Hermenêutica constitucional. Conceito, características, métodos, princípios e limites da interpretação constitucional. Mutação constitucional: conceito, espécies e limites

Páginas37-96
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HERMENÊUTICA CONSTITUCIONAL.
CONCEITO, CARACTERÍSTICAS, MÉTODOS,
PRINCÍPIOS E LIMITES DA INTERPRETAÇÃO
CONSTITUCIONAL. MUTAÇÃO
CONSTITUCIONAL: CONCEITO, ESPÉCIES
E LIMITES.
6.1. Conceito de interpretação constitucional
Como toda interpretação jurídica, de que é a espécie
mais relevante, a interpretação constitucional é a atividade
que consiste em xar o sentido das normas da lei fundamen-
tal – sejam essas normas regras ou princípios -, para resolver
problemas práticos, se e quando a simples leitura dos textos
não permitir, de plano, a compreensão de seu signicado e
de seu alcance. Noutras palavras, essa interpretação se im-
põe e tem início onde e quando a compreensão direta dos
enunciados constitucionais já não está ao alcance da mão,
provocando em seus tradutores sensação de estranheza ou
de mal estar hermenêutico. Em poucas palavras, o trabalho
de interpretação da Constituição tem início quando se frus-
tra a comunicação direta com seu texto, e ele já não respon-
de às perguntas de seus leitores.
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INOCÊNCIO MÁRTIRES COELHO
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6.2. Características da interpretação constitucional
À semelhança da levada a efeito nos outros ramos do
direito, a interpretação constitucional possui as característi-
cas comuns à tarefa hermenêutico-jurídica, em geral — lin-
guisticidade, literalidade, objetividade, necessidade, contex-
tualidade e mutabilidade.
6.2.1. Linguisticidade
É preciso entender a linguagem da norma constitucio-
nal, que há de ser comum a todos os seus destinatários − le-
gislador, administrador, juiz e comunidade −, sob pena de
se frustrarem seus objetivos. Quem fala uma linguagem que
mais ninguém fala, rigorosamente não fala 53.
6.2.2. Literalidade
Toda interpretação de um enunciado começa pela cap-
tação/revelação do seu sentido literal. Só depois, advertido
de que essa primeira leitura pode estar equivocada — por-
que decorrente de sua pré-compreensão, e surpreendido
com o aparecimento de sentidos outros nem sequer imagi-
nados — só então o intérprete põe em dúvida aquela com-
preensão inicial e se abre para entendimento diverso, em
fecundo diálogo que tem início consigo mesmo, mas logo
se estende à innidade de interlocutores de seu entorno ou
circunstância. Dá-se, portanto, o debate entre a consciência
jurídica individual e a consciência jurídica geral, tal como
interagem a língua e a fala.54
53 Hans-Georg Ga damer. Verdad y Método. Salamanca : Sígueme, vol. II, 1994,
p. 150; Verdade e Método. Petrópolis-RJ: vol. II, 2002 , p. 179;
54 Ferdinand de Saussure . Cours de Linguistique Général e. Paris: Payot, 1972,
p. 30-31, e Curso de Linguístic a General. Buenos Aires: Los ada, 1945, p.57.
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CARACTERÍSTICAS, MÉTODOS, PRINCÍPIOS E LIMITES...
6.2.3. Objetividade
Objeto da interpretação é o feito e o falado, não a suposta
vontade ou intenção, quer do legislador, quer da lei, até por-
que o intérprete não é psicanalista que deva buscar, por trás
das palavras do legislador, algo que eventualmente ele esteja
a “esconder”. Só as intencionalidades que se objetivaram, na
forma em que efetivamente se objetivaram – em palavras com
sentido – são trabalhadas pelos intérpretes e aplicadores do
direito, em todos os domínios da experiência jurídica55.
6.2.4. Necessidade
Toda norma, por sua condição de síntese, que integra e
supera tensões fático-axiológicas, por interferência decisó-
ria do Poder, em dado momento da vida social, precisa ser
“esclarecida”, a m de que, reconstituindo-se a sua gênese,
possamos compreendê-la, verdadeiramente. A natureza das
coisas é o seu nascimento 56.
6.2.5. Contextualidade
O “verdadeiro” sentido dos enunciados jurídicos
emerge ou se dene em cada situação hermenêutica. Isso sig-
nica dizer que ele só se “revela” no momento da aplicação,
Roland Bart hes. Elementos de Semiologi a. São Paulo: Cultr ix, 16 ª ed.,
2006, p. 19.
55 Emilio Bett i. Interpretación de la ley y de los acto s jurídicos. Madrid:
Revista de Derecho P rivado, 1975, p. 28.
56 Giambattista Vico, apud Rodolfo Mondolfo. Problemas e métodos
de investigação na história d a losoa. São Paulo: Mestre Jou, 1969,
p. 3 0-31.
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