Livrem-nos da Livre Negociação: Aspectos Subjetivos da Reforma Trabalhista

AutorMárcio Túlio Viana
Páginas134-140
CaPítulo
14
LIVREM-NOS DA LIVRE
NEGOCIAÇÃO: ASPECTOS SUBJETIVOS
DA REFORMA TRABALHISTA
Márcio Túlio Viana(1)
(1) Professor no Programa de Pós-Graduação da PUC/Minas. Desembargador Aposentado do TRT da 3ª Região.
(2) A expressão é de HOBSBAWM, Eric. A era dos extremos. São Paulo: Companhia das Letras, 2008, passim.
1. INTRODUÇÃO
Há poucos anos, o Guiness Book divulgava um re-
corde fantástico: um homem havia comido ...um avião!
Era um Cessna. Foi digerido dia após dia, aos pedaci-
nhos. O homem não morreu – e, naturalmente, não
conseguiu voar...
Quem conseguiu voar, mas infelizmente faleceu,
foi um padre do interior de São Paulo. Muitos talvez
se lembrem. Para conseguir fundos para sua igreja, ele
se amarrou corajosamente a dezenas de balões, mas os
ventos o levaram para o mar.
Cito esses dois episódios como exemplos simples
de um mundo complexo, que vive hoje – talvez mais do
que nunca – um acelerado processo de transformação.
E parece que tudo é possível. Como escreveu alguém,
vivemos a “emersão do múltiplo”. (VASQUEZ, 2011)
E se o mundo se transforma em rapidez crescente–
muita gente se pergunta – o Direito do Trabalho não
deveria mudar também?
É claro que sim. Mas até onde? E em qual direção?
De um barco que se orienta pelas estrelas? Dos ventos
que levaram o padre para o mar?
Nas páginas que se seguem, tentarei abordar a nor-
ma do “negociado sobre o legislado”, mas a partir desta
questão de fundo. Tentarei mostrar, em palavras sim-
ples, que espécie de vento estamos seguindo.
Aqui ou ali, pode ser que eu exagere um pouco – ou
pareça óbvio demais. Se cometer essas falhas, peço ao
leitor que me desculpe. Quase sempre, é mais fácil dis-
correr sobre o passado que analisar o presente. Como
acontece com certos defeitos da vista, olhar de longe
pode ser melhor do que ver de perto.
Ainda assim, ou por isso mesmo, é pelo passado que
eu começo.
2. AS EMOÇÕES DE ONTEM
Veja o brilho dos meus olhos
E o tremor nas minhas mãos
E o meu corpo tão suado
Transbordando toda a raça e emoção
(Gonzaguinha, “Sangrando”)
Em 1941, o serviço secreto norte-americano resol-
veu pesquisar Adolf Hitler. E concluiu, com surpresa,
que embora ele fosse feio e sem graça – mesmo para
os padrões daquele tempo –, as pessoas que o viam de
perto, e o ouviam falar, em geral o achavam simpático
(LANGER, 1972).
Este pequeno relato talvez nos ajude a mostrar que
as ideias se ligam, muitas vezes, às nossas emoções. E
se assim é no campo da política, não tem sido diferente
no mundo do trabalho, nem na dimensão do Direito.
Pois bem. Quais eram as emoções há meio século?
E como hoje elas são?
Nos chamados “anos gloriosos do capitalismo”(2), a
visão iluminista, mesmo já um tanto abalada – inclusive
pelas façanhas do próprio Hitler – era ainda bastante
forte. Apesar das guerras, respirávamos um clima de
mais confiança e otimismo. Em boa parte, permane-
ciam os sonhos, as utopias.

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