Origem da investigação criminal
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ORIGEM DA INVESTIGAÇÃO CRIMINAL
1.1 Origem da investigação criminal no mundo
[...] quaisquer que sejam os passos, quaisquer objetos tocados por ele, o
que quer que seja que ele deixe, mesmo que inconscientemente, servirá
como uma testemunha silenciosa contra ele. Não apenas as suas pegadas
ou dedadas, mas o seu cabelo, as bras das suas calças, os vidros que ele
porventura parta, a marca da ferramenta que ele deixe, a tinta que ele ar-
ranhe, o sangue ou sêmen que deixe. Tudo isto, e muito mais, carrega um
testemunho contra ele. (Edmond Locard)
Ainvestigação criminalé fruto do desenvolvimento histórico, as-
sim como outras disciplinas cientícas. Hoje assistimos pelos meios
de comunicação social as investigações policiais realizadas pela Polícia
Federal e Polícia Civil, assim como no âmbito cultural há vigorosa c-
ção detetivesca, surgindo, então, interesse pela origem histórica da in-
vestigação criminal como uma organização especializada que maneja
conhecimentos especícos, através de prossionais com cultura própria
e que empregamprincípios e metodologias distintas de outras áreas.
Desde os tempos mais remotos já havia mecanismos para perseguir
os criminosos, quando já encontrávamos noCódigo de Hamurabi, no
século XVIII a.C., procedimentos para imposição de castigos, passando
pelaArthasastrahindu do século IV a.C. e oCódigo de Manupor volta
do século II a.C., até chegarmos à Grécia Antiga e ao Império Romano
com asquestiones perpetuaem que o acusador desenvolvia uma investi-
gação e instrução do caso apresentado ao pretor, que acabou evoluindo
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Célio Jacinto dos Santos
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para a criação da gura doirenarcha, do curiosi e do stationari como
responsáveis pela investigação de crimes em ambiente no qual vice-
javam naquela época: furtos, roubos, vagabundos, ladrões habituais.
Neste período as atividades eram exercidas por órgãos personalizados,
não constituíam ainda instituição com corpo permanente e prossional
(Fentanes, 1979, p. 25 e 33).
Com o enfraquecimento da acusatio do período republicano,
quando a investigação e acusação eram de natureza popular, ou seja, o
cidadão podia perseguir os delitos públicos em nome do povo, surgiu
na fase imperial romana, junto ao praefectus urbis – que era considera-
do magistrado de ordem superior no exercício de funções estatais – o
stationarii em postos xos, na cidade de Roma, e o curiosi nas provín-
cias que tomavam conhecimentos dos crimes (Maier, p. 287). Fentanes
(1979, p. 27 e 33) relata que Roma era dividida em bairros sob responsa-
bilidade de um curator urbis com apoio dos denuntiatores como agentes
investigadores e lictores. O curator urbis corresponderia aos comissários
ou aos delegados de polícia dos tempos modernos, segundo o autor.
Curiosi exprime a ideia de investigar, explorar, de se informar, de
fazer perguntas e, também, está relacionada à inquisitividade. Deriva do
latim curiosus e corresponde àquele que é diligente, cuidadoso, inquiri-
dor, assim como cura signica cuidado. É uma tendência natural do ser
humano ter sede de conhecer a verdade, a natureza e os acontecimentos
naturais e humanos, intermediado pelos órgãos do sentido, com desta-
que para os olhos. O desejo excessivo por conhecer leva à curiosidade e
se constitui em vaidade, uma busca desordenada por coisas transitórias,
vãs e frívolas – a exemplo de Eva, no Livro do Gênesis, que desejou do-
minar pelo conhecimento do bem e do mal –, e a falta de curiosidade
leva ao descaso, descuido ou desinteresse.
Apesar das dúvidas que se possa lançar sobre as funções e níveis
de autoridades dos stationarii, curiosi e irenarchi, como assinala Michel
Rassat (apud Meireles, p. 13), pode-se armar que elas exerciam a função
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