Políticas públicas judiciárias
Autor | Morgana De Almeida Richa |
Ocupação do Autor | Doutora e Mestre em Direito Constitucional pela PUC/SP. Graduada em Direito pela UFPR |
Páginas | 161-247 |
Capítulo 4
POLÍTICAS PÚBLICAS JUDICIÁRIAS
4.1. Emergência de programas de ação político-institucional no Judiciário
O enfoque preponderante a respeito de políticas públicas considera a ideia
de que os direitos sociais são marcados pela necessidade de atuação do Estado
por meio de programas governamentais concebidos no ambiente político,
concretizados em regra pela função estatal executiva e sujeitos à justiciabilidade
no que tange ao processo de formulação e resultados correspondentes.
De outra sorte, assentado na doutrina que as grandes linhas das polí-
ticas públicas seus objetivos e diretrizes conguram opções políticas que
cabem aos representantes do povo, ou seja, ao Poder Legislativo, cujo papel é
organizá-las sob forma de leis para posterior execução pelo Poder Executivo,
segundo a clássica tripartição das funções estatais(370).
Em alargamento ao prisma originário, Maria Paula Dallari Bucci pondera
ilógica a limitação de que as políticas públicas possam apenas ser impostas
pelo Legislativo ao Executivo. Diante da dimensão assumida pela normati-
vidade do Poder Executivo, correto seria defender a realização de políticas
públicas por iniciativa direta desse Poder, ainda que dentro das diretrizes e
dos limites aprovados pelo Legislativo(371).
Mais além, observado o contexto da ampliação de direitos e de mudança
política, a sociedade demanda aprimoramento do Estado prestacional, o que, por
sua vez, exige uma postura mais ativa de todos os três poderes que o compõe,
cuja tripartição cartesiana tradicional está superada, dando lugar a um Estado
de unidade com atuação sistêmica das competências e atribuições colaborativas
entre os poderes estatais.
Direito é política (law is politics)(372). São urgentes os reclamos por políticas
públicascomnseconômicosociaisculturaisparaatenderapropostaemque
BUCCI Maria PaulaDallari Direito administrativo epolíticas públicas. São Paulo: Saraiva,
2002. p. 269.
BUCCI Maria PaulaDallari Direito administrativo epolíticas públicas. São Paulo: Saraiva,
2002. p. 271.
CANOTILHOJoséJoaquimGomesEstudosobredireitosfundamentais. 2. ed. São Paulo: RT;
Portugal: Coimbra, 2008. p. 130.
Morgana de Almeida Richa
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se conformou o Estado Democrático de Direito. Neste contexto, cabe mais ao Judi-
ciário que analisar normativas quanto às “proibições e sanções” ou “cálculos e
gestão”. A função do jurídico passa a compreender também um “discurso perfor-
mativo” e que permita “atar o laço social e oferecer aos indivíduos as marcas
necessárias para sua identidade e sua autonomia”(373).
Doponto devistateórico epráticohá portanto umainexãonecessária
na superação da perspectiva tradicional, para apresentar o Poder Judiciário,
órgão integrante da administração do Estado(374), como formulador de políticas
públicas. Em tal viés, observa-se que o princípio da inércia tem aplicação restrita
para dentro do processo (limites de sua decisão adjudicada), pois para além do
processo, como poder estatal, o protagonismo do Judiciário sugere postura de
sujeito ativo (policymaker) de serviços judiciários.
NestemisteroJudiciárioguracomoresponsávelpelaindicaçãoderecur-
sospela denição dofocode beneciários epeladeterminação dos traçados
na própria esfera de atuação, com o objetivo principal de satisfazer a garantia
constitucional do acesso à justiça na promoção de uma ordem jurídica justa em
sua amplitude considerada.
Necessário desde logo breves apontamentos sobre a teoria da separação
dospoderesestataisparaaonalconcluirqueaformulaçãodepolíticaspúbli-
cas pelo Poder Judiciário está inserida nas atribuições atípicas desempenhadas
por esse poder, em redesenho da função estatal.
Conceitualmente, a doutrina moderna tende a considerar que a teoria
da separação dos poderes engendrou um mito e levou a um desvirtuamento.
Consistiria este equívoco na atribuição a Montesquieu de um modelo assen-
tado na teoria dos três poderes rigorosamente separados: o Executivo, o
OSTFrançoisOtempo do direito. Tradução de Élcio Fernandes. Bauru: Edusc, 2005. p. 6.
NoparticularnãoédemasiaoapontamentodeAnaPauladeBarcelloscompeteàAdmi-
nistração Pública efetivar os comandos gerais contidos na ordem jurídica e, em particular, garantir
e promover os direitos fundamentais em caráter geral. Para isso será necessário implementar
ações e programas dos mais diferentes tipos e garantir a prestação de determinados serviços. Em
suma: será preciso implementar o que se descreveu acima como políticas públicas. É fácil perceber
que apenas por meio das políticas públicas o Estado poderá, de forma sistemática e abrangente,
realizar os fins previstos na Constituição (e muitas vezes detalhados pelo legislador), sobretudo
no que diz respeito aos direitos fundamentais cuja fruição direta depende de ações. (BARCELLOS,
Ana Paula de. Constitucionalização das políticas públicas em matéria de direitos fundamentais:
o controle político-social e o controle jurídico no espaço democrático. In: (Orgs.) SARLET, Ingo
WolfgangTIMMLuciano BeneiDireitosfundamentais: orçamento e reserva do possível. Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 2008. p. 116-117).
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Legislativo e o Judiciário, em funções próprias a cada qual, ausente qualquer
interferência dos outros(375),(376).
Sem adentrar na primazia dos diversos desenhos adotados, uma separação
rígida de poderes nunca foi plausível, tampouco constituiu este o propósito de
Montesquieu nos elementos que sustentaram suas conclusões. O que havia era
umapreocupação de contenção do poderpelo próprio poder a mde criar
obstáculo a uma independência em larga amplitude, desvinculada de limites
no exercício, em detrimento do funcionamento estatal. Desse modo, o modelo
sugere a necessidade de conceber uma divisão e coordenação entre os poderes,
nointuitodeatingirasnalidadespropostaspeloEstado
Ademaissempre gurouexplicitamentea necessidadedepermitir a um
determinado poder o exercício de atribuições originariamente concebidas na
conformação de outro. A noção de divisão abarcada pelo paradigma contem-
porâneo insere um compartilhamento exível de funções pelos órgãos que
as exercem, pois existe “permeabilidade de interpenetração entre as mesmas,
decorrentes da própria complexidade da realidade social de nossos dias”(377).
CANOTILHO José Joaquim Gomes Direito constitucional e teoria da Constituição. 7. ed.
Coimbra: Almedina, 2006. p. 114-115.
Segundo Immanuel Kant todoEstadoencerra trêspoderes dentro de si istoé a von-
tade unida geral consiste de três pessoas (trias políticas): o poder soberano (soberania) na pessoa
do legislador; o poder executivo na pessoa do governante (em consonância com a lei) e o poder
judiciário (para outorgar a cada um o que é seu de acordo com a lei) na pessoa do juiz (postestas
legislatóriarectoria e iudiciaria)”. (KANT, Immanuel. Metafísicados costumes. Tradução de Edson
Bini. Bauru: Edipro, 2003. p. 155-156). No entanto, o conceito tradicional de fracionamento de
“poderes”, cartesianamente, entre Judiciário, Executivo e Legislativo, cede espaço a uma visão de
unidade do Estado. Não há severa divisão de poderes, mas fragmentação de competências. Ensina
Alexandre Groppali: “enquanto Montesquieu, antes de tudo, fala sempre em ‘Poderes’, enten-
didos mais num sentido objetivo e substancial, isto é, mais como funções, a doutrina moderna, ao
invés, os considera principalmente sob o aspecto subjetivo, ou seja, como um complexo de órgãos
determinados destinados pela ordem jurídica ao exercício de competências especiais, dando em
resultado que qualquer Poder consista em um complexo de órgãos aos quais se conferem a titu-
laridade e o exercício de cada uma das funções do Estado.” Logo, a divisão de poderes não pode
ser compreendida [....] “não mais mecanicamente, no sentido de uma rígida separação de órgãos
comfunçõesindividuadasmas deumladocomoespecicaçãodeórgãos eatribuiçõesdefun-
ções expressas em formas diferentes (lei, decreto, sentença) e, de outro lado, como coordenação
de órgãos distintos na unidade do Estado, a qual encontrava sua expressão no poder político
exercido pelo governo com a maior liberdade de apreciação e atividade”. (GROPPALI, Alexandre.
DoutrinadeEstado. Tradução de Paulo Edmur de Souza Queiroz. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1962.
p. 187-188; 190 apud BOTALLO, Eduardo Domingos. Teoria da divisão dos poderes: antecedentes
históricos e principais aspectos. RevistadaFaculdadede DireitodaUniversidadede SãoPaulo. v.102.
USP: São Paulo, jan.-dez., 2007. p. 40. Disponível em:
FileAcessoemnov
BOTALLOEduardo Domingos Teoria da divisão dos poderes antecedentes históricos
e principais aspectos. Revista da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. v. 102. USP:
São Paulo, jan.-dez., 2007. p. 40. Disponível em:
FileAcessoemnov
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AampliaçãodasatividadesdoEstadocontemporâneoimpôs uma nova
visão da teoria da separação de poderes, além de diferentes formas de rela-
cionamento entre os órgãos legislativo, executivo e destes com o judiciário.
Atualmente fala-se em colaboração de poderes, uma característica do parlamen-
tarismoemqueogovernodependeda conançado ParlamentoCâmarados
Deputados); no presidencialismo, por sua vez, foram desenvolvidas técnicas de
independência orgânica para preservar a harmonia entre eles(378).
A conciliação da noção de soberania com a de poderes divididos e sepa-
rados é proposta por Paulo Bonavides, na esteira de que o princípio deve ser
interpretado exclusivamente como uma técnica distributiva de funções dife-
rentes entre órgãos relativamente separados, mas não considerado rigidamente
e válido quanto à incomunicabilidade destes entre si, visto que deve ocorrer
cooperaçãoharmonia e equilíbriosemqualquerdelimitação que denauma
separação absoluta ou intransponível entre eles(379).
Relevante, ainda, o alerta do autor quanto ao entendimento de que o prin-
cípio desempenha função moderadora contra os excessos desnecessários de
poderes eventualmente usurpadores, como o das burocracias executivas que,
por vezes, com posturas viciadas e equivocadas quanto à adequação social do
poder político, oprimem os legítimos interesses da liberdade humana(380).
O paradigma contemporâneo do poder político-jurídico reconhece que o
Estado constitucional de Direito está assentado na ideia de unidade, conside-
rado o poder soberano uno e indivisível, no sentido de que o poder não é fracio-
nadomasocorreadivisãodasfunçõesaseremdesempenhadasnosignicado
orgânico dos agentes estatais.
Dessa forma, o postulado básico da separação tripartite gestada pela
doutrina liberal clássica tem no moderno constitucionalismo a separação de
funções exercidas por órgãos dispersos no âmbito do Estado.
As balizas atuais acerca do tema, no pressuposto da inexistência de contor-
nos rígidos, vão ao encontro de um Estado contemporâneo em que os órgãos de
poder, além da função atribuída em caráter típico, exercem, outrossim, funções
atípicas em delegação extraordinária e instrumental.
No espectro da delimitação de competência constitucional, os órgãos de
Estado desempenham atribuições que na essência são características de sua
sionomiainstitucionaldenominadastípicassemprejuízodeoutraspróprias
dos órgãos distintos, de natureza atípica e complementares da função principal.
SILVAJoséAfonsodaCursodedireitoconstitucionalpositivo. 34. ed. revista e atualizada até
a Emenda Constitucional n. 67, de 22.12. 2010. São Paulo: Malheiros, 2011. p. 109.
BONAVIDESPauloCiênciapolítica. 15. ed. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 158.
BONAVIDESPauloCiênciapolítica. 15. ed. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 158-159.
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Vericaseapontamento característico nas atribuições do Poder Judiciário
que extrapolam seu núcleo central de competência quando, por exclusão de outros
poderes e à maneira legislativa, cabe a ele estatuir regras do seu respectivo funcio-
namento ou tal qual o Poder Executivo, organizar o quadro de servidores(381).
Com isso, é resguardada a função típica do órgão, em realce à preservação
do princípio da separação dos poderes, haja vista o compartilhamento das atri-
buições estabelecidas pelo texto constitucional, no equilíbrio dos freios e contra-
pesos da distribuição de competências.
O modelo constitucional de Estado posiciona-se a partir de instituições
independentes e harmônicas entre si mediante o exercício de competências
normativas expressas no texto ao contemplar as matrizes do funcionamento do
Estado, assentadas na distribuição do poder entre os órgãos de soberania encar-
regados das respectivas funções, na missão de organizar racionalmente o exercí-
cio das atividades para obter o equilíbrio de um governo moderado.
No enfoque, a separação dos poderes remanesce como pilar estruturante do
Estado, na equilibrada equação de tarefas delegadas em caráter principal e secun-
dário, num balanceamento a um só tempo capaz de traduzir a realização dos prin-
cípios fundantes, em defesa das liberdades e dos demais direitos fundamentais.
Concebida no estatuto normativo brasileiro a estruturação dos poderes
mediante a ordenação de funções distintas, constitucionalmente atribuídas aos
vários órgãos, conforme expresso na Constituição Federal, sobressai o Poder
Judiciário. Trata-se daquele que, inequivocamente, singulariza-se em relação aos
demais poderes, haja vista o exercício típico da função jurisdicional. Cumpre-
-lhe a missão de dirimir as controvérsias surgidas em decorrência da aplicação
das leis, além da preponderância da atuação junto à sociedade no papel preva-
lecente do órgão na organização político-social da atualidade.
No tocante ao primeiro aspecto, não é demasia reiterar o conceito da função
jurisdicional ou apenas da jurisdição como a concretização do mister conferido ao
PoderJudiciáriocomopoderautônomoeindependenteinerenteaopróprioente
estatalemsubstituiçãoaosparticularesparaefetivarodireitoaocasoespecíco
pormeiodaobediênciaaumprocedimentodeterminadoaomdoqualresulta
umadecisãorevestidadedenitividade
Ainda que una e indivisível a jurisdição encarnada pelo Poder Judiciário
em âmbito nacional, a concretização da justiça ocorre pelos diversos órgãos do
sistema, na seara federal e estadual, mediante exercício das competências cons-
titucionaisparasolucionarosconitosinstaurados
BONAVIDESPauloCiênciapolítica. 15. ed. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 152.
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Ao tempo em que o Estado assumiu tal encargo, disciplinou o direito
fundamental de ação como garantia de tutela jurisdicional ampla, estabelecido
que o legislador não está autorizado a vedar matérias da apreciação do Judi-
ciárioe nãopoderecusarse ao conhecimentodeum conitosocialartigo 5º,
XXXV, Constituição Federal de 1988).
Coerência que permeia a análise prossegue na esteira de que, como o
princípiodoacessoàjustiçanaessênciareeteoacessoaumaordemjurídica
justa, em simetria, a jurisdição deve encontrar a efetividade na faceta da atua-
ção em concreto.
Reconguramse para tanto as atribuições do Judiciário menos passivo
mais gestor-planejador), na busca de atender de forma ótima aos usuários de seus
serviços, solucionando questões sociais que lhe são trazidas, inclusive por meio de
ações planejadas que lhe imprimem feições de políticas públicas judiciárias.
Assiméqueaexigênciadaecáciademandaumnovoincrementodeativi-
dade mediante a implantação de políticas públicas judiciárias para remover
obstáculos apresentados na obtenção de uma ordem jurídica justa.
Nesse diapasão sustenta-se o Poder Judiciário como ente estatal formu-
lador de políticas públicas, em alargamento das atribuições tradicionalmente
consagradas, para reconhecer o seu papel ativo e colaborativo do projeto de
justiça social delineado pela Constituição Federal de 1988, a resultar na consoli-
dação democrática.
É certo que o Poder Judiciário assumiu, nas últimas décadas, um espaço de
enorme projeção na vida social, cabendo-lhe dar respostas aos conflitos instaurados.
Mais que isso, representa a possibilidade de cumprimento dos mandamentos
constitucionais que estabelecem vivência digna e saudável aos cidadãos. Este
cenárioinuenciounatransformaçãodaessencialfunçãodeEstadoquepassaa
ser vista como alternativa à superação do subdesenvolvimento, garantidora dos
direitos humanos.
Por conseguinte, reconhece-se com indiscutível prioridade a expansão do
papel do Poder Judiciário mediante ampliado leque de funções(382), enumeradas
por Luiz Flávio Gomes da seguinte maneira: a) aplicar contenciosamente a lei
aos casos concretos; b) controlar os demais poderes; c) realizar seu autogoverno;
d) concretizar os direitos e garantias fundamentais; e) garantir o Estado Consti-
tucional Democrático de Direito(383).
No aspecto Eugenio Raúl Zaaroni identica apenas trêsfunções do Poder Judiciário
contemporâneodecidiros conitoscontrolara constitucionalidadedas leiserealizar seuauto-
governo. (ZAFFARONI, Eugenio Raúl. PoderJudiciário: crise, acertos e desacertos. Tradução de
Juarez Tavares. São Paulo: RT, 1995. p. 55).
GOMES Luiz Flávio A dimensão da magistratura no estado constitucional e democrático de
direito: independência judicial, controle do Judiciário, legitimação da jurisdição, politização e res-
ponsabilidade do juiz. São Paulo: RT, 1997. p. 21-23.
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A perspectiva ampliada das tarefas do Judiciário corroborou a ideia de
que, no espectro da realização do autogoverno, da concretização dos direitos e
da garantia do Estado Democrático, é necessário o redesenho das atividades dos
próprios órgãos a partir da implantação de políticas públicas de organização e
encaminhamento dos serviços jurisdicionais. A ideia é possibilitar a maior parti-
cipação do Estado, por intermédio desse Poder, na busca pela concretização dos
direitos fundamentais e sociais conquistados ao longo da história.
Não se trata de substituir atribuições típicas dos Poderes Executivo e Legis-
lativo, mas de dissociar uma função do Estado em mais um órgão de Poder,
atribuído ao Judiciário (assim como aos demais Poderes da União) o dever de
alcançar os objetivos fundamentais da República, elencados no artigo 3º da
ConstituiçãoFederaldeA partirdessapremissacaclaraaparticipação
doatorpolíticooradestacadonadeniçãodointeressepúblicoemvirtudedo
status que lhe foi conferido pelo texto constitucional, ausente, por conseguinte,
ingerência entre os entes estatais(384).
Ao contrário, eis que a Constituição, ao estabelecer a existência de três
poderesharmônicoseindependentesentre si conferiu também ao Judiciário
a tarefa de contribuir como um participante ativo na política nacional, para a
deniçãodepolíticaspúblicasemsuaprópriaestruturaorgânicofuncional(385).
Esse horizonte vem sendo gradativamente desenhado pela literatura
jurídica. Conquanto recente o exame teórico circunstanciado sobre o alar-
gamento de atribuição no tocante à categoria própria das políticas públicas
judiciárias, constata-se que o Poder Judiciário detém funções políticas regu-
ladoras dessas atividades:
ArespeitoLenioStreckeJoséMoraisapontamAsfunçõesdoEstadovêmsofrendotrans-
formações na exata medida em que o Estado assume novos contornos. Desse modo, a clássica
separação de funções de cada um dos Poderes do Estado (Executivo, Legislativo e Judiciário) de
há muito está superada. Observe-se que, com os primeiros sinais do intervencionismo estatal, pró-
prios do Estado Social (contemporâneo), já ocorreram sensíveis alterações na esfera das relações
entre os Poderes do Estado, mediante o deslocamento da esfera de tensão do Poder Legislativo
para o Poder Executivo. Já no Estado Democrático de Direito, próprio do constitucionalismo do
pós-guerra, tem-se nitidamente o deslocamento dessa esfera de tensão, passando do Poder Execu-
tivo e do Poder Legislativo para o Poder Judiciário, mormente nos países com Constituições diri-
gentes, onde os Tribunais Constitucionais proporcionam aquilo que muitos autores chamam de
“judicialização da política”. (STRECK, Lenio Luiz; MORAIS, José Luis Bolzan de. Ciênciapolíticae
teoria do estado. 6. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008. p. 189).
Por certoqueo PoderJudiciário não fazpolítica partidária atéporque tal évedada aos
membros da magistratura pela própria Constituição Federal. No entanto, em concorrência com
outros atores políticos, faz política, no sentido de assumir parte da responsabilidade no que tange
àdeniçãodosrumosquedevemserseguidospelaNaçãosejapormeiodedecisõesjudiciaisseja
pormeiodaspolíticaspúblicasdenidorasdasdiretrizesaseremseguidaspelosistemadejustiça
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A despeito da crescente atenção deslocada para o Poder Judiciário,
ainda não é estudado na dimensão necessária, principalmente no
tocante à sua importância na efetividade de importantes políticas
públicas (TAYLOR, 2007), até porque existiriam pelo menos três
dimensões de atuação relevante dos tribunais para a ciência política,
quais sejam: a hobbesiana, a smithiana e a madisoniana. Observa-se
que os estudos sobre o Judiciário ainda se restringem excessiva-
mente à dimensão hobbesiana da segurança pública ou ao campo
smithiano, cuja ênfase recai sobre os custos e incentivos à economia
de mercado (CASTELAR PINHEIRO, 2000). Pouca atenção, por-
tanto, tem sido dada para a dimensão madisoniana de inter-relação
entre os poderes, principalmente no que diz respeito às políticas
públicas. Nesse sentido, uma faceta de atuação do Judiciário relati-
vamente ignorada refere-se ao seu papel como formulador de polí-
ticaspúblicasdirecionadasespecicamenteparaessepoder(386).
Na dimensão exposta, o protagonismo do Poder Judiciário manifesta-se para
alémdaarenapolíticaedecisóriaidenticadaanecessidadedeumaatuaçãomais
concreta a respeito da organização estrutural, da gestão e do planejamento insti-
tucional de seus órgãos. O objetivo é promover mudanças internas a partir de
políticas públicas de redesenho institucional, voltadas à readequação de procedi-
mentos, métodos de organização estrutural, estabelecimento de metas de produ-
tividade para garantir o aperfeiçoamento da prestação dos serviços judiciários,
alargando, por consequência, o princípio do acesso à justiça.
A inovação na gestão deve orientar-se para objetivos concretos de solução
deproblemasespecícoscriandocondiçõesquepermitamexperimentarnovos
modelose sua constante atualização a partir de lições vericadasnaprática
Além disso, deve engajar amplos leques de atores para assegurar legitimidade e
viabilidade nas mudanças propostas.
Como visto, a atividade jurisdicional do Estado aperfeiçoou-se. Não basta
a mera aplicação da lei pelo método da subsunção, para alcançar a esfera de
formulador de políticas públicas judiciárias a serem cumpridas pelos próprios
órgãos do Poder Judiciário, visando à efetiva prestação jurisdicional quando os
métodostradicionaisnãoserevelaremsucientes
Temsecomodesdobramentoaconstataçãodequeomdaatividadejudi-
ciária é proporcionar ao jurisdicionado a concretização de um direito que lhe
está sendo negado ou ameaçado de efetivação, de maneira que a atividade juris-
dicional pode não ser o bastante caso se perca de vista sua destinação.
SILVAJeovan Assis da FLORÊNCIO Pedro de Abreu e Lima Políticas judiciárias no
Brasil: o Judiciário como autor de políticas públicas. RevistadoServiçoPúblico. Brasília 62, abr.-jun.,
2011. p. 124.
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Pressuposto necessário à compreensão do que são as políticas públicas
judiciárias é entender que o Judiciário exerce papel político institucional para
atenderumanalidadesocialna busca de soluções que impliquem no incre-
mento do funcionamento da justiça e no constante compromisso de repensar a
deniçãodeseusrumoseoexercíciodafunçãojurisdicional
A acepção adotada para políticas públicas envolve, portanto, dimensão
ampliada a partir do reconhecimento de práticas e programas criados e desen-
volvidos pelo Poder Judiciário, relacionados, a um só tempo, com as funções
de autogestão e de orientação ao funcionamento do sistema de justiça, impac-
tando de modo positivo no exercício da função jurisdicional e consequente
solução de demandas sociais apresentadas no contexto pré e pós-processual.
Issosignica queaspolíticas públicas judiciáriasnãose confundemcom
políticas judiciais, estas destacadas por Jeovan Assis da Silva e Pedro de Abreu
e Lima Florêncio:
Paracomeçarpreferirseábuscarcompreenderofenômenoapartir
da expressão ‘políticas judiciárias’, porque entende-se aqui que o uso
do termo políticas judiciais pode equivocadamente remeter ao que,
em inglês, corresponde à expressão judicial policies Nos EUA, os
estudos sobre judicialpolicies enfatizam o impacto que as decisões de
cortes superiores possuem sobre cortes inferiores ou mesmo sobre
o pronunciamento judicial a respeito de políticas públicas imple-
mentadas nas demais esferas de governo (bons exemplos seriam as
decisõesarespeitodeaçõesarmativaseabortoPolíticasjudiciais
também surgiram quando magistrados tomam decisões políticas
a partir da interpretação da Constituição ou da elaboração de pre-
cedentes judiciais. No contexto das políticas judiciais nos EUA, os
tribunais são percebidos como importantes integrantes do sistema
políticoecapazesdeiniciaremodicarpolíticas(387).
Igualmente, a política pública judiciária detém dimensão singularizada em
relação às políticas judiciárias, conceituadas como a “ciência e arte que trata
daconstituição dajustiçae procuraordenarcorrigir esimplicaro funciona-
mento de seus órgãos, adotando e executando medidas necessárias que atinjam
aeciênciaquesuanalidadesocialexige(388).
Desvelando o nexo entre a essência dos conceitos discorridos, entende-
-se por políticas públicas judiciárias aquelas elaboradas pelo próprio Poder
SILVAJeovan Assis da FLORÊNCIO Pedro de Abreu e Lima Políticas judiciárias no
Brasil: o Judiciário como autor de políticas públicas. RevistadoServiçoPúblico. Brasília 62, abr.-jun.,
2011. p. 126.
NUNESPedrodosReisDicionáriodetecnologiajurídica. 9. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos,
1976. p. 671.
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170
Judiciário, capazes de conduzir as diretrizes de ações multidimensionais, condi-
cionadas a um roteiro que contempla: construção da agenda, formulação de
alternativas, planejamentos, planos de atuação e posterior avaliação sistemá-
tica das ações instituídas pelo ente judiciário. Este, por sua vez, é o responsável
pela direção de programas que concretizem socialmente a garantia de acesso à
justiça, fomentando o desenvolvimento de um regime que assegure a dignidade
dos cidadãos.
Um passo adiante permite situar as políticas públicas judiciárias como
atividade atípica do Poder Judiciário. Estas consistem em programa de ação
político-institucional coordenado por atores do sistema de justiça que operam
pormeiodeobjetivosemetaspreviamentedenidosaptosàconsecuçãode
um resultado que represente ampliação do acesso à justiça na faceta da efetivi-
dade do exercício jurisdicional e da administração da justiça.
Para o cumprimento do mister invocado o Judiciário promove uma releitura
da atuação clássica, sob o fundamento de que a entrega do provimento jurisdicio-
nal, depois de provocado, demanda em muitos casos uma postura ativa:
No plano prático, existe um amplo consenso de que as reformas nos
tribunaisseusprocedimentosenasprossõesjurídicassãonecessárias
para adaptar os sistemas de justiça a novas políticas sociais e inte-
resses recém-reconhecidos. São necessários mais criatividade e experi-
mentação que possam ajudar a sugerir abordagens novas e promissoras
Asinstituiçõesnãosãosagradaselasservemparaidenticarepro-
piciar implementação de políticas sociais(389).
O Estado, no âmbito das atividades constitucionalmente atribuídas ao
PoderJudiciárioconrmaafunçãotransformadoradarealidadesocialcongloba
o desenvolvimento nacional capaz de atender a prestação da justiça, além da
construçãodeprojetosdepacicaçãoEssanovamoldurasemdúvidafortalece
aestruturaestatalaodestinar papéis exíveis ao Poder Judiciário de acordo
comaevoluçãodapolíticaedasdecisõesexigidasemcadamomentoespecíco
de sua realização.
Aarmativadequeostribunaisconstitucionaisexercemfunçãopolítica
não é recente. Nos idos de 1957, Robert Dahl defendeu a atuação da Suprema
Corte como policymaker, ou seja, uma instituição política destinada a tomar
Tradução livre: On the practical level there is a broad consensus that reforms in courts, in
courtsproceduresandinthelegalprofessionarenecessarytoadaptthesystemsofjusticetonew
socialpolicies and newlyrecognizedinterests Morecreativity and experimentationare clearly
requiredandcomparativestudycanhelptosuggestnewandpromisingapproachsTheinsti-
tutionsarenotsacredtheyservetoaidor twarttheimplementationofsocial policiesGARTH
BryantGCAPELLETTI MauroTROCKER NicoloAccess tojustice variationsandcontinuity
ofaworldwidemovementDigitalrepositorofMaurerFacultyMaurerSchoolofLawIndiana
UniversityIndianap
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171
decisões sobre políticas públicas mediante a observância de alguns parâmetros
de aceitabilidade, desviando-se dos critérios jurídicos encontrados na jurispru-
dência, nas leis e na Constituição(390).
Segundo o autor, independentemente de conformação com a legalidade
ou constitucionalidade de uma alternativa, a decisão política é tomada por uma
escolha efetiva de acordo com: as preferências de uma minoria de cidadãos e
contra as preferências de uma maioria; as preferências de uma maioria, contra-
riando as minorias; ou, com as preferências de uma minoria em contrariedade a
outras minorias, estando os demais (maioria) indiferentes.
Prossegue na análise do sistema estadunidense com a crítica de que os
presidentes americanos não são conhecidos por indicar juízes com visões polí-
ticasdistintasnemsepoderiaesperaraconrmaçãodeumnomecujapostura
em questões-chave fosse contrária à maioria dominante do Senado, de modo
que a visão política dominante na Corte nunca é muito diferente da visão polí-
tica das maiorias legislativas.
Consoante se depreende da contribuição doutrinária a esse horizonte,
Robert Dahl destaca a complexidade do papel de uma Suprema Corte como
instituição elaboradora de políticas públicas, especialmente em sociedades
democráticas, nas quais, em princípio, a decisão deve seguir a soberania popu-
lar, de modo que a principal tarefa é conferir legitimidade às políticas funda-
mentais que denem padrões de comportamentos básicos requeridos para a
operacionalização de uma democracia.
Embora o contexto apresentado pelo cientista político norte-americano
tenha relação com a função política exercida pelo Supremo Tribunal Federal,
como a Corte Constitucional Suprema no país, interessante observar a evolução
desse pensamento no plano normativo pátrio a partir da instalação do Conselho
Nacional de Justiça, pela Emenda Constitucional n. 45/2004.
O marco legal ampliou o desempenho da função política do Poder Judiciá-
rio em face do protagonismo do órgão de controle externo, com vistas a efetivar
os princípios basilares do sistema, como o acesso à justiça, a celeridade proces-
sual, a proteção e a concretização judicial de direitos fundamentais.
Sem a pretensão de adensar o exame sobre o contexto político, social e
econômicoprecedenteàinstalaçãodoConselhoNacionaldeJustiça(391), importa
DAHL, Robert. Tomadade decisões em uma democracia: a Suprema Corte como uma enti-
dadeformuladora de políticas nacionais Tradução deGrupoPrimacy Translation Disponível
em:hpbibliotecadigitalfgvbrojsindexphprdaarticleview. Acesso em: 05 nov. 2020.
OtemafoiobjetodeestudoespecíconadissertaçãoOConselhoNacionaldeJustiçacomo
Instrumento de Efetividade da Constituição de 1988’, apresentada em dezembro de 2014, à Ponti-
fícia Universidade Católica de São Paulo, para obtenção do título de Mestre em Direito, na área de
concentração Direito Constitucional, sob orientação do Professor Doutor André Ramos Tavares.
Morgana de Almeida Richa
172
o lugar de destaque ocupado pelo órgão no Poder Judiciário, com atuação em
todo o território nacional visando concretizar ações de planejamento, coordena-
ção e controle administrativo, além do aperfeiçoamento da prestação da justiça,
materializado pela competência expressa no tocante à edição de atos regula-
Federal de 1988).
Concebido o Conselho Nacional de Justiça como órgão de coordenação
dosistema emnível degestãoorganização escalização destacaseamissão
precípua quanto à capacidade de planejamento e transparência do Poder Judi-
ciário, “no papel de gestor estratégico dos recursos administrativos, humanos,
logísticosenanceiros(393), além da função primordial no tocante à ampliação e
democratização do acesso à justiça, visando contribuir para a paz social.
A atuação do Conselho Nacional de Justiça voltada a modernizar e superar
asdeciênciasdoPoderJudiciáriorompevisõesepráticaslimitadasdaadmi-
nistração judiciária, planejando e coordenando administrativamente e de forma
vinculativa a atuação dos Tribunais em atendimento à necessidade reguladora,
corretora e estimuladora do Estado(394).
