaisquer pos-
sibilidades de a mulher praticar o aborto.
Signica que as causas legais acobertadas pelo manto legal e da Juris-
prudência não mais seriam reconhecidas como legítimas e o aborto passaria
a ser crime em toda e qualquer situação.
O caráter extremista demonstrado pelo Estatuto do Nascituro demons-
tra que a aludida proporcionalidade não foi respeitada, fato este que isolada-
mente já é suciente para declarar-se o texto legal como inconstitucional.
Questões outras como a criação de despesa pública sem a previsão
de receita para custeá-la e a afronta ao princípio da isonomia também per-
meiam o polêmico texto do Estatuto do Nascituro.
Para além disso, a inviabilização de pesquisas cientícas que se utili-
zam de matrizes genéticas extraídas de embriões excedentários também são
pontos que revestem os debates acerca do Estatuto do Nascituro que der-
roga a Lei de Biossegurança em tal ponto.
Inegável que, embora necessária a proteção jurídica da vida em expec-
tativa, não se pode desprezar preceitos constitucionais atinentes à dignidade
da pessoa humana e à isonomia entre os destinatários da norma jurídica.
4.2. A profundidade jurídica do termo nascituro
Importante para o desenvolvimento do presente trabalho é perquirir-
se inicialmente do que se trata a expressão “nascituro”.
Já no Direito Romano havia preocupação referente ao produto da
concepção. Contudo, muito mais restrita do que aquela experimentada
atualmente pela legislação pátria em vigor.
Desde os tempos do Direito Romano, já havia normas que falavam
so nascituro. Naqueles idos, a personalidade jurídica coincidia com o nas-
cimento. O feto nas entranhas maternas era uma parte da mãe (portio mulie-
res vel viscerum), e não uma pessoa, um ente, um corpo. Não obstante isso,
os seus interesses já eram resguardados e protegidos, e em atenção a eles,
determinava-se antecipação presumida de seu nascimento, dizendo-se que
nasciturus pro iam nato habetur quoties de eius commodis agitu. Operava-se,
nestes termos, uma equiparação do infans conceptus ao já nascido, não para
considerá-lo pessoa, porém no propósito de assegurar os seus interesses
(BARBOSA TERCEIRO, 2013, p.1).
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