A pesquisa com embriões humanos excedentários no espaço eurocomunitário: uma análise crítica do caso Óliver Brüstle

AutorMelissa Cabrini Morgato
Ocupação do AutorAdvogada, mestre em Direito e professora licenciada no Curso de Direito do UNIVEM
Páginas241-264
6
A PESQUISA COM EMBRIÕES HUMANOS
EXCEDENTÁRIOS NO ESPAÇO
EUROCOMUNITÁRIO: UMA ANÁLISE
CRÍTICA DO CASO ÓLIVER BRÜSTLE
Melissa Cabrini Morgato(*)
6.1. Introdução
A partir da descoberta do DNA, em 1953, o desenvolvimento cientí-
co, no âmbito das ciências biomédicas, engenharia genética e embriologia,
alcançou horizontes inesperados. A cada dia, cientistas e pesquisadores des-
cobriam novas possibilidades relacionadas à vida, à morte, à sexualidade, à
reprodução humana, às tecnologias conceptivas, ao patrimônio genético e
à muitas outras.
Ainda na década de 1997, cientistas da equipe do Embriologista Ian
Wilmut, do Instituto Roslin, situado em Edimburgo (Escócia) foram capa-
zes, por meio da técnica assexual utilizada para clonar vegetais, de clonar
um animal: a “famosa” ovelha Dolly.
Essa experiência demonstrou que células somáticas adultas são pluripo-
tentes (células tronco), ou seja, células capazes de exprimir a totalidade da ca-
pacidade genética que caracteriza o indivíduo, e de se diferenciarem em vários
tipos de células, inobstante isso “são raras e as vezes difíceis de identicar1”.
(*) Advogada, mestre em Direito e professora licenciada no Curso de Direito do UNIVEM.
Doutoranda em ciências jurídico-políticas pela FDUL – Faculdade de Direito de Lisboa
1 FAGOT-LARGEAULT, Anne, Embriões, células-tronco e terapias celulares: questões
losócas e antropológicas, Estudos Avançados, v. 18, n. 51, p. 22-245, 2004, p. 233.
Bioreito_Bioetica.indd 241 23/12/2013 14:31:55
242
RICARDO PINHA ALONSO / LUIZ FERNANDO KAZMIERCZAK (
Orgs.)
Posteriormente, em 1998, os cientistas James Thomson e John Gearhart
notaram que as células tronco, provenientes de embriões, em estágio inicial
de evolução, poderiam se transformar em vários tipos de células do cor-
po humano. Essas experiências, divulgadas pela imprensa, repercutem de
modo intenso na sociedade contemporânea, gerando preocupação e debate
quanto às possibilidades oferecidas pela engenharia genética.
O incrível potencial terapêutico das células tronco embrionárias causa
polêmica em torno do estatuto do embrião e instiga diversos questionamentos
éticos e jurídicos a respeito do início da vida no sentido de saber se o embrião
extra uterino2, aquele que se encontra congelado em laboratório a espera de
um destino, é vida humana e portador de dignidade humana. A resposta a es-
sas dúvidas reete na possibilidade de se utilizar o embrião em pesquisas que
impliquem em sua destruição e de torná-lo objeto de patente biotecnológica.
Neste âmbito face a recente decisão proferida pelo Tribunal de justiça
da União Europeia (UE)3 (30.10.2011 – Acórdão proferido no Caso Óliver
Brüstle x Greenpeace) que vedou o patenteamento das invenções obtidas a
partir de embriões humano, o objeto do presente trabalho centrar-se-á em
avaliar a tensão que se estabelece entre a permissão das pesquisas com em-
briões humanos e a vedação da patente no espaço eurocomunitário4.
6.2. A regulação eurocomunitária em pesquisas com
células embrionárias e a Diretiva 98/44/CE
Não há consenso mundial acerca da utilização de embriões humanos
em pesquisas cientícas. No que diz respeito a União Europeia, a Carta dos
2 Conforme o parecer n, p./01/APB/05 da Associação Portuguesa de Bioética a respeito do
estatuto do embrião: “por embrião humano ‘excedentário’, ‘supranumerário’ ou ‘supéruo’ se
deve entender aquele embrião que não foi, nem irá, ser transferido para o útero materno – no
âmbito de um processo de fertilização in vitro porque: a) Foram criados mais embriões do que
aqueles que podem ser transferidos num só ciclo e, posteriormente, o casal não pode ou não
quer utilizá-los; ou b) Não é possível a dação desses embriões a outro casal (infértil ou não)”.
3 A Croácia passou a integrar a União Europeia em 30.06.2013, quando já havia se encer-
rado as pesquisas a respeito das legislações dos países euro-comunitários, portanto este
texto não consta de dados sobre a legislação do país.
4 Esta expressão, conforme Maria Luísa Duarte, descreve a “singularidade do modelo jurí-
dico da União, de génese comunitária e de base europeia”. DUARTE, Maria Luísa, União
Europeia : estática e dinâmica da ordem jurídica eurocomunitária, Coimbra: Alme-
dina, 2011, p. 19.
Bioreito_Bioetica.indd 242 23/12/2013 14:31:55

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT