O Novo CPC e o regime probatório no processo civil brasileiro, com ênfase na realização de mais completa instrução

AutorFernando Rubin
Ocupação do AutorAdvogado sócio do Escritório de Direito Social, especializado em saúde do trabalhador. Bacharel em Direito pela UFRGS, com a distinção da Láurea Acadêmica
Páginas115-129

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Tratamos até aqui da linha histórica de formação do Novo CPC, investigamos o período de maturação do Codex dentro do Congresso Nacional, falamos, em linhas gerais, de novidades e supressões, e ainda buscamos investigações tópicas que confirmam a sistematização de uma nova lógica do ordenamento adjetivo.

Chegamos, enfim, aos derradeiros avanços, em que retomando a concepção de uma investigação mais ampla, tratemos de pontos decisivos do processo civil, que devem exigir permanente interesse e atenção dos operadores do direito.

Enfrentemos a temática probatória, as disposições recursais e as novidades interessantes na órbita dos procedimentos executivos judiciais e extrajudiciais; investigando, por fim, a título de prévia conclusão, alguns cenários de aplicação do Novo CPC nos ritos dos Juizados Especiais e da Justiça do Trabalho.

Iniciemos com o estudo da prova, abordando a legislação específica sobre o tema (arts. 358/484), não olvidando os avanços já realizados, notadamente aqueles envolvendo a flexibilização procedimental com o direito das partes no incremenento de negócios processuais e acordos de procedimentos (arts. 190/191).

Em matéria probatória, não podemos dizer que o Novo CPC (Lei n. 13.105/2015) veio para trazer reformulações amplas no sistema posto. E nem poderia.

A sistemática das provas, como uma teoria geral435 e as disposições referentes às provas em espécie436, nunca foi tema de maiores exames críticos na doutrina e na jurisprudência, principalmente em razão da boa técnica adotada pelo Código Buzaid437.

Assim, o que se nota com o novel modelo adjetivo são alguns ajustes, a fim de que se obtenha com cada meio probante tipificado o máximo de resultado dentro do processo; além disso, já tivemos a oportunidade de enaltecer o comando geral contido no art. 369 a explicitar o direito fundamental à prova, determinando

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que a negativa de sua admissibilidade por parte do Estado-juiz só ocorra em situações excepcionais - cenário confirmado pelo próximo art. 370, parágrafo único, a exigir decisão fundamentada para o caso de indeferimento de meio probante requerido pela parte438. E havendo eventuais dúvidas quanto ao âmbito de aplicação da norma processual, deve o operador do direito se socorrer dos princípios constitucionais que regulamentam a matéria, em que confirmado um direito prioritário à prova, forte no art. 1º do Novo CPC c/c art. 5º da CF/1988.

Reforçam-se os poderes instrutórios do magistrado, como também autoriza-se maior liberdade para a participação ativa das partes litigantes na produção da prova, o que tende a afastar a malfadada lógica pretoriana de que "o juiz é o destinatário da prova"439.

Sabido que os destinatários da prova são todos os agentes envolvidos na relação jurídico-processual, sendo importante realmente esse movimento de cooperação processual, repercutindo o princípio processual constante já no art. 6º do Novo CPC.

É, pois, distorcida e contrária aos modernos contornos do devido processo legal essa convicção de que o juiz é o destinatário da prova, ao menos por dois fundamentos: por colocar os atores do processo em posição de manifesta desigualdade, supervalorizando a figura do Estado-juiz, como se os argumentos trazidos pelos meios probantes fossem destinados à convicção tão só do julgador, e não das partes litigantes440; e por negar que haja a real possibilidade de o juiz de primeiro grau não ser o efetivo "julgador" da demanda, ao passo que o princípio do duplo grau de jurisdição permite que superiores instâncias passem a reavaliar a causa (e o próprio material probatório aportado), sendo daí perfeitamente possível se suceder que aquela prova tida como irrelevante pelo Juízo a quo (e, por isso, indeferida), pudesse auxiliar (quiçá decisivamente) na formação do convencimento do Juízo ad quem441.

Avancemos, então, para o exame comparativo dos diplomas processuais, iniciando sob a ótica da prova pericial e da inspeção judicial, meios típicos que em muito se assemelham.

A necessidade da prova pericial está ligada a questões técnicas, conforme regula o art. 420 do CPC/1973 e o art. 464 do Novo CPC. Mesmo porque não deve ser realizada quando for desnecessária em vista de outras provas produzidas (entenda-se: prova documental já acostada ao processo).

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Trata-se de meio de prova técnico, importantíssimo quando há necessidade de aprofundamento da instrução (fase instrutória, pós saneamento). Em verdade, é prova tão relevante, que pode ser verificada mesmo em fase de execução, para fins de quantificação dos valores devidos, com a possibilidade de abertura de incidente de liquidação de sentença (art. 475-D do CPC/1973 e art. 510 do Novo CPC).

Na forma tradicional, deve a prova pericial ser produzida depois da prova documental e antes da audiência de instrução e julgamento, mesmo porque podem os peritos, oficial e assistentes, comparecer à audiência para responder a quesitos de esclarecimento - espécie de complementação oral de sua participação escrita já aportada ao processo (art. 435 do CPC/1973 e art. 477 do Novo CPC).

Observa-se, no entanto, de acordo com o art. 139, VI, do Novo CPC, que o juiz poderá inverter a ordem das provas, caso se mostre mais adequado à regular tramitação do feito, diante da realidade do caso sub judice - certamente ouvindo com antecedência as partes litigantes, como determina o comando geral do Codex contido no art. 10.

Há ainda condição da prova técnica indispensável não ser produzida, quando emprestada de outro feito. Nessa hipótese, de prova atípica na órbita do CPC/1973442 e que passa agora a ser regulada pelo Novo CPC no art. 372, opera-se o traslado da prova de processo originário para processo secundário, devendo ter (em ambos os processos) a participação da parte contra quem a prova desfavorece, sendo então importante o estabelecimento do contraditório no processo originário com a participação ao menos desta parte - em caso de não existir essa identidade, pode-se cogitar de utilização dessa prova não com o peso de prova emprestada (que determinaria a desnecessidade de realização da prova técnica no feito secundário), sendo recebida como prova documental unilateral (pré-constituída - sendo inclusive essa a forma que vai assumir no feito a ser julgado), a estar obrigatoriamente sujeita ao contraditório no momento de ingresso no processo secundário.

O aludido art. 372 do Novo CPC, de modo muito econômico, somente regula que o juiz poderá admitir a utilização de prova produzida em outro processo, atribuindo-lhe o valor que considerar adequado, observado o contraditório.

Outra medida substitutiva da tradicional perícia oficial, mais aprofundada pelo Novo CPC, cinge-se à produção de "prova técnica simplificada". Regula o art. 464, §§ 2º a 4º, da Lei n. 13.105/2015, que é viável tal medida quando o ponto controvertido for de menor complexidade, cabendo daí ser feita tão somente a inquirição do especialista (oral e não por escrito), pelo juiz, sobre ponto controvertido da causa que demande especial conhecimento científico ou técnico, como já sucede nos juizados especiais443.

Agora, sendo necessária a perícia oficial, o Novo CPC destaca que o juiz nomeará expert "especializado no objeto da perícia" (art. 465 do Novo CPC), a fim de que realmente se tenha o melhor resultado possível, garantindo também economia processual.

Por outro lado, forçoso reconhecer que as partes, pelo novo texto, podem interferir mais na escolha do perito, auxiliando o Estado-juiz nessa missão. A uma, pelo fato de as partes poderem estabelecer uma espécie de acordo de procedimento, conforme regulamenta o já destacado art. 191 do Novo CPC, trazendo ao processo um projeto de sequência da instrução, inclusive com o nome do perito oficial escolhido de comum acordo entre

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os litigantes; a duas, pela circunstância de ser possível a realização de audiência de saneamento no processo, conforme regulamenta o art. 357, § 3º, a fim de que em causas de maior complexidade o prosseguimento para realização da prova pericial seja feito "em cooperação com as partes", de modo presencial - nesse último caso, as partes poderão, de comum acordo, escolher o perito, mediante requerimento, desde que sejam plenamente capazes e a causa possa ser resolvida mediante autocomposição (art. 471).

Saneado o processo, explicita ainda o art. 357, agora no § 1º, que as partes têm o direito de pedir esclarecimentos ou solicitar ajustes, no prazo comum de 5 dias, sob pena de "estabilização" da medida444 - seria uma espécie de embargos declaratórios capaz de solucionar determinados impasses antes de se iniciar a fase próxima do procedimento, in casu com a realização da prova técnica.

A nomeação dos assistentes técnicos e a indicação de quesitos até realização da data da perícia oficial é momento ímpar no processo445.

A participação dos assistentes técnicos em contraditório pleno com o perito oficial é importante para a qualidade do resultado da perícia. Daí por que entendemos perfeitamente viável ser prorrogado, pelo Juízo, o prazo para apresentação dos assistentes e mesmo o encaminhamento dos quesitos ao perito oficial, na situação do procurador da parte não ter cumprido com o prazo legal para tais medidas, contados a partir da intimação da data aprazada para o evento solene.

Pelo CPC/1973, o prazo era de 5 dias, conforme dicção do art. 421; já pelo Novo CPC o prazo é de 15 dias de acordo com o art. 465. Louvável o acréscimo de prazo regular, diante da importância da medida, como explicado. Ademais, pela sistemática do Novo Codex, como alhures já descrito, temos a confirmação da possibilidade de prorrogação de prazo no amplo dispositivo contido no art. 139, VI, a autorizar que o juiz não só altere a ordem das provas, mas também prorrogue prazos na instrução446.

Trata-se aqui de típico prazo dilatório, que pode ser prorrogado em situações excepcionais. Pela relevância da participação do perito assistente (necessário no estabelecimento do contraditório técnico) e...

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