Planejamento sucessório: a tutela da autonomia privada como reflexo da evolução do direito das sucessões

AutorBruna Vilanova Machado
Ocupação do AutorMestranda em Direito Civil pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro ? UERJ. Advogada
Páginas493-514
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PLANEJAMENTO SUCESSÓRIO:
A TUTELA DA AUTONOMIA PRIVADA COMO REFLEXO DA
EVOLUÇÃO DO DIREITO DAS SUCESSÕES
Bruna Vilanova Machado1
Sumário: 1. Introdução. 2. Direito das Sucessões: do Código Civil de 1916
ao Código Civil de 2002. 3. Família e Patrimônio: a evolução dos dois
pilares do Direito das Sucessões. 4. Planejamento sucessório como
exercício legítimo da autonomia privada. 5. Conclusão. 6. Referências.
1. Introdução
O presente trabalho tem por objetivo analisar a legitimidade do
planejamento sucessório como instrumento de exercício de autonomia
privada por parte do titular da herança que, ainda em vida, regulamenta a
distribuição de seu patrimônio por meio de institutos que produzirão seus
plenos efeitos após a sua morte.
Para a referida análise, será realizada um exame histórico e
evolutivo do Direito das Sucessões, tendo como premissa metodológica o
Direito Civil-Constitucional e como parâmetro normativo os dispositivos
do Código Civil.
A partir dessas premissas, se analisará, no segundo capítulo, a
evolução legislativa do Direito das Sucessões, em exame comparativo
entre as disposições do Código Civil de 1916 e do Código Civil de 2002.
Nesse ponto, será desenvolvido o contexto econômico e político em que os
sucessivos diplomas civis foram publicados, para demonstrar a axiologia
valorativa que orientou as regras de direito hereditário nessas legislações.
Em seguida, no terceiro capítulo, será proposta uma análise da
evolução dos conceitos de patrimônio e família, os dois pilares que
sustentam o Direito das Sucessões. Pretende-se demonstrar que as
1 Mestranda em Direito Civil pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro UERJ. Advogada.
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modificações sociais pelas quais passou a sociedade contemporânea levam
à insuficiência de uma leitura puramente estrutural desses dois institutos,
sendo necessário que tal exame ceda lugar a uma perspectiva
funcionalizada.
No quarto capítulo, tratar-se do tema do planejamento
sucessório, estratégia por meio da qual o titular de herança futura organiza,
ainda em vida, a distribuição de seus bens após a sua morte. Como se
demonstrará, o planejamento sucessório representa estratégia válida e
eficaz de organização patrimonial, sendo merecedora de tutela na medida
em que realize os valores constitucionais do ordenamento jurídico.
A título de conclusão, busca-se evidenciar que o planejamento
sucessório representa forma legítima de exercício da autonomia privada,
que realiza os anseios de flexibilidade que os indivíduos capazes e
responsáveis possuem no âmbito da contemporânea família
funcionalizada.
2. Direito das Sucessões: do Código Civil de 1916 ao Código Civil
de 2002
O Código Civil brasileiro de 1916 foi desenvolvido a partir de uma
ótica individualista e voluntarista, orientado pelos ideais políticos liberais
que estavam em voga no mundo ocidental. Sua publicação teve inegável
inspiração no Código Civil francês de 1804, o chamado Código Napoleão,
símbolo da Escola da Exegese.
Portanto, o dogma dominante na produção legislativa brasileira
quando da edição do Código Civil de 1916, se baseava na pretensa
permanência e completude das codificações.2 O diploma civil, então, era
compreendido como suficiente para regulamentar todos os aspectos da vida
2 Confira-se a clássica lição de Norberto Bobbio: “A cada grande codificação (desde a francesa de 1804
até a alemã de 1900) desenvolveu-se entre os juristas e os juízes a tendência de ater-se
escrupulosamente aos códigos, atitude esta que foi chamada, com referência aos juristas franceses em
relação aos códigos napoleônicos, mas que se poderia estender a cada nação com Direito codificado,
de fetichismo da lei. Na França, a escola jurídica que se foi impondo depois da codificação é geralmente
designada com o nome de escola da exegese, e se contrapõe à escola científica, que veio depois. O
caráter peculiar da escola da exegese é a admiração incondicional pela obra realizada pelo legislador
através da codificação, uma confiança cega na suficiência das leis, a crença de que o código, uma vez
promulgado, basta-se completamente a si próprio, isto é, não tem lacunas: numa palavra, o dogma da
completude jurídica” (BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico. 6ª ed. Brasília: Editora
Universidade de Brasília, 1995, p. 121).

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