Prefácio

AutorAnderson Schreiber
Ocupação do AutorProfessor Titular de Direito Civil da UERJ
Páginas5-7
PREFÁCIO
Anderson Schreiber
Professor Titular de Direito Civil da UERJ
Já se tornou truísmo dizer que a internet alterou a relação entre memória e esqueci-
mento.1 Motores de busca e outros instrumentos que facilitam imensamente nossas vidas,
ao permitir o acesso à informação em um oceano quase inf‌indável de dados, também
se converteram, por força dos novos hábitos, em uma espécie de catálogo universal, no
qual o nome de cada pessoa corresponde a um conjunto de notícias e ocorrências que
acaba por def‌ini-la perante a sociedade. Desde um início de namoro até uma entrevista
de emprego, as pessoas estão sendo cotidianamente avaliadas com base nos primeiros
resultados que a busca por seu nome oferece na internet.
O modo como tais resultados são selecionados e organizados permanece, em regra,
imune ao controle e até ao conhecimento do público. O sigilo costuma ser defendido
com base em diferentes razões – que vão desde o direito ao segredo industrial até uma
alegada ausência de racionalidade apriorística que derivaria do emprego de algoritmos
que se baseiam no próprio comportamento dos usuários da rede, passando, não sem
intenso debate, por argumentos ligados à necessidade de preservação da liberdade de
expressão na internet. Independentemente das razões apresentadas, parece inegável,
neste contexto, o risco de que uma pessoa venha a ser retratada de modo equivocado. E
um dos equívocos mais frequentes – que resulta da própria perenidade das informações
na internet – é a retratação desatualizada do indivíduo, que pode passar a ser visto pela
sociedade com base em um fato ou característica pretérita que sua própria trajetória de
vida já tenha, há muito, superado.
Tornou-se célebre em todo o mundo o caso de Mario Costeja, cidadão espanhol
que, em 2010, propôs ação judicial contra uma editora espanhola e um conhecido motor
de busca na internet. Mario Costeja alegou que, quando pesquisavam por seu nome no
motor de busca, os usuários da internet recebiam, como resultado, a indicação de duas
páginas do jornal La Vanguardia com informações de um leilão de imóveis ocorrido, em
1998 e 1999, com vistas ao pagamento de dívidas previdenciárias já adimplidas há muitos
anos. Costeja pleiteou a supressão das páginas do periódico e dos resultados do motor
de buscas atrelados a esta notícia. O Tribunal de Justiça da União Europeia, embora não
tenha reconhecido o direito à exclusão das páginas do jornal La Vanguardia, determinou
sua exclusão do motor de busca, “tendo em conta o caráter sensível, para a vida privada
dessa pessoa, das informações contidas nesses anúncios e o fato de a sua publicação inicial
1. Ver, por todos, Viktor Mayer-Schönberger, Delete – the virtue of forgetting in the digital age, New Jersey: Princeton
University Press, 2009, p. 13
DIREITO AO ESQUECIMENTO.indb 5DIREITO AO ESQUECIMENTO.indb 5 22/04/2020 16:55:5422/04/2020 16:55:54

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