A importância reside na viabilidade de integrar o sistema judiciário como um
todo(395), desde a sua base até a cúpula, inserindo programas de informatização,
Acompetênciaconstitucional doConselhoNacional deJustiçanotocanteà expediçãode
atos regulamentares e recomendação de providências tem fundamental impacto na materialização
das políticas públicas judiciárias, mediante instrumentos de aplicação direta ou autoexecutória.
Sobreessamatéria grandes constitucionalistas registram competência de grande signicado
institucional, nesse contexto, é aquele referente à expedição de atos regulamentares”. (MENDES,
Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Cursodedireitoconstitucional. São Paulo: Saraiva,
2014. p. 1007).
SAMPAIOJoséAdércioLeiteO ConselhoNacionalde Justiçaeaindependência doJudiciário.
BeloHorizonteDelReyp
NobalançoefetuadopeloMinistrodoSupremoTribunalFederalGilmarMendesem
após passagem pela presidência do órgão, enfatizada a atuação de policymakerdo Conselho. Con-
forme suas palavras: “Os esforços para se assegurar tais garantias são nítidos nas diversas inicia-
tivas coordenadas pelo Conselho Nacional de Justiça. Essa Instituição demonstra constantemente
seu austero compromisso com a defesa dos direitos fundamentais, assumindo a sua responsabili-
dade pela inclusão social e proteção efetiva dos direitos fundamentais e fortalecendo a crença no
valor inquestionável da cidadania. Além disso, o Conselho Nacional de Justiça defende o papel do
Judiciáriocomoestabilizadordeexpectativaseconômicasegarantidordedireitosfundamentaise
a relevância da cooperação com a iniciativa privada para construir um Judiciário mais ajustado às
demandasdasociedadeTambémestimulaadesjudicializaçãoeresoluçãodeconitospormeios
extrajudiciais”. (MENDES, Gilmar Ferreira. AscontribuiçõesdoCNJparao Judiciáriobrasileiro. Dis-
ponível em: <hpwwweditorajccombrascontribuicoesdocnjparaojudiciariobrasileiro.
Acesso em: 05 nov. 2020).
ConsideradaaunicidadedoPoderJudiciárionacionalreputasequeaoConselhoNacional
deJustiçacabexaraimplementaçãodediretrizesnacionaisparanortearaatuaçãoinstitucional
de todos os órgãos do Poder Judiciário. Tanto assim o é que a Resolução n. 70, de 18.03.2009,
dispôssobreoPlanejamentoeaGestãoEstratégicanoâmbitodoPoderJudiciário
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
173
dequalicação de servidoresdegestão administrativa ampliandoatranspa-
rênciaeascalizaçãodamáquinaadministrativajudiciáriaedeacessoàjustiça
embasados em relatórios estatísticos(396) que apontam, ultrapassada a primeira
década da instalação do órgão, gargalos de magnitude a inviabilizar o próprio
funcionamentodosistemadejustiçanaelevadalitigiosidadefenômenocultu-
ral componente da sociedade brasileira.
Estabelecidas as premissas centrais norteadoras do Conselho Nacional de
Justiça, emerge a sua natural ocupação de espaço como o protagonista nato
das políticas públicas judiciárias, constituindo-se, portanto, pedra funda-
mental para o aperfeiçoamento do sistema de justiça brasileiro, sob o ideal
deconsolidaçãodeumajustiçaecienteecélereconsumandoopressuposto
idealhegemônicoparaainstituição
Atribuído ao Conselho o redesenho do sistema de justiça em busca de um
Judiciáriomais fortee ecienteoórgão foiidenticado comoelementoviabi-
lizador da formulação de políticas públicas destinadas ao crescimento e ao
desenvolvimento da sociedade, além da garantia dos direitos fundamentais dos
cidadãos, conforme previsto na Constituição Federal de 1988.
A função política dirigida ao Conselho foi anunciada já no julgamento da
ADI 3367-1-DF(397), quando mencionado pelo Ministro Relator Cezar Peluso o
“papel de órgão formulador de uma indeclinável política judiciária nacional” na
medida em que o Conselho Nacional de Justiça:
sob a rubrica das atribuições inerentes ao poder de controle da atuação
administrativaenanceiradoJudiciárioartigoBassumeo
dever jurídico de diagnosticar problemas, planejar políticas e formular
projetos, com vistas ao aprimoramento da organização judiciária e da
prestação jurisdicional, em todos os níveis, como exigência da própria
feição difusa da estrutura do Poder nas teias do pacto federativo(398).
O Conselho, em linhas gerais, desempenha papel formulador das políticas
públicas judiciárias nacionais, voltadas à ampliação do acesso à justiça, à paci-
cação e à responsabilidade social. Na visão de Maria Tereza Sadek:
O Conselho Nacional de Justiça representa um dos aspectos mais signi-
cativosdasalteraçõesrecentesSuaslinhasdeatuaçãodecorrem
de suas funções de natureza administrativa e disciplinar. Assim, elas
Atributosdeconhecimentoempatamarfundamental destinadoaproduzirbase dedados
segura para um diagnóstico preciso.
Proposta pelaAssociação dos Magistrados Brasileiros em face das normas relativas ao
órgão, julgada totalmente improcedente.
BRASIL Supremo Tribunal Federal PlenoADI n DF Rel Min Cézar Peluso j
13.04.2005.
Morgana de Almeida Richa
174
envolvem planejamento estratégico e proposições de políticas judiciá-
rias, modernização tecnológica, ampliação do acesso à justiça(399).
O protagonismo do Conselho Nacional de Justiça como formulador de polí-
ticas públicas foi aventado, igualmente, por Germana Moraes e Geovana Freire:
O Conselho Nacional de Justiça se caracteriza como um órgão elabo-
rador de políticas públicas para o judiciário, buscando aproximar os
campos político e jurídico, conforme a demanda da sociedade com-
plexa e em constante mutação que está inserido(400).
Nessa mesma linha de compreensão, Sérgio Renault acentua o papel rele-
vante do Conselho na atividade de planejar e implementar políticas públicas,
tendo em vista sua razão de ser institucional voltada a possibilitar a integra-
çãodeprogramasdeinformatizaçãodequalicaçãodeservidoresdeacessoà
justiça e de gestão administrativa em todo o sistema de justiça(401).
Em simetria, o Conselho Superior de Justiça do Trabalho (CSJT)(402) e o
Conselho da Justiça Federal (CJF)(403) exercem a mesma função perante as Justiças
do Trabalho e Federal Comum, principais responsáveis pelos arranjos institucio-
nais correspondentes às políticas públicas nos âmbitos de atuação respectivos.
Em vista da característica narrada, os órgãos – CSJT e CJF – simultanea-
menteincorporam a guradosfazedores ociaisdepolíticaspúblicas vale
dizer, são os policymakers encarregados do encadeamento de ações planejadas,
envolvendo meios e instrumentos aptos a atingir os objetivos traçados para redi-
mensionar os rumos funcionais do sistema de justiça.
O atributo de fazedor de política pública, embora extraído do texto cons-
titucional, haja vista a possibilidade de expedição de atos regulamentares e a
recomendaçãodeprovidênciasparagarantiraecáciadomisterconstitucional
(artigos 103-B, § 4º, I; 105, parágrafo único, II; e, 111-A, § 2º, II da Constituição
Federal de 1988), não aparece expressamente descrito como tal. Vem eviden-
ciado nas tarefas atribuídas aos órgãos, tão somente capazes de êxito mediante
coordenação multidimensional encontrada nas políticas públicas judiciárias.
Logo, nada mais claro do que situar os órgãos de controle neste patamar.
SADEKMariaTerezaPoderJudiciárioseupanteãoRevistaBrasileiradeEstudosConstitu-
cionaisRBEC, Belo Horizonte, ano 5, out.-dez., 2011. p. 135.
FREIRE Geovana Maria Cartaxo deArruda MORAES Germana de Oliveira O Con-
selho Nacional de Justiça como ponto de mutação do sistema judicial brasileiro. In: XX Congresso
Nacional do CONPEDI, Vitória/ES, Anais, 2011. p. 1105.
RENAULTSérgioRTammAreformadoPoderJudiciáriosobaóticadogovernofederal
RevistadoServiçoPúblico. Brasília, ENAP, v. 56, n. 2, 2005. p. 133.
BRASILConstituiçãoFederalArtigo 111-A, § 2º, II.
BRASILConstituiçãoFederalArtigo 105, III, parágrafo único, II.
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
175
PelobrevepanoramaapresentadocaclaropoisqueosConselhoscomo
policymakers têm competência constitucional para assegurar que o Poder Judi-
ciário nacional execute providências transformadoras em prol da sociedade,
redimensionando o desempenho do sistema de justiça. Para tanto, necessário o
funcionamento como órgãos fomentadores de políticas públicas judiciárias, por
meio de programas selecionados, voltados à condução da essência do papel do
Judiciário, mais próximo e sensível às demandas da população.
No aparato da efetividade, os Conselhos Judiciais contemplam instru-
mentos de maior valia para o nivelamento na esfera nacional, pois detêm
autoridade para dispor, de modo uniforme e racional, sobre o regramento das
políticas públicas para o Poder Judiciário nacional em concretização do prin-
cípiodaeciência
A plausibilidade da política pública está assentada na correta escolha dos
elementos que abrangem as diferentes etapas de desenvolvimento, desde o
processo de formulação da agenda até a avaliação dos resultados, para o que a
leitura dos dados estatísticos constitui instrumento nuclear a embasar a tomada
de decisão nos programas escolhidos.
Chancela-se como meio válido e legítimo para atender tal desiderato, o
órgão de assessoramento técnico do Conselho Nacional de Justiça, denominado
Departamento de Pesquisas Judiciárias (DPJ), criado pela Lei n. 11.364/2006,
posteriormente alterado pela Lei n. 11.618/2007, para desenvolver pesquisas
atinentes ao Poder Judiciário, realizar levantamentos e dados estatísticos, além
de manter bancos de dados para avaliação do Judiciário nacional, os quais
devem ser disponibilizados e coletados permanentemente.
AsaçõesdoDepartamentodePesquisascontamcomorçamentoespecíco
para o fomento, produção, gestão e disseminação de conhecimentos, por meio
da promoção de pesquisas engajadas no incremento de soluções aos problemas
que afetam o desempenho do ente estatal.
O Departamento de Pesquisas Judiciárias tem como atribuição estabele-
cer vínculos de cooperação e intercâmbio com quaisquer órgãos e entidades
públicas ou privadas nacionais, estrangeiras ou multinacionais, assim como
celebrar contratos com autoridades públicas e pessoas físicas e jurídicas
nacionais e internacionais, especializados nos assuntos submetidos a exame.
Outrossim, cabe ao órgão a proposição de projetos nas áreas temáticas relati-
vas a direito e sociedade, direito e política, direito e economia, reforma legal
e do Judiciário e em outras áreas que atendam aos interesses do Poder Judi-
ciárioespecicandoas linhas de pesquisa desenvolvidas e suas diretrizes
metodológicas visando modernização.
Nesta senda relatórios anuais denominados ‘Justiça em Números’ são
veiculados desde o início do funcionamento do Conselho Nacional de Justiça.
Eles contemplam um pressuposto da maior valia para a ratio pretendida em
Morgana de Almeida Richa
176
perspectiva, consinoção elementar de que nenhuma instituição pode ser gerida
sem conhecer plenamente sua realidade, assentada na análise adequada das
informaçõesextraídasdedadosestatísticosconáveis
A transparência é um pressuposto fundamental das políticas públicas judiciá-
rias, na medida em que permite consolidar dados capazes de gerar a compreensão
do passado e de orientar os gestores na tomada de decisões, facilitando o controle
social tão importante ao funcionamento das instituições públicas(404).
A partir dos números compilados, impõe-se compreender as causas e
as consequências da litigiosidade, percebendo os porquês da concentração
do acervo, o conteúdo das matérias e classes processuais que sobrecarregam
osistema a mdeviabilizar o planejamentoadequadopara repensar asvias
disponíveis à concretização do acesso à justiça, garantindo a prestação de um
serviço público essencial com qualidade e em tempo razoável.
Não há dúvida de que o tratamento dos dados estatísticos auxilia no
compêndio necessário a amparar o encaminhamento dos assuntos relativos às
questões orçamentárias, administrativas e de litigiosidade do Poder Judiciário
brasileiro. Ademais, falhas indicadas no sistema podem subsidiar o planeja-
mento e a formulação de políticas públicas judiciárias visando o contínuo aper-
feiçoamento da prestação jurisdicional.
É possível concluir que o sistema do ‘Justiça em Números’ é ferramenta
indispensável para a realização de políticas públicas atinentes ao sistema de
justiça, permitindo elaborar diagnósticos e planos de ação, além de possibili-
tar concretamente a prestação de contas à sociedade. Conforme ressalta Rubens
Curado, “é a consciência que gera a ação, força propulsora da gestão”(405).
DeimediatoaanálisedoJustiçaemNúmerosdemonstraaculturadalitigiosidadequese
tornou um entrave para a modernização e a celeridade do Judiciário brasileiro. Os dados divul-
gados relativamente aos últimos anos apontam estabilização no congestionamento da Justiça, sem
que se tenha em verdade avançado na efetividade, conforme demonstrado pelos dados divul-
gados nos últimos três anos. Em 2019, relativo ao ano base 2018, registrou-se a somatória de 78,7
milhões de processos em tramitação, com 28,1 milhões de casos novos e 31,9 milhões de processos
baixados. A taxa de congestionamento foi de 72,1%, para um quadro de 18.141 magistrados e
272.138 servidores. Quanto ao ano 2020, referente ao calendário de 2019, apontou 77,1 milhões de
processos em tramitação, destacados 30,2 milhões ajuizados e o maior patamar, até então, de 35,4
milhões baixados no curso do ano, atingida menor taxa de congestionamento da série histórica no
percentual de 68,5%, para um quadro de 18.091 magistrados e 276.331 servidores. A divulgação
do último ano aferido (2021), relativa ao ano base de 2020, consignou 75,4 milhões de processos
em tramitação, destacados 25,8 milhões ajuizados e 27,9 milhões baixados no curso do ano, com
taxa de congestionamento em elevação no percentual de 69,1%, para um quadro de 17.988 magis-
tradoseservidoresDisponívelemhpswwwcnjjusbrwpcontentuploads
relatorio-justica-em-numeros2021-081021.pdf. Acesso em: 13 out. 2021).
SILVEIRA, Rubens Curado. Gestão judiciária: o que gritam os números da justiça. In:
(Coords.) MENDES, Gilmar Ferreira; SILVEIRA, Fabiano Augusto Martins; MARRAFON, Marco
Aurélio. Conselho NacionaldeJustiça: fundamentos, processo e gestão. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 339.
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
177
Por meio das políticas públicas implementadas em decorrência dos dados
obtidos, a disseminação de conhecimentos deve ser cumprida com a divulgação
dos resultados das pesquisas às instituições da justiça, aos operadores do direito
e à comunidade em geral.
Com isso, inverte-se a lógica. É o Judiciário como protagonista dessas ações
quepassaaserobjetodescalizaçãoinclusivequantoàaccountabilitydas pres-
tações implementadas em seu âmbito de atuação.
A esse respeito importa o conceito trazido pela doutrina de Fabrício Tomio
e Ilton Robl, no sentido de que o termo accountabilityrefere-se à:
necessidade de uma pessoa ou instituição que recebeu uma atribuição
oudelegaçãode poderprestarinformaçõesejusticações sobresuas
ações e seus resultados, podendo ser sancionada política, pública, ins-
titucional e/ou juridicamente por suas atividades(406).
Em seguida, os autores explicam a diferença entre accountability vertical,
ou seja, mecanismos de controle externo do povo, divididas em eleitoral (cida-
dãos sancionam por meio da eleição os representantes e as autoridades eleitas)
e social (sociedade organizada e imprensa por meio de denúncias e exposição
pública); e accountability horizontal (institucional) realizada mediante instru-
mentos de controle interno entre os agentes estatais com autoridade para requi-
sitarinformaçõesejusticações(407).
Nesse particular enfatiza-se a função política do Poder Judiciário visto
que as atividades desenvolvidas por meio de políticas públicas são passíveis de
controle social e institucional, responsabilização e prestação de contas (especial-
mente a partir das informações colhidas pelos Conselhos judiciais)(408).
À luz desse papel manifesto e cada vez mais recorrente, torna-se claro que
os órgãos do Judiciário responsáveis pela concretização das políticas públicas
têmo deverdeinformar asaçõesadotadas além dejusticaras atitudeseas
respectivasescolhassobpenadesançãopeloagirdemaneirainecienteoucom
abuso de autoridade, por exemplo.
Como desdobramento, a crítica ao modelo atual versa sobre o fato de que
os juízes e os Tribunais, de maneira geral e incluindo a vertente de atuação
TOMIOFabrícioRicardodeLimasROBLFILHOIltonNorbertoAccountability e indepen-
dência judiciais: uma análise da competência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Revistade
SociologiaePolítica, v. 21, n. 45, mar. 2013. p. 30.
TOMIOFabrícioRicardodeLimasROBLFILHOIltonNorbertoAccountability e indepen-
dência judiciais: uma análise da competência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Revistade
SociologiaePolítica, v. 21, n. 45, mar. 2013. p. 30.
Não é demais enfatizar que o preceito abordado não representa ofensa à independência
judicial decisional do magistrado no exercício de dizer o direito ao caso concreto.
Morgana de Almeida Richa
178
nos projetos que envolvem políticas públicas, não estão submetidos ao mesmo
controle oferecido pelos meios tradicionais de accountability, sobretudo porque
seus agentes “são dotados de elevado grau de garantias funcionais”, casos em
quehásignicativalimitaçãodeformasecientesdecontrole(409).
Anna Maria Campos, pioneira na discussão sobre accountability na seara
nacional revelou a diculdade de controle sobre os servidores públicos
agentes não representantes ativos dos cidadãos na relação entre democracia
constitucional e accountability(410). O embaraço no controle retoma a característica
das “anarquias organizadas” do modelo de Michael Cohen, James G. March e
Johan Olsen (garbage can model) (411).
De fato a diculdade de controle tornase ainda mais complexa num
ambiente organizacional de membros permanentes (“dotados de elevado grau
de garantias funcionais”(412)), que podem ser convocados, provisoriamente, a
atuar na administração, com ou sem compromisso com as decisões tomadas na
gestão anterior. A oscilação dos cargos de gestão e planejamento (de políticas
públicas judiciárias) de forma provisória, mas por membros permanentes (em
razãodagarantiafuncionalcorroboraadiculdadedecontroledescritapor
Anna Maria Campos(413), por reproduzir o que o modelo do garbage can aponta
comoumdeseusdeagradoresjustamentepelaspreferênciasproblemáticas
em movimentos que ora aproximam, ora distanciam a atenção sobre a decisão
originariamente tomada, mesmo que por caprichos(414).
Os problemas observados fragilizam todas as fases do ciclo da política
pública, desde a primeira, por revelar inconsistência de metas e adoção de “deci-
sões ambíguas”, agravada pela oscilação de membros que participam da tomada
de decisão. Na falta de controle, sobressai o improviso: soluções procuram pelos
problemas e as alternativas são postas pelos participantes à medida que apare-
cem(415). É a “inversão temporal completa da produção normativa”, expressa na
TOMIOFabrícioRicardodeLimasROBLFILHOIltonNorbertoAccountability e indepen-
dência judiciais: uma análise da competência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Revistade
SociologiaePolítica, v. 21, n. 45, mar. 2013. p. 36.
CAMPOS Anna Maria Accountability: quando poderemos traduzir para o português?
RevistadeAdministraçãoPública. fev.-abr., Rio de Janeiro, 1990. p. 33.
COHEN, Michael; MARCH, James; OLSEN, Johan. A garbage can model of organizational
choice. AdministrativeScienceQuarterley, v.17. p. 1-25, 1972. p. 1.
TOMIOFabrícioRicardodeLimasROBLFILHOIltonNorbertoAccountability e indepen-
dência judiciais: uma análise da competência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Revistade
SociologiaePolítica, v. 21, n. 45, mar. 2013. p. 36.
CAMPOS Anna Maria Accountability: quando poderemos traduzir para o português?
RevistadeAdministraçãoPública. fev.-abr., Rio de Janeiro, 1990. p. 33.
COHEN, Michael; MARCH, James; OLSEN, Johan. A garbage can model of organizational
choice. AdministrativeScienceQuarterley, v. 17. p. 1-25, 1972. p. 1.
SOUZACelinePolíticaspúblicasumarevisãodaliteraturaSociologias. Porto Alegre, ano
8, n.16, jul.-dez., 2006. p. 30.
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
179
inviabilidade de controle quando “não existem atores pré-constituídos, nem
desaosprédeterminados(416).
Vale dizer, é o domínio da incerteza e “indeterminação dos valores”(417) em
oposição ao ideal de regular controle e accountability de todas as fases do ciclo da
política pública judiciária.
Denotaseidênticadeciêncianosistemadejustiçaemquesevislumbra
a ausência de transparência e publicidade adequadas na compilação dos dados
obtidos e alimentados pelos Tribunais do país. Basta um rápido acesso ao site do
ConselhoNacionalde Justiçaparaconstatarquedosportaiseletrônicospouco
se pode avaliar em termos de resultados das políticas públicas judiciárias imple-
mentadasalémdeinexistireminformaçõeseindicadoressucientesparatodos
os programas(418).
Os atores públicos têm a obrigação de comprometimento com a qualidade
dos serviços públicos oferecidos aos consumidores da justiça, observada a justa
distribuição dos benefícios e os resultados obtidos; caso contrário, sem a trans-
parência necessária sobre suas ações, estará prejudicada a participação social e
a viabilidade do controle dos órgãos, ensejando, por conseguinte, baixo desem-
penho dos agentes públicos e baixos índices de concretude dos programas(419).
Além disso, os atores políticos envolvidos têm por dever constitucional apre-
sentardadosdecorrentesdasatividadesadministrativasenanceirasrealizadas
(artigo 37 da Constituição Federal de 1988).
Coerente seria o desenvolvimento de projetos obrigatórios de acompanha-
mento sistemático de políticas públicas judiciárias com potencial de reforçar a
accountability horizontal das ações do Poder Judiciário, mensurando os resulta-
dosobtidosecapazesdepromoveralteraçõesinstitucionaiseestruturaissigni-
cativas no Estado, como meios para concretizar a democracia. Para conferir uma
visãolosócojurídicadotemaconsiderasequenessesprogramasseexaltam
três aspectos:
Do lado da democracia, iremos perguntar como arbitrar entre priori-
dades do presente, experiência do passado e exigências do futuro. Do
lado da justiça, começaremos a nos interrogar sobre a durabilidade
OSTFrançoisO tempo do direito. Tradução de Élcio Fernandes. Bauru: Edusc, 2005. p. 351.
OSTFrançoisO tempo do direito. Tradução de Élcio Fernandes. Bauru: Edusc, 2005. p. 351.
OsprojetosdoSistemaCarcerárioExecuçãoPenaleMedidasSocioeducativas não possuem
dados que possibilitem avaliar projetos como o ‘Começar de Novo’ ou ‘Cidadania nos Presídios’.
(Disponível em: <hpwwwcnjjusbrpesquisasjudiciariasAcessoemnov
Ana Maria Campos percebe que a scalização em uma burocracia livre preocupase
somente com a orientação dos funcionários sobre as normas e procedimentos (formalismo).
(CAMPOS, Anna Maria. Accountability: quando poderemos traduzir para o português? Revistade
Administração Pública. fev.-abr., Rio de Janeiro, 1990. p. 42).
Morgana de Almeida Richa
180
da herança que transmitimos às gerações futuras. Do lado do direito
positivo, iremos nos recolocar a questão de saber se, mais que gerir na
urgêncianãoseriaprecisoantesinstituirnaconança(420).
Noescopooutrossimapromulgaçãodeleismaisespecícasestabelecendo
um desenho institucional de controle interno e externo das políticas públicas
formuladaspeloPoderJudiciárioqueconsideremalegitimidadeeaeciência
incorporadas na Constituição Federal de 1988(421).
Em vista de todo o exposto parece certo concluir que o Poder Judiciário
quando age como gestor público, seja pelos Conselhos judiciais, seja pelos Tribu-
nais singularizados, tem como dever constitucional implantar políticas públicas
de interesse relevante para a sociedade.
Na esteira, considerada a multidimensionalidade atrelada ao funciona-
mentodo sistema de justiça inseremseaspolíticas públicas especicamente
voltadas a aperfeiçoar a prestação jurisdicional decorrente do amplo conheci-
mento que o Poder Judiciário detém de suas estruturas. É certo que, como parte
da Administração Pública, possui informações técnicas de suas instituições para
planejar e executar ações.
Políticas públicas orientadas para o sistema judicial podem ser resumidas
como programas e ações implementados pelo Poder Judiciário, em sua seara de
atribuições, para aperfeiçoar a atuação no efetivo exercício das funções consti-
tucionais. Nos contornos que seguem, quando o Judiciário propõe determinada
política pública, responsabiliza-se por conceber, negociar interlocutores, realizar
consultaspúblicaselegeropçõesrazoáveiseaptasaconcretizarasnalidadese
organizar as despesas inerentes.
As políticas públicas, em geral, são relevantes para aperfeiçoar a democra-
cia contemporânea. Cabe ao Poder Judiciário elaborar os respectivos programas
sem a interferência dos demais poderes, como órgão legitimado ao redirecio-
namentodasatividadesdainstituiçãoem áreas especícas na promoção dos
direitos fundamentais estatuídos.
O efeito transformador congloba o percurso que vai do momento da
tomada da decisão até a implementação de atividades multidimensionais
reputadas relevantes pelo ente estatal e concretizadas por meio de progra-
masespecícosvoltadosà efetividade do acesso à justiça e cumprimento dos
deveres atribuídos aos agentes públicos(422).
OSTFrançoisO tempo do direito. Tradução de Élcio Fernandes. Bauru: Edusc, 2005. p. 408.
ROBL FILHO, Ilton Norberto. ConselhoNacionaldeJustiça– Estado Democrático de Direito
e accountability. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 195.
Ante a relevância do entrelaçamento proposto, não é demasia salientar que o acesso à jus-
tiça constitui instrumento de democracia, cidadania e inclusão social, elemento fundante do Estado
DemocráticodeDireito Delimitouse que a expansão dos direitos reclama a efetividade e e-
ciência) da operacionalidade de serviços judiciários criativos e inovadores, para além do provimento
jurisdicionaltradicionalcomométodoemdeacessoàJustiça
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
181
Logo, as políticas públicas judiciárias consistem em programas e ações
implantados dentre as atividades do Estado prestacional. Ainda que reportem
um conceito polissêmico, um fuzzy(423) normativo, compõem o eixo de recipro-
cidade estatal dentro do Estado Democrático de Direito e de todos os seus
poderes. Guarnecido dessa oscilação conceitual e da nebulosidade das premis-
sasque constituemasua deniçãorelevanteanalisar diantedosprogramas
instituídosaquelescomsionomiadepolíticapúblicajudiciária
Empiricamente constatada a consolidação de políticas públicas judiciá-
rias no cenário brasileiro, serão analisadas em seguida, na seara do Conselho
Nacional de Justiça: a conciliação e mediação, o sistema carcerário, a execução
penal e as medidas socioeducativas e a violência contra a mulher (Lei Maria
da Penha); e ainda, no Conselho Superior da Justiça do Trabalho, o Programa
Trabalho Seguro.
No intento de demonstrar o atributo de policymakersdos Conselhos Judi-
ciaisinseridonasfunçõesdosórgãosdecontroleodesaoquesegueconsiste
emdesvendar aspolíticaspúblicasjudiciárias identicando eexaminandoas
ações postas em prática pelo Poder Judiciário no exercício da sua função atípica.
Cabe, em última análise, referenciar que a seleção das políticas públicas
judiciárias considera as características dos programas desenvolvidos pelos
fazedores institucionais, competentes para por em prática uma atuação trans-
formadora nas vertentes enfocadas, cujo exame, destaque-se, observa dife-
rentes estágios causais e consecutivos, como também etapas analíticas de
características heterogêneas.
4.2. Conciliação e mediação
Notória a cultura da litigiosidade como um dos maiores problemas da
Justiça brasileira, demonstrada anualmente nos relatórios do ‘Justiça em
Números’ elaborados pelo Conselho Nacional de Justiça. Os dados estatísti-
cossinalizamqueosistemadeJustiçapadecedediculdadesparaalémdas
questões estruturais, materiais e até mesmo processuais, na medida em que o
contingente de demanda por si revela elemento desestabilizador do funcio-
namento adequado do aparato judiciário, posto que, abarrotado de processos
em larga monta, não consegue responder ao quantitativo em observância ao
esperadobinômioqualidadeceleridade(424).
CANOTILHOJoséJoaquimGomesEstudosobredireitosfundamentais. 2. ed. São Paulo: RT;
Portugal: Coimbra, 2008. p. 100.
Os dadoslevantados peloCNJ naversão lançadaem agostoindicam preocupante
cenário no Poder Judiciário, haja vista elevada média de processos em tramitação ao longo dos
anosaferidosParansinformativosregistraseporexemploquenosúltimosanos
Morgana de Almeida Richa
182
Em grande medida o fenômeno expresso no levantamento de dados
decorre do período seguinte à promulgação da Constituição Federal de 1988.
Neste momento, foi consagrado o Poder Judiciário no primeiro plano do cená-
rio político nacional na senda da outorga de novos direitos, da incapacidade
dos demais Poderes na execução de políticas públicas que lhes são próprias, da
ineciênciadosserviçosprestadosedamaiorconscientizaçãodocidadãocomo
sujeito de direitos e detentor da tutela jurisdicional.
Ampliado o protagonismo judicial associado à visão alargada de acesso
à justiça, as últimas décadas contaram com o aumento de demandas judiciais,
especialmente sobre matérias antes restritas às esferas de competência dos
Poderes Executivo e Legislativo, incapazes de responder aos anseios advindos
da consolidação do estado de bem-estar social.
OJudiciáriopassanessecenárioaseracionadoemquestõeseconômicas
políticas e sociais, acarretando o excesso de demandas e a consequente morosi-
dade na resposta judicial mediante os instrumentos processuais ordinários(425).
Além disso, outros aspectos de engessamento do Poder Judiciário brasi-
leirodevemser sopesados dentre os problemas que calcicam odesenvolvi-
mento adequado do sistema, dentre eles o excesso de formalidade, os custos
operacionais dos trâmites e a duração prolongada de procedimentos, de modo
que é preciso repensar novas modalidades que visem a melhor integração com
o atual sistema jurídico.
A solução, de imediato, evidencia-se na antítese da “cultura da sentença”,
qualsejaabuscadapacicaçãocompreendidaestacomonalidadeprecípua
da função jurisdicional. Por certo, as limitações dos mecanismos processuais
encontram mananciais valorosos nos instrumentos consensuais de solução
dosconitosintersubjetivoscomênfaseàconciliaçãoeàmediaçãoprincipais
vertentes à disposição dos operadores do direito contemporâneo.
Ofortalecimentodacomposiçãodeconitospormeiodeinstrumentosque
busquem reestabelecer de maneira ágil e efetiva a desejada paz social é desta-
cado por Kazuo Watanabe:
a média de processos em tramitação chegou ao patamar aproximado de 77,9 milhões, a repre-
sentar uma taxa de congestionamento médio equivalente a 71%. Note-se, ainda, que a taxa de
congestionamento avalia a capacidade do Poder Judiciário decidir com presteza as demandas
da sociedade, ou seja, na medida em que o gargalo de congestionamento encontrado mantém-se
estável, demonstrado está que o modelo contencioso necessita da construção de espaços alterna-
tivosdesoluçãodoconito
Por certo o reconhecimento do direito de acesso à justiça como porta de ingresso ao
Judiciário, e a conscientização da sociedade quanto aos direitos estatuídos levaram à crescente
demanda judicial; entretanto, a despeito de não ser objeto do presente estudo, trata-se de proble-
máticademaiorcomplexidadeabrangendomatériasdenaturezapolíticaeconômicasocialalém
da administração e gerenciamento do sistema de justiça.
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
183
Aincorporaçãodosmeiosalternativosderesoluçãodeconitosem
especial dos consensuais, ao instrumental à disposição do Judiciário
para o desempenho de sua função de dar tratamento adequado
aosconitosque ocorrem na sociedade não somentereduziriaa
quantidade de sentenças, de recursos e de execuções, como também,
o que é de fundamental importância para a transformação social com
mudançadementalidade, propiciaria uma soluçãomaisadequada aos
conitoscom a consideraçãodaspeculiaridades e especicidades
dosconitosedasparticularidadesdaspessoasneleenvolvidas(426).
