Filiação e multiparentalidade no direito de família brasileiro: ressignificação a partir da afetividade

AutorRicardo Calderón
Páginas705-718
FILIAÇÃO E MULTIPARENTALIDADE NO DIREITO
DE FAMÍLIA BRASILEIRO: RESSIGNIFICAÇÃO A
PARTIR DA AFETIVIDADE
Ricardo Calderón
Sumário: 1. Filiação à luz do código civil de 1916 – 2. Posse de estado de lho: afetividade – 3. Leitura
jurídica da afetividade – 4. Direito de liação x direito ao conhecimento da ascendência genética – 5.
Multiparentalidade – 6. Registro extrajudicial da liação socioafetiva – 7. Considerações nais.
1. FILIAÇÃO À LUZ DO CÓDIGO CIVIL DE 1916
A codicação civil brasileira aprovada no início do Século XX reetiu as ideias que
prevaleciam na sociedade daquela época, retratando o que se entendia como família
no texto codicado. O Código Beviláqua vinculava o reconhecimento da família ao
casamento civil; fora dele não era possível vislumbrar alguma outra entidade familiar.1
Diversas das suas disposições procuravam demonstrar a prevalência do homem
sobre a mulher. Ao primeiro, cabiam as principais funções jurídicas da família; já para
a segunda, restava apenas a administração doméstica e outras questões tidas como
menores (sob o ponto de vista de então). Para além disso, originariamente o casamento
era indissolúvel. Dentre algumas características do direito de família codicado era
possível destacar que o texto era precipuamente patriarcal, matrimonial e patrimonial.
O regramento da liação no Código Civil de 1916 se preocupava mais com a tutela
da família enquanto instituição do que com a proteção dos indivíduos enquanto pessoa.
Prova disso, a odiosa distinção entre duas grandes categorias de lhos: os legítimos
(havidos do casamento) e os ilegítimos (havidos fora do casamento, que subdividiam
em naturais e espúrios – incestuosos/adulterinos).2
Vigorava fortemente a presunção pater is est (pai é o marido da mãe), o que reforçava
a prevalência do vínculo formal do matrimônio no estabelecimento dos laços de liação.
Em paralelo, na redação originária do antigo Codex havia vedação para a averiguação
de paternidade de possíveis lhos extramatrimoniais, sob o pálido argumento que isso
poderia abalar a “família enquanto instituição.3
1. MATOS, Ana Carla Harmatiuk. As famílias não fundadas no casamento e a condição feminina. Rio de Janeiro:
Renovar, 2000.
2. MADALENO, Rolf. Curso de Direito de Família. 5. ed., rev. atual. ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2013.
3. FACHIN, Luiz Edson. Direito de família: Elementos críticos à luz do novo Código Civil brasileiro. 2. ed. Rio de
Janeiro: Renovar, 2003.

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