Estado, fascismo e compreensão da codificação do direito comercial no século XXI

AutorGiovani Ribeiro Rodrigues Alves
Páginas97-149
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CAPÍTULO 3
Estado, Fascismo e Compreensão da
Codificação do Direito Comercial no
Século XXI
Conforme observado no capítulo precedente, a
relação entre direito comercial e Estado se mostrou
determinante para a forma e para o conteúdo apresentados
pela disciplina comercialista na fase de sua origem e de
sua codificação, visto que a partir da maior ou menor
vinculação entre o direito comercial e o ente estatal houve
a apresentação de determinadas estruturas e o desempenho
de específicas funções pela disciplina comercialista.
Analisou-se que, em sua origem medieval, o direito
comercial foi fruto da organização da classe mercantil e da
tentativa dos comerciantes de superação do ambiente de
insegurança da Idade Média causado, em expressiva
medida, por conta da descentralização do poder e pela
carência de força do ente estatal.
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Como reflexo deste contexto dentro do qual foi
originado, o direito comercial assumiu as características de
ser classista e desvinculado do Estado tanto em sua
formação quanto em sua aplicação, configuração peculiar
do ius mercatorum e deste primeiro momento histórico do
direito comercial.
Retratou-se que a expressão codificada da disciplina
comercialista, na Modernidade, foi fruto de um ambiente
institucional radicalmente distinto, em que o Estado
gradativamente recuperava sua força e em que o ente
estatal e o direito comercial se aproximaram. Esta nova
configuração trouxe reflexos diretos à formalização, ao
conteúdo e à aplicação da disciplina.
Neste sentido, observou-se que diferentemente do
havido na fase originária, em que o direito comercial era
compreendido como mecanismo para que fossem tutelados
unicamente os interesses dos comerciantes, no período da
codificação francesa a disciplina comercialista era tomada
como uma ferramenta para que também o Estado
alcançasse suas finalidades.
Tal constatação acentuou o caráter estatal do direito
comercial moderno mesmo diante de um Estado
caracterizado por ser essencialmente liberal no plano
econômico
302 vez que houve a aproximação, ainda que
indireta, entre os interesses público e privado na tutela
fornecida pela legislação comercialista francesa.
Adiante, verificou-se que a codificação do direito
comercial foi um dos reflexos da alteração paradigmática
302 LOBO, Jorge. Publicização do Direito Comercial. In: COELHO, Fábio
Ulhoa; LIMA, Tiago Asfor Roch a; NUNES, Marcelo Guedes (coords.).
Reflexões sobre o Projeto de Código Comercial. São Paulo: Saraiva, 2013,
p. 49.
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que caracterizou a passagem da Idade Média para a Idade
Moderna. Especificamente, demonstrou-se que a
codificação do direito comercial foi um dos efeitos
decorrentes da substituição da concepção medieval de
pluralidade de fontes do direito pela moderna, de que o
Estado seria o único ente legitimado para emanar e fazer
valer o ordenamento jurídico vigente.
Por meio da abordagem acima sintetizada, buscou-se
demonstrar que a relação entre o Estado e o direito
comercial assumiu diferentes graus de proximidade no
transcorrer da história e que o vínculo entre ambos trouxe
diferentes influências sobre a disciplina comercialista,
tanto no aspecto formal (inclusive na codificação) quanto
no aspecto material (principalmente no âmbito de
abrangência da tutela).
Com efeito, a supracitada influência do Estado sobre
o direito comercial pode ser vista como um dos reflexos da
primordial relevância dos contextos históricos sobre a
expressão deste ramo do direito. Não por acaso, Ascarelli
acentua que é justamente o fator histórico que distingue o
direito comercial de outras disciplinas, tal a importância
da história sobre a formação, consolidação e
desenvolvimento da disciplina
303.
Prosseguindo com a análise do presente livro,
observa-se que a relevância da história sobre o direito
comercial também é observável ainda que nem sempre
de modo expresso a partir da classificação
tradicionalmente utilizada pela doutrina comercialista a
respeito das fases caracterizadoras do direito comercial.
303 ASCARELLI, Tullio. Iniciação ao Estudo do Direito Mercantil.
Sorocaba: Editora Minelli, 2007, p. 117.

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