Na esteira, necessário pontuar o predicado mais relevante da conciliação
eda mediação poisinstrumentosde pacicação social queencerramo conito
em dimensão muito superior à demanda, trazendo às partes o alívio pela solu-
ção encontrada, retirada a supremacia do vencedor e igualmente a opressão do
vencido, superadas pela compreensão da plausibilidade de encaminhamento que
contemple o melhor interesse, mediante concessões recíprocas a que se atribui
nalidadedepremissasuperior
Colocados em marcha diversos projetos concatenando meios consensuais
desoluçãodosconitosdeinteressecomênfasenaconciliaçãoenamediação
surgiu a necessidade de promover a construção de um modelo capaz de aprimo-
rar o funcionamento das estruturas de Estado, nivelando as disparidades de um
paíscontinentalseguramentereetidasnouniversoondegravitamasunidades
do Poder Judiciário brasileiro.
A composição orgânica do Poder Judiciário foi reestruturada de modo
a colocar em prática o desenho de uma política judiciária nacional de trata-
mentoadequadodosconitosdeinteresseapartirdeumnovo modelode
atuação jurisdicional.
O objetivo primordial que se busca com a instituição de semelhante
política pública é a solução mais adequada dos conitos de inte-
resses, pela participação decisiva de ambas as partes na busca do
resultado que satisfaça seus interesses, o que preservará o relaciona-
mento delas, propiciando a justiça coexistencial [...]. Por meio dessa
política pública judiciária, que proporciona aos jurisdicionados uma
soluçãomais adequada dos conitos o Judiciário Nacional estará
adotando um importante ltroda litigiosidade, que, ao contrário de
barrar o acesso à justiça, assegurará aos jurisdicionados o acesso à
ordem jurídica justa, e, além disso, atuará de modo importante na
WATANABEKazuoPolítica públicado PoderJudiciárionacional paratratamento ade-
quadodos conitos de interessesIn Coords PELUSOAntônio Cezar RICHA Morganade
Almeida. Conciliação e mediação: estruturação da Política Judiciária Nacional. Rio de Janeiro:
Forense, 2011. p. 4.
Morgana de Almeida Richa
184
redução da quantidade de conitos a serem ajuizados e também, em
relação aos conitosjudicializados ou que venham aser judicializados, a
suasoluçãopelosmecanismosdesoluçãoconsensualdosconitoso
que certamente determinará a redução substancial da quantidade de
sentenças, de recursos e de execuções judiciais(427).
Assimé projetada nalisticamente umapolíticapública judiciária para a
entrega da prestação respectiva, por meio da conciliação e mediação, confor-
madaapadrõesecientesdeacessodeceleridadeedeefetividadeParatanto
foi necessário desenvolver um modelo estruturado, visando contribuir no desa-
fogamento do Judiciário importante ltro de litigiosidade capaz de reunir
outrossim, a emancipação das partes que passam a compor seus interesses com
menor grau de intervenção do Estado.
Com efeito, no exercício das atribuições constitucionalmente concebi-
das (artigo 103-B, § 4º, Constituição Federal de 1988), o Conselho Nacional de
Justiça(428) instituiu a política judiciária nacional de tratamento adequado dos
conitosdeinteressenoâmbitodoPoderJudiciárioformalizadapelaResolução
n. 125, de 29.11.2010.
O normativo consolidou uma política pública judiciária nacional, orga-
nizada e estruturada com fulcro nos interesses sociais percebidos pelo órgão
administrativo de cúpula do Poder Judiciário, previstos mecanismos destinados
a promover o interesse público de determinado segmento da população.
A ideia central foi conceber um novo paradigma nacional para prestação
do serviço jurisdicional mediante utilização de meios alternativos de solução
delidesao tempoemqueasseverouprimordial desenvolvêloscomeciência
operacionalpadronizaçãoeracionalizaçãodosórgãosdejustiçaamdeevitar
disparidades nos serviços prestados e, com isso, incrementar a qualidade e a
eciênciadaatividadejurisdicional
O texto expressou sensibilidade ao reconhecer as similitudes e respeitar as
especicidadesdecadasegmentopermitindouidezaomodeloem suaacep-
ção macro, permeável às diferentes esferas de atuação do Poder Judiciário, na
seara de suas competências.
WATANABEKazuoPolítica públicado PoderJudiciárionacional paratratamento ade-
quadodos conitos de interessesIn Coords PELUSOAntônio Cezar RICHA Morganade
Almeida. Conciliação e mediação: estruturação da Política Judiciária Nacional. Rio de Janeiro:
Forense, 2011. p. 4-5.
Oretornoàessênciadasatribuições doConselhoNacional deJustiçalheremeteaspectos
decontroleeciência operacionalacessoà Justiçaeresponsabilidade socialconcebidoo Poder
Judiciário como um modelo nacional em que buscada a padronização do sistema em sua integra-
lidade e deste modo compreendido pela população.
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
185
Linhasmestras de base losóca utilizada para estruturação da política
pública judiciária foram pontuadas já na parte inicial do ato normativo, em que
os considerandos representam exposição de motivos circunstanciada e contem-
plam os fundamentos principiológicos das formas consensuais de solução dos
conitoscompreendidosestes em elevadae crescente escala na sociedade a
demandardoJudiciárioinstrumentosdepacicaçãosocial
Atribuiu-se aos órgãos judiciários a incumbência de oferecer mecanismos
consensuais, prestando atendimento e orientação necessários para a realização
dapolíticapúblicajudiciáriadenidososatoresqueparticipamdoprocessoem
diferentes momentos.
Segundo referencia Valeria Lagrasta, a nova imagem do Poder Judiciário
demanda responder aos anseios da comunidade:
Eissoporque oacessoàJustiçaqualicadoexigenão sóefetividade
celeridade e adequação da tutela jurisdicional, mas uma atenção do
Poder Público, em especial do Poder Judiciário, a todos que busquem
soluçãoaqualquerproblemajurídiconãonecessariamenteumconito
de interesses. Assim, cabe ao Poder Judiciário organizar não apenas
os serviços processuais, como também os serviços de solução de con-
itosatravés demétodosalternativos àsoluçãoadjudicada pormeio
da sentença (hoje, conciliação e mediação) e os serviços que atendam
os cidadãos de modo mais abrangente, como a solução de simples pro-
blemas jurídicos, a orientação jurídica, a assistência social e a obtenção
de documentos essenciais ao exercício da cidadania(429).
À frente da edificação desse programa, o Conselho Nacional de Justiça
figura na condição de policymaker para o desempenho central na coordenação
dos serviços públicos judiciários a partir de diretrizes nacionais integradas na
Resoluçãodenindoparâmetrosgeraisdeatuaçãoesistematizaçãoquedevem
ser seguidos pelos Tribunais de todo o país com a nalidade de reduzir os
conitosdeinteressesjudicializados
A concepção macro atribuída ao Conselho Nacional de Justiça como poli-
cymaker insere indicadores de ação elastecidos para os trabalhos de conciliação
no espaço pré-processual, processo de execução e efetividade dos processos em
relação aos litigantes em massa. Também em relação aos principais atores envol-
vidos, a inserção dos agentes e operadores do direito, em especial mediante
parceria com a Ordem dos Advogados do Brasil, Ministério Público, Associa-
ções e Faculdades de Direito.
LUCHIARIValeriaFerioliLagrastaAResoluçãondoConselhoNacional deJustiça
origem, objetivos, parâmetros e diretrizes para a implantação concreta. In PELUSOAntônio
Cezar; RICHA, Morgana de Almeida (coords.). Rio de Janeiro: Forense, 2011, p. 230-231.
Morgana de Almeida Richa
186
Em outras palavras, o Conselho possui, outrossim, função abrangente de
interlocutor nacional entre os diversos segmentos do Poder Judiciário e insti-
tuições públicas e privadas e de fomentador à propagação e à valorização das
práticas autocompositivas.
No desiderato de gerir a política pública da conciliação no Judiciário, o
Conselhoéresponsávelporobservardepertoocrescimentoeadiversicaçãodas
atividades nos Tribunais, os quais contam com manancial expressivo na criativi-
dade e no comprometimento das instituições e de seus magistrados.
Signicadizerquenadaobstanteaabrangênciaeadeniçãodasdiretri-
zesnacionaiscaremsobaresponsabilidadedoConselhoNacionaldeJustiça
é por intermédio dos Tribunais que a política pública em questão adquire
formato no âmbito interno, desaguando no desenvolvimento de ações concre-
tas concatenadas.
Os contornos de atuação dos Tribunais envolvidos são, portanto, decisivos
paraaecáciadasestratégiasdelineadaspelapolíticamediante escolharacio-
nal das prioridades e interesses públicos que conduzirão a relação de causali-
dade entre a política pública e o resultado pretendido.
De maneira coerente, o direcionamento do desenho de ações de compe-
tência dos Tribunais, no âmbito da conciliação e da mediação, conta com o
Comitê Gestor da Conciliação, encarregado de apresentar projetos anuais
descrevendo as atividades a serem implementadas nas unidades jurisdicio-
nais, por intermédio dos gestores responsáveis, que recebem orientações para
preparar e executar os trabalhos.
Nesse particular não é demasia o registro de que os Comitês Gestores são
instituídos pelo Conselho Nacional de Justiça segundo Portarias(430), para dar
efetividadeaoprojetodedivulgaçãoeincentivodasoluçãopacícadeconitos
além de ser encarregado da organização e da execução de medidas de continui-
dade do Movimento pela Conciliação, realizado anualmente nos Tribunais em
todo o país.
Odesenhoda política judiciária nacional de tratamento dos conitos de
interesse vem alicerçado em quatro pilares estruturantes.
O primeiro deles consiste no estabelecimento de Núcleos Permanentes de
MétodosConsensuaisdeSoluçãodeConitosemcadaTribunalNUPEMECs
células de inteligência no desenvolvimento da política judiciária local, respon-
sáveis pelo prolongamento do programa nos Estados, pela interlocução com
Nasquaisnomeadososmembrosindicadosnosperíodosdeatuaçãorespectiva
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
187
outros Tribunais, entidades públicas e privadas(431)amde manter eaperfei-
çoar as ações voltadas ao cumprimento da política e de suas metas(432).
Para planejar é preciso conhecer a realidade de cada Tribunal,
mapeando todas as práticas implantadas no Estado ou Região, ana-
lisando a forma como são distribuídas, segundo a organização judi-
ciária local, o tipo de atividade que vêm desenvolvendo, quais as
parceriasjármadasequevêmsemostrandoprodutivaseanadas
com os escopos do Poder Judiciário, os melhores resultados colhidos
e as práticas adotadas que conduziram a eles. Possivelmente esta
será a primeira missão dos Núcleos: esmiuçar as formas e os locais
de implantação das práticas autocompositivas(433).
De fato, aos Núcleos cabe o exercício da função política, tarefa que resulta
na permanência, aprimoramento e expansão dos meios alternativos de solução
de controvérsias, de acordo com a especificação e a orientação dos Tribunais para
o desenvolvimento da política pública judiciária na esfera regional ou estadual.
Os Núcleos ainda devemcriare mantercadastrounicadode todosos
conciliadores e mediadores que atuem no âmbito do respectivo Tribunal,
ligadosou nãoaosCentros JudiciáriosdeSolução deConitose Cidadania
mediantexaçãode critérios mínimos para a inscrição e a observância dos
princípios éticos constantes do Código de Ética de Conciliadores e Mediadores
Judiciais (Anexo III da Resolução n. 125/2010).
Oaspectoemparticularrevelaimportantecaracterísticadapolíticapúblicanamultiplici-
dade de atores públicos e privados. Dentre eles, as instituições de ensino, universidades, Subse-
ções da Ordem dos Advogados do Brasil, Defensorias Públicas, Procuradorias, Ministério Público,
órgãos do Poder Executivo etc. O incentivo às práticas autocompositivas não se sustenta sem a
integração com as demais instituições.
AsfunçõesdoNUPEMECsãodescritasnosincisosdoartigodoregramentoemexame
IdesenvolveraPolíticaJudiciáriadetratamentoadequadodosconitosdeinteressesestabele-
cida nesta Resolução; II – planejar, implementar, manter e aperfeiçoar as ações voltadas ao cum-
primento da política e suas metas; III – atuar na interlocução com outros Tribunais e com os órgãos
integrantes da rede mencionada nos artigos 5º e 6º; IV – instalar Centros Judiciários de Solução
deConitoseCidadaniaqueconcentrarãoarealizaçãodassessõesdeconciliaçãoemediaçãoque
estejam a cargo de conciliadores e mediadores, dos órgãos por eles abrangidos; V – incentivar ou
promover capacitação, treinamento e atualização permanente de magistrados, servidores, conci-
liadoresemediadoresnosmétodosconsensuais desoluçãodeconitosVI proporaoTribunal
arealizaçãodeconvênioseparcerias comentes públicose privadosparaatender aosns desta
Resolução; VII – criar e manter cadastro de mediadores e conciliadores, de forma a regulamentar o
processo de inscrição e de desligamento; VIII – regulamentar, se for o caso, a remuneração de con-
ciliadores e mediadores, nos termos do artigo 169 do Novo Código de Processo Civil combinado
com o artigo 13 da Lei de Mediação.
NOGUEIRA Mariella Ferraz deArruda Pollice Dos núcleos permanentes de métodos
consensuais de solução de conitos In Coords PELUSOAntônio Cezar RICHA Morgana
de Almeida. Conciliação e mediação: estruturação da Política Judiciária Nacional. Rio de Janeiro:
Forense, 2011. p. 254.
Morgana de Almeida Richa
188
Importante espaço de alargamento da atuação judiciária, por esta via,
insere a possibilidade de conciliadores e mediadores privados no cadastro, após
processodeseleçãoeconrmaçãodetreinamentodemodoa garantiraquali-
dade dos serviços prestados àqueles interessados na autocomposição.
Osegundo pilarestabelecidopelonormativoprevêainstalaçãoe asca-
lizaçãodeCentrosJudiciáriosdeSoluçãodeConitose CidadaniaCEJUSCs
encarregados da execução da política pública, assumindo a responsabilidade
pelo funcionamento e pelo sucesso mediante a coordenação de um magistrado(434)
que supervisionará os serviços prestados pelos conciliadores, mediadores e
demais colaboradores nas sessões e audiências. Aos servidores do Judiciário,
capacitadosnostermosdoAnexoIecomdedicaçãoexclusivacadelegadaa
triagem dos casos, prestação de informações e orientação aos jurisdicionados
para garantia do legítimo acesso à ordem jurídica justa.
Coerência lógica do modelo atribui aos Centros a gestão das sessões,
audiências de conciliação e mediação a cargo de conciliadores e mediadores,
além do atendimento e orientação ao cidadão.
Na vertente histórica destaca-se a racionalização das atividades dos Centros
JudiciáriosdeSoluçãodeConitoseCidadaniainspiradanogerenciamentodos
processos e no Fórum de Múltiplas Portas ou Tribunal Multiportas do direito
norte-americano.
Este sistema decorreu inicialmente de uma abordagem inovadora elabo-
rada pelo professor de Harvard, Frank E. A. Sander, em 1976, ao se debruçar
sobre a demanda crescente nos tribunais dos Estados Unidos e a insatisfação
popular com o sistema judiciário. Sua proposta previa programas diferenciados
desoluçãodiversadaadjudicadaestabelecidasportasapropriadasaoconito
dentro ou fora do tribunal, mediante o diagnóstico das causas e o subsequente
encaminhamento para solução pelo meio mais adequado.
Teve como meta colocar em funcionamento engrenagens aptas a reduzir ou
eliminar a frustração dos cidadãos e desenvolver programas que preenchessem
as lacunas nos serviços de administração da justiça. Nas palavras de Valéria
Luchiari:
O Fórum de Múltiplas Portas ou Tribunal Multiportas constitui uma
forma de organização judiciária na qual o Poder Judiciário funciona
como um centro de resolução de disputas, com vários e diversos pro-
cedimentos, cada qual com suas vantagens e desvantagens, que devem
ser levadas em consideração, no momento da escolha, em função das
SobreojuizcoordenadornecessáriorealizartreinamentonostermosdoAnexoIdaReso-
lução n. 125/2010, cujo objetivo é associar os magistrados à política pública judiciária, expondo-lhes
aformadefuncionamentodosCentroseosmétodosdesoluçãodeconitosaseremutilizados
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
189
característicasespecícasdecadaconitoedaspessoasneleenvol-
vidas. Em outras palavras, o sistema de uma única “porta”, que é
o do processo judicial, é substituído por um sistema composto de
variados tipos de procedimento, que integram um “centro de reso-
lução de disputas”, organizado pelo Estado, composto de pessoas
treinadas para receber as partes e direcioná-las ao procedimento
maisadequadoparaoseutipodeconito(435).
No sistema de justiça nacional previsto pela Resolução, os CEJUSCs devem
abrangertrêssetores osetorde soluçãodeconitos préprocessualoproces-
sual e o setor de cidadania, além de contar com estrutura funcional mínima.
A capacitação permanente de magistrados, servidores e colaboradores nos
métodosconsensuaisdesoluçãodos conitosrepresentaoterceiropilardessa
política pública, atribuído ao Conselho Nacional de Justiça o desenvolvimento
de parâmetro curricular e de ações correspondentes(436), além da avaliação do
treinamento dos mediadores e conciliadores, orientando e apoiando as localida-
descomdiculdadenaefetivaçãodapolíticajudiciárianacional
Acapacitação especíca éessencialao sucessodoprograma e porisso
mesmo, somente serão admitidos mediadores e conciliadores treinados na
forma do texto constante no Anexo I, cabendo aos Tribunais realizar o curso
próprio ou por meio de parcerias. Dentre as mais relevantes, o desenvolvi-
mento de projetos para formar prepostos de grandes demandantes, dos seto-
resprivadoepúblicoalémdeconteúdosparaáreasespecícasdamediação
como família, penal e justiça restaurativa(437).
Os cursos de formação(438) de instrutores, supervisores e prepostos em
mediação judicial e conciliação, como também de formação de instrutores em
ocinasde divórcioeparentalidade abrangemperspectivade acessoàJustiça
de importante repercussão social, contemplando parcerias dentro e fora do
Poder Judiciário, promoção, formação e sensibilização dos atores envolvidos
nos processos autocompositivos.
LUCHIARIValériaFerioliLagrastaResoluçãondoConselhoNacionaldeJustiçaIn
CoordsPELUSOAntônioCezarRICHAMorganadeAlmeidaConciliação e mediação: estrutu-
ração da Política Judiciária Nacional. Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 241.
Ocursodecapacitação básicadosterceirosfacilitadoresconciliadores emediadorestem
por objetivo transmitir informações teóricas gerais sobre a conciliação e a mediação. Além disso,
propiciam vivência prática para aquisição do mínimo de conhecimento que torne o corpo discente
apto ao exercício da conciliação e da mediação judicial. O curso é dividido em duas etapas (teó-
rica e prática), tem como parte essencial os exercícios simulados e o estágio supervisionado de
60 e 100 horas, nos termos delineados pelo Anexo I da Resolução n. 125, denominado ‘Diretrizes
Curriculares’.
BRASILConselhoNacionaldeJustiçaCursosdeFormaçãoDisponívelemhpswww
cnjjusbrprogramaseacoesconciliacaoemediacaoqueroserumconciliadormediador
Acesso em: 05 nov. 2018.
SobacoordenaçãodaComissãoPermanentedeAcessoàJustiçaeCidadania
Morgana de Almeida Richa
190
EmtallinhadeatuaçãormadosconvêniosentreoConselhoNacionalde
Justiça e as Escolas Nacionais de Magistratura (Escola Nacional de Formação e
Aperfeiçoamento de Magistrados – ENFAM e a Escola Nacional de Formação
e Aperfeiçoamento de Magistrados do Trabalho – ENAMAT), para desenvol-
ver cursos de capacitação destinados a magistrados e servidores, direcionados
paraaconciliaçãoamdeformarmultiplicadores
A importância da ação formativa reete diretamente na qualidade dos
serviços prestados e assegura o acesso a uma “ordem jurídica justa”, de modo
que é razoável a exigência de disciplina mínima alinhada com a compatibilidade
dos ensinamentos em relação ao conteúdo programático estabelecido, assegu-
rando a uniformidade do ensino.
Os programas têm por escopo incentivar e promover a capacitação, trei-
namento e atualização permanente de magistrados, servidores, conciliadores e
mediadoresnosmétodosconsensuaisdesoluçãodeconitosAatuaçãodesses
sujeitos redimensiona a política pública judiciária e causa impacto na condução
dos processos judiciais e nas reclamações apresentadas pelas partes.
O último e não menos importante pilar exige a manutenção de um banco
de dados permanentemente atualizado sobre as atividades de conciliação e
mediação no país, para possibilitar a análise apurada dos diversos diagnósticos
sobre a justiça brasileira e a elaboração de planejamento que vise aprimorar a
prestação jurisdicional.
Nesse sentido o caráter coercitivo da Resolução, ao estabelecer que os
Tribunais deverão criar e manter banco de dados sobre as atividades de cada
Centro, cabendo ao Conselho Nacional de Justiça compilar as informações sobre
os serviços públicos de solução consensual das controvérsias existentes no país e
sobre o desempenho de cada um deles, por meio do Departamento de Pesquisas
Judiciárias (DPJ), mantendo constante atualização do banco de dados.
Por certo, o somatório do conjunto de informações armazenadas, aliado à
observação dos paradigmas existentes, constitui instrumental à disposição dos
Tribunais e do Conselho Nacional de Justiça no pressuposto de que a dinâmica
atualizada das relações no tempo e no espaço é fator determinante para aprimo-
rar a política judiciária nacional.
De outra parte, as ações de divulgação alcançam as “boas práticas” elabo-
radas pelos Tribunais em mediação judicial e conciliação. Com acerto o site
do Conselho disponibiliza material detalhado a respeito dos programas regio-
nalizados, informando a descrição dos projetos, principais objetivos, público
participante, recursos envolvidos e os resultados obtidos, a representar um faci-
litador e incentivador dos mecanismos consensuais de solução de demandas(439).
BRASILConselhoNacionaldeJustiçaBancodeboaspráticasemmediaçãojudicialecon-
ciliação. Disponível em: <hpwwwcnjjusbr. Acesso em: 05 nov. 2020.
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
191
No campo da promoção de discussões e levantamento de boas práticas de
aprimoramento do exercício das funções desempenhadas por seus integran-
tes, foi criado o Fórum Nacional da Mediação e Conciliação (FONAMEC), no
âmbito da justiça estadual. Seu objetivo é aperfeiçoar os métodos consensuais
de solução de conitos de interesse por meio do intercâmbio de experiên-
cias. Composto pelos coordenadores dos Núcleos Permanentes de Métodos
Consensuaisde Solução de Conitos oFórumtemâmbito nacional e conta
com o auxílio dos Tribunais de Justiça dos Estados, da Associação dos Magis-
trados Brasileiros (AMB) e das Escolas de Magistratura para concretizar os
objetivos correspondentes(440).
Ainda na esteira da visibilidade do programa e compilação de dados, teve
início o funcionamento do Portal da Conciliação, ferramenta extremamente rele-
vante para consolidar a política judiciária nacional(441).
A estratégia de comunicação é, outrossim, um elemento indispensável para
disseminar a cultura da conciliação perante a sociedade, fulcrada na importância
do diálogo para chegar à solução do problema. Material de divulgação de campa-
nha elaborado, a cada período, pauta a visibilidade da matéria, mediante veicula-
ção com ampla repercussão em programas de rádio, mídia televisiva e nas redes
sociais. A interlocução também é realizada por magistrados, na apresentação de
dados e de boas práticas de conciliação nas comunidades.
Esgotadas as premissas fundamentais em que estruturado o tratamento
adequadodos conitosdeinteresses e traçadasasdiretrizes geraisdefuncio-
namento nos Tribunais, o passo que segue demanda fazer referência a ações
concretas exemplicativamente consideradas aquelas entendidas como de
maior densidade para alavancar a política pública judiciária.
Dentre as hipóteses aventadas, foi lançado o prêmio ‘Conciliar é legal’ em
cujoobjetivoéidenticarpremiardisseminareestimulararealizaçãode
ações de transformação no âmbito do Poder Judiciário(442), como também para
imprimirmodernizaçãorapidezeeciênciaà justiça brasileira.
A partir de temas que envolvem a paz duradoura, a conciliação pré-proces-
sual e a Semana Nacional da Conciliação, foram inscritas, na primeira edição,
práticas nos três segmentos de justiça, premiadas nas categorias Tribunais e Juiz
BRASIL Conselho Nacional de Justiça Fórum Nacional da Mediação e Conciliação
FONAMEC. Disponível em: <hpwwwcnjjusbr. Acesso em: 05 nov. 2020.
BRASILConselho Nacional de Justiça Conciliação e mediação portal da conciliação
DisponívelemhpswwwcnjjusbrprogramaseacoesconciliacaoemediacaoAcessoem
05 nov. 2020.
BRASIL ConselhoNacional deJustiçaPrêmioConciliar éLegal Disponívelem hps
wwwcnjjusbrprogramaseacoesconciliacaoemediacaopremioconciliarelegalAcesso em
05 nov. 2020.
Morgana de Almeida Richa
192
Individual(443)Oscritériosdeavaliaçãoobservaramaeciênciadosmodelosa
restauratividade das relações sociais, a criatividade, a exportabilidade, a satisfa-
ção do usuário, o alcance social e a desburocratização.
O prêmio está na 11ediçãoeem20, contemplou sete categorias: tribu-
nal; juiz individual; instrutores de mediadores e conciliadores; instituições de
ensino; mediação e conciliação extrajudicial; demandas complexas ou coletivas;
inovando com o segmento “empresa ou grupo empresarial”(444).
Outra forma de valorizar os magistrados que atuam na conciliação foi inse-
rida na Resolução n. 106 do Conselho Nacional de Justiça, que dispõe sobre
os critérios objetivos para aferir o merecimento na promoção de magistrados
e acesso aos Tribunais de 2º grau, estabelecidos os parâmetros utilizados para
pontuação, dentre eles a produtividade e a presteza.
O normativo aprovado introduziu a avaliação da produtividade consi-
derando alguns requisitos como, por exemplo, o volume de produção mensu-
rado pelo número de conciliações realizadas. E, ainda, privilegia na avaliação da
produtividade os magistrados cujo índice de conciliação seja proporcionalmente
superior ao de sentenças. Ademais, na presteza computadas medidas efetivas de
incentivo à conciliação em qualquer fase do processo.
Contribuição expressiva a esse horizonte de ações abrange a ampliação
dos espaços de conciliação e mediação na era da modernidade eletrônica
Asseguraroacessoàjustiçaatodososcidadãospormeiodapacicaçãosocial
gurounoprogramalançadopeloConselhoNacionaldeJustiçaMediação
digital: a justiça a um clique’, em que se viabiliza a celebração de acordos pela
formavirtualparapartessicamentedistantesAsaçõesdedivulgaçãodessa
nova modalidade de acesso tecnológico estão sendo difundidas nos Tribunais,
por marca e visual próprios, para facilitar o reconhecimento do sistema pelo
usuário da ferramenta(445).
A mais emblemática atuação do Poder Judiciário no tema da conciliação
e mediação tem início antes mesmo da concepção estruturada de uma polí-
tica pública judiciária, com o Movimento pela Conciliação, em 23 de agosto
de 2006(446).
BRASIL Conselho Nacional de Justiça PrêmioConciliar é Legal Disponível emhps
www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/conciliacao-e-mediacao/premio-conciliar-e-legal/i-premio-na-
cionaldeconciliacaoAcessoemnov
BRASIL Conselho Nacional de Justiça PrêmioConciliar é Legal Disponível emhps
wwwcnjjusbragendasxipremioconciliarelegalAcessoemnov
BRASILConselhoNacional deJustiçaMediação digital Disponívelemhpswwwcnj
jusbrmediacaodigitalAcessoemnov
Por iniciativados conselheirosGermana deMoraese EduardoLorenzoni comapoio da
ministra Ellen Gracie e da unanimidade dos seus integrantes. No discurso do lançamento do pro-
grama, a Ministra Ellen Gracie ressaltou: “A conciliação é o caminho para a construção de uma
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
193
Em breve retrospectiva por representar marco de alargamento na cultura
dapacicaçãooprograma Conciliaré legalteve porfoco incentivare divul-
gara soluçãopacícade conitosmediante aconstruçãode acordosalémda
modernizaçãodarapidezedaeciência dajustiçabrasileiraProssegueatual-
mente com a participação dos Tribunais nas esferas estaduais, federais e do
trabalho, irmanadas unissonamente as cortes de justiça na interlocução dialética
para tornar concreto o direito à cidadania.
O dia da justiça (08/12) marcou o início das atividades conjuntas de conci-
liação, em contexto que posteriormente materializou projeto permanente do
Conselho Nacional de Justiça.
Tratasedoprimeiromarcoocialinstitucionalenãoapenaspolítico-
-programático, ou de mera gestão, versando sobre o reconhecimento
da existência de uma nova modalidade, em que pese ressurgente, de
se solucionar contendas, e nisso inaugura o novo formato da verda-
deira JustiçaNacional, a qual nasce, ou como Fênix, ressurge, sob signo
da missão cidadã de implantar métodos que detenham a real capaci-
dadededarprontasoluçãoemtempoútilrazoávelaosconitosde
interesses apresentados no seio das populações, a bem de imensidões
de jurisdicionados que a cada dia mais querem e necessitam se valer
desses serviços, demonstrando que é de fato relevante para o Estado
oelementomaissignicativointegrantedoteoremadaação judicial
qualsejaotempodevidaduranteoqualaspartespacícaeresig-
nadamenteaguardamasoluçãodoconitosemrecorrerparatanto
a métodos marginais, até mesmo ilícitos(447).
A primeira Semana Nacional da Conciliação, de 3 a 8 de dezembro de 2007,
representou a ampliação do movimento, envolvendo mais de 3 mil magistrados
e 20 mil servidores e colaboradores empenhados para o atendimento superior a
400 mil pessoas(448).
convivênciamaispacícaO entendimentoentre aspartes ésempre amelhor formaparaquea
Justiça prevaleça. O objetivo é uma sociedade capaz de enfrentar suas controvérsias de modo
menoslitigioso valendoseda conciliação orientadapor pessoas qualicadaspara diminuiro
tempona buscadasolução deconitos e reduziro númerodeprocessos contribuindoassim
para o alcance da paz social. (BUZZI, Marco Aurélio Gastaldi. Movimento pela conciliação – um
brevehistóricoInCoordsPELUSOAntônioCezarRICHAMorganadeAlmeidaConciliação e
mediação: estruturação da Política Judiciária Nacional. Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 50).
BUZZI Marco AurélioGastaldi Movimento pela conciliação um breve histórico In
CoordsPELUSOAntônioCezarRICHAMorganadeAlmeidaConciliação e mediação: estrutu-
ração da Política Judiciária Nacional. Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 47.
BRASILConselhoNacionaldeJustiçaDisponívelemhpswwwcnjjusbrprogramas-
eacoesconciliacaoemediacaosemananacionaldeconciliacaoAcessoemnov
Morgana de Almeida Richa
194
O ano de 2008 agregou assinatura de termos de cooperação entre os dias 1º
e 5 de dezembro, aberta a Semana simultaneamente em sete capitais do país(449).
Comotodedarcontinuidadeaomovimentodivulgareincentivarasolu-
çãopacícadeconitos foiinstituído ocomitêgestordaconciliaçãoem de
outubro de 2009(450)cujasatividadescaramsobaresponsabilidadedacomis-
são permanente de acesso à justiça e cidadania(451).
A Semana Nacional que ocorreu de 7 a 11 de dezembro proporcionou a
efetivação de 260 mil audiências e 120 mil acordos, somando aproximadamente
R$ 1 bilhão.(452) O evento apresentou diferencial para a conciliação no âmbito do
Judiciárioaoincluirumasemanaespecícapararealizaraudiênciasdeconcilia-
ção em processos vinculados à Meta 2(453). O programa, para reduzir o grande
estoque de processos da justiça brasileira, buscou aqueles de grande complexi-
dade e tramitação prolongada.
Ainda, os processos mais antigos, assim considerados os distribuídos até
Meta contaram com uma semana de conciliação especíca em
2009, quando mais de 69 mil audiências foram realizadas e mais de 25 mil acor-
dosforamrmadosmovimentandoRmilhões(454).
Premissa central para o incentivo ao jurisdicionado na participação direta
de acordo amigável está baseada nas campanhas publicitárias criadas para
BUZZI Marco AurélioGastaldi Movimento pela conciliação um breve histórico In
CoordsPELUSOAntônioCezarRICHAMorganadeAlmeidaConciliação e mediação: estrutu-
ração da Política Judiciária Nacional. Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 53.
BRASILConselhoNacionaldeJustiçaPortarianDisponívelemhpsatoscnjjus
bratosdetalharAcessoemnov
AsComissõesórgãosintegrantesdoConselhoNacionaldeJustiçanostermosdoartigo
do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça, possuem as seguintes atribuições: I – dis-
cutir e votar as proposições sujeitas à deliberação que lhes forem distribuídas; II – realizar audiên-
cias públicas com órgãos públicos, entidades da sociedade civil ou especialistas; III – receber
requerimentos e sugestões de qualquer pessoa sobre tema em estudo ou debate em seu âmbito de
atuação; IV – estudar qualquer assunto compreendido no respectivo campo temático ou área de
atividade, podendo propor, no âmbito das atribuições para as quais foram criadas, a realização
de conferência, exposições, palestras ou seminários (artigo 28 do Regimento Interno do Conselho
Nacional de Justiça).
