Redemocratização, Reformas, Estabilização e o novo papel da política fiscal e tributária: 1988-2014

AutorFabrício Augusto de Oliveira
Páginas85-144
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CAPÍTULO IV
REDEMOCRATIZAÇÃO, REFORMAS,
ESTABILIZAÇÃO E O NOVO PAPEL
DA POLÍTICA FISCAL E TRIBUTÁRIA:
1988-2014
1. Constituição de 1988: descentralização das receitas,
ampliação dos direitos sociais e o ajuste fiscal:
1988-1994
Em reação ao espírito centralizador e autoritário que predominou
durante o regime militar, a reforma tributária de 1988 foi presidida pela
lógica da descentralização, transformada, na década de 1980, em sinônimo
de democracia, ao mesmo tempo que, para dar respostas às demandas
reprimidas da sociedade por políticas sociais, os constituintes ampliaram,
no capítulo relativo à ordem social, as responsabilidades do Estado nesse
campo com a introdução do conceito de Seguridade Social e com a
montagem de uma estrutura exclusiva de financiamento dessas políticas
regida por regras distintas das estabelecidas para os impostos tradicionais.
Essa equação enfrentaria, contudo, dificuldades para se sustentar em um
ambiente de fortes restrições orçamentárias, de crise econômica e de
aceleração inflacionária, e também por não ter havido preocupação de
nela combinar, adequadamente, as fontes de financiamento com as novas
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FABRÍCIO AUGUSTO DE OLIVEIRA
atribuições do Estado, especialmente no que concerne às do Poder
Central.54
No Quadro I.5 encontra-se retratada a nova estrutura tributária que
brotou da Constituição de 1988, bem como a distribuição de seus campos
de competência e de recursos entre os distintos níveis de governo.
Uma análise perfunctória dessa nova estrutura revela que se mo-
dificou, consideravelmente, a estrutura da distribuição de competências
e de receitas entre os entes da federação, beneficiando estados e muni-
cípios em detrimento da União, bem de acordo com o objetivo de
injetar novas forças no processo de descentralização.
De fato, a União perderia os impostos únicos (incidentes sobre a
energia elétrica, os combustíveis e os minerais) e os especiais (transpor-
tes rodoviários e serviços de comunicação), que seriam integrados ao
novo imposto estadual – o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e
Serviços (ICMS) – e veria ampliada, consideravelmente, a fatia do pro-
duto da arrecadação do Imposto de Renda e do IPI transferida para os
estados e municípios (de 33% para 47% no caso do IR e de 33% para
57% no do IPI). Em contrapartida, ganharia apenas o Imposto sobre
Grandes Fortunas, que nunca foi regulamentado, e o Imposto sobre a
Propriedade Territorial Rural (ITR), de inexpressiva arrecadação, que
ainda deveria partilhar com os municípios.
54 O que se segue nessa seção apoia-se no trabalho de OLIVEIRA, Fabrício Augusto.
Crise, reforma e desordem do sistema tributário nacional. Campinas: Editora da Unicamp,
1995.
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PARTE I - CAPÍTULO IV - REDEMOCRATIZAÇÃO, REFORMAS...
Quadro I.5
Constituição de 1988: distribuição de competências
e partilha de receitas
Competência Partilha/distribuição
União Estados Municípios
União
Importação
Exportação
Renda (IR)
IPI
Operações f‌i nanceiras (IOF)
Territorial rural (ITR)
Grandes Fortunas (IGF)
100,0
100,0
53,0
43,0
100,0
50,0
100,0
-
-
21,5 (FPE)
3,0 (FC)
21,5 (FPE)
3,0 (FC)
7,5 (F. Ex.)
-
-
-
-
-
22,5 (FPM)
22,5 (FPM)
2,5 (F.Ex.)
-
50,0
-
Estados
ICMS
Causa mortis e doação (ITCD)
Veículos automotores (IPVA)
-
-
-
75,0
100,0
50,0
25,0
-
50,0
Municípios
Predial e territorial urbano (IPTU)
Transmissão inter-vivos
Vendas a varejo combustíveis (IVVC)
Serviços de qualquer natureza (ISS)
-
-
-
-
-
-
-
-
100,0
100,0
100,0
100,0
Fonte: Tácito, Caio. Constituições brasileiras: 1988. 5. Ed. Brasília: Senado Federal: Ministério
da Ciência e Tecnologia, Centro de Estudos Estratégicos, 2005).
Os estados foram beneficiados, por sua vez, com a expressiva
ampliação da base de incidência do novo ICMS, à qual se integraram os
impostos únicos e especiais, e com a criação do Imposto sobre Herança
e Doações, além do aumento expressivo do FPE, dos recursos para os
Fundos Constitucionais do NO-NE-CO e da criação do Fundo de
Compensação das Exportações de Manufaturados, que drenaria 10% da

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