Como minimizar a sobreutilização da atividade jurisdicional e a morosidade do poder judiciário: a 'tragédia dos comuns' e as soluções propostas por Garret Hardin

AutorHenrique Kurscheidt e Luciana Gonçalves Nunes
Páginas145-183
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CAPÍTULO 5
Como minimizar a
sobreutilização da atividade
jurisdicional e a morosidade
do poder judiciário?
A “tragédia dos comuns” e as soluções
propostas por Garret Hardin
Henrique Kurscheidt
Luciana Gonçalves Nunes
1.INTRODUÇÃO
O presente trabalho busca apontar possíveis caminhos para minimizar o
principal problem a indicado no Estudo da imagem do Judiciário bra sileiro,
com relação a “motivações para recorrer e razões para não recorrer à Jus-
tiça”, qual seja, a morosidade do Poder Judiciário, aplicando-se as soluções
apontadas por Garret Hardin para a chamada “tragédia dos comuns”. No
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DIREITO E ECONOMIA: ANÁLISES APLICADAS
primeiro capítulo, são apresentados dados do aludido estudo. No segundo
capítulo, expõe-se a chamada “tragédia dos comuns”, bem como sua relação
com o tema em debate. No terceiro capítulo, discorre-se sobre a chama-
da “justiça multiportas”, a ef‌icácia, a ef‌iciência e a efetividade das instân-
cias judiciais e admini strativas em que métodos alternativos de solução de
conf‌litos são aplicados. No quarto capítulo, analisam-se as propostas tra-
balhadas por Hardin, para “problemas sem solução técnica”, quais sejam,
a educação e a “regulação de acesso ao bem comum”. Por f‌im, conclui-se
que as soluções apresentadas por Hardin são viáveis para o enfrentamento
de alguns aspectos relacionados à sobreutilização e à morosidade do Poder
Judiciário, em especial, em demandas envolvendo relações consumeristas.
2. MOTIVAÇÕES PARA RECORRER E RAZÕES
PARA NÃO RECORRER À JUSTIÇA
A Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) encomendou à Fundação
Getulio Vargas (FGV) um diagnóstico de imagem intitulado Estudo da
imagem do Judiciário brasileiro, com vistas a colher informações inéd itas
sobre as percepções e as expectativas da população a respeito da atuação
da Justiça no Brasil.
O estudo, concluído em dezembro de 2019, ao averiguar “motivações
para recorrer e razões para não recorrer à Justiça”, constatou que a maio-
ria da sociedade (59%) considera que “vale a pena recorrer à Justiça”. Entre
as situações que motivam o acionamento do Poder Judiciário, destacam-se
quatro: (i) “garantia dos direitos previstos na legislação” (54%); (ii) “violação
ao direito do consumidor” (52%); (iii) omissão da administração pública na
“prestação de serviços públicos” (42%); (iv) “questões tributárias” (21%).1
1. ASSOCIAÇÃO DOS MAGISTR ADOS BRASILEIROS (A MB). Estudo da imagem do Jud iciário
brasileiro, 2019. Disponível em: htt ps://www.amb.com.br/wp-content/uploads/2 020/04/ESTU-
DO_DA_IM AGEM_.pdf. Acesso em: 14 jul. 20 20. p. 27.
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COMO MINIMIZAR A SOBREUTILIZAÇÃO DA ATIVIDADE JURISDICIONAL…
Em outro viés, foram apontadas diversas razões que desestimulam
as pessoas a buscar o Poder Judiciário. Mencionam-se as mais recorren-
tes: (i) “a Justiça é muito lenta e burocrática” (64%); (ii) favorecimento a
“quem tem dinheiro e poder” (28%); (iii) baixa resolutividade/ineficiência
(20%); (iv) “as penas são muito leves” (19%); (v) “pouca informação sobre
como ter acesso e o que fazer” (15%); (vi) “as decisões não são justas, não
são imparciais” (14%); (vii) “as custas são altas” (14%); (viii) “dificuldades/
demora em receber indeni zação” (11%).
Em relação às causas da sobrecarga do Judiciário, foram apontadas,
em especial: (i) a “ausência de atuação das agências reguladoras e de ou-
tras instância s administ rativas de resolução das demandas da sociedade”
(48%); (ii) a “ineficiência dos serviços públicos” (47%); (iii) a “omissão do
Poder Legislativo” (35%); (iv) a “ampla previsão de direitos individuais,
sociais e coletivos na Constituição” (31%).2
Da análise dos dados coligidos, conclui-se, em síntese, que, por um
lado, a maioria da sociedade considera que “vale a pena recorrer à Justi-
ça”, em especial, para “garantia dos direitos” e/ou em virtude de “viola-
ção ao direito do consumidor”. Todavia, o principal problema seria que
“a Justiça é muito lenta e burocrática”, precipuamente, pela “ausência
de atuação das agências reguladoras e de outras instâncias administra-
tivas de resolução das demandas da sociedade” e/ou pela “ineficiência
dos serviços públicos”.
Partindo-se dessas premissas, o presente trabal ho busca apontar pos-
síveis caminhos para minimizar o principal problema identificado, com
relação a “motivações para recorrer e razões para não recorrer à Justiça”,
qual seja, a morosidade do Poder Judiciário. Inicialmente, apresenta-se o
marco teórico do trabalho, vale dizer, a chamada “tragédia dos comuns”,
tratada por Garret Hardin.
2. ASSOCI AÇÃO DOS MAGISTRADOS BRASILE IROS, op. cit., p. 115.

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