Formas de trabalho análogo ao de escravo no cultivo da cana-de-açúcar no Brasil

AutorMarcelo Roberto Campos, Paulo César Corrêa Borges
Páginas251-271
Escritos Sobre Trabalho Escravo Contemporâneo
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FORMAS DE TRABALHO ANÁLOGO AO DE ESCRAVO NO CULTIVO DA CANA-DE-
AÇÚCAR NO BRASIL
Marcelo Roberto Campos
1
Paulo César Corrêa Borges
2
Resumo: A finalidade deste trabalho é tratar sobre as formas contemporâneas
de trabalho análogo ao de escravo no Brasil, especificamente na atividade
rural do cultivo de cana-de-açúcar, à luz do ordenamento jurídico e, inclusive,
quanto a questões socioeconômicas e a tutela pelo Estado dos direitos e
garantias fundamentais do cidadão, com o objetivo de mostrar os caminhos
para tentativa de sua erradicação. No Brasil, a prática do trabalho análogo ao
de escravo apresenta-se de diversas formas, tais como a do trabalho forçado
ou obrigatório, e a do trabalho realizado em condições degradantes. Estudos
demonstram que a grande maioria dos trabalhadores de cana-de-açúcar são
provenientes de estados do Nordeste, onde a oferta de emprego é escassa,
fazendo com que estes indivíduos busquem trabalho longe de casa e aceitem
ofertas de labor sem garantias de remuneração e/ou condições de trabalho
adequado. Minas Gerais e o Pará são os estados com maior número de casos
de trabalhadores resgatado sem situação análoga ao de escravo. Apesar de
historicamente abolida a escravidão no Brasil, ainda é comum esse tipo de
labor que tem denegrido a imagem do país perante os órgãos internacionais
como a ONU e a OIT, motivo pelo qual não se tem medido esforços na tentativa
de sua erradicação. O auxílio no combate ao trabalho análogo ao de escravo,
no país, iniciou-se na década de 90, do século passado, quando o Brasil
reconheceu, perante a comunidade internacional, a existência de tal prática
em seu território. Assim, Políticas Públicas para erradicação do trabalho
escravo foram implantadas, contando com o apoio desempenhado por órgãos
de fiscalização, tais como Ministério do Trabalho e Emprego, Ministério Público
1
Mestrando do PPGDIREITO/UNESP/FRANCA; Coordenador do Curso Técnico em Serviços
Jurídicos da Éter de Olímpia. Docente do Centro Paula Souza. E-mail:
marcelocampos_adv@hotmail.com.
2
Professor Assistente-doutor de Direito Penal da Universidade Estadual Paulista “Júlio de
Mesquita Filho”, Campus Franca/SP. Professor do PPGDIREITO/UNESP/FRANCA. Coordenador
do NETPDH Núcleo de Estudos da Tutela Penal e Educação em Direitos Humanos. Realizou
pós-doutoramento na Universidade de Sevilla. E-mail: pauloborges@franca.unesp.br.
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do Trabalho, Polícia Federal e Justiça do Trabalho, que libertaram e resgataram
vários trabalhadores do regime de escravidão, sendo necessário combater a
impunidade de tal prática pelos empregadores. Outrossim, o trabalho análogo
ao de escravo no Brasil é definido pelo artigo 149 do Código Penal, que o prevê
como crime e não como mera infração trabalhista, inclusive é considerado
crime contra a dignidade da pessoa humana, com pena de reclusão, além da
pena correspondente à violência contra a pessoa. Por fim, mesmo com todos
os mecanismos já existentes para o combate ao trabalho análogo ao do
escravo, deve-se realizar discussões sobre a forma de repressão, melhores
estratégias de fiscalização e responsabilização dos culpados, além de uma
articulação responsável entre os órgãos governamentais envolvidos. É
importante também que se restabeleça a ordem dos valores humanos e a
prevalência dos princípios fundamentais da dignidade da pessoa humana e do
valor social do trabalho, tratando o trabalho escravo em sua relação com o
direito interno e internacional, bem como do resgate e libertação dos
empregados submetidos a tal labor pelos órgãos de fiscalização. Para a
realização deste trabalho, a metodologia utilizada é de revisão bibliográfica
com trabalhos relacionados ao assunto, de autores fidedignos publicados
entre os anos de 2007 e 2015.
Palavras Chave: Trabalho Escravo. Cana-de-açúcar. Código Penal.
1 Introdução
Segundo Camila Bertelli Apaz (2014), a escravidão surgiu da necessidade
de mão de obra, marcada pela dominação dos que detinham mais poder ou
posse sobre aqueles considerados inferiores. Os escravos eram considerados
como produtos, tendo seu preço baseado em suas habilidades profissionais,
sexo, condições físicas, procedência, entre outros quesitos. Raymundo Carlos
Bandeira Campos, a define como:
A escravidão é a condição social na qual o indivíduo se encontra
dentro de uma sociedade, na sujeição de cativeiro, utilizando a sua
força motriz para fins econômicos e políticos ou na determinação de

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