BRASILConselhoNacionaldeJustiçaDisponívelemhpswwwcnjjusbrprogramas-
eacoesconciliacaoemediacaosemananacionaldeconciliacaoAcessoemnov
Dentre as metastraçadasno EncontroNacional do Judiciáriorealizadoem fevereiro
deem buscada efetivaprestaçãojurisdicional ametaobjetivouidenticar osprocessos
judiciais mais antigos e adotar medidas concretas para julgar os feitos distribuídos até 31.12.2005
(em 1º e 2º graus e tribunais superiores).
CONJUR Semana da conciliação. Acordos em tribunais ultrapassam R$ 218 milhões. Dis-
ponível em: <hpswwwconjurcombrsetacordossemanaconciliacaoultrapassam-
-218-milhoesAcessoemnov
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
195
demonstrar os benefícios múltiplos da conciliação, a exemplo do slogan adotado
em 2009: ‘Ganha o cidadão. Ganha a Justiça. Ganha o País’.
Diversas foram as ações implementadas, dentre elas, parcerias com entida-
des representativas de classe, com empresas públicas e privadas e com órgãos
públicos; criação de centrais de conciliação; realização de cursos técnicos e de
mutirões conciliatórios no âmbito dos Tribunais.
O crescente destaque do Movimento pela Conciliação resultou em sua
institucionalização no âmbito do Conselho Nacional de Justiça em março de
2009(455), mediante aprovação em Plenário que avaliou a consolidação do Movi-
mentodiantedanecessidadeedaimportânciadasolução pelaviadapacica-
ção, assentado também que a justiça assoberbada é justiça de baixa qualidade.
Por consequência, adentrar em 2010 trouxe o adensamento da temática,
transformadaempolíticapúblicajudiciáriadetratamentoadequadodosconi-
tos de interesse no âmbito do Poder Judiciário, com substrato no poder norma-
Do ponto de vista prático, o novo momento representou um avanço para a
capilarização das práticas, o enraizamento do projeto que, para além da semana
nacional da conciliação, incorporou-se à agenda permanente dos Tribunais,
mobilizados para o desenvolvimento do aparato judicial na via de soluções
alternativas que visem melhorar a prestação jurisdicional.
O slogan ‘Conciliando a gente se entende’ simbolizou a campanha de 2010 e
seu inegável avanço merecedor de registro: em contraposição à cultura litigiosa,
ganhavisibilidadeeincentivoasoluçãodosconitospormeiododiálogoinau-
gura-se um ciclo virtuoso nos Tribunais, com as práticas conciliatórias respalda-
das por magistrados, servidores, procuradores, operadores do direito de modo
geral; ampliam-se as estruturas por meio de capacitações, núcleos e centros
próprios para equilibrar o modelo adversarial; a cultura da conciliação amplia
BRASILConselhoNacionaldeJustiçaVotoderelatoriadaconselheiraAndréaPachános
autos do processo n. 0001075-26.2008.2.00.0000, de 17 mar. 2009, cuja ementa segue transcrita:
“Diante do exposto, considerando a sua trajetória, a percepção de que o movimento permanece
consolidadoesolidicadoedequeasociedadeeprincipalmenteosmembrosdoPoderJudiciário
járeconhecemhojeanecessidadeeaimportânciadasoluçãodeconitospormeiodaconciliação
submeto a este Plenário a presente proposta de que o projeto em referência deixe de integrar os
trabalhos da Comissão de Acesso à Justiça, Juizados Especiais e Conciliação e seja institucionali-
zado no âmbito deste Conselho Nacional de Justiça, devendo a Secretaria-Geral dar continuidade
e prosseguimento ao movimento, criando-se um Comitê Gestor e indicando, desde logo, os ser-
vidoresque carãoresponsáveis pela suaexecução Sugiro por mque após aaprovação da
presentesejamociadostodosostribunaisdandoseciênciadoseuteoresejasolicitadooaposti-
lamento de elogio nos assentamentos funcionais dos juízes e servidores que trabalharam durante
todos esses anos no Movimento pela Conciliação no âmbito das Cortes”.
Morgana de Almeida Richa
196
espaço social, ao incorporar legitimidade perante a população com a resolução
dosconitosmedianteexercíciodecidadaniaejustiça
A abordagem da Semana Nacional de 2011 priorizou o enfrentamento dos
litígios em massa a partir dos dados coletados pelo Conselho Nacional de Justiça
sobre os 100 maiores litigantes dos tribunais estaduais, regionais federais e do
trabalho(456). Constatados gargalos no ranking, em especial relativamente aos
setores públicos federal, estadual e municipal, bancos e telefonia, a diretriz do
planejamento esteve assentada em negociações coletivas envolvendo agências
reguladoras e empresas demandantes em larga escala, estabelecidas metas de
conciliaçãomediantetermosdecooperaçãoespecícosquepossamigualmente
absorver a seara da conciliação pré-processual.
Com o conceito ‘Quem concilia sempre sai ganhando’, o ano de 2012 marcou
o enfoque junto às redes sociais, programada a divulgação de posts diários(457)
sobre o número de acordos realizados no período e outros dados relevantes,
como incentivo aos que ainda não conciliaram. O material tornou-se recorrente
na página do Conselho Nacional de Justiça no Facebook, inclusive mediante a
euconcilioDeigualformaplanejadaamobilizaçãodecelebridadespeloperl
no Twier, com a mesma hashtag.
ASemana Nacional da Conciliação de expôs o slogan ‘Eu concilio.
Você concilia. Nós ganhamos’. A edição contou com o engajamento espontâ-
neo dos próprios tribunais que assumiram o protagonismo na consolidação da
justiçaconsensualAiniciativareetiunosdadosobtidosindicandorecordeno
número de acordos celebrados pelas partes(458).
Desenvolvida a campanha pela conciliação de 2014 segundo o conceito de
que a conciliação é um acordo justo: ‘Conciliar: bom para todos, melhor para
você’. Para auxiliar os tribunais na divulgação da Semana Nacional nas redes
sociais (pelos canais Facebook,Twier,Youtube, Instagram, portal, intranet), o Conse-
lho Nacional de Justiça elaborou um plano de comunicação digital destinado a
sensibilizar o internauta a respeito da importância da utilização dessa ferramenta.
Na esteira, oferecidos conteúdos nas redes sociais sobre os serviços da Semana
BRASIL Conselho Nacional de Justiça Disponívelem hpswwwcnjjusbrwpcon-
tentuploadspesquisamaioreslitigantespdfAcessoemnov
Naocasião deliberado o uso de artes que instruam o fã a manifestarsuavontade de
conciliar, sejam emotivas e comoventes, retratem o lead das matérias do portal e reforcem a
identidade visual da campanha Disponível em hpswwwcnjjusbrprogramaseacoes
conciliacao-e-mediacao/semana-nacional-de-conciliacao/campanhas-conciliacao/campanha-con-
ciliacaoAcessoemnov
mil composiçõeshomologadasa representarumaumento deem relaçãoaoano
anteriorNessa ediçãorealizadasmais demil audiênciasenvolvendomontante superior
aR bilhãoem acordosDisponívelem hpswwwcnjjusbrwpcontentuploads
relatorioconciliacaopdfAcessoemnov
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
197
Nacionalda Conciliação com ointuitodedesmisticar o litígioesanardúvi-
das dos procedimentos, destacada a conciliação como a forma de resolução de
conitosmaissimplesrápidaeeconômica(459).
No ano seguinte, ‘O caminho mais curto para resolver seus problemas’ foi
a marca utilizada em todas as ações do programa, incluída a Semana Nacional.
Para reforçar essa nova face da justiça, selecionadas fotos e imagens que remetem
à sensação de liberdade e de satisfação. O plano de comunicação incluiu divul-
gação publicitária conjunta pelos Tribunais e Conselho Nacional de Justiça, pela
imprensa e mídias sociais, a adicionar força e visibilidade aos atos em auxílio
aos Tribunais na repercussão em seus canais(460).
Mais recentemente, a Semana Nacional de 2016 manteve o conceito: ‘O
caminho mais curto para resolver seus problemas’, realizadas 444 mil audiên-
cias, resultando em 130 mil acordos que totalizaram R$ 1,2 bilhão em valores
homologados pela Justiça(461).
A Semana Nacional de Conciliação de 2017 elegeu o tema ‘Conciliar: nós
concordamos’ e teve como objetivo empoderar as partes na decisão de conciliar
e o consenso atingido de comum acordo. Amplamente noticiada nessa campa-
nha a página no Portal do Conselho Nacional de Justiça com endereço e contato
dosNúcleosouCentrosdeConciliaçãodosTribunaisamdefacilitarabusca
de informações do cidadão sobre como conciliar, quais processos podem inte-
grar a modalidade, prazos e outras informações no tribunal competente(462).
A Semana Nacional de Conciliação de 2018 concatenou uma sequência de
atividades concentradas nos Tribunais, mediante o conceito: ‘Conciliar: a deci-
são é nossa’. A facilitação da busca de informações do cidadão contou com o
alargamento de espaço, alinhada ao desiderato de atender e orientar consoante
texto normativo(463).
BRASILConselhoNacionaldeJustiçaDisponívelemhpswwwcnjjusbrprogramas-
-e-acoes/conciliacao-e-mediacao/semana-nacional-de-conciliacao/campanhas-conciliacao/cam-
panhaAcessoemnov
BRASILConselhoNacionaldeJustiçaDisponívelemhpswwwcnjjusbrprogramas-
-e-acoes/conciliacao-e-mediacao/semana-nacional-de-conciliacao/campanhas-conciliacao/cam-
panhaAcessoemnov
BRASIL ConselhoNacional de JustiçaSemana nacionalda conciliação terminacom mil
acordosDisponívelemhpswwwcnjjusbrprogramaseacoesconciliacaoemediacaosema-
nanacionaldeconciliacaoresultadossemanaconciliacaoAcessoemnov
Na edição pessoas foram atendidas mobilizando magistrados juízes
leigos, 6.510 conciliadores e 6.972 colaboradores, o que ensejou a homologação de 127 mil acordos,
num total de R$ 1,6 bilhão. BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. SemanaNacionaldaConciliação
. Disponível em: <hpswwwcnjjusbrprogramaseacoesconciliacaoemediacaosema-
nanacionaldeconciliacaocampanhasconciliacaocampanha. Acesso em: 06 nov. 2020.
BRASILConselhoNacionaldeJustiçaSemanaNacionaldaConciliação. Disponível em:
hpswwwcnjjusbrprogramaseacoesconciliacaoemediacaosemananacionaldeconci-
liacaocampanhasconciliacaocampanhaAcessoemnov
Morgana de Almeida Richa
198
Por último, separação amigável, reconstrução de laços, direito ao nome
socialeàpacicaçãocomunitáriaalémdagarantiadedireitostrabalhistas e
darecuperaçãodecréditosimpactadospelosexpurgosinacionáriosforamos
temas alcançados pela Justiça brasileira durante os cinco dias da Semana Nacio-
nal da Conciliação 2019(464).
A XV Semana da Conciliação prossegue a campanha no período de 30 de
novembroadedezembrodecomosloganConciliaçãomenosconito
mais resultado”, sinalizando o estímulo de que o processo pode desenvolver-
-se com menos desgastes e custos para as partes envolvidas, sedimentados os
Núcleos e Centros de Conciliação dos Tribunais como ambientes de execução e
informações do programa(465).
Não é difícil antever que o cenário vivenciado em tempos mais recentes
direciona a conciliação e a mediação para os espaços virtuais, possivelmente a
mais nova ampliação do acesso à justiça. Em tempos de crise mundial na saúde,
pela propagação de um vírus que transforma os comportamentos humanos,
certamentea política judiciária nacional de tratamentoadequadodeconitos
percorreráoscaminhostelemáticosquedeigualmodomodicamsubstancial-
mente as interações na forma como conhecemos.
Curioso notar que o Movimento pela Conciliação emergiu como um
instrumento de mobilização social e de orientação aos operadores jurídicos
para fomentar a cultura de realização de acordos nos processos judiciais. A
iniciativa resultou na consolidação de uma política pública judiciária focada
em ações contínuas de incentivo à conciliação e mediação, reduzindo lides
mediante soluções alternativas de controvérsias e contribuição para uma
justiça mais efetiva, transparente e célere.
De todo o exposto, pode-se sintetizar os objetivos da política pública
judiciária em curso conforme segue: a) colaborar na organização dos serviços
deconciliaçãomediaçãoeoutrosmétodosconsensuaisdesoluçãodeconi-
tosparapromoveracriaçãodeJuízosderesoluçãoalternativadeconitos
órgãos judiciais especializados na matéria; b) capacitar magistrados, servi-
dores, mediadores, conciliadores e demais facilitadores da solução consen-
sual de controvérsias; c) desenvolver relações de cooperação entre os órgãos
públicos, instituições públicas e privadas da área de ensino, para promover
a cultura da solução pacíca dos conitos promover e apoiar ações para
Atendidas mais de mil pessoas e homologados acordos que superaram Rbilhão
BRASIL. CNJ. Semana Nacional da Conciliação 2019. Disponível em: <hpswwwcnjjusbrpro-
gramaseacoesconciliacaoemediacaosemananacionaldeconciliacao. Acesso em: 07 abr. 2020.
BRASILCONSELHONACIONALDEJUSTIÇADisponívelemhpswwwcnjjusbr
programas-e-acoes/conciliacao-e-mediacao/semana-nacional-de-conciliacao/campanhas-conci-
liacao. Acesso em: 06 nov. 2020.
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
199
implementar práticas autocompositivas junto a empresas públicas e privadas
e agências reguladoras; d) promover eventos para divulgar boas práticas na
utilização de técnicas e habilidades autocompositivas; e) premiar e disseminar
boas práticas autocompositivas; e, f) reduzir a taxa de congestionamento do
Poder Judiciário.
Segundo Kazuo Watanabe, mentor intelectual da base normativa:
A instituição de semelhante política pública pelo CNJ, além de criar um
importante ltrodalitigiosidade, estimulará em nível nacional o nas-
cimento de uma novacultura não somenteentreosprossionais do
direito, como também entre os próprios jurisdicionados, de solução
negociadaeamigável dos conitos Essa cultura teráinúmerosreexos
imediatos em termos de maior coesão social e determinará, com toda a
certezamudançasimportantesnaorganizaçãodasociedadeinuindo
decisivamente na mudança do conteúdo e orientação do ensino uni-
versitárionaáreadoDireitoquepassaráaformarprossionaiscom
visão mais ampla e social, com plena consciência de que lhes cabe
atuarmuitomaisnaorientaçãopacicaçãoprevençãoecomposição
amigáveldoquenasoluçãocontenciosadosconitosdeinteresse(466).
Empatamar de destaquesobressaiposterior conformação identicadora
da conciliação como política pública judiciária, expressamente reconhecido tal
status na Resolução n. 174, de 30.10.2016, do Conselho Superior da Justiça do
Trabalho, que assentou funcionamento inequívoco do modelo de ação estatal na
seara do Poder Judiciário.
Sobre o normativo especíco no âmbito trabalhista importa frisar o
processo de construção da norma, inserida no rol das “políticas públicas judiciá-
rias mais democráticas que já se produziu”(467), sob o protagonismo dos gestores
depolíticasjudiciáriasdesoluçãoautocompositivadeconitosdaJustiçado
Trabalho – coordenadores dos núcleos de conciliação.
A criação do Fórum Nacional de Coordenadores de Núcleos de Concilia-
çãodaJustiçadoTrabalhononaldeculminounaadoçãodeiniciativas
que avançassem o tema, incialmente abrangido pela norma editada pelo CNJ,
agora à luz do segmento especializado da justiça, promovidos debates em nível
WATANABEKazuoPolítica públicado PoderJudiciárionacional paratratamento ade-
quadodos conitos de interessesIn Coords PELUSOAntônio Cezar RICHA Morganade
Almeida. Conciliação e mediação: estruturação da Política Judiciária Nacional. Rio de Janeiro:
Forense, 2011. p. 6.
PINHEIRORogérioNeivaResoluçãondoCSJTéexemplodeconstruçãodemocrática
no Judiciário. Consultor Jurídico, publicado em 11.10.2016. Disponível em: <hpswwwconjur
combroutrogeriopinheiroresolucaocsjtexemplodemocraticoimprimir.
Acesso em: 27 out. 2020.
Morgana de Almeida Richa
200
nacional e compilação das sugestões dos Presidentes dos Tribunais Regionais
do Trabalho.
A necessidade de regramento próprio restou mais evidente a partir da
exclusão da Justiça do Trabalho da Resolução n. 125/CNJ, por meio da Emenda
n. 2, publicada em 08.03.2016(468), de modo que nada mais coerente do que
a elaboração de regramento próprio pelo órgão administrativo de cúpula do
Judiciário Trabalhista, a partir dos avanços alcançados pelos Núcleos e/ou
Centros de Conciliação no desenvolvimento da cultura conciliatória dentre os
membros dos Tribunais.
Acompletaestruturaçãodosmétodosalternativosdesoluçãodeconitos
foi o passo seguinte e aos debates restaram agregadas sugestões da Magistra-
tura, sistematizadas no 18º Congresso Nacional dos Magistrados do Trabalho
(CONAMAT), e da Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas (ABRAT).
Tem-se como desdobramento que a Justiça do Trabalho passou a contar
com regramento próprio, comungando da nova roupagem do Poder Judiciá-
rio, por meio do sistema conhecido como “múltiplas-portas” ou “multiportas”,
composto por mecanismos de solução consensual, como a mediação e a concilia-
çãomediantetécnicasabalizadasparaauxiliarnoencaminhamentodosconi-
tos de maneira a observar a natureza das demandas, ao tempo em que privilegia
a construção de aptidões sociais para os litigantes.
Quanto ao conteúdo do texto aprovado e assinado em 30.09.2016, durante a
abertura da II Conferência Nacional de Mediação e Conciliação, promovida pelo
CNJ, em parceria com o TST e CSJT, cumpre alguns apontamentos de destaque.
A Resolução, nas primeiras linhas, diferencia os conceitos de conciliação e
mediaçãoesclarecendoquenoprimeiromodeloaspartesconamafunçãode
aproximação e formulação de propostas a uma terceira pessoa (magistrado ou
servidor) e, no segundo, não há criação ou proposta de opções para composição
dalidegurandoomagistradoouservidorsupervisionadonafunçãodeesti-
mular o diálogo e orientar na construção de um acordo.
Além disso, tornada obrigatória a instituição, no âmbito de cada Tribunal
Regional, de Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Solução de Dispu-
tas (NUPEMEC-JT), assim como de Centros Judiciários de Métodos Consensuais
deSoluçãodeDisputasCEJUSCJTcriandoambientedepacicaçãoemenor
desgaste ante a utilização de técnicas próprias para atendimento às partes.
Outro ponto enfatizado consiste na limitação dos conciliadores e mediado-
res dentre aqueles pertencentes aos quadros da Justiça do Trabalho, de modo
que restrita a atuação aos servidores ativos, bem como servidores e magistrados
ArtBOCNJeditaráresolução especícadispondosobreaPolíticaJudiciária detrata-
mentoadequadodosconitosdeinteressesdaJustiçadoTrabalho
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
201
togadosinativoscapacitadoseformadosemcursosespecícosdeconciliaçãoe
mediação, submetidos, outrossim, ao Código de Ética de Conciliação e Media-
ção para a Justiça do Trabalho (anexo II da norma).
Aindano tocanteàgura doconciliador mediadorexigesea presença
física de um magistrado disponível às partes nas sessões, que deverão obser-
varonúmeromáximodeseispormagistradosupervisorNatônicadosatores
envolvidos, imprescindível a participação do advogado da parte reclamante nas
audiências realizadas no CEJUSC-JT.
De tudo quanto posto na temática, notabilizada a prioridade do enfoque
jurisdicional no desenvolvimento da política pública judiciária, até mesmo
porque as estruturas em funcionamento demandam uniformidade de trata-
mento da matéria dentro dos estados da federação, um dos aspectos funda-
mentais para a visibilidade tanto da política pública abordada, como do
tratamento adequado dos conitos de interesse com vistas a solucionar e
reduzir demandas judiciais.
Assim é que por meio de um conjunto de ações do Poder Judiciário alme-
ja-se alavancar os objetivos coletivos de aprimoramento da sociedade a partir
deumltrodalitigiosidadequedeigualformacontribuiráparaformaçãode
nova cultura de solução de controvérsias como alternativa à solução adjudi-
cadacomreexosimediatosemtermosdeconsolidaçãodacidadaniaemaior
coesão social.
Enmaconstruçãodapolíticajudiciárianacionaltraduzavontadetrans-
formadora do Poder Judiciário, conhecedor de suas capacidades, aptidões e
limitesArquitetou um regramento capaz de denir com clareza a todos os
aplicadores, não apenas os objetivos, mas especialmente a forma de implemen-
tá-los. Não é novidade a conciliação no âmbito da Justiça, tampouco muitas
das premissas tratadas, porém constitui elemento revolucionário a magnitude
do programa em nível nacional, coordenado, estruturado e, acima de tudo,
orientado por um formato verticalizado tão abrangente.
4.3. Sistema carcerário, execução penal e medidas socioeducativas
De acordo com dados do Levantamento Nacional de Informações Peni-
tenciárias(469) (INFOPEN), o Brasil possui 773.151 pessoas privadas de liber-
dade em unidades do sistema penitenciário e em carceragens de delegacias(470),
CriadoemoINFOPENcompilainformaçõesestatísticasdosistemapenitenciáriobra-
sileiro, por meio de um formulário de coleta estruturado, preenchido pelos gestores de todos os
estabelecimentos prisionais do país. Ao longo de sua existência, o processo de coleta e análise dos
dados do INFOPEN consiste numa ferramenta estratégica para a gestão prisional.
ConformediagnósticoocialsobreosistemaprisionalatualizadoemDisponívelem
hpswwwgovbrptbrnoticiasjusticaesegurancadadossobrepopulacaocarcera-
riadobrasilsaoatualizadosAcessoemnov
Morgana de Almeida Richa
202
gurandocomooterceironoranking dos países com maior população prisional
do mundo(471).
Em termos relativos, a taxa de aprisionamento registrou a marca de 338
pessoas presas para cada 100 mil habitantes(472). Os dados indicam, outrossim,
umdécitde(473) vagas e uma taxa de ocupação de 165%(474).
O problema envolvendo o sistema carcerário brasileiro revelou-se verda-
deira violação de direitos humanos, visibilizada pela atuação do Conselho
Nacional de Justiça, que levantou a falência do modelo diante de falhas de diver-
sas ordens, grandemente atreladas à superpopulação carcerária, redundando na
ausência de condições adequadas de saúde, educação, alimentação, trabalho e
assistência jurídica.
Consta nos relatórios do Conselho Nacional de Justiça o retrato das
condições de vida insalubre, falta de acesso a direitos básicos, indispensáveis
à dignidade minimamente concebida em qualquer ordem jurídica, ilustrada
a barbárie estarrecedora em dois casos paradigmáticos: no Estado do Tocan-
tins, foram encontrados presos amarrados em árvores por falta de espaço nas
celas da prisão(475); no Estado do Espírito Santo, constatou-se violência carce-
rária diante de presos em contêineres de ferro submetidos a temperaturas
desumanas, esquartejamento e tortura, objeto de denúncia na Organização
das Nações Unidas(476).
Na avaliação do Ministro Ricardo Lewandowski, ao prefaciar obra
elaborada pelo Grupo de Trabalho no âmbito do Departamento Penitenciário
Nacional(477), importa considerar:
BRASIL EBC Agência Brasil Disponível em hpagenciabrasilebccombrgeral
noticiapopulacaocarcerariadobrasilsobedeparapessoas. Acesso
em: 05 nov. 2020.
Dadosdisponíveisemhpsgglobocommonitordaviolencianoticiabra-
sil-tem-338-encarcerados-a-cada-100-mil-habitantes-taxa-coloca-pais-na-26a-posicao-do-mundo.
ghtml. Acesso em: 06 nov. 2020.
Dadosdisponíveisemhpsgglobocompoliticanoticiadectnosistema-
-prisional-brasileiro-cresce-apesar-de-criacao-de-vagas-diz-infopen.ghtml:. Acesso em: 06 nov.
2020.
Ataxa deocupação éo resultadoobtido pelarazão entreo númerototal depessoas pri-
vadas de liberdade e a quantidade de vagas existentes no sistema prisional. Para o cálculo, são
computadas as pessoas privadas de liberdade em carceragens de delegacias, desconsideradas as
vagas existentes em espaços de custódia.
Disponível em hpsespacovitaljusbrasilcombrnoticiasemtocantinspre-
soscamamarradosemarvoreAcessoemnov
Disponívelemhpsnoticiasuolcombrcotidianoultimasnoticiasviolacao-
-de-direitos-humanos-em-presidios-do-es-sera-discutida-na-onu.htmAcessoemnov
InstituídopelaPortariandedenovembrode
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
203
Dentre os desacertos diagnosticados, que demandam urgente cor-
reção, encontram-se a forma seletiva de atuação da justiça criminal, o
crescimento exponencial da população carcerária, os custos elevados
de manutenção do sistema prisional, a estigmatização social dos
detentos e o elevado índice de reincidência dos egressos, resultante da
total incapacidade de sua ressocialização com base no atual modelo
de execução penal.
Além dos males apontados, constatou-se que é preciso vencer a própria
inércia dos intérpretes desse sistema esgotado, inação essa que leva ao
contínuo agravamento das mazelas existentes. E o pior é que – como
reação ao crescimento da criminalidade – a “cultura do encarceramento”
aprofunda-se cada vez mais, estimulando uma crescente demanda de
certos setores sociais para o endurecimento das penas.
Essas reações, destituídas de qualquer fundamento racional, não logram
apresentarcomocouevidenciadoqualquerresultadopositivoparaoincre-
mento da segurança pública. Pelo contrário, tão somente demonstram que a
violência estatal acaba gerando mais violência social(478).
Vale referenciar, no campo da proteção jurídica, o destaque por conta do
dever de assunção das responsabilidades dos entes públicos, diante da reper-
cussão, inclusive na seara internacional, dos dados aferidos e desvelados da
condiçãodeindiferentesatoresconsumadaanecessidade depôr emprática
medidas saneadoras.
Diante das múltiplas situações levantadas no modelo prisional brasileiro,
constatadaadeciêncianosistemaenaefetividadedajustiçacriminaloConse-
lho Nacional de Justiça, consideradas as atribuições regulamentares constitucio-
nais (artigo 103-B, § 4º da Constituição Federal de 1988), desenvolveu programas
destinados ao sistema carcerário, à execução penal e às medidas socioeducativas
visando equacionar, no espaço que compete ao Poder Judiciário, uma das ques-
tões mais complexas da realidade social do país.
A atuação por meio desses programas especícos permite minimizar a
insustentável situação do sistema carcerário, retratadas ao longo dos anos as
péssimas condições de higiene e de saúde, superlotação, atentado à higidez
física e mental dos presos nas mais diversas irregularidades praticadas sob as
vistas do Estado em sua totalidade(479). Guardada a responsabilidade de cada
LEWANDOWSKIRicardo Postulados princípios e diretrizes para a política de alternativas
penais. Brasília: Ministério da Justiça, Departamento Penitenciário Nacional, Programa das Nações
Unidas para o Desenvolvimento, Conselho Nacional de Justiça, 2016. p. 7.
Naspalavras deMariaTerezaSadek notocanteàs deciênciasdosistemacarcerárioO
retrato é sempre terrível, variando apenas a ênfase em um de seus traços postos em evidência.
Compõem a cena, celas superlotadas, sem condições de higiene, insalubres; pavilhões sem divi-
sões internas e sem triagem por tipo de delito. Recentemente duas jovens turistas inglesas tiveram
Morgana de Almeida Richa
204
protagonista estatal, na questão judiciária, os relatórios das unidades da federa-
ção exigem a adoção de medidas corretivas nas mazelas mais prementes.
A resposta à questão passa pelo enfoque das políticas públicas judiciárias
examinadas, na certeza de que a magnitude do problema vivenciado exige
ações, termos e acordos de cooperação entre os três Poderes da República,
instituições correlatas e entidades privadas, cada qual assumindo seus encar-
gos e adotando as medidas cabíveis para, de forma articulada, fazer frente ao
retrato caótico do sistema penitenciário nacional.
Para desconstruir o ambiente apresentado emergem atores centrais na
somatória de esforços entre o Conselho Nacional de Justiça, o Conselho Nacio-
nal do Ministério Público e o Ministério da Justiça, parceiros no desenvolvi-
mento de políticas públicas judiciárias que consubstanciam importante suporte
na evolução de diretrizes norteadoras do sistema penal, abarcando um sólido
conjunto de indicadores em auxílio ao fomento da mudança cultural do encar-
ceramento(480), extremamente necessária para essa área de atribuição do Estado.
Observado o protagonismo central do Conselho Nacional de Justiça para
enfrentar a questão na perspectiva do Poder Judiciário, foi criado o Departa-
mento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de
Execução de Medidas Socioeducativas – DMF (Lei n.12.106/2009), como órgão
doConselhoNacionaldeJustiçaencarregadodescalizarecontrolarocumpri-
mento de penas no sistema carcerário, tomar soluções em face das irregularida-
des e implantar medidas socioeducativas, dentre outras(481).
a oportunidade, no Rio de Janeiro, de provar, e proclamar ao mundo, a calamidade do sistema
prisional brasileiro, dividindo uma cela abarrotada, sem colchão, sem banho, com privada sem
descarga. Depois de uma semana conseguiram sair. Deixaram para trás outras brasileiras que
provavelmentecarão noabandono e pormuito mais tempoquaisquer que tenhamsido seus
delitosPrisõescom taisdeciênciasnem seriaprecisodizer nãoressocializammassãoverda-
deiras escolas de crimes, fábricas de delinquentes, reino da lei do mais forte, tornando draconiano
qualquer castigo”. (SADEK, Maria Tereza. A favor do homem comum. Caráterperversodosistema
carcerárionãoénovidade. Disponível em: <hpswwwconjurcombragocaraterperver-
sosistemacarcerariobrasileironaonenhumanovidade. Acesso em: 05 nov. 2020).
Segundodadosdo INFOPEN das pessoas privadas de liberdade no Brasil em
dezembro de 2019, são presos provisórios; 48,47% foram sentenciadas em regime fechado;
17,87%, em regime semiaberto e 3,36%, em regime aberto (Conforme Levantamento Nacional
de Informações Penitenciárias. Disponível em: <hpsapp powerbicomviewreyJrIjoi-
ZWIMmJmMzYtODAMCYmZiLWIMItNDUZmIyZjFjZGQIiwidCIImViMDkwN-
DIwLTQNGMtNDNmNyMWYyLTRiOGRhNmJmZThlMSJ. Acesso em 06 nov. 2020).
Nostermos daLein Artigo Fica criado, no âmbito do Conselho Nacional
de Justiça, o Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema
de Execução de Medidas Socioeducativas – DMF. § 1º Constituem objetivos do DMF, dentre
outros correlatos que poderão ser estabelecidos administrativamente: I – monitorar e fiscalizar
o cumprimento das recomendações e resoluções do Conselho Nacional de Justiça em relação à
prisão provisória e definitiva, medida de segurança e de internação de adolescentes; II – planejar,
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
205
Desdeasuaconcepçãooórgãotemcomoincumbênciaespecícaassegu-
raroescopofundamentaldoConselhonamodicaçãodarealidadeenfrentada
no sistema prisional e de justiça; além disso, ocupa papel de destaque como
fazedorocialdapolíticapúblicaoraexaminada
Em 2011, o Conselho instituiu o Grupo de Trabalho de Juízes de Varas
PenaiseMedidasAlternativasPortarianamdedarsuportenade-
nição de diretrizes e de atuação, procedimentos e objetivos voltados ao desen-
volvimento da Política Criminal das Penas e Medidas Alternativas com foco no
desencarceramento, na intervenção penal mínima e no aspecto restaurativo.
O limite territorial que o cárcere estabelece torna insustentável ao Estado
manter em prisão todo aquele universo de pessoas por ele criminalizadas,
o que demanda os diversos programas do Conselho Nacional de Justiça/
Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do
Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas cujo objetivo é aperfeiçoar
a prestação jurisdicional e modernizar as varas criminais e de execução penal,
além de adotar ações educativas, de capacitação social e de reinserção no
mercado de trabalho dos presos e egressos do sistema carcerário, que deve
ser visto não de maneira isolada, mas integrado ao mundo social.
