Tipos de investigação criminal

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TIPOS DE INVESTIGAÇÃO CRIMINAL
A investigação criminal pode assumir várias facetas nos mais va-
riados contextos da vida social, seja na academia, na sociedade, na em-
presa, na doutrina, na cultura, na arte, principalmente nas instituições
ociais incumbidas de realizá-la. Contudo, em todos os contextos estará
presente o núcleo duro da atividade: a descoberta e o conhecimento de
crime para sua repressão.
Vamos analisar neste capítulo alguns tipos de investigação, ou seja,
algumas formas/modelos de pesquisas que possuem um conjunto de
características interligadas que se repetem nas diversas facetas, as quais
acabam se inserindo no conceito de investigação criminal. Os tipos ana-
lisados exploram o tempo, o modo, a matéria e os sujeitos da investiga-
ção, socorrendo-se dos construtos teóricos da teoria do conhecimento,
já que reconhecemos que ela oferece pautas teóricas essenciais para o
estudo da investigação criminal.
5.1 Tipos de investigação quanto ao tempo
O estudo do tempo na investigação criminal pode adotar diversas
abordagens, com destaque para o princípio do imediatismo no início das
diligências investigativas para propiciar maior êxito nas investigações,
sob pena de os vestígios e indícios se perderem pela ação do tempo e da
natureza, ou no princípio da oportunidade no qual a celeridade nas in-
vestigações convive com a conveniência da medida conforme a melhor
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Célio Jacinto dos Santos
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tática para o caso concreto. Referidos princípios serão analisados no
Capítulo 7 deste ensaio.
A ideia central defendida pelos clássicos, não acatada integralmen-
te por nós, em que reduz o tempo da investigação criminal ao passado,
nos leva a problematizar o “pré” e o “pós” do fato criminal, ou seja, o
antes e o depois. Entendemos que a pós-cognição do crime não resolve a
questão do enfrentamento criminal, pois temos de olhar também para o
“agora” e o ulterior, o que poderá acontecer no futuro, contudo, não po-
demos esquecer, com Lyotard (1997, p. 33), que o “agora, e muito mais o
futuro, é difícil de se apoderar porque “é constantemente arrastado por
aquilo a que chamamos o uxo da consciência, o curso da vida, das coi-
sas, dos acontecimentos, como quisermos – ele não cessa de se dissipar”.
A dimensão temporal permeia toda vida do homem em sociedade e
logicamente do ato criminoso, por conseguinte, o tempo inuencia o ato
investigativo e deve ser analisado pelo criminalista, principalmente quan-
do se analisa a ocorrência criminal considerada estaticamente num ponto
do tempo e o espaço que a separa da realização da investigação para escla-
recê-lo, ou seja, investigação de fato presente, de fato passado ou futuro.
O tempo não determina o fato, ao revés o fato que determina o
tempo com a denição de uma posição temporal para o mesmo, xando
o fato para àquele que o investiga.
Na discussão losóca e cientíca sobre o tema, depara-se com po-
sições que remetem a Aristóteles, Agostinho de Hipona, Newton e ou-
tros autores modernos como Mach, Braudel e Heidegger, com destaque
para os contributos vindos da física, dentre eles Einstein e sua teoria da
relatividade que relaciona o tempo ao espaço e à velocidade e, portanto,
ao movimento, à mudança que denota a existência do tempo. A corren-
te mais antiga aponta que o tempo é uniforme, homogêneo, reversível,
escalar e mensurável (Aróstegui, 2006, p. 274).
Há fenômenos que são irreversíveis, como exemplica Klein (1995,
p. 28) é impossível ver um bolo de chocolate reaquecer espontaneamente,
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ou um ser vivo rejuvenescer. Entretanto, no âmbito das partículas mi-
croscópicas da física elas são reversíveis, como num lme visto ao con-
trário ou no sentido contrário de uma seta.
Todas essas explanações nos colocam diante da diculdade em si-
tuar o tempo da investigação criminal, “uma vez que o passado já não
existe e que o futuro ainda não existe, uma vez que o próprio presente
deixa de existir cada vez que se encontra a começar” (Klein, 1995, p. 77).
Isso nos leva a considerar que o único tempo verdadeiro é o presen-
te, explanado por Klein (1995, p. 79), devido ao conforto que nos pro-
porciona a sua imutabilidade, que não encontra um m e está sempre
presente, “ao contrário do passado e do futuro, que só existem através
do pensamento, sob a forma de recordação ou de expectativa, mas que
não estão ao nosso dispor (idem, p. 78). É no presente que colhemos os
vestígios de crime do passado, seus efeitos e os danos provocados. Da
mesma maneira colhemos dados ou elementos de provas de crimes que
poderão ocorrer no futuro, mas ontologicamente em ambos estamos
buscando conhecer o crime para reprimi-lo e proporcionar a paz social.
Como magistralmente ensina Santo Agostinho (1984, p. 344) ao
destacar o presente, três são os tempos: “[...] o presente dos fatos pas-
sados, o presente dos fatos presentes, o presente dos fatos futuros, que
correspondem respectivamente à memória, à visão e à espera, ou aos
três momentos do espírito: lembrança, atenção e expectativa, de ma-
neira “que aquilo que a alma espera torna-se lembrança depois de ser
objeto de atenção” (1984, p. 235). Prosseguindo com o autor, resta-nos
“materializar” aquilo que não existe, tanto o passado como o futuro. A
memória nos traz as palavras que exprimem imagens do fato que são
impressas no espírito humano, como as imagens do tempo de infância
que estão na minha memória e podem ser resgatadas no presente (idem,
p. 343). Também, na predição do futuro não se alcança os acontecimen-
tos que ainda não existem, mas “as causas ou os sinais precursores que
já existem”, como no exemplo da aurora que é vista e permite prever
o surgimento do sol, através de imagens que estão no presente (1984,
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