Princípios, regras, competências e imunidades tributárias

AutorJoão Paulo Fanucchi De Almeida Melo
Páginas31-276
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PRINCÍPIOS, REGRAS, COMPETÊNCIAS
E IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS
As limitações ao poder de tributar são vistas nos âmbitos constitucional
e infraconstitucional.
As limitações constitucionais ao poder de tributar podem ser subdivididas
em três grupos: (1) os denominados princípios tributários; (2) as competências
tributárias e (3) as imunidades tributárias.
Joaquim Carlos Salgado ensina que
A constituição positiva é que arma a existência política de um povo,
como, por exemplo, “O poder emana do povo”, “O Reich alemão é uma
república” etc. Antes de toda normatização há “uma decisão política
fundamental do titular do poder constituinte”, seja o povo, seja o monarca.
E esse ato de declaração é fundamental, pois dele parte a validade das leis
constitucionais.77
Assim, se todo poder emana do povo e o direito constitucional decorre
de prévia decisão política fundamental, no que se refere ao sistema tributário,
a Constituinte de 1988 o elevou motivadamente a status constitucional.
É dizer que foi uma opção política e conscientemente debatida que, com
a promulgação da Constituição, passou a ser direito positivo.
Esta válida opção contrapõe outras hipóteses possíveis, tal como praticado
em outros países e que eram de pleno conhecimento dos constituintes,
conforme se nota nos debates travados e formalizados nos anais da Assembleia
Nacional Constituinte.
77 SALGADO, Joaquim Ca rlos. Apresentação. In : SCH MITT, Carl. Lega lidade e legit imidade.
Belo Horizonte: Del Rey, 2007, xvi-xv ii.
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JOÃO PAULO FANUCCHI DE ALMEIDA MELO
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Conforme lembra Humberto Ávila, em outros Estados Nacionais o sistema
tributário é regulado no campo infraconstitucional. A título de ilustração, o
autor cita a Alemanha, que dedica apenas dois dispositivos constitucionais
para matéria tributária.78
Os constituintes, ao tomarem a decisão de elevar o sistema tributário a
nível constitucional, por evidente, concluíram por excluir o tema do âmbito
normativo infraconstitucional. Ou melhor, deixaram que a normatização
infraconstitucional apenas complementasse, pormenorizasse, esclarecesse ou
evidenciasse tudo aquilo que foi consignado como direitos e objetivos/ns a
serem alcançados no texto constitucional.
Não há o mínimo espaço, pelo sistema de hierarquia normativa, para que
a legislação infraconstitucional vá defronte ao texto constitucional positivo.
Pelo direito positivo, o exercício do poder tributante é um dos meios
pelos quais o Estado pode atingir o patrimônio, no sentido total – já que pode
ser dividido em propriedade, renda, bens etc. – do cidadão.
Assim, a legalidade e a legitimidade da sua ação, no aspecto tributário,
dependem da máxima observância das balizas que estão presentes nos três
grupos – princípios, competências e imunidades – que preenchem as limitações
constitucionais ao poder de tributar.
Na perspectiva republicana, em que todo poder emana do povo,79 a
opção do constituinte foi de elevar a propriedade como direito e garantia
fundamental,80 como cláusula pétrea.81 Contudo, a propriedade do cidadão não
é absoluta, em razão das ressalvas expressas no texto constitucional, como, por
78 ÁVILA, Humberto.Competênc ias tributária s. São Paulo: Malheiros, 2 018 .
79 Art. 1º da CRFB: “A República Federat iva do Brasil, formad a pela união ind issolúvel
dos Estados e Municípios e do Dis trito Federal, c onstitui-se em Est ado Democrático de
Direito e tem como funda mentos: [...] Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o
exerce por meio de representantes eleitos ou d iretamente, nos termos desta Con stituição.”
(BRASIL. Cons tituição da Repú blica Federativa do Bra sil de 1988. Diário O cial da
União, Bra sília, 5 out. 1988.)
80 Art. 5º da CRF B: “Todos são iguais pera nte a lei, sem distinç ão de qualquer naturez a,
garantindo- se aos brasileiros e aos e strangeiros resid entes no País a inviolabi lidade
do direito à vida, à l iberdade, à igua ldade, à segu rança e à propriedade [...]” (BRASIL.
Constituição d a República Federativa do Brasi l de 1988. Diário Ocial da União, Bra sília,
5 out. 1988.)
81 Art. 60, § 4º d a CRFB: “Não será objeto de del iberação a proposta de emenda tendente a
abolir: [...] IV - os direitos e gara ntias individuais.” (BRASIL . Constituição d a República
Federativa do Brasi l de 1988. Diário Ocial da União, Bra sília, 5 out. 1988.)
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DIREITO CONSTITUCIONAL TRIBUTÁRIO
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exemplo, a observância da função social,82 a hipótese de aplicação de pena83 e,
ainda, o exercício da tributação.
A tributação, como uma das exceções constitucionais que legitimam a
ação estatal na propriedade privada, possui as suas limitações, que devem ser
levadas a sério, em razão do status constitucional.
Em outros termos, o Constituinte garante a propriedade privada como
direito fundamental que deve ser garantido, como cláusula pétrea que é,
contudo, admite, excepcionalmente, a intervenção ou ação do Estado, sendo
a tributação uma das hipóteses. Ocorre que esse exercício do poder tributante
possui contornos constitucionalmente previstos e que devem ser observados,
tendo, pois, caráter dual, isto é, balizas/limitações ao Estado e direitos e
garantias dos cidadãos-contribuintes.
Estes contornos constitucionais são, reitera-se: (1) os princípios que
devem ser observados; (2) as competências tributárias, isto é, as incidências
tributárias devem se limitar às hipóteses constitucionalmente previstas, em
máxima observância às situações materiais e econômicas elencadas; e (3) as
imunidades tributárias, que são situações que a priori seriam tributadas por se
encontrarem no campo das competências, porém não o serão em decorrência
da opção democrática e política do Constituinte.
Nessa linha expositiva, o agir dos Poderes ou Funções do Estado –
Executivo, Judiciário e Legislativo, exceto do Constituinte Derivado, desde que
observando as cláusulas pétreas, precisa se curvar às balizas constitucionais,
no exercício das suas funções.
82 O entendimento do que seja funç ão social da propried ade pode ser extr aído do art.
186 da Constituição: “A função so cial é cumprida qu ando a propriedade ru ral atende,
simultaneame nte, segundo critér ios e graus de exigênc ia estabelecidos em lei, aos
seguintes requ isitos: I - aproveitamento racional e a dequado; II - util ização adequad a
dos recursos natu rais disponí veis e preservação do meio a mbiente; III - observâ ncia das
disposições que reg ulam as relações de tra balho; IV - exploração que favoreça o b em-estar
dos proprietários e dos t rabalhadores.” (BRA SIL. [Constituiç ão (1988)]. Constituiçã o da
República Federativa d o Brasil. Diário Ocial d a União, Brasília, DF, 5 out. 1988.
83 “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem d istinção de qualquer naturez a, garantindo-se
aos brasileiros e aos es trangeiros residente s no País a inviolabil idade do direito à vid a, à
liberdade, à igu aldade, à segurança e à propr iedade, nos termos seguintes: [...] XLVI - a lei
regulará a i ndividual ização da pena e adot ará, entre outra s, as segui ntes: a) privação ou
restrição da l iberdade; b) perda de bens; [...].” (BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição
da República Federat iva do Brasil. Diário Ocia l da União, Brasília, DF, 5 out. 1988).
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