Nessa seara, o Conselho Nacional de Justiça atua com o objetivo de promo-
verumaculturadepacicaçãono campo penal de acordo com a concepção
democrática no sentido de que a prisão constitui uma medida excepcional, a
última ratio do Estado-juiz para restabelecer a ordem social abalada por um
comportamento penal relevante. De outro modo,
perpetuar-se-á a lamentável situação retratada, em que pessoas que
cumprem condenações perdem, não apenas a liberdade, mas, sobre-
tudo, as perspectivas de retomada de vida condigna e socialmente
útil, quando a Constituição da República convida todos a construir
organizar e coordenar, no âmbito de cada tribunal, mutirões para reavaliação da prisão provisória
e definitiva, da medida de segurança e da internação de adolescentes e para o aperfeiçoamento de
rotinas cartorárias; III – acompanhar e propor soluções em face de irregularidades verificadas no
sistema carcerário e no sistema de execução de medidas socioeducativas; IV – fomentar a imple-
mentaçãodemedidas protetivasedeprojetosde capacitaçãoprossionalereinserçãosocial do
interno e do egresso do sistema carcerário; V – propor ao Conselho Nacional de Justiça, em relação
ao sistema carcerário e ao sistema de execução de medidas socioeducativas, a uniformização de
procedimentos, bem como de estudos para aperfeiçoamento da legislação sobre a matéria; VI
– acompanhar e monitorar projetos relativos à abertura de novas vagas e ao cumprimento da
legislação pertinente em relação ao sistema carcerário e ao sistema de execução de medidas socioe-
ducativasVIIacompanharaimplantaçãoeofuncionamentodesistemadegestãoeletrônicada
execuçãopenaledemecanismodeacompanhamentoeletrônicodas prisões provisóriasVIII
coordenar a instalação de unidades de assistência jurídica voluntária no âmbito do sistema carce-
rário e do sistema de execução de medidas socioeducativas.
Morgana de Almeida Richa
206
uma sociedade justa e solidária, enraizada no respeito à dignidade da
pessoa humana(482).
Pelo panorama apresentado, a atuação do Conselho Nacional de Justiça no
âmbito da política pública judiciária converge para reestruturar a justiça crimi-
nal, tema prioritário na tomada de soluções que possam reverter o atual quadro
do sistema penitenciário brasileiro.
As medidas e os programas a seguir estudados traduzem o encaminha-
mento e a reorganização dos atos judiciários que conferem a ampliação do
acesso à justiça e o aprimoramento da prestação jurisdicional.
O mais notório programa levado a efeito pelo Conselho Nacional de Justiça
consiste nos ‘Mutirões Carcerários’, responsáveis por levar às manchetes nacio-
nais e internacionais as perversas cenas da realidade prisional no país e por
reacender o debate quanto à necessidade premente de reforma das prisões e do
sistema de justiça criminal.
A iniciativa destinada a efetivar o controle social do sistema carcerário foi
posta em prática em agosto de 2008, e posteriormente inserida no texto legal (Lei
n. 12.106/2009), ao prever, dentre os objetivos do Departamento de Monitora-
mento e Fiscalização, o planejamento, a organização e a coordenação, no âmbito
decada tribunalde mutirõesparareavaliaraprisão provisóriae denitivaa
medida de segurança e a internação de adolescentes (artigo 1º, I).
Os excessos diagnosticados pautaram as duas principais vertentes de
atuação dos Mutirões Carcerários, com a participação de juízes, membros
do Ministério Público, da Defensoria Pública, da Ordem dos Advogados, da
Administração Penitenciária e Segurança Pública, além dos servidores e enti-
dades educacionais.
Aprimeiravoltadaàrevisãojurídicadasprisõesprovisóriasedenitivas
ante o grande número de pessoas privadas de liberdade sem condenação ou de
presos condenados com a integralidade da pena já executada(483), a representar
PELUSOCézarConselhoNacionalde JustiçaMutirãocarcerário – raio x do sistema peni-
tenciáriobrasileiroDisponívelem hpwwwrcdhesgovbrsitesdefaultles
CNJ%20Mutirao%20Carcerario%20-%20raio-x%20do%20sistema%20penitenciario%20brasileiro.
pdfAcessoemnov
A deciência do Judiciário ao retardar a prestação jurisdicional pode ser vericada no
Estado do Maranhão, onde um detento condenado a 17 anos de prisão permaneceu no cárcere um
ano e três meses a mais do que deveria. (MENDES, Gilmar Ferreira. Conselho Nacional de Justiça
e parcerias institucionais – temas prioritários. In: MENDES, Gilmar Ferreira; SILVEIRA, Fabiano
Augusto Martins; MARRAFON, Marco Aurélio. Conselho Nacionalde Justiça: fundamentos, pro-
cesso e gestão. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 27).
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
207
um verdadeiro mecanismo de acesso à justiça para parcela discriminada no
sistema(484).
A segunda com enfoque na inspeção dos estabelecimentos prisionais de
cada Estado, originando os relatórios que comprovaram a inobservância do
princípio da dignidade humana para grande parte dos presos e a consequente
falência do sistema como um todo(485).
Ao relatar o projeto desenvolvido durante a gestão como presidente do
Conselho Nacional de Justiça, o idealizador do programa, Ministro Gilmar
Mendesreetiu
Trata-se de experiência exitosa por permitir que se avalie, com pre-
cisão, o atual estado do sistema carcerário brasileiro, incentivando-se
a atuação conjunta de tribunais e demais órgãos públicos.
[...]
Os mutirões nos dão uma aula de Brasil, cujas revelações ensinam que
apenas por meio de esforço conjunto, sério e planejado pode-se virar
essa página tão triste e calamitosa, tanto do ponto de vista dos direitos
humanos como da segurança pública. Daí a elaboração de ampla Estra-
tégia Nacional de Justiça e Segurança Pública, alicerçada em estreita
colaboração entre os órgãos do Judiciário, do Executivo e do Minis-
tério Público, direcionada à superação dos problemas que, além de
empalidecerem a efetividade da lei, inibem o fortalecimento das insti-
tuições democráticas no país(486).
As constatações advindas dessa importante ação na política pública judiciá-
ria ensejaram a Resolução Conjunta n. 1/2009 do Conselho Nacional de Justiça
e do Conselho Nacional do Ministério Público, impondo às unidades do Poder
Judiciário e do Ministério Público a implantação de mecanismos que permitam,
com periodicidade mínima anual, rever a legalidade da manutenção das prisões
provisóriasedenitivasdasmedidasdesegurançaedasinternaçõesdeadoles-
centesemconitoscomalei
Muitas vezespor falta decondições nanceiras paracontratar advogado oupor não ter
acesso aos serviços da Defensoria Pública.
Osrelatóriosdosmutirõescarceráriosapresentamnítidosexemplosdosabusoscometidos
nas prisões brasileiras e a indignidade das pessoas privadas de liberdade submetidas ao sistema.
Os documentos confeccionados pelo Conselho Nacional de Justiça de 2010 a 2014, atinentes a
todosos Estados dafederação estãodisponíveisem hpswwwcnjjusbrsistemacarcerario
mutirao-carcerario/relatorios-dos-mutiroes-carcerario/. Acesso em: 06 nov. 2020.
MENDESGilmarFerreiraConselhoNacionaldeJustiçaeparceriasinstitucionaistemas
prioritários. In: MENDES, Gilmar Ferreira; SILVEIRA, Fabiano Augusto Martins; MARRAFON,
Marco Aurélio. Conselho NacionaldeJustiça: fundamentos, processo e gestão. São Paulo: Saraiva,
2016. p. 25-26; 28.
Morgana de Almeida Richa
208
Oregramentobuscoureverteraineciênciadosistemadeexecuçãopenal
com a formação de grupos de trabalho de cada estado membro, encarregados
darevisãodaspenasprovisóriasedenitivasdasmedidasdesegurançaedas
condições de cumprimento, além de serem responsáveis pelo exame das possi-
bilidades de reinserção do interno à sociedade.
Na esteira da efetividade de direitos como a dignidade da pessoa humana,
garantia do devido processo legal, presunção de inocência e razoável duração
do processo, o Conselho concentrou esforços na elaboração de diretrizes espe-
cícasrelacionadas ao planejamento estratégico e àcoordenaçãodapolítica
pública judiciária, modernização tecnológica, ampliação do acesso à justiça,
pacicaçãoeresponsabilidadesocialegarantiadoefetivocumprimentodaLei
de Execução Penal(487).
Para tanto, o arcabouço normativo emitido pelo Conselho Nacional de
Justiça contempla instruções aos Tribunais, visando maior efetividade e organi-
zação da prestação jurisdicional, essencial à modernização do Judiciário e, por
consequência, à celeridade processual e concretização do direito fundamental
do acesso efetivo à justiça.
Vários são os exemplos nesse sentido: a) a Recomendação n. 20/2008 sugere
aos Tribunais o maior intercâmbio de experiências no âmbito da execução penal,
aadoção de processo eletrônicoa estruturação earegionalizaçãodas varasde
execuçõespenaisbaResoluçãoncomanalidadedeimprimirmaior
controle das decisões que decretam prisão provisória, determina o envio de rela-
tórios sobre o tema às Corregedorias Gerais de Justiça; c) a Resolução n. 77/2009
tem por objetivo a inspeção nos estabelecimentos e entidades de atendimento ao
adolescenteemconitocomaleidemodoaauxiliarosmagistradosnocontrolee
aplicação das medidas socioeducativas; d) a Resolução n. 108/2010 dispõe sobre a
padronização do cumprimento de alvarás de soltura pelo mesmo juízo competente
para decidir a respeito da liberdade ao preso provisório ou condenado, no prazo de
heaResoluçãoninstituioprocessoeletrônicodeexecuçãounicado
como sistema de processamento de informações e prática de atos processuais rela-
tivos à execução penal; e, f) a Portaria n. 69/2017 que indica a realização anual de
esforço concentrado de julgamento dos crimes dolosos contra a vida (mês nacional
do júri), definindo diretrizes e ações para garantir a razoável duração do processo
e os meios assecuratórios da celeridade de sua tramitação.
Sem embargo do elevado grau da complexidade da matéria, demandando
muito mais que ações isoladas para o desenvolvimento do sistema penitenciário,
MENDESGilmarFerreiraConselhoNacionaldeJustiçaeparceriasinstitucionaistemas
prioritários. In: MENDES, Gilmar Ferreira; SILVEIRA, Fabiano Augusto Martins; MARRAFON,
Marco Aurélio. Conselho NacionaldeJustiça: fundamentos, processo e gestão. São Paulo: Saraiva,
2016. p. 28.
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
209
a iniciativa inaugurou a consolidação de políticas públicas do sistema penal no
âmbitodoPoderJudiciárionacionalcomsignicativoimpactonaefetividadeda
Lei de Execuções Penais ante o alcance das medidas a indivíduos desprovidos
de proteção, posto que no período, “cerca de 400 mil processos de presos foram
analisados e mais de 80 mil benefícios concedidos, como progressão de pena,
liberdade provisória, direito a trabalho externo, entre outros”, totalizando “45
mil presos libertados como resultado do programa, pois já haviam cumprido a
pena decretada pela justiça”(488).
A consolidação da prática possibilitou, para além do diagnóstico preciso do
sistema carcerário e de execução penal, a adoção de medidas e ações concretas
deplanejamentodevagaseregimesparaospresosquedevemcarnosistema
tendo por isso recebido o Prêmio Innovare, na edição VI, de 2009(489).
Relevante assinalar que o programa instituído pelo Conselho Nacio-
naldeJustiça permanece gerando reexos positivos no sistema da justiça
criminal, a exemplo do primeiro mutirão carcerário de 2018, no Estado do
Paraná, que, contando com a participação do Ministério Público e da Defen-
soria Pública, revisou 1.599 processos em três Varas de Execuções Penais e
antecipou 786 benefícios(490).
Em razão da crítica ao modelo penal que tem no encarceramento o seu
método hegemônico a realização de mutirões carcerários surgiu como uma
medida capaz de amenizar a situação e promover o acesso à justiça de conde-
nados e pessoas privadas de liberdade, tanto pela via da razoável duração do
processo, quanto pelo dever de proporcionar dignidade à prestação jurisdicio-
nal, especialmente em virtude do excessivo grau de desigualdade e de exclusão
que caracterizam a sociedade brasileira.
A partir dos mutirões surge uma nova vertente de ação: o projeto ‘Começar
de Novo’(491)prevendoumconjuntodeaçõeseducativasdecapacitaçãopros-
sional e social e de reinserção no mercado de trabalho dos presos, egressos do
sistema carcerário e de cumpridores de medidas e penas alternativas(492).
BRASILConselhoNacionaldeJustiçaMutirãocarcerárioDisponívelemhpswwwcnj
jusbrsistemacarcerariomutiraocarcerarioAcessoemabr
PRÊMIO INNOVARE. Práticapremiada. Disponível em: <hpwwwpremioinnovarecom
br/proposta/mutirao-carcerario/printAcessoemnov
ConselhodaComunidadedeCuritibaPublicadaemmarDisponívelemhps
conselhodacomunidadecwb.com.br/2018/03/06/primeiro-mutirao-carcerario-de-2018-revisa-
processos. Acesso em: 06 nov. 2020.
InstitucionalizadopelaResoluçãonde
Diantedodiagnóstico inicialsobre osistema prisionalo ConselhoNacional deJustiça
buscou com o programa sensibilizar órgãos públicos e da sociedade para a oferta de trabalho e
decursosprossionalizantesparapresoseegressosdosistemacarcerário
Morgana de Almeida Richa
210
O objetivo do programa é promover a cidadania e reduzir a reincidência
de crimes, primando pela dignidade da pessoa e justiça social mediante partici-
pação ativa dos órgãos públicos e da sociedade na construção de caminhos para
transformação capaz de promover o reconhecimento dos direitos e deveres dos
destinatários e a ressocialização a partir do trabalho, afastando o condenado da
inércia e dando oportunidade de recuperar sua autoestima e valorização como
ser humano.
Como desdobramento da implementação do modelo, forma-se uma rede
de solidariedade à inserção, com o papel ativo dos Tribunais, entidades públi-
caseprivadasrmandocontratosemparceriaparaacontrataçãodeexdeten-
tos. Fica claro que essa política pública judiciária visa germinar a qualidade de
vida de todos os cidadãos, dever do Estado, mas também de responsabilidade
comum, devendo, portanto, ser pensada e consolidada junto à sociedade civil.
O portal de oportunidades e o cadastramento de entidades integrantes da
rede e de propostas de cursos, trabalhos, bolsas e estágios materializam a respon-
sividade moderna. Para tanto, o Conselho Nacional de Justiça disponibilizou uma
página de internet que reúne vagas de emprego e cursos de capacitação(493).
O sistema funciona mediante intermediação dos Tribunais de Justiça, a
quem cabe a coordenação nos estados, por intermédio do grupo gestor respon-
sável pelos ajustes entre o candidato e a entidade ofertante da vaga. Além
disso, poderá o egresso contatar o Conselho da Comunidade para mediação e
ajustes necessários.
Nesse último aspecto, importante destacar que a norma editada pelo Conse-
lho Nacional de Justiça almejou efetivar a Lei de Execuções Penais também no
tocante à instalação e ao funcionamento dos Conselhos da Comunidade, prevista
no artigo 80 da Lei n. 7.210/1984.
Parcerias em todo o território consubstanciam a forma de potencializar as
ações do programa mediante oferta de cursos, muitas vezes gratuitos, a empre-
sasquenecessitempatrocinaraqualicaçãoprossionalparapreenchervagas
A capacitação do assistido tem especial importância para o êxito da medida
de reinserção, haja vista a constatação ao longo de sua existência de número
expressivo de vagas que deixam de ser preenchidas por falta de preparo da mão
de obra prisional.
Visando divulgar o projeto e expandir as propostas de trabalho e cursos
decapacitaçãoprossionalparapresoseegressosdosistemapenitenciárioem
2011, o Conselho lançou a ‘Cartilha do Empregador’ com informações claras e
precisas quanto ao programa, elencando os incentivos legais para contratação e
BRASIL Conselho Nacional de Justiça Projeto Começar de Novo. Disponível em hps
www.cnj.jus.br/projetocomecardenovo/index.wsp. Acesso em 06 nov. 2020.
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
211
os deveres da instituição contratante, para auxiliar as empresas e as instituições
que oferecem oportunidade de trabalho(494).
No documento explicativo há referência a leis estaduais e municipais(495)
prevendo a reserva de percentual mínimo de vagas de trabalho em obras e
serviços contratados pelo Poder Público, inclusive empresas públicas e socie-
dades de economia mista, a apenados, egressos e cumpridores de medidas
socioeducativas.
A política pública judiciária de inclusão teve grande repercussão nos anos
que antecederam a Copa das Confederações e a Copa do Mundo FIFA 2014,
quando rmado o Acordo de Cooperação Técnica entre o Comitê Organiza-
dor, o Ministério do Esporte e os Estados e Municípios sedes dos jogos, que
assumiram o compromisso de exigir das empresas vencedoras nas licitações de
obras de infraestrutura e serviços a oferta de vagas de trabalho aos assistidos do
programa ‘Começar de Novo’(496). Para além desse evento mundial, o Conselho
Nacional de Justiça tem mantido parcerias com o propósito de potencializar as
ações do programa.
AindacomoestímuloforamxadospeloConselhopormeiodaPortaria
n. 49/2010, requisitos para outorga de um selo às instituições apoiadoras da:
selo do programa ‘Começar de Novo’. Para receber o documento assinado pelo
presidente do Conselho Nacional de Justiça entregue pelo Tribunal de Justiça
local, as instituições deveriam oferecer cursos de capacitação ou vagas de traba-
lho para os assistidos.
Ao tratar da política pública judiciária de reintegração social no sistema
penitenciário, o Conselho Nacional de Justiça, em parceria com outros membros
do Poder Público e da sociedade civil, promove caminhos a fornecer amparo
a essa parcela da população, entendido o trabalho como fator de dignidade na
recuperação. Desse modo, a política pública judiciária tem contribuído para
Disponívelemhpwwwcnjjusbrimagesprogramascomecardenovocampanha
cartilha_do_empregador.pdfAcessoemabr
No Estado do Maranhão a Lei n instituiu a Política Estadual de inserção
de egressos do sistema prisional no mercado de trabalho; em Minas Gerais, foi criado o Projeto
Regresso (Decreto n. 45.119/2009), destinado a fomentar a inserção dos egressos do sistema prisional
no mercado de trabalho, além da edição da Lei n. 18.401/2009, que passou a autorizar o Poder Exe-
cutivoa conceder subvenção econômica às pessoas jurídicas quecontratemegressos do sistema
prisional daquele Estado; e, no Estado de São Paulo, foram instituídos o Programa Pró-Egresso (Pro-
grama de Inserção de Egressos do Sistema Penitenciário no Mercado de Trabalho), pelo Decreto
n. 55.126/2009, e o Programa de Inserção de Jovens Egressos e Jovens em Cumprimento de Medida
Socioeducativa no Mercado de Trabalho, pelo Decreto n. 55.125/2009”. (MENDES, Gilmar Ferreira.
Conselho Nacional de Justiça e parcerias institucionais – temas prioritários. In: MENDES, Gilmar
Ferreira; SILVEIRA, Fabiano Augusto Martins; MARRAFON, Marco Aurélio. Conselho Nacional de
Justiça: fundamentos, processo e gestão. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 32-33).
Empregousepresoseexdetentosdosistemacarcerárionoperíodo
Morgana de Almeida Richa
212
evitar o cenário caótico do sistema, no qual se retroalimentam os ciclos de
criminalidade e taxas de reincidência.
Para arrematar, inócuas as iniciativas no sentido de assegurar os direitos
fundamentais dos acusados e dos detentos do sistema penitenciário brasileiro,
sem a contrapartida de ações para a reinserção social dos egressos.
Novo programa de ação implementado pelo Conselho Nacional
de Justiça consiste em assegurar a apresentação de toda pessoa presa em
agranteàautoridadejudicialcompetenteem horasSãoasAudiênciasde
custódiaalavancadasemfevereirode mediante uma parceria rmada
entre o Ministério da Justiça e o Tribunal de Justiça de São Paulo(497).
Além dos acordos rmados em conjunto pelo Conselho Nacional de
Justiça, Ministério da Justiça e Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD)
preverem a difusão do projeto ‘Audiência de Custódia’, foi estabelecido, outros-
sim, o uso de medidas alternativas à prisão e àmonitoraçãoeletrônicabuscando
enfrentar a cultura do encarceramento instalada no Brasil e, como consequência,
reduzir a superlotação dos presídios e o ciclo de violência instalado no sistema
penitenciário como um todo.
Esta política pública judiciária presta homenagem ao princípio consti-
tucional da dignidade humana, sobretudo ao estimular a cultura do diálogo
mediante apresentação e entrevista do acusado ao juiz, numa audiência em
que são ouvidas as manifestações do Ministério Público, da Defensoria Pública
ou do advogado constituído, e é considerada “a primeira linha de defesa dos
direitos do cidadão alvo de uma persecução criminal”(498).
Nesse contexto, o magistrado deverá analisar a prisão sob o aspecto da
legalidade, da necessidade e da adequação da continuidade do encarceramento
ou da eventual concessão de liberdade, com ou sem a imposição de outras medi-
das cautelares, e poderá avaliar também eventuais ocorrências de tortura ou de
maus-tratos, entre outras irregularidades.
Num traçado do inovador programa composto por três acordos, o
primeirodispôssobreoapoiotécnicoenanceiroaosestadosparaaimplanta-
çãodeCentraisdeMonitoraçãoEletrônicaCentraisIntegradasdeAlternativas
Penais e câmaras de mediação penal, mediante recursos a serem repassados
Ainiciativa tevegrandereceptividadedosTribunaiseguroudentreuma dasmetas do
Conselho Nacional de Justiça efetivamente cumpridas já em outubro de 2015, com a instituição da
medida. (Disponível em: hpwwwcnjjusbrsistemacarcerarioeexecucaopenalaudiencia-
-de-custodia/mapa-da-implantacao-da-audiencia-de-custodia-no-brasil. Acesso em: 11 abr. 2018).
LEWANDOWSKIRicardo Postulados princípios e diretrizes para a política de alternativas
penais. Brasília: Ministério da Justiça, Departamento Penitenciário Nacional, Programa das Nações
Unidas para o Desenvolvimento, Conselho Nacional de Justiça, 2016. p. 8.
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
213
pelo Ministério da Justiça aos Estados, responsáveis pela execução do projeto e
pelaaquisiçãodetornozeleiraseletrônicas(499).
O segundo acordo procurou ampliar a cominação de medidas alternativas
à prisão(500), como a aplicação de penas restritivas de direitos, o uso de medidas
protetivas de urgência, o uso de medidas cautelares diversas da prisão, a conci-
liação e a mediação, na busca da efetividade do sistema de alternativas penais
no país.
Com relação à política de substitutivos ao cárcere, é faculdade dos magis-
trados tanto para os casos de prisões provisórias, como para as medidas caute-
lares e de execução da pena, podendo ser adotado como medidas alternativas,
porexemplo o usodetornozeleiras eletrônicasorecolhimento domiciliar no
período noturno, a proibição de viajar, de frequentar alguns lugares ou de
manter contato com determinadas pessoas.
Por último, o escopo do terceiro acordo foi a elaboração de diretrizes e
apromoção de política de monitoração eletrônica para todos os estados O
incentivo à utilização das tornozeleiras abarca principalmente duas situações
especícasmonitoramentodemedidascautelaresincidentesaacusadosde
qualquer crime, com exceção daqueles acusados da prática de crimes dolosos
punidos com pena privativa de liberdade superior a quatro anos ou que já tive-
rem sido condenados por outro crime doloso, e monitoramento de medidas
protetivas de urgência aplicadas a acusados de crime que envolva violência
doméstica e familiar contra mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou
pessoacomdeciência
As informações consolidadas do programa indicam a importância da
concepção da política pública judiciária em comento, especialmente quando
o objeto da medida está diretamente relacionado ao bem atrelado à liberdade
do cidadão(501).
Considerado um contexto de sucesso para o aperfeiçoamento do sistema
de justiça criminal, as ‘Audiências de Custódia’ foram regulamentadas pela
Disponível em hpswwwcnjjusbrsistemacarcerarioaudienciadecustodiadocu-
mentosAcessoemnov
Segundo EugenioRaúl Zaaronia intervençãominimalista éumatendência políticocri-
minalcontemporâneaquepostulaareduçãoaomínimodasolução punitivanosconitossociais
em atenção ao efeito frequentemente contraproducente da ingerência penal do Estado”. (PIERAN-
GELI, José Henrique; ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Manual de direito penal brasileiro: parte geral.
11. ed. São Paulo: RT, 2015. p. 324).
Segundo os dados colhidos: total de audiências de custódia realizadas: 732.893; casos
que resultaram em liberdade: 294.735; casos que resultaram em prisão preventiva: 437.327;
casos em que houve relato de tortura/maus tratos: 41.867; casos em que houve encaminha-
mento socialassistencial Disponível em hpspaineisanalytics cnjjusbrsingleap-
pidbe50c488-e480-40ef-af6a-46a7a89074bd&sheet=ed897a66-bae0-4183-bf52-571e7de97ac
langptBRoptcurrselAcessoemnov
Morgana de Almeida Richa
214
Resolução n. 213/2015. O regramento que deve ser aplicado pelo Poder Judiciário
apresentaprotocolosespecícoseminuciososaseremseguidospelosmagistra-
dos quanto a sua atuação, aplicação e acompanhamento de medidas cautelares
diversas da prisão para custodiados apresentados nas audiências de custódias;
procedimentos para acompanhamento das medidas cautelares e inclusão social.
Além disso, estabelece condutas pormenorizadas sobre prevenção e combate à
tortura, tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes.
A atuação das Centrais Integradas de Alternativas Penais e das Centrais
deMonitoramentoEletrônicodePessoasestácondicionadaaosprocedimentos
elencados detalhadamente na norma.
Inegável a relevância dos contornos estabelecidos por esta política pública
judiciária instituída pelo Conselho Nacional de Justiça, visando alterar os parâ-
metros que norteiam o sistema penal e, mais que isso, a promoção da cultura
da paz e o rompimento com os malefícios do círculo vicioso da violência que
envolve prisão, marginalização e reincidência. Para isso, o sistema de justiça
deve ter adequada estrutura na execução das alternativas penais de modo que
as opções judiciais possam ser sopesadas e efetivadas.
Passo adiante das políticas públicas judiciárias anteriormente aferidas
lançou o programa ‘Cidadania nos presídios’, voltado ao reconhecimento e à
valorização de direitos a partir de debates sobre a nova dinâmica e metodologia
paraosistemadeexecuçãoescalizaçãodaspenas
Em alinhamento ao pretendido inicialmente pelos mutirões carcerários,
propõe-se rever o funcionamento das varas de execução penal e a superlotação
dos presídios, destacada a interlocução e a interação dos atores envolvidos nas
rotinas de execução penal(502).
A síntese do programa enfoca fazer a diferença na perspectiva do julga-
mento dos pedidos de indulto e comutação, metodologia de cooperação e cola-
boração, diagnóstico e plano de ação para mudanças estruturais, qualidade na
ação e nos resultados, celeridade nos julgamentos e concentração de atos, capa-
citaçãodosagentespúblicosconstruçãoconsensualdasmodicaçõesesolução
dos problemas, fortalecimento das estruturas locais, relação presos/vagas em
estabilidade ou redução e articulação de ações sociais para o egresso(503).
A importância da atuação interinstitucional é refletida em ações que redun-
demna garantiada efetividadedosistema oquesevericapor exemplona
Seguemdetalhadososobjetivoscorrespondentesnosite do Conselho Nacional de Justiça.
Disponível em: <hpwwwcnjjusbrsistemacarcerarioeexecucaopenalcidadanianospresi-
dios. Acesso em: 05 nov. 2020.
BRASIL Conselho NacionaldeJustiça Disponível emhpwwwcnjjusbrsistemacar-
cerarioeexecucaopenalcidadanianospresidiosobjetivosdetalhados. Acesso em: 06 nov. 2020.
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
215
interação acordada entre o Tribunal de Justiça do Espírito Santo, a Secretaria
de Justiça, o Conselho Nacional de Justiça e o Conselho Brasileiro de Óptica
e Optometria, em projeto local que resultou na realização de exames visuais e
doação de óculos para 148 internas da Penitenciária Feminina de Cariacica. A
iniciativademonstraqueaconstruçãodeuxoseparceriasentreasinstituições
que compõem o sistema penal em todas as suas fases facilitam a preservação e o
respeito à dignidade da pessoa.
Há que se fazer referência no elenco que segue ao Programa de Ações
Intersetoriais de Assistência à Saúde e de Assistência Social para o Sistema
Prisional (PAISA) – Saúde Prisional, instituído em 2016, pelo Conselho Nacio-
nal de Justiça. A iniciativa reúne diversas medidas com o intuito de transformar
o cenário peculiar e perverso de violações a direitos humanos cotidianamente
vericadonascarceragensbrasileiras
Analidade dessaaçãoé asseguraraospresos umpadrãosanitário ede
assistência social mínimo. Para tanto, conta com a parceria do Poder Executivo
e da sociedade civil.
A via escolhida para assegurar aos detentos o acesso universal aos proce-
dimentosdeassistênciabásicaàsaúdefoidenidaapartirdaadoçãodemedi-
dasparaaprevençãodedoençaseoacessoatratamentosespecícosalémda
garantiadeatendimentoparagestanteseseuslhosedemedidasterapêuticas
aos presos com transtorno mental e dependentes de drogas.
O programa é dividido em quatro eixos norteadores que se desdobram em
açõesaseremalcançadasparaosnsneleprevistoseixouniversalizaçãodo
acesso à saúde das pessoas privadas de liberdade; eixo 2 – saúde das mulheres
privadas de liberdade; eixo 3 – medidas terapêuticas aplicáveis à pessoa com
transtornomentalemconitocomaleieixoindicadordoConselhoNacio-
naldeJustiçadescalizaçãoemonitoramentodadignidadehumana(504).
Finalmente, na missão de acompanhar e propor soluções a respeito das
irregularidadesvericadasnossistemascarceráriosenasexecuçõesdasmedi-
das socioeducativas, foi criado o ‘Programa Justiça ao Jovem’, inicialmente
denominado ‘Medida Justa’, com o intento de investigar o cenário nacional
a respeito da execução da medida socioeducativa de internação do jovem em
conitocomalei(505).
Aspirando ao mapeamento das condições correspondentes, desenvolvido
um amplo trabalho de campo, em que foram visitados 320 estabelecimentos de
Disponívelemhpwwwcnjjusbrsistemacarcerarioeexecucaopenalsaudepri-
sionalAcessoemabr
Lançadoem peloDepartamento deMonitoramentoeFiscalizaçãodo SistemaCarce-
rário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas.
Morgana de Almeida Richa
216
internação das Varas da Infância e Juventude de todos os estados da federação
e documentadas as impressões pertinentes a cada um deles, especialmente no
tocante aos aspectos da estrutura física das unidades de internação, ao aten-
dimentoprestado à formadetramitação dos processos eoperl social dos
adolescentes entre 12 e 18 anos.
Os relatórios parciais produzidos na primeira etapa do programa(506) segui-
ram encaminhados aos Tribunais de Justiça, por intermédio de suas presidên-
cias, corregedorias e coordenadorias da infância e juventude, e aos Executivos
Estaduais, além de outras autoridades integrantes do Sistema de Garantias de
Direitos Infantojuvenis, para análise das recomendações e adoção das providên-
cias cabíveis.
Num segundo momento, um ano após a primeira visita, as equipes
retornaram aos estados mais críticos para averiguar possível evolução das
unidades responsáveis pelos jovens Propôsse ainda a articulação com
os Poderes Judiciário e Executivo dos respectivos estados e a realização de
cursosde aperfeiçoamento para magistrados e servidoresamde garan-
tir as disposições da Lei n. 12.594/2012 (Lei do SINASE) e do Estatuto da
Assim, com o intuito de analisar a execução das medidas socioedu-
cativas, o Conselho Nacional de Justiça realizou investigação social
com a intenção de traçar panorama da situação dos adolescentes em
conitocomaleino Brasilbuscando conheceroperlsocialdestes
dos processos de execução de medida em tramitação e as condições
de atendimento deles nas estruturas de internação. Este trabalho, sem
precedentes no âmbito da pesquisa empírica sobre o sistema de Jus-
tiça Infantojuvenil pela sua abrangência geográca e institucional
expressa a importância das atividades desempenhadas pelo Con-
selho Nacional de Justiça de contribuir para a efetividade de direitos e
garantias de crianças e adolescentes socialmente vulneráveis no Brasil.
A partir da realização de diagnósticos sobre a execução das medidas
socioeducativas, pode-se desenvolver políticas bem orientadas de
melhoramento do sistema de Justiça(507).
Também em 2012, diante da complexidade e da magnitude do problema
envolvendo os direitos e as garantias da criança e do adolescente, o Conselho
Nacional de Justiça aprova a Resolução n. 165, estabelecendo normas gerais para
Realizadadeaporumaequipecompostaporjuízescomexperiência
na execução de medidas socioeducativas, servidores de cartórios judiciais e técnicos do Judiciário
das áreas de assistência social, psicologia e pedagogia.
BRASILConselhoNacionaldeJustiçaPanorama nacional – a execução das medidas socioe-
ducativas de internação Disponível em hpswwwcnjjusbrwpcontentuploads
panoramanacionaldojwebpdfAcessoemnov
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
217
o atendimento pelo Poder Judiciário ao adolescente em conito com a lei no
âmbito da internação provisória e no cumprimento das medidas socioeducativas.
Nota-se, portanto, a atuação concreta do órgão na criação de critérios
pontuais relacionados à população infantojuvenil e a adoção de uma política
orientadoraparaosistemadegarantiasdedireitosdosjovensemconitocom
a lei. Tornou-se factível, por meio dessas premissas, conferir ao gestor público
a padronização de procedimentos que possibilita análises sobre a compatibili-
dade entre a oferta de serviços de justiça e sua demanda.
Outra medida de materialização da política pública judiciária veiculou
cartilhas destinadas ao adolescente em cumprimento de medida socioeducativa
de internação ou de semiliberdade nos estabelecimentos educacionais. É um
instrumento útil aos agentes do sistema de garantias de direitos, dentre eles,
conselheiros tutelares e de direitos, servidores das unidades socioeducativas,
defensores públicos, promotores de justiça e juízes da infância e da juventude.
Em vista do exposto parece certo concluir que a política pública judiciária
voltada para a causa infantojuvenil promove canais para o acesso à justiça dispo-
nibilizando subsídios para aprimorar a estrutura judiciária e prestar adequada-
mente o serviço jurisdicional. É o primeiro passo para garantir condições dignas
a esses sujeitos vulneráveis e de restabelecimento da vida livre com possibili-
dade concreta de regresso da criança e do adolescente ao convívio social.
Em resumo, diante da situação carcerária no Brasil, são observadas graves
violações aos direitos fundamentais nas prisões, praticadas pelo próprio
Estado, conforme reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal em liminar na
ADPF 347/DF, de relatoria do Ministro Marco Aurélio, um “estado de coisas
inconstitucional”(508).
A sujeição de detentos a condições inadequadas que vão desde a superlota-
ção, insalubridade, proliferação de doenças, violência, má alimentação, falta de
águapotáveldeassistênciajudiciáriadeeducaçãoetrabalhoatéainsuciên-
cia de controle do cumprimento das penas, leva a distorções que culminam com
o domínio dos cárceres por organizações criminosas.
Na mudança do quadro dramático enfrentado pelo sistema prisional, a
transformação da postura do Poder Público envolve de modo geral os Pode-
res de Estado e as instituições correlatas, donde emerge a fundamentalidade de
políticas públicas coordenadas.
Mais adiante, o protagonismo individual atribui a cada ator estatal
responsável, dever próprio na implementação de políticas públicas atinentes
BRASILSupremoTribunal FederalADPFDFDecisãoliminar deferidaemparteem
09 set. 2015.
Morgana de Almeida Richa
218
aos problemas vivenciados interna corporis, para a solução das mazelas que
lhes são peculiares.
Assim é que a perspectiva da atuação do Poder Judiciário apresentada nos
programas coordenados pelo Conselho Nacional de Justiça estabelece sua condi-
ção como principal policymaker na formulação de políticas públicas judiciárias
para contribuir no afastamento e superação do estado de inconstitucionalidade.
4.4. Violência contra a mulher (Lei Maria da Penha)
A violência doméstica é um grave problema social com visibilidade cada
vez maior, que possui muitas formas de manifestação, das mais tênues às mais
evidentes, noticiados com frequência casos de feminicídio. Necessário, portanto,
o enfrentamento do tema que atinge um grande universo de mulheres vítimas,
independente de classe social.
A complexidade também decorre da diversidade de fatores envolvidos na
violênciafamiliarconjugalpoisofenômenoinstalasenaintimidadedoconví-
vio em conjuntura de papéis com hierarquia de gênero e de poder, relações assi-
métricas de toda ordem no ambiente doméstico.
O Brasil registrou, em 2019, 1.036.746 processos referentes à violência
doméstica contra a mulher, 5.127 processos de feminicídio em tramitação na
Justiça, além de 403.646 medidas protetivas concedidas no ano. O número
corresponde a praticamente 530 casos novos de violência doméstica a cada 100
mil brasileiras, de acordo com levantamento do Conselho Nacional de Justiça(509).
Ainda sobre os dados da violência contra as mulheres no mundo, segundo
a Organização Mundial da Saúde, estima-se que 70% das mulheres já sofreram
violência física ou sexual praticada por parceiro íntimo em algum momento
da vida(510).
Em vista desta conjuntura, o estudo prossegue no desencadeamento de
uma política pública judiciária sobre medidas de combate à violência domés-
tica e familiar praticada contra a mulher, ao encontro da efetividade da Lei
Maria da Penha, tema sobre o qual está debruçado o Conselho Nacional de
Justiça, desde 2007.
CNJMonitoramento daPolíticaJudiciária NacionaldeEnfrentamento àViolênciacontra
as Mulheres. Disponível em: <hpspaineiscnjjusbrQvAJAXZfcopendochtmdocumentq-
vwlCpainelcnjqvwhostQVSneodimioanonymoustruesheetshVDResumo.
Acesso em 09 nov. 2020.
Disponívelemhpwwwunwomenorgenwhatwedoendingviolenceagainstwomen
factsandguresAcessoemnov
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
219
Interessante observar que, não obstante a importância e a antiguidade da
matériacomochagadasociedadebrasileiraotratamentojurídicoespecícoque
lhe foi conferido é relativamente recente, situando-se tanto na Lei n. 11.340/2006,
quanto na adoção de medidas estruturantes no Poder Judiciário.
A Lei Maria da Penha é um marco na história do direito pátrio, represen-
touarupturadanoçãodequeoprocessotradicionalerasucienteparaquea
mulher transpusesse os séculos de tratamento de inferioridade, discriminação
e violência. Para além de uma norma repressiva, recriou o processo penal a
partir de mecanismos para assegurar a proteção da mulher, recuperar o agente
agressor, romper o ciclo da violência nas famílias e, por consequência, promo-
vera pacicaçãosocialpormeio da atuaçãoconjuntaentre os Podereseas
demais instituições.
No curso da história, embora as reivindicações e as conquistas de direitos
civispolíticoseeconômicostenhamocorridoaolongodoséculoXXsomente
a partir dos anos 1970 os direitos das mulheres a uma vida sem violência
começaram ter guarida por meio de diversos tratados e convenções aprovadas
porentidadesinternacionaisdedireitoshumanosemreexoaosmovimentos
feministascomo um fenômenoglobal(511). Em 1979, a pressão dos movimen-
tos resultou na Convenção das Nações Unidas sobre a eliminação de todas as
formas de discriminação contra as mulheres, quando foram materializados os
compromissos assumidos na conferência realizada no México em 1975(512).
Não menos importante, a Conferência das Nações Unidas sobre Direi-
tos Humanos, realizada pela Organização das Nações Unidas em 1993, reco-
nheceu ser prioridade da comunidade internacional promover e proteger os
Sobreomovimentofeministano BrasilAnaPaulaSchwelmGonçalvesresumeAprimeira
onda do feminismo tinha o foco originalmente na promoção da igualdade nos direitos contratuais,
propriedade para homens e mulheres, oposição de casamentos arranjados e da propriedade de
mulherescasadaseseuslhosporseusmaridosComogolpemilitardeosmovimentosde
mulheres, juntamente com os demais movimentos populares, foram silenciados e massacrados. A
segunda onda do feminismo iniciou nos anos 70, após a ampliação da resistência ao regime militar,
quando se proliferou através de novos grupos e assumiu novas bandeiras como os direitos repro-
dutivosasexualidadeeocombateàviolênciacontraamulherNonaldadécadadeoslemas
de luta do movimento feminista brasileiro foram “quem ama não mata” e “o silêncio é cúmplice da
violência”, para banir a prática de homicídios praticados por homens violentos que acabavam absol-
vidos pela sociedade em nome da chamada “tese da legítima defesa da honra”. O tema ganha visibi-
lidade com manifestações de rua e espaço na mídia, denunciando o problema da violência conjugal,
e o que era uma situação comum mantida em segredo no mundo privado, passa a ganhar espaço
públicoe exigir soluções GONÇALVESAnaPaula SchwemSecretaria Especial de Políticas
para Mulheres: um instrumento indispensável para o empoderamento das mulheres em situação de
violência. In: (Coords.) CAMPOS, Amini Haddad; COSTA, Lindinalva Rodrigues Dalla. Sistemade
justiçadireitoshumanoseviolêncianoâmbitofamiliar. Curitiba: Juruá, 2011. p. 76).
OnormativoentrouemvigoremefoicorroboradoporpaísesNoBrasileem
outrosterritórioscontudoaConvençãofoiraticadacomreservasnoâmbitodosdireitoscivis
Morgana de Almeida Richa
220
direitos humanos das mulheres. Por sua vez, a Convenção de Belém do Pará,
adotadapela OrganizaçãodosEstadosAmericanosem raticada
peloBrasilemtraçouum conceitodeviolênciacontramulherdenida
como “qualquer ato ou conduta, baseada no gênero, que cause morte, dano ou
sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto na esfera pública como
na esfera privada”(513).
No cenário pátrio, a nova conjuntura normativa e a política internacio-
nal somaram-se às reivindicações feministas em busca da conquista de direi-
tos a uma vida sem violência, principalmente após o caso envolvendo Maria
da Penha Fernandes, vítima de duas tentativas de homicídio pelo marido em
1983. Ao recorrer à Organização dos Estados Americanos (OEA), denunciando a
impunidade e a morosidade da resposta judicial(514), Maria da Penha obteve, em
2001, a condenação do Estado brasileiro por negligência, omissão e tolerância
em relação à violência doméstica contra as mulheres.
Na ocasião, a deliberação da Organização dos Estados Americanos orien-
tou o governo a implementar as seguintes medidas: a) capacitar e sensibilizar
funcionários judiciais e policiais especializados para compreenderem a impor-
tânciadenãotoleraraviolênciadomésticabsimplicarosprocedimentosjudi-
ciaispenais a m de reduzir o tempo processualsem afetar os direitos e as
garantias do processo; c) estabelecer formas alternativas às judiciais, rápidas e
efetivasdesolucionarconitosintrafamiliaresalémdesensibilizarcomrespeito
à sua gravidade e às consequências penais geradas; d) multiplicar o número de
delegacias policiais especiais para a defesa dos direitos da mulher e dotá-las dos
recursos especiais necessários à tramitação e investigação de todas as denúncias
de violência doméstica, além de prestar apoio ao Ministério Público na prepara-
ção de seus informes judiciais; e, e) incluir em seus planos pedagógicos unida-
des curriculares destinadas a compreender a importância do respeito à mulher
e a seus direitos reconhecidos na Convenção de Belém do Pará, bem como ao
manejodosconitosintrafamiliares(515).
A pressão do cenário internacional e a condenação pela Organização dos
Estados Americanos culminaram com a aprovação da Lei n. 11.340/2006 (Lei
Maria da Penha), considerada um dos mais relevantes avanços legislativos na
seara dos direitos humanos, desde a promulgação da Constituição Federal de
ConvençãoInteramericana para Prevenir Punir e Erradicar a Violência Contra a Mulher
Convenção de Belém do Pará Disponívelem hpswwwcidhoasorgbasicosportu-
gues/m.belem.do.para.htm#:~:text=EM%20F%C3%89%20DO%20QUE%20os,Conven%C3%A7%-
CAodeBelCAmdoParCAEDAcessoemnov
Acondenaçãoaanosdeprisãodomaridoagressorocorreuapenasem
ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOSAMERICANOSComissão Interamericana deDireitos
Humanos. Relatório n. 54/2001; caso 12.051 – Maria da Penha Fernandes, 4 abr. 2001. Disponível
em: <hpswwwcidhoasorgannualrepporthtm. Acesso em: 09 nov. 2020.
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
221
1988 que, em seu artigo 226, § 8º, já havia declarado pleno repúdio à violência
intrafamiliare denido a responsabilidade do Estado emdarrespostas mais
contundentes a essa forma de violência(516).
De modo geral, aspectos importantes sobre a legislação são: a inovação
no tocante ao procedimento mínimo previsto no normativo que compreende
a inaplicabilidade dos institutos despenalizadores(517), a atuação de equipe
multidisciplinar no processo, a tramitação concomitante do procedimento
cautelardas medidas protetivase a modicaçãodeestrutura das autoridades
públicas e dos sujeitos processuais, mediante criação dos Juizados de Violência
Doméstica e Familiar contra a mulher.
Ademais, prevista a instituição de serviços especializados por meio de casas
de abrigo, delegacias, núcleos de defensoria pública, serviços de saúde, centros
da mulher e promotorias públicas ou núcleos de gênero do Ministério Público.
Na esteira dos contornos dos institutos, a Lei Maria da Penha trouxe uma
conceituação precisa das formas de violência(518), a possibilitar às vítimas o
reconhecimento e o correto enquadramento das demandas com todas as suas
peculiaridades, viabilizada, outrossim, a elaboração de melhores políticas de
enfrentamento visando contemplar o caráter multidimensional do problema.
O conceito abrangente de violência contra a mulher e a natureza complexa
das agressões ocorridas em contextos familiares, de intimidade, traduz de
imediato a dimensão do desao do Estado para tornar efetivo o mecanismo
legal. A visão tradicional do direito, com enfoque meramente jurídico, não basta
para enfrentar esse tipo característico de violência, que exige abordagem multi-
disciplinar para a compreensão de suas razões e o estabelecimento de formas de
modicaressarealidade
Por certo, a promulgação da Lei Maria da Penha impactou sobremaneira
as instituições que compõem o sistema de justiça, uma vez que o instrumento
legal dispôs sobre a criação de estruturas especializadas para processar os
crimes que envolvem a violência doméstica e familiar contra a mulher, ao
passo que possibilita criar estruturas especializadas em órgãos que cumprem
SegundootextoconstitucionalOEstadoasseguraráaassistênciaàfamíliana pessoade
cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito das relações”.
Oscrimescontraamulherperdemocaráterdemenorpotencialofensivoexcluídaacom-
petência dos Juizados Especiais Criminais para processamento dessas demandas.
Artigo 5º.Paraosefeitosdesta Leiconguraviolênciadoméstica efamiliarcontraa mulherqual-
queraçãoouomissãobaseadanogênero quelhecausemortelesãosofrimentofísicosexual oupsicológico
edanomoraloupatrimonialInoâmbitodaunidadedomésticacompreendidacomooespaçodeconvívio
permanentedepessoascomousemvínculofamiliarinclusiveasesporadicamenteagregadasIInoâmbito
dafamíliacompreendidacomoacomunidadeformadaporindivíduosquesãoouseconsideramaparentados
unidosporlaçosnaturaisporanidadeouporvontadeexpressaIIIemqualquerrelaçãoíntimadeafeto
naqualoagressorconvivaoutenhaconvividocomaofendidaindependentementedecoabitação
Morgana de Almeida Richa
222
as funções e ssenciais à justiça, como o Ministério Público e a Defensoria Pública,
competentes para atuar nesses casos.
Com a lei formou-se, portanto, um verdadeiro microssistema de proteção
à família e à mulher, reunindo um conjunto de princípios, diretrizes e regras
cujo desiderato é alcançar a questão da violência em toda sua gênese e comple-
xidade, para resguardar a entidade familiar e assegurar à mulher o direito à
integridade física, psíquica e moral.
Não sem razão as peculiaridades no enfoque normativo da proteção das
mulheres em situação de violência foram tratadas como política pública já no
artigo 8º da Lei, previsto um conjunto de ações articulado dos órgãos de Estado(519).
Desse modo, prosseguiu a lógica do enquadramento no Judiciário mediante
parceria do Conselho Nacional de Justiça, com o Ministério da Justiça, a Secreta-
ria Especial de Políticas para as Mulheres da Presidência da República e a Escola
Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados.
Isso porque a atuação do Poder Judiciário na aplicação da Lei Maria
da Penha possui papel fundamental para concretude do instrumento legal,
uma vez que as medidas protetivas, uma das principais inovações da norma,
dependem da concessão por meio de ato judicial, como um dos mais importan-
tes instrumentos de prevenção de agressões.
Artigo 8º A política pública que visa coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher
far-se-á por meio de um conjunto articulado de ações da União, dos Estados, do Distrito Federal e
dos Municípios e de ações não-governamentais, tendo por diretrizes: I – a integração operacional
do Poder Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública com as áreas de segurança
pública, assistência social, saúde, educação, trabalho e habitação; II – a promoção de estudos e
pesquisas, estatísticas e outras informações relevantes, com a perspectiva de gênero e de raça ou
etnia, concernentes às causas, às consequências e à frequência da violência doméstica e familiar
contraamulherparaasistematizaçãodedadosaseremunicadosnacionalmenteeaavaliação
periódica dos resultados das medidas adotadas; III – o respeito, nos meios de comunicação social,
dos valores éticos e sociais da pessoa e da família, de forma a coibir os papéis estereotipados que
legitimem ou exacerbem a violência doméstica e familiar, de acordo com o estabelecido no inciso
III do artigo 1º, no inciso IV do artigo 3º e no inciso IV do artigo 221 da Constituição Federal; IV
– a implementação de atendimento policial especializado para as mulheres, em particular nas
Delegacias de Atendimento à Mulher; V – a promoção e a realização de campanhas educativas
de prevenção da violência doméstica e familiar contra a mulher, voltadas ao público escolar e à
sociedade em geral, e a difusão desta Lei e dos instrumentos de proteção aos direitos humanos das
mulheres; VI – a celebração de convênios, protocolos, ajustes, termos ou outros instrumentos de
promoção de parceria entre órgãos governamentais ou entre estes e entidades não-governamen-
tais, tendo por objetivo a implementação de programas de erradicação da violência doméstica e
familiar contra a mulher; VII – a capacitação permanente das Polícias Civil e Militar, da Guarda
MunicipaldoCorpo deBombeirose dosprossionaispertencentes aosórgãose àsáreasenun-
ciados no inciso I quanto às questões de gênero e de raça ou etnia; VIII – a promoção de programas
educacionais que disseminem valores éticos de irrestrito respeito à dignidade da pessoa humana
com a perspectiva de gênero e de raça ou etnia; IX – o destaque, nos currículos escolares de todos
os níveis de ensino, para os conteúdos relativos aos direitos humanos, à equidade de gênero e de
raça ou etnia e ao problema da violência doméstica e familiar contra a mulher.
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
223
Sob essa perspectiva, a Política Judiciária Nacional de Enfrentamento à
Violência contra as Mulheres, desenvolvida pelo Conselho Nacional de Justiça,
visa conferir efetividade à Lei Maria da Penha, mediante ações de combate à
violência doméstica em âmbito nacional e de maneira sistematizada em todo o
Poder Judiciário brasileiro. Seu escopo é reduzir os casos nela previstos e contri-
buir para modernizar o acesso à justiça, superando as desigualdades e comba-
tendo todas as formas de preconceito e discriminação.
Assim é que logo após a entrada em vigor da Lei Maria da Penha, muito
embora não houvesse coerção legislativa para instalar varas e juizados de violên-
cia doméstica contra a mulher, o Conselho editou o primeiro ato regulamen-
tar sobre a matéria, a Recomendação n. 09/2007(520), por meio da qual instou os
Tribunais, de imediato, à criação e estruturação dos Juizados Especializados nas
capitais e no interior dos estados, com a implementação de equipes multidisci-
plinares para efetividade da norma.
Diante da lógica de que o Poder Judiciário é responsável por adotar polí-
ticas que visem garantir os direitos humanos das mulheres no âmbito das
relações domésticas e familiares, o Conselho recomendou inicialmente aos
Tribunais de Justiça dos Estados e Distrito Federal a prática das medidas a
seguir: divulgar a Lei Maria da Penha e as providências administrativas neces-
sárias à mudança de competência e à garantia do direito de preferência do
julgamento das causas decorrentes da prática de violência doméstica e fami-
liar contra a mulher; formar um Grupo Interinstitucional de Trabalhos para
tratar de medidas integradas de prevenção, de responsabilidade do Judiciário,
tendentes à implantar políticas públicas que visam a coibir a violência domés-
tica e familiar contra a mulher e garantir os direitos humanos das mulheres
no âmbito das relações domésticas e familiares; incluir, nas bases de dados
ociais estatísticas sobre violência doméstica e familiar contra a mulher
promover cursos de capacitação multidisciplinar em direitos humanos/violên-
cia de gênero e de divulgação da Lei n. 11.340/2006, voltados aos operadores
de direito, preferencialmente magistrados; e, integrar o Poder Judiciário aos
demais serviços da rede de atendimento à mulher(521).
Subsequente ato normativo atrelado à funcionalidade do Poder Judiciário
materializou-se com a Resolução n. 128/2011(522)queimpôsa criaçãode Coor-
denadorias Estaduais das Mulheres em situação de violência doméstica e fami-
liar nos Tribunais dos Estados e do Distrito Federal, dirigidas por magistrados,
BRASIL Conselho Nacional de JustiçaRecomendação n de . Disponível em:
hpsatoscnjjusbratosdetalharatosnormativosdocumentoAcessoemnov
BRASIL Conselho Nacional de JustiçaRecomendação n de . Disponível em:
hpsatoscnjjusbratosdetalharatosnormativosdocumentoAcessoemnov
BRASILConselhoNacionaldeJustiçaDisponívelemhpsatoscnjjusbratosdetalhar
atosnormativosdocumentoAcessoemnov
Morgana de Almeida Richa
224
mediantecolaboraçãodeequipemultiprossionaleadministrativa(523). Além de
estabelecer o órgão como integrante da estrutura permanente da Presidência
de cada Tribunal de Justiça, elencou suas respectivas atribuições, dentre elas,
observar as diretrizes do Conselho Nacional de Justiça no que tange à execução
de políticas públicas judiciárias atinentes a tema tão caro à sociedade atual.
Após ultrapassar mais de uma década de vigência, ainda são inúmeros os
desaos que impostos à efetividade da Lei Maria da Penha, especialmente se
consideradas as diculdades decorrentes do embate cultural na incidência da
norma e a infraestrutura precária para resgatar a dignidade das mulheres. Nesta
seara, o decisivo papel do Conselho Nacional de Justiça como órgão de articula-
ção e integração com outras instituições para estruturar práticas de ampliação do
acesso à justiça, voltadas à melhoria da prestação jurisdicional no particular.
Campo das atribuições constitucionalmente conferidas ao Conselho Nacio-
nal de Justiça, a violência doméstica contra a mulher integra a agenda de ações
cuja execução é delegada à Comissão Permanente de Acesso à Justiça e Cidada-
nia, em processo de condução do Poder Judiciário à essência do seu mister, no
aspecto voltado à atuação preventiva, punitiva e de redução das violações aos
direitos das mulheres.
Para enquadrar as ações do Conselho nesse contexto, houve a concretização
de uma política pública judiciária a partir da indução de melhorias na aplica-
ção da Lei n. 11.340/2006 em atuação orgânica do Conselho Nacional de Justiça,
agregada a diversas medidas convergentes a um aprimoramento integrado. O
objetivo é estabelecer as condições necessárias para melhor prestação jurisdi-
cional em diversas frentes de atuação, muitas delas dependentes de articulação
interinstitucional, até mesmo pelo caráter multidisciplinar envolvendo o tema.
No âmbito das ações concretas desenvolvidas pelo Conselho e Tribunais,
destacam-se: as Jornadas Lei Maria da Penha, o Fórum Nacional de Juízes de
Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (FONAVID), o Programa Justiça
Asatribuições dasCoordenadorias seguemdescritasnoregramentoI elaborar sugestões
para o aprimoramento da estrutura do Judiciário na área do combate e prevenção à violência domés-
tica e familiar contra as mulheres; II – dar suporte aos magistrados, aos servidores e às equipes
multiprossionais visando à melhoria da prestação jurisdicional III promover a articulação
interna e externa do Poder Judiciário com outros órgãos governamentais e não-governamentais;
IV – colaborar para a formação inicial, continuada e especializada de magistrados e servidores na
área do combate/prevenção à violência doméstica e familiar contra as mulheres; V – recepcionar, no
âmbito de cada Estado, dados, sugestões e reclamações referentes aos serviços de atendimento à
mulher em situação de violência, promovendo os encaminhamentos e divulgações pertinentes; VI
– fornecer os dados referentes aos procedimentos que envolvam a Lei n. 11.340/2006 ao Conselho
NacionaldeJustiçadeacordocomaparametrizaçãodas informaçõescomasTabelasUnicadas
do Poder Judiciário, promovendo as mudanças e adaptações necessárias junto aos sistemas de
controle e informação processuais existentes; VII – atuar sob as diretrizes do Conselho Nacional
de Justiça em sua coordenação de políticas públicas a respeito da violência doméstica e familiar
contra a mulher.
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
225
pelaPazemCasa epormaPolíticaJudiciáriaNacionaldeEnfrentamentoà
Violência contra as Mulheres no Poder Judiciário (Portaria n. 15/2017 do Conse-
lho Nacional de Justiça).
Logo após a vigência da Lei n. 11.340/2006, estatuindo um modelo judi-
cial próprio para aplicar normas mais severas de controle à violência doméstica,
foram inauguradas as primeiras ações do Conselho Nacional de Justiça volta-
das à implementação do novo regramento pelos tribunais estaduais, em prol da
estruturação dos serviços legalmente previstos e do aumento da qualidade do
atendimentoeecáciadaprestaçãojurisdicionalàsmulheres
Já em 2007, o Conselho Nacional de Justiça, em parceria com a Secretaria Espe-
cial de Política para as Mulheres(524), promoveu a I Jornada Lei Maria da Penha,
realizada com o intuito de incentivar debates permanentes a respeito da aplicação
do normativo e orientar os procedimentos dos operadores do direito, especial-
mente magistrados e servidores, no tocante aos casos de violência doméstica.
A I Jornada abordou a importância da especialização no enfrentamento à
violência doméstica contra a mulher, com foco na criação de comissões discipli-
nares nos tribunais, formadas por psicólogos, assistentes sociais, dentre outros
prossionaisparaacompanharasvítimasOencontroinauguralresultounoenca-
minhamento de compromisso dos participantes quanto à promoção da aplicabili-
dade da norma nas respectivas instituições e regiões, de modo a facilitar a criação
de uma rede interinstitucional de erradicação e combate à violência doméstica e
familiar contra a mulher. Estiveram presentes representantes de 27 Tribunais de
Justiça, além de atores do sistema de justiça e de outros Poderes da República.
Em documento(525) encaminhado pelos participantes do evento estabeleceu-
-se a realização anual da Jornada visando avaliar o cumprimento da Lei Maria
da Penha e dos instrumentos internacionais que tratam do tema(526).
Por seu turno, a II Jornada Lei Maria da Penha, ocorrida em 2008(527)xou
como meta capacitar magistrados e servidores na aplicação da legislação(528),
Hojedenominada SecretariaNacionalde PolíticaparaMulheres vinculadaaoMinistério
dos Direitos Humanos.
AonaldecadaediçãoéproduzidaumaCartana qualsãoreproduzidasaspropostas de
ação para subsidiar a implementação da Política Judiciária Nacional de enfrentamento à violência
contra as mulheres.
BRASILConselhoNacionaldeJustiçaI Jornada Lei Maria da PenhaDisponívelemhps
wwwcnjjusbrwpcontentuploadscartadajornadapdfAcessoemnov
BRASILConselhoNacionaldeJustiçaII Jornada Lei Maria da PenhaDisponívelemhps
www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/violencia-contra-a-mulher/jornadas/ii-jornada-lei-maria-da-
penhaAcessoemnov
ConsoanteprevistonoincisoVIIdoartigodaLeiMariadaPenha
Morgana de Almeida Richa
226
implantar e supervisionar varas especializadas em violência doméstica(529),
marco digno de registro pelo êxito na concretude da política pública judiciária(530).
Neste evento, balizada, ainda, a necessidade de criar espaço junto ao site
do Conselho Nacional de Justiça, delineada a nova perspectiva de distribuição
da justiça pela inserção dos dados referentes à aplicação da Lei n. 11.340/2006
noJustiçaemNúmerosgarantindoassimaecáciadoartigo 8º, II da norma.
Visando colocar essa política em prática decidiu-se promover materiais
de divulgação e informativos explicativos dos aspectos da Lei Maria da Penha
envolvendo a violência doméstica e familiar e correspondentes procedimentos e
serviços públicos disponíveis para auxiliar o rompimento do ciclo.
Dentre os propósitos xados para a realização contínua dos trabalhos
evidente a importância do encaminhamento dessa ação pelo órgão máximo
incumbido do controle administrativo e estrutural dos tribunais, na medida em
que a atuação conjunta e coordenada do Poder Judiciário Estadual pelo Conse-
lho Nacional de Justiça conduz ao aprimoramento permanente dos debates de
enfrentamento da violência doméstica e familiar contra a mulher.
O ano seguinte marcou o programa a partir do desenvolvimento de uma
identidade visual com o objetivo de chamar a atenção para o ciclo de violência.
Isso porque a natureza da hostilidade nesses casos gera danos físicos e psíquicos,
muitas vezes irreparáveis para ela própria e para as pessoas do círculo de convi-
vênciaprincipalmenteoslhosquetendemarepetirospadrõesvivenciados(531).
Outrossim, relevante ação decorreu dessa terceira edição de trabalhos com
a criação do Fórum Permanente de Juizados de Violência Doméstica e Fami-
liar contra a Mulher (FONAVID)(532)cujanalidadeécongregarmagistradosdo
Sistema de Juizados e Varas de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher
dos Estados e do Distrito Federal(533).
Para tanto, vale o registro de que destinados R$ 21 milhões pelo Programa Nacional de
Segurança com Cidadania para combate à violência nas regiões com maior índice de crimina-
lidade no país (Pronasci), do Ministério da Justiça, para investimento em projetos de criação de
núcleos de justiça comunitária, na efetivação da Lei Maria da Penha e na assistência jurídica a
presos e familiares de 13 Estados da Federação. (Disponível em: <hpwwwobservatoriodese-
gurancaorgsegurancapronasci. Acesso em: 24 abr. 2018).
Desse processo de encaminhamentos na esfera administrativa a gestão do Conselho
alcançousignicativoresultadoemquandoatingidaaMetadoPoderJudiciáriobrasileiro
com a instalação de, ao menos, uma Vara/Juizado Especializado em crimes contra mulher em cada
Tribunal de Justiça do país. Em 2006, havia apenas seis unidades especializadas.
BRASILConselhoNacionalde JustiçaIII Jornada Maria da PenhaDisponívelemhps
www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/violencia-contra-a-mulher/jornadas/iii-jornada-lei-maria-da-
penhaAcessoemnov
ProjetodeigualmodopermanentenoConselhoNacionaldeJustiça
BRASILConselhoNacionaldeJustiçaTermodecriaçãodeFórumPermanente. Disponível em:
hpswwwcnjjusbrprogramaseacoesviolenciacontraamulherforumnacionaldejuizes-
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
227
A IV Jornada realizada em 2010 enfatizou a continuidade do projeto de
instalação de Juizados Especializados e a estruturação das Varas já implantadas.
Na busca pela efetividade da Lei Maria da Penha destacou-se a necessidade de
uniformizar os procedimentos relativos ao funcionamento das Varas Especia-
lizadas; também foi apresentada proposta preliminar do Manual de Rotinas e
Estruturação dos Juizados, que sugeriu a adoção de um número máximo de
processos por Vara(534).
O documento contendo o registro e a sistematização das normas e proce-
dimentos para o bom funcionamento dos Juizados visou proporcionar servi-
ços padronizados aos cidadãos, rotinas de trabalho para as atividades judiciais
e dos serventuários, que garantam a prestação jurisdicional célere e de quali-
dade em todas as unidades da Federação.
A edição contemplou outras ações relativas aos Juizados de Violência Domés-
tica, como apurar dados que orientem as políticas judiciárias pertinentes ao tema
e divulgar boas práticas que possam ser disseminadas pelo país. Para atingir tais
intentos, previstos trabalhos junto à coordenação do Projeto Integrar(535), com o
deverdealcançar a ecácia e a eciência na prestaçãojurisdicional observado
o planejamento estratégico que engloba a padronização dos serviços judiciários,
juntocom o ComitêGestordaTabelaProcessual Unicada que tempornali-
dade uniformizar classes, assuntos e movimentação processual.
AVJornadaLeiMariadaPenhaexpôsoquadroatualizadodainstalação
e do funcionamento dos Juizados e Varas Especializadas e propôsumaree-
xãosobre osignicadodos dadoscolhidos abordandoosaspectos jurídicos
da lei em painéis de debate com a presença de magistrados, juristas e opera-
dores do direito(536).
Ao avaliar a estruturação apta a permitir a efetividade da Lei n. 11.340/2006,
foram criadas, pela Resolução n. 128/2011, as Coordenadorias Estaduais das
Mulheres em situação de violência doméstica e familiar nos Tribunais de
deviolenciadomesticaefamiliarcontraamulherfonavidAcessoemnov
BRASILConselhoNacionalde JustiçaIVJornadaMariada PenhaDisponívelemhps
www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/violencia-contra-a-mulher/jornadas/iv-jornada-lei-maria-da-
penhaAcessoemnov
InstituídonoâmbitodoConselhoNacionaldeJustiçaparaauxiliaroJudiciárionaadoção
de práticas de gestão que contribuam para aprimorar as rotinas e melhorar o atendimento ao
cidadãonamodernizaçãodouxodetrabalhodassecretariasegabinetesearealizaçãodagestão
por competência – reengenharia da estrutura de pessoal nas unidades judiciárias; e, na uniformi-
zação da prestação da Justiça em todo o Judiciário brasileiro.
BRASILConselho NacionaldeJustiça VJornada MariadaPenhaDisponível emhps
www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/violencia-contra-a-mulher/jornadas/v-jornada-lei-maria-da-
penhaAcessoemnov
Morgana de Almeida Richa
228
Justiça dos Estados e Distrito Federal, com atribuições descritas no artigo 2º
do Regramento(537).
Dando continuidade às atividades anuais, o evento organizado em 2012
tevepornalidadediscutirpolíticaspúblicasdoPoderJudiciárioparaaapli-
cação da Lei Maria da Penha e ações integradas com outros órgãos que coíbam
a violência no ambiente doméstico. Além de abordar aspectos jurídicos da
norma, a Jornada apresentou os resultados obtidos a partir da sua aplicação
nos estados e o funcionamento do sistema de monitoramento de dados sobre a
aplicação da lei nos tribunais e nas varas especializadas. Durante essa Jornada,
denidos os objetivos que devem ser alcançados pelas coordenadorias de
violência doméstica nos tribunais, criadas pela Resolução n. 128 do Conselho
Nacional de Justiça(538).
Debatida a efetividade da lei brasileira na VII Jornada(539), diante da exis-
tência de apenas 66 unidades judiciárias, distribuídas de maneira desigual nas
regiõesdopaísadeciênciafoiapresentadaaoladodasboaspráticasdesenvol-
vidas pelos tribunais. Por sua vez, a VIII Jornada Lei Maria da Penha resultou na
xaçãodemetasquedemonstramanítidaconguraçãodoprogramacomouma
política pública judiciária(540).
ElaborarsugestõesparaaprimoraraestruturadoJudiciárionaáreadocombateeprevenção
à violência doméstica e familiar contra as mulheres; dar suporte aos magistrados, aos servidores e
àsequipesmultiprossionaisvisandomelhoraraprestaçãojurisdicionalpromoveraarticulação
interna e externa do Poder Judiciário com outros órgãos governamentais e não governamentais;
colaborar para a formação inicial, continuada e especializada de magistrados e servidores na área
do combate/prevenção à violência doméstica e familiar contra as mulheres; recepcionar, no âmbito
de cada Estado, dados, sugestões e reclamações referentes aos serviços de atendimento à mulher
em situação de violência, promovendo os encaminhamentos e divulgações pertinentes; fornecer
os dados referentes aos procedimentos que envolvam a Lei n. 11.340/2006 ao Conselho Nacional
deJustiçadeacordocomosparâmetrosdasinformaçõesconformeasTabelasUnicadasdoPoder
Judiciário, promovendo as mudanças e adaptações necessárias junto aos sistemas de controle e
informação processuais existentes; atuar sob as diretrizes do Conselho Nacional de Justiça em sua
coordenação de políticas públicas a respeito da violência doméstica e familiar contra a mulher.
BRASILConselhoNacionalde JustiçaVIJornadaMariada PenhaDisponívelemhps
wwwcnjjusbragendasajornadaleimariadapenhaAcessoemnov
BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. VIIJornadaMariadaPenhaDisponívelemhps
wwwcnjjusbrcnjpromoveviijornadadaleimariadapenhaAcessoemnov
Fomentaracriaçãode umaEquipeMultidisciplinarvinculadaacada Varaquetrabalha
contra a Violência Doméstica. 2. Fomentar a criação e/ou especialização de Juizados ou Varas nas
capitais e no interior. 3. Fomentar a realização de cursos de capacitação para servidores, magis-
trados e parceiros da rede. 4. Recomendar a designação de magistrado auxiliar para juízo de
origem dos Juízes das Coordenadorias Estaduais da Mulher em Situação de Violência Doméstica
eFamiliaramdegarantirquenãohajaprejuízodafunçãojurisdicionalemdecorrênciadasres-
ponsabilidades atribuídas em razão do cargo de coordenador. 5. Fomentar a implementação e o
fortalecimento das Coordenadorias Estaduais das Mulheres em Situação de Violência Doméstica
eFamiliar inclusivecom dotaçãoorçamentária especícacom vistasa possibilitara instalação
físicacriaçãodeestrutura deapoioadministrativoedeequipemultiprossional emcadaCoor-
denadoria. 6. Fomentar a criação de banco de dados estatísticos do Judiciário nacional, único, a
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
229
Realizada na Escola Paulista da Magistratura do Estado de São Paulo, a
IX edição buscou mobilizar, discutir, aprovar, revisar, publicar e divulgar
trabalhos e propostas relacionadas à promoção da efetividade da Lei Maria da
Penha, recomendada a criação do Plano Nacional de Enfrentamento à Violência
Doméstica e Familiar contra a Mulher, cujo objetivo constou na implantação de
políticaspúblicasapartirdedadossobreoperldasvítimas
A proposição incluiu orientação aos tribunais para criar núcleos de aten-
dimento aos agressores domésticos, em verdadeiro comprometimento insti-
tucionalamdeevitardesmobilizaçãodoapoioedoacompanhamentodos
trabalhos de prevenção e combate a cada mudança de gestão. Reiterada, neste
momento, a necessidade de desenvolver cursos e treinamentos, pelas escolas da
magistratura objetivando uma maior sensibilização dos juízes e dos servidores
para o tema(541).
A X Jornada promovida em agosto de 2016 realçou a efetividade da Lei
Maria da Penha atrelada ao cumprimento das medidas protetivas de urgência
no tocante às recomendações ao Poder Judiciário. A adoção de sistema virtual
para estas medidas, desde a delegacia de polícia até os tribunais, foi apontada
como imprescindível para agilizar a tramitação, tanto quanto a instalação de
sistema virtual de comunicação, monitoramento e acompanhamento(542).
Com a inclusão em sistemas de consultas integradas buscou-se interligar
o Poder Judiciário com o Sistema de Segurança Pública, Ministério Público e
Defensoria Pública, possibilitando acompanhar as medidas protetivas nas
audiências com a presença das partes. Sugeriu-se, ainda, implantar ações para
agilizar a intimação da parte autora sobre as medidas protetivas, devendo o juiz
monitorar o cumprimento para evitar a vigência por tempo indeterminado(543).
ser alimentado pelas coordenadorias estaduais, sobre a violência doméstica e familiar contra a
mulher Fomentar medidas para assegurar aefetividade e scalização do cumprimento das
medidasprotetivaspormeiodemonitoramentoeletrônicoououtrorecursoFomentaracriação
de programa de reeducação/conscientização para os agressores. 9. Criação de mecanismos para
facilitar o acesso da vítima ao sistema de justiça. 10. Fomentar a criação de fórum permanente
de discussão, na internet, para os coordenadores do Poder Judiciário Estadual. 11. Fomentar a
realização de palestras educativas nas escolas e divulgação nos veículos de comunicação com
vista à conscientização das questões de gênero. 12. Fomentar a realização de parcerias com os
demais poderes públicos e órgãos de saúde e assistência social para possibilitar a reabilitação dos
agressores usuários álcool e drogas. (BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Carta. VIIIJornadaLei
Maria da PenhaDisponívelemhpswwwcnjjusbragendasviiijornadadetrabalhosdalei-
mariadapenhaAcessoemnov
BRASILConselhoNacionaldeJustiçaCartaIX Jornada Lei Maria da Penha. Disponível em:
hpswwwcnjjusbragendasixjornadamariadapenhaAcessoemnov
BRASIL ConselhoNacional de JustiçaCarta X Jornada Lei Maria da Penha. Disponível em:
hpswwwcnjjusbragendasaedicaodajornadamariadapenhaAcessoemnov
BRASILConselhoNacionaldeJustiçaCartaX Jornada Lei Maria da Penha. Disponível em:
hpswwwcnjjusbragendasaedicaodajornadamariadapenhaAcessoemnov
Morgana de Almeida Richa
230
Nostrabalhosrealizadosnoperíodocoupatente anecessidade deos
tribunais estruturarem os Juízos Especializados com equipe multidiscipli-
nar, mediante disponibilização de verba a ser destinada ao combate à violên-
cia doméstica.
A edição comemorativa de 10 anos da Jornada teve como pauta debater
osavançoseosdesaosdaLeiMaria dePenhaconcentradaa programação
nas ações da justiça restaurativa(544) com foco na construção da “paz em casa”
para enfrentar a violência doméstica e apontar matérias a serem equacionadas
pelo órgão(545).
Com ênfase na adoção de práticas da justiça restaurativa, como forma
depacicar os casoscabíveise independente deresponsabilizaçãocriminal
aprovada uma recomendação aos tribunais estaduais no sentido de apoiar e
estimular a participação dos magistrados que atuam com a temática da violên-
cia doméstica em atividades extrajurisdicionais e com outras instituições
governamentaise não governamentais A nalidadefoiproporcionarmaior
integração e interação, valorizando essa participação no exercício das funções.
Conformesedepreendeda conceituaçãoapresentadapeloConselhoo método promove
intervenções focadas na reparação dos danos, no atendimento das necessidades da vítima e na
responsabilização do ofensor com objetivo de promover a pacificação das relações sociais. Pode ser
utilizada em crimes graves, sem necessariamente excluir o sistema criminal, pois, de fato, não deve
ser excludente de pena ao agressor. Não há um momento ideal de iniciar as práticas restaurativas:
ela pode ocorrer na fase anterior à acusação, na fase pós-acusação (antes do processo), assim como
na etapa em juízo, tanto antes do julgamento quanto durante o tempo da sentença. E pode ser uma
alternativa à prisão ou fazer parte da pena”. (Disponível em: hpswwwcnjjusbrjusticarestau-
rativa-e-aplicada-em-casos-de-violencia-domestica/. Acesso em: 09 nov. 2020).
Aprofundamentonotema da JustiçaRestaurativa Criaçãodemais varas especiali-
zadas; 3. Capacitação das equipes técnicas em questões de gênero e em Justiça Restaurativa; 4.
Fortalecimento da rede de proteção às mulheres; 5. Preservação da palavra da vítima; 6. Discussão
de um novo modelo de suspensão de processo, com a participação da vítima; 7. Melhoria da estru-
tura das varas e capacitação de seus servidores; 8. Ouvida do Ministério Público e das equipes
antes do envio de um caso para procedimento restaurativo; 9. Estudo prévio dos casos aos quais
será aplicada a Justiça Restaurativa; 10. Critérios para assegurar a voz e a proteção da mulher;
11. Investimento na capacitação em Justiça Restaurativa, com mais regulamentação sobre o como
aplicá-la na área da violência doméstica, sem trair os princípios e garantias da Lei Maria da Penha;
12. Reavaliação acerca da jurisprudência sobre o tema da violência doméstica; 13. Debate sobre
a oportunidade de aplicação da Justiça Restaurativa na área da violência doméstica e da técnica
adequada, visando a não revitimização; 14. Incompatibilidade de os membros das equipes mul-
tidisciplinares de atendimento funcionarem como facilitadores; 15. Reconhecimento de que a
Lei Maria da Penha não é do Poder Judiciário, mas fruto do movimento de defesa dos direitos
das mulheres; 16. Avaliação da aplicação da Justiça Restaurativa em crimes de violência domés-
tica apenas na fase da execução da pena; 17. Ouvida da sociedade; 18. Atenção para o fato de a
ONU não haver recomendado o uso da mediação para tratar as questões de violência doméstica.
(BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. RelatórioFinalXI JornadaLei Mariada Penha. Disponível
em hpswwwcnjjusbrwpcontentuploadsconteudoarquivoceccbfae-
16f1982ec27c65.pdf. Acesso em: 09 nov. 2020).
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
231
Para tanto, aos tribunais exortada a capacitação permanente dos magistrados,
das equipes multidisciplinares e dos facilitadores em justiça restaurativa e em
temática de gênero(546).
A edição da Jornada Maria da Penha realizada em 2018 teve por escopo
sensibilizarprossionais queatuam nosistemade justiçaesegurança públicaa
respeito da importância de aprimorar a atuação na investigação, processamento e
julgamento de homicídios dolosos praticados contra a mulher baseados no gênero.
Nessa seara, o evento enfocou o tema feminicídio e a necessidade de capa-
citação e de integração operacional do Poder Judiciário, do Ministério Público,
da Defensoria Pública, da Polícia Civil e da Polícia Militar, para implementar
as diretrizes nacionais para investigar, processar e julgar com perspectiva de
gênero as mortes violentas de mulheres – feminicídios, além de integrar as insti-
tuições responsáveis por aplicar as normas de proteção aos direitos das mulhe-
res, com o intuito de multiplicar ações concretas para capacitar e aperfeiçoar a
investigação, o processo e o julgamento da morte violenta de mulheres, com
perspectiva de gênero(547).
Finalmente, as XIII e XIV Jornadas, realizadas em 2019 e 2020, tiveram
o desiderato de avaliação e gestão dos riscos de violência doméstica e fami-
liar; apresentação do Formulário Nacional de Avaliação de Risco de Violência
Doméstica do CNJ; conscientização acerca da necessidade de integração opera-
cional do Poder Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública com
as áreas de segurança pública; e do fomento da capacitação de magistrados para
aadequadaidenticaçãoegestãodoriscodeviolênciadomésticaefamiliar(548).
Relativamente à última edição cumpre o registro da utilização de meios
telemáticosemespecícoa plataformaCisco Webexcomtransmissãoaovivo
pelo canal do CNJ no Youtube, quando avaliada a violência doméstica em
mulheres vulneráveis, em quatro abordagens: mulheres que residem no campo,
mulheres refugiadas, mulheres indígenas e mulheres negras(549).
O Fórum Permanente de Juízes de Violência Doméstica e Familiar contra
a Mulher (FONAVID), instituído em 31.03.2009, durante a III Jornada, amplia
o lastro da política pública nas ações de enfrentamento das demandas pelo
Poder Judiciário(550).
BRASILConselhoNacionaldeJustiçaCartaXI Jornada Lei Maria da Penha. Disponível em:
hpswwwcnjjusbragendasxijornadaleimariadapenhaAcessoemnov
BRASIL Conselho NacionaldeJustiça Disponível emhpswwwcnjjusbragendas
xiijornadaleimariadapenhaAcessoemnov
BRASIL ConselhoNacional deJustiça XIIIJornada LeiMaria daPenha Disponívelem
<hpswwwcnjjusbragendasxiiijornadaleimariadapenha. Acesso em: 09 nov. 2020.
BRASIL ConselhoNacional de JustiçaXIV Jornada LeiMaria daPenhaDisponívelem
<hpswwwcnjjusbragendasxivjornadaleimariadapenha. Acesso em 09 nov. 2020.
ComoresultadodosacordospormeiodoTermodeCooperaçãoTécnicaSRJMJn
foi estabelecido que o FONAVID terá, por tempo indeterminado, o apoio do Conselho Nacional
Morgana de Almeida Richa
232
Em primeiro lugar, porque a multiplicidade de atores envolve além da
triangulação do Conselho Nacional de Justiça com o Ministério da Justiça e a
Secretaria para as Políticas para as Mulheres (SPM), também a atuação conjunta
da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), da Escola Nacional de Forma-
ção e Aperfeiçoamento de Magistrados (ENFAM).
A condução permanente do debate pauta as ações do Fórum cujo manan-
cial de destaque está no compartilhamento de experiências e decisões na esteira
da compreensão dos aspectos jurídicos sobre a legislação.
Embora com abordagem similar às temáticas das Jornadas anuais, os
encontros do Fórum Permanente de Juízes de Violência Doméstica e Familiar
contra a Mulher resultam na formulação de Enunciados para orientar os opera-
dores do direito, na medida em que é intensaacontrovérsiasobreasdenições
e os conceitos abarcados pela legislação ainda recente no ordenamento jurídico.
Entre as várias discussões que marcaram a atuação do Fórum Perma-
nente de Juízes de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher sobressaem:
a garantia de vínculo trabalhista à vítima de violência doméstica, a gestão de
conitosfamiliaresaconcessãodasmedidasprotetivasoslimiteseosconitos
de competência entre os Juizados e as Varas de Violência doméstica e Varas de
Família. Atualmente são 56 enunciados(551).
Dos encontros anuais, relevante ressaltar em 2018 a abordagem ‘Violên-
ciasMachistas Desaos do Sistema de Justiça quedebateu a violência de
gênero em um diálogo entre o direito e outras áreas da ciência como a socio-
logia e a psicologia.
Há que se distinguir ainda o programa de ação ‘Justiça pela Paz em Casa’,
para julgar ações relativas a casos de violência doméstica e familiar contra a
mulher, sensibilizar e conscientizar sobre o tema, esforço concentrado reali-
zado ao longo de três semanas do ano(552). Incorporada à política judiciária
nacional de enfrentamento à violência contra as mulheres, tornou-se uma ação
permanente dos Tribunais de Justiça dos Estados e Distrito Federal(553) em
compromissormadocomoConselhoNacionaldeJustiça
de Justiça (CNJ), da Escola de Formação e Aperfeiçoamento dos Magistrados (ENFAM), da Secre-
taria de Reforma do Poder Judiciário do Ministério da Justiça (SRJ/MJ), da Secretaria de Polí-
ticas para as Mulheres (SPM) e da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), objetivando o
suporteinstitucionalenanceiroparaaconsecuçãodeseusobjetivos
Disponíveis em hpswwwcnjjusbrprogramaseacoesviolenciacontraamulher
forum-nacional-de-juizes-de-violencia-domestica-e-familiar-contra-a-mulher-fonavid/enun-
ciados/. Acesso em: 09 nov. 2020.
Nosmesesdemarçodiainternacional damulheragostodata daLeiMariadaPenhae
novembro (dia internacional para eliminação da violência contra as mulheres).
OConselhoNacionaldeJustiçainstitucionalizouaCampanhacomoprogramapermanente
por meio da Portaria n. 15, de 08.03.2017.
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
233
NecessáriopormregistrarqueoprotagonismodoConselhonacoordena-
ção, elaboração e execução de políticas públicas judiciárias relativas às mulheres
em situação de violência no espaço jurídico de atribuições do Poder Judiciário
resultoumaisrecentementenaPortariandedenidoradaPolítica
Judiciária Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres.
Dentre as principais premissas, o texto incentiva a criação de unidades
judiciárias especializadas, a constante capacitação, o aperfeiçoamento dos siste-
mas informatizados para coletar dados estatísticos, destaca a importância das
coordenadorias estaduais da mulher, estabelece a forma de concretização das
atividades para alcançar resultados e incorpora o programa ‘Justiça pela Paz em
Casa’ como ação permanente.
Comotodealteraraculturadaviolênciadomésticaapolíticajudiciária
nacional avança ao prever a aproximação dos tribunais e do Poder Executivo
para inserir nos currículos escolares conteúdos relativos aos direitos humanos,
igualdade de gênero, de raça ou etnia e combate à violência contra a mulher.
Entidades públicas e não governamentais poderão participar das ações, como
parceiras, sobretudo nas áreas de segurança pública, assistência social, educa-
ção, trabalho e habitação.
Em última análise, a violência contra a mulher guarda um caráter singu-
lar enquanto política pública judiciária, haja vista o paralelismo da Lei Maria da
Penhacom a inclusão na agendadoConselhoNacionalde Justiça denida de
imediatoaconguraçãoespelhadanainiciativadoPoderJudiciárioamdeque
o novo regramento pudesse, pela mesma via estrutural, encontrar efetividade na
somatória de parceiros e ações envolvidas, para mudar o contexto das mazelas do
Poder Público no que diz respeito ao sistema de justiça.
É fatoqueaLeiMariadaPenhadeniuumapolíticapúblicaAlémdisso
a faceta de atuação do Judiciário preserva identidade própria dentro do espaço
de inserção no sistema de justiça. Isto porque não basta a política pública de
iniciativa do Poder Executivo, pois o que as diferencia é justamente o escopo
de atingir internamente ações mediante o protagonismo somado a partir da
agenda de cada protagonista.
Vale dizer, a política pública judiciária mantém o viés de resolução da
problemática intrínseca ao funcionamento da matéria no Poder Judiciário.
Por certo a institucionalização do tema pelo Conselho Nacional de Justiça
tem nos standards da ação institucional pretensão de perenidade. Em outras pala-
vras, procura-se com isso evitar a quebra de continuidade para obter o efeito
transformador dos problemas que atingem a prestação jurisdicional no tema da
violência doméstica.
Outro elemento merecedor de arremate é o suporte normativo expresso
no texto legal, concebida uma política pública de proteção contra a violência
doméstica, juntamente com a previsão dos meios necessários aos resultados,
circunstanciados os atores e previsto um conjunto articulado de ações.
Morgana de Almeida Richa
234
Dos contornos da atuação institucional emerge, por consequência, que de
maneira inédita ações foram (e permanecem) desenvolvidas pelo Poder Judi-
ciário nacional, coordenadas pelo órgão administrativo de cúpula desse poder,
para democratizar o acesso à justiça e fortalecer as instituições responsáveis por
reduzir os índices de violência contra as mulheres, combater a impunidade e
promover a paz.
4.5. Programa Trabalho Seguro
O cerne do nosso sistema jurídico constitucional atribui ao tema da saúde
peculiaridade que o distingue, pois expressamente albergado na Constituição
Federal junto a políticas públicas para resguardar as garantias previstas. Embora
evidentetratarsede tarefa atribuída ao Poder Executivo o uxo de deman-
das judiciais envolvendo a matéria, também disciplinada pelos normativos de
proteçãona seara trabalhista exigiuumapolítica pública judiciária especíca
para prevenir riscos de acidentes do trabalho e saúde do trabalhador.
Com efeito, dentre os direitos sociais regulamentados na Constituição Fede-
ral de 1988, estatui o artigo 196 que a saúde é direito de todos e dever do Estado,
garantidomediantepolíticas sociaiseeconômicasdestinadasàreduçãodo risco
de doença e de outros agravos, além do acesso universal e igualitário às ações e
serviços para sua promoção, proteção e recuperação.
O direito à saúde foi reconhecido internacionalmente na Declaração Univer-
sal de Direitos Humanos, proclamada pela Assembleia das Nações Unidas em
10.12.1948, prescrito no artigo 25, § 1º: “todo ser humano tem direito a um padrão
de vida capaz de assegurar-lhe, e a sua família, saúde e bem-estar”.
Ainda na seara dos documentos externos(554), atribui-se aos Estados signatá-
rios a obrigação de assegurar o direito de toda pessoa a desfrutar o mais elevado
nível possível de saúde física e mental.
No campo do direito do trabalho, a Constituição da Organização Inter-
nacional do Trabalho, no preâmbulo, ressaltou a necessidade de proteger os
trabalhadores contra as moléstias graves ou prossionais e os acidentes do
trabalho”(555), como elemento de justiça social.
Atenta à realidade crescente no que tange aos acidentes de trabalho nas
diversas localidades do planeta, a Organização Internacional do Trabalho,
PromulgadonoBrasilapartirdoDecretondeDisponívelemhpwww
planaltogovbrccivildecretodhtm. Acesso em: 10 nov. 2020.
Disponível em hpswwwiloorgwcmspgroupspublicamericasrolimailo-
brasiliadocumentsgenericdocumentwcmspdfAcessoemnov
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
235
em 1947, aprovou a Convenção n. 81(556), dispondo que a inspeção do trabalho
“deverá ser informada dos acidentes de trabalho e dos casos de enfermidade
prossional nos casos e da maneira determinados pela legislação nacional
(artigo 14).
O artigo 20 da norma estrangeira estabelece ainda que “a autoridade central
de inspeção publicará um relatório anual de caráter geral sobre os trabalhos de
inspeção submetidos a seu controle”, devendo conter as estatísticas de acidente
de trabalho (alínea “f”).
Em 1981, aprovada a Convenção da Organização Internacional do Traba-
lho n. 155, segundo a qual os Estados aderentes devem formular, por em
prática e reexaminar periodicamente uma política nacional coerente a respeito
de segurança e saúde dos trabalhadores e do meio ambiente do trabalho, tendo
por objetivo “a prevenção dos acidentes e dos perigos para a saúde resultantes
do trabalho quer estejam relacionados com o trabalho quer ocorram durante o
trabalho, reduzindo ao mínimo as causas dos riscos inerentes ao ambiente de
trabalho” (artigos 4º, 1 e 2)(557).
O artigo 7º do mesmo instituto determina que a situação em matéria de
segurança e saúde dos trabalhadores e meio ambiente de trabalho deverá ser
examinada de forma contínua, globalmente ou em relação a setores determi-
nadoscomanalidadede identicaros principaisproblemaselaborarmeios
ecazesparasoluçãodeniraordemdeprioridadedasmedidasnecessáriase
avaliar os resultados.
Em alinhamento, o artigo 8º estabelece que os Estados-membros devem
providenciar, por via legislativa ou regulamentar, ou por qualquer outro método
de acordo com as organizações representativas de empregadores e de trabalha-
dores interessados, as medidas necessárias a efetivar o artigo 4º, incluindo as
destinadas à orientação dos empregados e trabalhadores (artigo 10º).
A previsão contida no artigo 11 desse Diploma, no sentido de que as auto-
ridades competentes deverão garantir a realização progressiva de tarefas, prevê
o estabelecimento e a aplicação de procedimentos para a declaração de aciden-
tesdotrabalho edoenças prossionaisporpartedosempregadoresequando
pertinente, das instituições seguradoras ou outros organismos ou pessoas dire-
tamente interessadas, e ainda, a elaboração de estatísticas anuais sobre acidentes
dotrabalhoedoençasprossionaisalíneac
Interessante apontar a diretiva do normativo internacional, ao estabelecer
dentre as tarefas a serem desempenhadas pelo Estado na consecução dos objetivos
PromulgadanopaíspeloDecretonde
Disponível em hpswwwiloorgbrasiliaconvencoesWCMSlangptindex
htmAcessoemnov
Morgana de Almeida Richa
236
previstos, a publicação anual de informações sobre as medidas adotadas para
aplicação da política de prevenção de acidentes do trabalho.
Nesse contexto, considerada a realidade brasileira dos acidentes do traba-
lho e doenças ocupacionais(558), desconectada daquela estatuída pelas normas
queregulamentam o tema especicamente a Convenção n da Organi-
zaçãoInternacionaldo Trabalho raticada pelo Brasil por meiodoDecreto
n. 1.254/1994, adotou-se integradora conformação pelo Poder Judiciário,
no âmbito de sua competência, para alavancar uma política pública interna
voltada à execução de projetos e ações nacionais para prevenção.
No cenário histórico, importa contextualizar o nascimento do Programa
Nacional de Prevenção de Acidentes de Trabalho (Programa Trabalho Seguro),
materializado em decorrência do número alarmante de acidentes do trabalho e
doenças ocupacionais, dos custos sociais, previdenciários e trabalhistas, a par do
expressivo número de processos ajuizados na justiça especializada.
Em maio de 2011, o presidente do Tribunal Superior do Trabalho e do
Conselho Superior da Justiça do Trabalho, ministro João Oreste Dalazen, assi-
nou recomendação conjunta, orientando desembargadores e juízes do trabalho
a priorizar a tramitação e o julgamento de processos relativos a acidentes do
trabalho. A recomendação, subscrita pelo corregedor-geral da Justiça do Traba-
lhoministroAntônioJoséBarrosLevenhagenocorreuduranteasolenidadede
comemoração dos 70 anos da instalação da Justiça do Trabalho no Brasil(559).
Essa foi a primeira medida concreta do protocolo de Cooperação Técnica
rmado pelo Tribunal Superior do Trabalho com os Ministérios da Saúde
do Trabalho e Emprego, da Previdência Social, Advocacia-geral da União e
Duranteo anobaseforam registradosacidentes dotrabalhoDo totalregis-
trado com CAT, os acidentes típicos representaram 75,5%; os de trajeto 22,5% e as doenças do
trabalho 2%. As pessoas do sexo masculino participaram com 68,85% e as do sexo feminino 31,13%
nos acidentes típicos; 59,48% e 40,51% nos de trajeto; e 56,52% e 43,48% nas doenças do trabalho.
Nos acidentes típicos, a faixa etária decenal com maior incidência de acidentes foi de 30 a 34
anos, com 16,13% do total de acidentes registrados. Nos acidentes de trajeto e nas doenças de
trabalho, a faixa com maior incidência foi de 25 a 29 anos e 35 a 39 anos com, respectivamente,
e das ocorrências registradas ANUÁRIO ESTATÍSTICO DA PREVIDÊNCIA
SOCIAL Disponível em hpswwwgovbrprevidenciaptbracessoainformacaodados-
abertosarquivosaeatpdfAcessoemnovAlémdessesnúmerosoutrosdados
apontamqueasituaçãopodeseraindamaisgrave consideradaasubnoticaçãodos acidentes
decorrentes da falta de emissão da CAT pelas empresas (sem CAT registrada somaram 99.536
acidentes). O Anuário Estatístico ressalta, outrossim, que os indicadores de acidentes do trabalho
são os itens avaliados para poder mensurar e avaliar a exposição dos trabalhadores aos níveis de
riscodeacordocom aatividadeeconômicabem assimoacompanhamentodasutuaçõesedas
tendências históricas dos acidentes e seus impactos nas empresas e na vida dos trabalhadores.
Disponível em hpswwwtstjusbrwebtrabalhosegurotramitacaoprioritaria
Acesso em: 10 nov. 2020.
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
237
Conselho Superior da Justiça do Trabalho. O protocolo teve a adesão do Minis-
tério da Saúde.
Lançado no evento o Programa Nacional de Prevenção de Acidentes de
Trabalho, com a apresentação de vídeo institucional sobre o tema e destaque
ao desenvolvimento de campanha institucional de rádio, TV, mídia impressa
e internet para alertar a gravidade da situação relativa aos acidentes do traba-
lho. Na ocasião, o presidente do Tribunal Superior do Trabalho e do Conselho
SuperiordaJustiçadoTrabalhoarmouqueosdadosociaissãouma“pálida
imagem” da grave situação, seja porque não abrangem o trabalho informal,
seja pelo fato de muitas empresas deixarem de comunicar o acidente à Previ-
dência Social(560).
Em tal espectro, o Programa Trabalho Seguro (Programa Nacional de
Prevenção de Acidentes de Trabalho) desponta como uma política pública judi-
ciária de iniciativa do Conselho Superior da Justiça do Trabalho e do Tribunal
Superior do Trabalho, em parceria com diversas instituições públicas e priva-
das. Seu objetivo é formular e executar projetos e ações nacionais voltados à
prevenção de acidentes do trabalho e fortalecer a Política Nacional de Segurança
e Saúde no Trabalho, de modo a contribuir para diminuir o número de acidentes
e, por consequência, reduzir o número de ações no tema (demandas trabalhistas,
acidentárias e previdenciárias).
No plano interno, a Política Nacional de Segurança e Saúde do Trabalho
(PNSST), promulgada pelo Decreto n. 7.602/2011, buscou atender à disposi-
ção contida no artigo 4º da Convenção n. 155 da Organização Internacional do
Trabalho, constituindo um importante marco na promoção da saúde e da segu-
rança dos trabalhadores, ao eliminar ou reduzir riscos no ambiente de trabalho,
elevando a prevenção à condição de princípio.
Curto lapso temporal decorreu até a regulamentação do Programa com
a Resolução n. 96/2012 do Conselho Superior da Justiça do Trabalho. Destaca-
-se a possibilidade de garantir sua consecução mediante orçamento próprio e
especícoparadesenvolverações eprojetos inclusivedestinados aosTribu-
nais Regionais Trabalhistas(561).
Disponível em hpwwwtstjusbrwebtrabalhoseguroapresentacaoAcessoem
nov. 2020.
Inicialmenteem oConselhoSuperiordaJustiçadoTrabalho destinouRmilhões
para o Programa com repasse parcial a todos os Tribunais Regionais. (Disponível em: <hp
www.premioinnovare.com.br/praticas/l/programa-nacional-de-prevencao-de-acidentes-de-tra-
balhoprogramatrabalhoseguro. Acesso em: 10 nov. 2020). Em 2017, foram destinados R$ 4
milhões ao Trabalho Seguro (Disponível em: <httpsjuslaboriststjusbr. Acesso em: 06 mar.
2018). Em 2018, o Conselho Superior da Justiça do Trabalho disponibilizou R$ 1 milhão ao Pro-
grama. (Disponível em: <hpastrtjusbr. Acesso em: 06 mar. 2018).
Morgana de Almeida Richa
238
Assentado, portanto, o Programa Trabalho Seguro no âmbito da Justiça do
Trabalho, as atividades são norteadas pelas seguintes linhas de atuação: (i) polí-
tica pública: colaborar na implementação de políticas públicas de defesa do meio
ambiente, da segurança e da saúde no trabalho e de assistência social às vítimas
de acidentes de trabalho; (ii) diálogo social e institucional: incentivar o diálogo
com a sociedade e com instituições públicas e privadas, notadamente por meio
de parcerias voltadas a cumprir os objetivos do Programa; (iii) educação para a
prevençãodesenvolveraçõeseducativaspedagógicase de capacitação pros-
sional em todos os níveis de ensino, diretamente a estudantes, trabalhadores
e empresários; (iv) compartilhamento de dados e informações: incentivar o
compartilhamento e a divulgação de dados e informações sobre saúde e segu-
rança no trabalho entre as instituições parceiras, prioritariamente por meio
eletrônicovestudosepesquisaspromoverestudosepesquisassobrecausas
econsequênciasdosacidentesdetrabalhonoBrasiletemasconexosamde
auxiliar no diagnóstico e no desenvolvimento de ações de prevenção e de redu-
çãodos custossociaisprevidenciários trabalhistas eeconômicosdecorrentes
(vi) efetividade normativa: adotar ações e medidas necessárias ao cumprimento
dasnormasinternase internacionaisraticadas peloBrasilsobresaúdesegu-
rança e meio ambiente de trabalho, assim como ao aperfeiçoamento da legisla-
çãovigenteviieciênciajurisdicionalincentivaratramitaçãoprioritáriados
processos relativos a acidentes de trabalho e ao ajuizamento de ações regressi-
vas nas hipóteses de culpa ou dolo do empregador(562).
Do sintético traçado das principais diretrizes da Resolução n. 96 do Conse-
lho Superior da Justiça do Trabalho, percebe-se o Poder Judiciário atuando
ativamente a partir da administração de uma política pública judiciária voltada
a promover estratégias, prioridades e ações no âmbito das relações laborais, em
resposta às demandas sociais e aos anseios da coletividade. Busca-se, outrossim,
promover contínuas mudanças no processo de produção e no meio ambiente do
trabalhofomentandoa importânciadaeducaçãoedacapacitaçãoprossional
para prevenir acidentes por meio de estratégias de redução de riscos(563).
Além disso, destaca-se dentre os principais objetivos da política pública
judiciária o desenvolvimento de um banco de dados e de informações a serem
compartilhadasentreosórgãosdaAdministraçãoPúblicaamdeaperfeiçoar
a metodologia estatística utilizada e formar um quadro único acerca dos dados
referentes a acidentes do trabalho para todos os envolvidos no Programa(564).
BRASILTribunalSuperiordoTrabalho ProgramaTrabalhoSeguro. Disponível em: <hp
wwwtstjusbrwebtrabalhoseguroregulamentacao. Acesso em: 10 nov. 2020.
DemodogeralagestãoderiscodeveserpensadanoBrasilapartirdestaspremissasmais
evoluídas.
BRASILTribunalSuperiordoTrabalho ProgramaTrabalhoSeguro. Disponível em: <hp
wwwtstjusbrwebtrabalhoseguroregulamentacao. Acesso em: 10 nov. 2020.
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
239
Não seria possível cumprir com os objetivos de um programa de tamanha
dimensão sem o comprometimento dos diversos entes que gravitam na proble-
mática envolvendo doenças e acidentes do trabalho. Uma das mais relevantes
etapas do Programa envolve a articulação entre instituições públicas federais,
estaduais e municipais, abrangendo a aproximação com os atores da sociedade
civil, como empregados, empregadores, sindicatos, Comissões Internas de
Prevenção de Acidentes (CIPAs), além de instituições de pesquisa e de ensino.
Assim, institucionalizadas e sistematizadas ações de prevenção de acidentes
do trabalho no âmbito da Justiça do Trabalho diante do Protocolo de Cooperação
TécnicarmadopeloTribunalSuperiordoTrabalhoConselhoSuperiordaJustiça
do Trabalho, Ministério do Trabalho e Emprego, Ministério da Saúde, Ministério
da Previdência Social e da Advocacia-Geral da União, ao qual aderiram todos os
Tribunais Regionais do Trabalho e diversas instituições públicas e privadas(565).
Concomitantemente, para o desenvolvimento das atividades em concreto
foi criado o Comitê Interinstitucional(566), destinado a conjugar esforços para
implementar os projetos e as ações nacionais voltadas a prevenir acidentes do
trabalho e fortalecer a Política Nacional de Segurança e Saúde do Trabalho(567),
indicados magistrados para atuar como gestores nacionais e regionais, vale
dizer, responsáveis pela condução da política pública judiciária.
No âmbito interinstitucional, a atuação conjunta dos parceiros alarga a
envergadura do Programa Trabalho Seguro para além do Judiciário trabalhista,
na senda de diversos projetos desenvolvidos pela somatória das contribuições
individuaisdosentesenvolvidosnamedidadascompetênciasespecícas(568).
A despeito da importância de todas as parcerias, destaca-se a atuação do
Ministério do Trabalho, pelo papel nas normas regulamentadoras relativas à
Disponívelemhpwwwtstjusbr. Acesso em: 10 nov. 2020.
Formado o Comitê por representantes do Tribunal Superior do Trabalho do Conselho
Superior da Justiça do Trabalho, dos Ministérios da Saúde, da Previdência Social e do Trabalho e
Emprego, da Fundação Jorge Duprat Figueiredo, de Segurança e Medicina do Trabalho (FUNDA-
CENTRO), do Instituto Nacional do Seguro Social, da Advocacia Geral da União e do Ministério
Público do Trabalho. Disponível em: <hpswwwtstjusbrwebtrabalhosegurooquesaoaci-
dentesdetrabalho. Acesso em: 10 nov. 2020.
AsatribuiçõesdoComitêsãodescritasdaseguinteformaproporplanejareacompanharos
programas e as ações pactuados; implementar políticas públicas permanentes em defesa do meio
ambiente do trabalho; promover estudos e pesquisas sobre causas e consequências dos acidentes de
trabalhoamdeauxiliar naprevençãoenaredução doscustossociaiseeconômicosdecorrentes
fomentaraçõeseducativasepedagógicasamdesensibilizarasociedadecivilsobreanecessidade
de combater os riscos no trabalho; promover e conferir efetividade às Convenções internacionais
raticadaspeloBrasilqueversemsobresegurançaesaúdedostrabalhadorescriarealimentarum
banco de dados comum, com informações necessárias ao alcance do objeto do Protocolo.
EmoProgramacontavacommaisdeinstituiçõesparceirasDisponívelemhp
wwwpremioinnovarecombr. Acesso em: 10 nov. 2020.
Morgana de Almeida Richa
240
segurança e à medicina do trabalho. Na outra ponta, o Ministério da Previdên-
cia e Assistência Social incorpora a faceta complexa das estatísticas e dos bene-
fícios concedidos em razão de acidentes e doenças do trabalho, constituindo
elemento relevante nas ações do Programa. Por sua vez, a Fundacentro(569)
agregacontribuiçãoexpressivanaeciente divulgaçãode estudosepesquisas
sobre segurança e medicina do trabalho.
Um país de dimensão continental como o Brasil demanda capilaridade
judiciária nacional para atingir seus propósitos. Assim é que dentre as diretrizes
dessa política pública para promover a saúde do trabalhador, a norma regula-
mentar instrumentaliza a celebração de parcerias diretamente pelos Tribunais
Regionais do Trabalho como mecanismo para reduzir o número de acidentes do
trabalho no âmbito de atuação regional.
Reunindo as duas pontas do funcionamento judiciário encontra-se a matriz
para a condução do Programa, em âmbitos nacional e regional, ambos coorde-
nados pelas administrações dos Tribunais respectivos. Na efetividade das ações
regularmente previstas, o Comitê Gestor Nacional e os Gestores Regionais são
os responsáveis pela coordenação da política pública judiciária.
No que tange à gestão nacional, é competência do Presidente do Conse-
lho Superior da Justiça do Trabalho coordenar globalmente as atividades do
Programa Nacional de Prevenção de Acidentes de Trabalho, auxiliado por um
comitê designado especicamente para conceber e gerenciar atividades na
vertente da política judiciária nacional em curso.
Oalcancedestinadoaobterefeitoreexoregionaldasaçõesamderever-
berar a mesma linguagem nacional na comunicação para a melhor qualidade
de resultados, em acréscimo à mudança global da cultura, é atingido pela atua-
ção direta dos Tribunais Regionais, aos quais incumbe designar, igualmente,
gestores regionais e equipes indicadas para desenvolver as atividades técnicas e
operacionais do Programa no contexto de sua atuação.
AFundacentrofoicriadaocialmenteemquandoapreocupaçãocomosaltosíndices
de acidentes e doenças do trabalho crescia no Governo e entre a sociedade”, voltada para o estudo
e pesquisa das condições dos ambientes do trabalho, com a participação de todos os agentes sociais
envolvidos na questão. Com sua vinculação ao Ministério do Trabalho em 1974, cresceram as atribui-
ções e atividades da instituição, exigindo um novo salto da entidade: a implantação do Centro Téc-
nico Nacional, cuja construção teve início em 1981, sendo concluído em 1983, no bairro de Pinheiros,
em São Paulo. Atualmente, a Fundacentro é liderança na América Latina no campo da pesquisa na
área de segurança e saúde no trabalho, designada como centro colaborador da Organização Mun-
dial da Saúde (OMS), além de colaboradora da Organização Internacional do Trabalho (OIT). No
tocante às políticas públicas em SST, abre espaço para divulgação e participação de pesquisadores
em comissões e grupos que tenham como objetivo discutir ou formular normas, diretrizes e docu-
mentos referentes a diferentes temas e áreas que compõem as Políticas Públicas em SST. (Disponível
emhpswwwgovbrfundacentroptbrAcessoemnov
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
241
No âmbito das atribuições nacionais e regionais deve estimular, coordenar
e implementar as ações de prevenção de acidentes do trabalho, em colabora-
ção com os órgãos envolvidos; atuar na interlocução com os demais gestores,
relatandoas açõesdesenvolvidasas diculdades encontradaseos resultados
alcançados; promover e coordenar ações educativas voltadas a empregados,
empregadores, estudantes, sindicatos, escolas e demais entidades públicas e
privadas no propósito de fomentar a cultura de prevenção de acidentes por
meio da educação; divulgar e distribuir os materiais produzidos e recomenda-
dos pelo programa; acompanhar o cumprimento dos planos de ação, as metas,
as recomendações, as resoluções e os compromissos relativos ao Programa(570).
Em outras palavras, os protagonistas da política pública judiciária concer-
nente ao Programa Trabalho Seguro são os gestores responsáveis por conduzir
as ações planejadas, envolvida toda cadeia de atos necessários para elaborar e
executarobjetivosAconduçãoocialdomodeloemquestãoestáassentadano
tripéemqueguramcomopolicymakers o Conselho Superior do Tribunal de
Justiça e os grupos gestores nacional/regional.
O panorama nacional trazido à luz mostrou, segundo a complexidade
descrita, a premência de fomentar e difundir ações permanentes de prevenção
de novos litígios e de defesa do meio ambiente, da segurança e saúde no traba-
lho, além de promover a cidadania e a responsabilidade socioambiental, como
objetivos perseguidos para redimensionar os fatores de risco.
As múltiplas situações em que as iniciativas devem ser desenvolvidas pelos
grupos gestores são estabelecidas por meio de metas escolhidas pelos fazedores
ociais que nacionalmente instituem as diretrizes para o cumprimento pelos
Tribunais Regionais do Trabalho, respeitado o elenco de prioridades avaliadas(571).
Conformeartigoº da Resolução n. 96 do Conselho Superior da Justiça do Trabalho.
Biênio META – Desenvolver e implementar plano de comunicação que dê
maiorvisibilidadeaosobjetivosdoProgramaTrabalhoSeguroparansdeconscientizaçãodetra-
balhadores, empregadores e sociedade em geral quanto à necessidade de prevenção de acidentes
de trabalho e doenças ocupacionais. META 2 – Promover ações educativas continuadas, voltada
a estudantes, trabalhadores e empregadores, fomentando a inclusão do tema saúde e segurança
no trabalho em todos os níveis de ensino, preferencialmente com uso de material pedagógico do
Programa Trabalho Seguro. META 3 – Divulgar mensagens educativas sobre saúde, segurança e
meio ambiente de trabalho, com foco na prevenção de acidentes de trabalho, por mecanismos de
comunicação de massa com campanha publicitária específica. META 4 – Realizar evento anual
abrangente e multidisciplinar, para discussão de temas relacionados à prevenção de acidentes de
trabalho e doenças ocupacionais, preferencialmente quanto ao trabalhador rural, no ano de 2014.
META 5 – Instituir banco de dados de boas práticas na gestão de processos relativos a acidentes
do trabalho e doenças ocupacionais. META 6 – Instituir, no âmbito dos Regionais, a Semana de
promoção de saúde no trabalho e prevenção de acidentes no TRT, voltada a magistrados, servi-
dores e terceirizados. Biênio 2016-2017: META 1 Realizarumeventocientícomultidisciplinar
na jurisdição do Tribunal Regional sobre o tema dos transtornos mentais relacionados ao trabalho.
META 2 – Desenvolver o Programa de prevenção de transtornos mentais também no âmbito da
Morgana de Almeida Richa
242
Explicitadas as diretrizes gerais de ação, merece destaque a realização perió-
dica de Seminários de Prevenção de Acidentes do Trabalho no Tribunal Supe-
rior do Trabalho, contendo a discussão dos temas de maior vulnerabilidade na
segurança e saúde do trabalhador. Exemplo marcante ocorreu em 2011, quando
assinada a Carta de Brasília, documento que sintetiza a compreensão sobre os
principais aspectos que repercutem no aperfeiçoamento da proteção ao meio
ambiente laboral(572). No Seminário, foi proposto um posicionamento do Estado,
Justiça do Trabalho, envolvendo magistrados e funcionários, devendo realizar a “Semana de Pre-
venção de Acidentes e Doenças Ocupacionais”, preferencialmente abrangendo a semana do dia
28 de abril de 2017. META 3 – Divulgar por todos os meios possíveis mensagens educativas sobre
saúde, segurança e meio ambiente do trabalho, com ênfase para o tema deste biênio. META 4
– Aprofundar o relacionamento institucional com os parceiros locais do Programa do Trabalho
SeguropararealizareventosconjuntoseintensicarocompartilhamentodeinformaçõesMETA
ContribuircomoTribunalRegionalnacriaçãodocadastrodeprossionaispararealizaçãode
perícias, especialmente nas demandas sobre acidentes do trabalho e doenças ocupacionais. Biênio
2018-2019: META 1. Realizar Ato Público para divulgação do tema do biênio, preferencialmente
comparticipaçãodeexpositordereferêncianamatériaMETARealizareventocientícomulti-
disciplinar na jurisdição do Tribunal Regional sobre o tema do biênio. META 3. Produzir proposi-
çõesdemelhoriainstitucionaldecididasapartirdecadaeventocientícoMETAIntensicara
atuação no Comitê Interinstitucional local para realização de ações conjuntas com ênfase no tema
do biênio. META 5. Cooperar para implementação da Resolução CNJ n. 240/2016, que estabelece
a Política Nacional de Gestão de Pessoas do Poder Judiciário, em sintonia com a Resolução CNJ
n. 207/2015, que estabelece a Política de Atenção Integral à Saúde de Magistrados e Servidores,
inclusive nas Escolas Judiciais. META 6. Realizar em 2019 o V Seminário Internacional sobre pre-
venção de acidentes do trabalho e doenças ocupacionais no Tribunal Superior do Trabalho. META
7. Promover gestões em Escolas Judiciais, instituições de ensino, OAB etc. para inclusão do tema
de segurança, saúde e meio ambiente do trabalho nos currículos e nos programas de concurso.
As percepções dosexpositoresforam consolidadas no documento a seguir transcrito
CARTADE BRASÍLIA SOBRE PREVENÇÃO DE ACIDENTES DE TRABALHO Os partici-
pantes do Seminário de Prevenção de Acidentes de Trabalho, organizado e promovido pelo Tri-
bunal Superior do Trabalho, entre 20 e 21 de outubro de 2011, vêm a público para: 1. Expressar
perplexidade e preocupação com o número acentuado e crescente de acidentes e doenças rela-
cionados ao trabalho no País, que atinge diretamente a dignidade da pessoa humana, um dos
fundamentos da República; 2. Alertar as empresas de que acidentes de trabalho são previsíveis
e, por isso, evitáveis, razão pela qual prevenção e gestão de riscos constituem investimento,
enquanto reparação de danos implica prejuízo; 3. Recordar que é dever do empregador cumprir
e fazer cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho (CLT, artigo 157), obrigação do
empregado colaborar no seu cumprimento (CLT, artigo 158), e atribuição do Estado promover
arespectivascalizaçãoCLT, artigo 156), de modo a construir-se uma cultura de prevenção de
acidentesArmarqueum ambientedetrabalhoseguroesaudáveldeveter primaziasobre
o recebimento de adicionais compensatórios pelas condições desfavoráveis; 5. Registrar que o
avanço do Direito Ambiental deve alcançar os locais de trabalho, para assegurar aos trabalha-
doresummeioambientesegurosaudáveleecologicamenteequilibradoExigiroelcumpri-
mento do artigo 14 da Convenção n. 155 da OIT, em vigor no Brasil desde 1993, segundo o qual
questões de segurança, higiene e meio ambiente do trabalho devem ser inseridas em todos os
níveisdeensinoede treinamentoincluídosaquelesdo ensinosuperiortécnicoe prossional
com o objetivo de satisfazer as necessidades de treinamento de todos os trabalhadores; 7. Con-
clamarpelaraticaçãourgentedaConvençãondaOrganizaçãoInternacionaldoTrabalho
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
243
empresas, trabalhadores e sociedade em geral no que concerne ao grave quadro
dos acidentes de trabalho no país.
Na linha prática da atuação, relevante registrar as Resoluções do Conse-
lho Superior da Justiça do Trabalho n. 98/2012 e n. 103/2012. A primeira dispõe
sobre a inclusão de exigências de capacitação em saúde e segurança no traba-
lhonoseditais e contratos administrativos rmados pelos Tribunais Regio-
nais do Trabalho. Dessa forma, obrigatório inserir nos editais de licitação, cujo
objeto seja contratar obras ou serviços que envolvam o fornecimento de mão de
obra, bem como nos contratos administrativos, cláusula com exigência de capa-
citação de todos os trabalhadores em saúde e segurança no trabalho, dentro da
jornada, observada carga mínima de duas horas mensais, com ênfase na preven-
ção de acidentes. A segunda norma aprovou o guia prático para incluir critérios
de sustentabilidade nas contratações de bens e serviços no âmbito da Justiça do
Trabalho de primeiro e segundo graus.
A mudança de um determinado cenário para ser concretizada com a efeti-
vidade pretendida é diretamente proporcional à conscientização dos diversos
personagens envolvidos na faceta humana do processo produtivo, donde a
importância do tema, trabalhado pelas diversas vertentes que abrangem as
causas e os efeitos do problema, deságua no desenvolvimento de uma cultura
de prevenção nacional.
Importante, pois, referenciar o viés cultural albergado pelo Programa
Trabalho Seguro diante da recorrente incidência de determinados fatores
de risco, consistente na autorização para inserir conteúdos de segurança e
saúde do trabalhador, incluindo conhecimentos essenciais em prevenção de
acidentes no ensino básico como forma de sensibilizar a sociedade. Evidente
que a educação é omais importante e eciente predicado para cumprir o
comando constitucional na proteção do ambiente laboral seguro e saudável.
A inclusão do tema no currículo escolar representa o maior passo, a médio e
longo prazo, para reverter elementos reiterados.
O principal resultado da ação é a familiarização, desde a formação inicial,
com valores, conhecimentos e princípios em Segurança e Saúde no Trabalho
SST É a maneira mais ecaz de aumentar a conscientização dos futuros
OIT, sobre o Março Promocional da Segurança e Saúde no Trabalho; 8. Encarecer aos poderes
constituídos a implementação, com urgência, de política nacional sobre segurança, saúde e
meio ambiente do trabalho; 9. Proclamar a necessidade de maiores investimentos na produção
e difusão de conhecimento sobre Segurança e Saúde no Trabalho e Meio Ambiente, bem como
deuniformidadeemaiorprestezanadivulgaçãodasestatísticasociaisrelativasaosacidentes
detrabalhonoPaísamdeauxiliaraimplementaçãodepolíticaspúblicasrealistaseecazes
10. Convocar toda a sociedade para uma mobilização e conjugação de esforços na busca de
medidas concretas para reduzir ao mínimo possível os acidentes e doenças relacionados ao
trabalho, com os quais todos perdem. Brasília, 21 de outubro de 2011.
Morgana de Almeida Richa
244
trabalhadores empregadoresouprossionaisliberais As açõesnesteaspecto
têm como maior veículo as cartilhas desenvolvidas pela Fundacentro.
Contudo, o diálogo com a sociedade e as instituições públicas e privadas
deve ultrapassar as atividades educacionais e de conscientização. Cabe às comu-
nidades do trabalho sugerir, informar, pleitear meios de cooperação que viabi-
lizem o aprimoramento imediato das condições de trabalho. O envolvimento
diretodetrabalhadoreseorganizaçõescomaquestãosignicaatransformação
do meio ambiente do trabalho, a representar adequadas condições para realizar
as atividades laborais em segurança.
Campanhas de comunicação em massa são elemento de destaque no
Programa Trabalho Seguro, haja vista a visibilidade dos temas escolhidos, rele-
vantes para a inserção publicitária em âmbito nacional. Diante de ações concen-
tradas de mídia é possível pulverizar o conhecimento do problema, chamar a
atenção para a mudança de cultura e a conscientização da responsabilidade
de todos, atingindo o elemento pedagógico pretendido para reverter o nefasto
quadro de acidentes e de doenças do trabalho.
Dentre os diversos temas, é votado a cada período um ramo de atividade
para potencializar os resultados. A primeira abordagem, em 2012, foi a constru-
ção civil, seguida dos acidentes de transportes em 2013. Em 2014, sob o tema
‘Trabalhadores Rurais’, iluminou-se o dever de cuidado com a mão de obra que
sustenta um dos pilares centrais da economia brasileira, de forma geral mantida
com o árduo trabalho invisível no campo.
A campanha certa ganhou a mídia perfeita nessa gestão do programa,
quando veiculada publicidade em larga escala, com o slogan: ‘A prevenção é o
melhor caminho – os acidentes não acontecem por acaso, os acidentes aconte-
cem por descaso’. O propósito de ressaltar a previsibilidade do acidente agre-
gouaidenticaçãodopúblicocomotemaesuperouasexpectativas(573).
Enfatizados os acidentes com máquinas em 2015 e projetada a veiculação
do problema conhecido como o mal do século XXI(574) para o biênio 2016/2017,
quando escolhido pelos gestores nacionais e regionais do programa o tema
‘Transtornos Mentais e Saúde do Trabalho’, haja vista o crescente número de
demandas e os afastamentos previdenciários envolvendo estas enfermidades.
AcampanharecebeuamedalhadepratadoPrêmioColunistasnacategoriaFilmeIns-
titucional ou Corporativo, mediante cinco vídeos chamando a atenção da sociedade para a impor-
tância das ações de prevenção, contou com o apoio de todos os Tribunais Regionais do Trabalho,
das instituições parceiras do Programa Trabalho Seguro, da Associação Brasileira de Rádio e TV
(Abert) e de outros segmentos da sociedade relacionados aos direitos dos trabalhadores.
ASSOCIAÇÃOBrasileiradePsiquiatriaDisponívelemhpabporgbr. Acesso em: 10
nov. 2020.
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
245
Para o biênio 2018/2020 as ações do programa ‘Trabalho Seguro’ foram
pautadas pelo tema ‘Violências no trabalho: enfrentamento e superação’, eleito
para conscientizar a sociedade sobre a importância de combater práticas no
ambiente de trabalho que possam resultar em problemas físicos e psicológicos.
Por último, selecionado o tema ‘Construção do trabalho seguro e decente
em tempos de crise: prevenção de acidentes e de doenças ocupacionais’, para
o biênio 2020/2022, no escopo de conscientizar os empregadores quanto ao
bem-estar dos empregados e promover ações para evitar que acidentes ocorram
durante a jornada de trabalho.
No tocante ao diálogo social e institucional, foram estabelecidas diretri-
zes aos grupos de trabalho visando divulgar mensagens sobre prevenção de
acidentes do trabalho por meio de instrumentos de comunicação em massa, os
quaisdurante determinados períodospassarama guraremextratos bancá-
rios, contas de energia, água e telefone, dentre outros(575).
A criação do Portal Trabalho Seguro nos sites do Tribunal Superior do
Trabalho e do Conselho Superior de Justiça do Trabalho, com réplicas regionais
nos sites dos Tribunais Regionais do Trabalho, representa o registro institucional
econguraumimportanteinstrumentoparadivulgaraçõesdadosestatísticos
eventos, cursos e palestras, além de outras informações necessárias ao cumpri-
mento dos objetivos do Programa(576).
Como exemplo dessa atuação que estimula o diálogo social e institucional o Tribunal
RegionaldoTrabalhoda Regiãoincluiufrasessobresaúdee segurançanotrabalhonos con-
tracheques dos trabalhadores do Sinduscon, do Seconci e outras entidades parceiras, além da
divulgação de dicas na rádio CBN.
ComoexemploasboaspráticasdeprevençãodeacidentesadotadaspelosTribunaisRegio-
nais do Trabalho: BOA PRÁTICA 1 – Capacitação de magistrados em SST; Capacitação de magis-
trados através de curso de conteúdo técnico sobre saúde, segurança e medicina do trabalho; BOA
PRÁTICA 2 – Equipe de apoio aos gestores regionais; Instituir equipe de apoio aos gestores regio-
nais, constituída de, pelo menos, um servidor, que possa acompanhar a execução das atividades do
Programa, sem prejuízo de suas atribuições, como estabelecer contatos (telefonemas) com parceiros,
elaboração de relatórios, documentos, sistematização das mensagens e documentos enviados pelos
gestores nacionais etc. BOA PRÁTICA 3 – Enfoque especial às micro e pequenas empresas; Instituir
parcerias com órgãos que desenvolvam atividades junto às micro e pequenas empresas, a exemplo
do SEBRAE, para a criação de manuais sobre segurança, saúde e meio ambiente do trabalho, especí-
cosparaaatividadeeconômicadoempreendimentoalémdeplanejamentodecursosdeformação
sobre o tema direcionado aos pequenos empreendedores. BOA PRÁTICA 4 – Realização de Audiên-
cias Públicas; Realizar audiências públicas para discutir problemas relacionados à segurança, saúde
e meio ambiente do trabalho, com participação dos parceiros do Programa, sindicatos, etc. BOA
PRÁTICA 5 – Visitas a canteiros de obras; Visitar canteiros de obras, em parceria com Auditores-
-Fiscais do Trabalho, Procuradores do Trabalho e representantes dos órgãos de Saúde, Trabalho e
Meio Ambiente Estaduais ou Municipais, para apresentar mensagens do Programa a trabalhadores
e empregadores. BOA PRÁTICA 6 – Estipulação de condições para fornecer energia elétrica; Incen-
tivar que as concessórias de energia elétrica exijam apresentação de projeto das instalações elétricas
doscanteirosdeobrassubscritoporprossionallegalmentehabilitado comocondiçãoessencial
Morgana de Almeida Richa
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Especicamente no que diz respeito à inserção jurisdicional proativa a
Recomendação Conjunta GP. CGJT n. 1/2011 orienta que os Tribunais Regio-
naisdoTrabalhoconramprioridadeàtramitaçãoeaojulgamentodasreclama-
ções trabalhistas que envolvam acidente do trabalho. Como exemplo, a Portaria
PresidênciaCorregedoriando Tribunal Regional do Trabalho da
Região, no sentido de priorizar os processos relacionados a acidentes do traba-
lho, inclusive ações civis públicas e ações coletivas envolvendo a questão(577).
Em contexto semelhante, a Recomendação Conjunta GP. CGJT n. 2/2011,
para que os magistrados da Justiça do Trabalho encaminhem cópia de senten-
ças e acórdãos que reconheçam conduta culposa do empregador em acidente
do trabalho à respectivaunidade da Procuradoria Geral Federal a m de
subsidiar eventual ajuizamento de ação regressiva, nos termos do artigo 120
Vê-se que o acesso à justiça, na perspectiva do Trabalho Seguro, representa
uma ordem jurídica vislumbrada na amplitude do quadro que envolve os aciden-
tes do trabalho e doenças ocupacionais. Por esse motivo, imperativo incluí-los
no âmbito de política pública judiciária reunindo trabalhadores, empregadores e
instituições públicas e particulares no sistema nacional de promoção e proteção
da saúde, possibilitada a articulação das ações de promoção, proteção, preven-
ção, assistência, reabilitação e reparação.
O cumprimento da missão do programa depende da soma de esforços
do Judiciário e instituições parceiras para envolver a sociedade e disseminar a
consciência de que todos são responsáveis pela prevenção. Além disso, identi-
caredebaterasimplicaçõesmetodológicasàluzdoentendimentoatualvisa
para a ligação inicial e o fornecimento de energia elétrica. BOA PRÁTICA 7 – Disponibilização
on-line de Autos de Infração e Termos de Ajustamento de Conduta; Manter contato com o Minis-
tério Público do Trabalho e a Superintendência Regional do Trabalho para disponibilização on-line
aos Juízes do Trabalho dos Autos de Infração e Termos de Ajustamento Conduta. BOA PRÁ-
TICA 8 – Formação de base de dados para tutela dos interesses coletivos; Implementar Banco de
Dados Nacional relativo a decisões de tutelas preventivas coletivas acerca de segurança, saúde e
meio ambiente do trabalho, permitindo seu compartilhamento. BOA PRÁTICA 9 – Composição
deacervobibliográcoCriação debibliotecanosRegionaiscomacervobibliográco eaudiovi-
sual sobre segurança e medicina do trabalho, formada, inicialmente, com o material fornecido
pela Fundacentro e pelo MTE. BOA PRÁTICA 10 – Produção de material educativo; Produção de
lmescartilhaseoutrosmateriaisdedivulgaçãoBOAPRÁTICAAperfeiçoamentodamatriz
curricular de cursos Técnicos de Segurança do Trabalho; Introdução da disciplina ‘Aspecto legal
da segurança do trabalho’ na matriz curricular do curso Técnico de Segurança do Trabalho.
DisponívelemhpswwwtrtjusbrportaldestaquesxhtmlAcessoemnov
Artigo da Lei n Nos casosde negligência quantoàs normaspadrãode
segurança e higiene do trabalho indicados para a proteção individual e coletiva, a Previdência
Social proporá ação regressiva contra os responsáveis”.
Políticas Públicas Judiciárias & Acesso à Justiça
247
contribuir para aperfeiçoar e ampliar o papel da Justiça do Trabalho na proteção
da saúde dos trabalhadores.
Emerge, portanto, o Programa Trabalho Seguro inovando o papel insti-
tucional da Justiça do Trabalho, ao agregar uma atuação ativa de prevenção
denovoslitígiosaomodelotradicionaldepacicaçãodeconitoserepara-
ção de direitos.
O Programa contribui para redesenhar a formulação e o desenvolvimento
de políticas públicas, historicamente afetas ao Poder Executivo, destacada a
atuação ampliada pelo Poder Judiciário visando fomentar a articulação e a inte-
gração de ações realizadas por instituições públicas e privadas em prol de um
objetivo comum. Representa, outrossim, importante instrumento de aproxima-
ção de magistrados trabalhistas e sociedade, sobretudo em ações educativas nas
escolas, sindicatos, empresas e ambientes de trabalho.
Por derradeiro, a síntese da atuação do Poder Judiciário Trabalhista, na
preservação da saúde do trabalhador, é uma política pública judiciária voltada
à prevenção de acidentes do trabalho e proteção dos interesses da coletividade
– sociedade, trabalhadores, empregadores e do Estado, visando à dignidade
da pessoa humana e valorização social do trabalho, fundamentos da República
Federativa do Brasil.
Aexistência de normas éinsucientepara efetivarosdireitossociais
Cabe ao Poder Judiciário Trabalhista parcela de responsabilidade na promo-
ção de ações para conscientizar e prevenir acidentes do trabalho e doenças
ocupacionais, alargando o paradigma contido no acesso à justiça e enfren-
tando o tema alusivo aos infortúnios laborais mediante instituição de uma
política pública própria.
Vericasenaessênciaaatuação diretado PoderJudiciárioparaconcre-
tizar o direito à saúde e contribuir para o cumprimento da Política Nacional de
Segurança e Saúde no Trabalho, na conscientização de assunto pouco valori-
zado pela população em geral, mas que afeta diretamente todos os trabalhado-
res do país.
Com a materialização do programa abre-se o leque para o acesso à ordem
jurídica justa, inserido o Poder Judiciário Trabalhista na realidade social, compro-
metido com a realização da justiça, mediante uma política pública judiciária
capaz de promover a tutela de direitos sociais, evitar a proliferação de demandas,
vencida, por conseguinte, aquela atuação judicial meramente reparatória.
O Judiciário Trabalhista, à vista disso, assume posição de destaque, torna-
-se instrumento de inserção política para o exercício da cidadania ativa e para
a participação de diversos atores no conjunto das atividades atreladas ao
Programa Trabalho Seguro, instrumento que garante a efetividade dos direitos
ampliando o acesso à justiça no modelo democrático do século XXI.
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