Reestruturação empresarial

AutorMauricio Godinho Delgado
Páginas42-53

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O segundo grupo de fatores (processo de reestruturação empresarial) também tem caráter preponderantemente estrutural, embora não de modo exclusivo, é claro.

Ele envolve significativas modificações econômicas e organizacionais no plano da estruturação das empresas, ou seja, mudan ças que se verificam no próprio processo de organização das enti dades empresariais e nos sistemas de produção internos a essas entidades. São alterações, portanto, que afetam de maneira mais direta a estrutura do empreendimento empresarial, alterando-lhe a conformação e o modo de operar.

De fato, do ponto de vista estrutural, os anos 1970 e décadas seguintes assis tem à profunda alteração tecnológica envolvendo o processo produtivo. Essa alteração produz-se mediante absorção ou incremento nas empresas da automação acentuada (e seu ápice, a robotização), da microeletrônica e, finalmente, da informática. Na mesma conjuntura, acentuam-se as inovações e melhorias no campo das comunicações, tanto no tocante à transmissão de dados (telecomunicações, inclusive internet), como no referente à facilitação e ao bara teamento do transporte de bens e pessoas.

Esse quadro de modificações tecnológicas viabiliza e se associa à disseminação de novas formas de organização tanto das empresas como do próprio processo de trabalho.

1. Estrutura organizacional das Empresas

No que tange às mudanças na estrutura organizacional do em preendimento capitalista, ganha prestígio, em certos segmentos, a estratégia de diluição das grandes unidades empresariais.

Em face da grande praticidade e do menor custo dos meios de comunicação e de transporte disponibilizados nas últimas décadas, ao lado do objetivo gerencial de redução do tempo de produção e diminuição do montante de estoques, as empresas podem abandonar ou, pelo menos, restringir o antigo critério organizacional de ver ticalização e concentração do sistema produtivo.

Passam, assim, à diferença da sistemática anteriormente dominante, a delegar, por subcontratação, a outras entidades empre sariais conexas ou mesmo

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independentes a tarefa de produzir distintos implementos necessários a seu produto final ou, até mesmo, realizar fases inteiras de seu tradicional ciclo produtivo. A empresa líder reduz, em consequência, sua própria dimensão estrutural e operacional, sem prejuízo de poder conseguir elevação em sua produção final no mesmo (ou menor) período de tempo.

Ganha prestígio, assim, a ideia de empresas em rede, uma modalidade de estruturação do empreendimento capitalista pela qual as clássicas concentração e centralização do capital se realizam mediante unidades empresariais de pequeno e médio porte, e outras de gran de porte, ao invés da via tradicional estruturada em torno de megaplantas empresariais.

Embora tal novo estratagema - mais prestigiado na indústria - não atinja, necessariamente e na mesma proporção, todo o em presariado, terá, de qualquer modo, impacto importante no mundo empresarial e do trabalho.

Para ilustrar esse impacto, note-se que tal descentralização ou subcontratação empresarial (às vezes conhecida como terceiriza çãoempresarial)5 enfraquece os caminhos clássicos de atuação do sindicalismo - por ser esse, tradicionalmente, mais forte nas grandes empresas -, contribuindo também para fracionar, em alguma medida, ainda que em um primeiro instante, esse mesmo movimento sindical.

Registre-se, a propósito, que, no segmento do comércio, a ideia de empresas em rede dissemina-se também de maneira muito signi ficativa, aqui potenciada por inovador mecanismo de conexão inte rempresarial, que é o regime de franquias.

2. organização do Processo de Trabalho

No que tange às mudanças na organização do processo de trabalho dentro das empresas, ganham prestígio três principais fór mulas de gestão trabalhista: a redução de cargos e funções (e, consequentemente, de postos de trabalho), com maior agregação fun cional nos mesmos indivíduos; a terceirização trabalhista; o sistema toyotista ou ohnista de gestão do trabalho.

Todas essas três fórmulas visam, em seu conjunto, acentuar a produtividade do trabalho, diminuindo, ao mesmo tempo, os custos a este vinculados. Todas são fórmulas de gestão social, de gestão trabalhista, métodos de gerenciamento da força de trabalho.

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A) Redução de Cargos e Funções

A fórmula de redução de cargos e funções - logo, também de postos laborativos - é propiciada, é claro, pelos ganhos tecnológicos advindos da terceira revolução industrial, como já visto.

Entretanto não se deve apenas a eles: tem papel fundamental nessa fórmula a decisão gerencial de se atribuir ao mesmo trabalhador número maior de tarefas e funções, sem perda notável da quali dade do labor desempenhado.

A partir da noção de trabalho flexível e, por consequência, do conceito de trabalhador flexível e multifuncional, passam a ser con centradas na mesma pessoa atividades que, anteriormente, seriam exercidas por outros trabalhadores. Ainda que essa concentração não seja plena, melhor correspondendo a um processo de agregação de atividades, tarefas, funções e poderes em um número menor de pessoas, o fato é que, em seu conjunto, tem grande impacto na elevação da produtividade do trabalho e na diminuição no montante de empregos na vida empresarial.

Em síntese, com esse novo estratagema de gestão, muitos pos tos de trabalho são eliminados, ainda que a efetiva função continue a ser importante na divisão de trabalho interna à empresa.

Note-se que a presente fórmula de redução de cargos e funções, com a concentração de atividades laborativas no mesmo trabalhador (ideia de multifuncionalidade do obreiro, de trabalhador flexível), enquadra-se em certa concepção de gestão da força de trabalho, cognominada toyotismo ou ohnismo, de grande prestígio a partir dos anos 1970, principalmente no segmento industrial do capitalismo (tal concepção será examinada no subitem IV.2.C deste capítulo).

Contudo, tal fórmula não se circunscreve, estritamente, à ma triz do toyotismo, uma vez que, sendo diretamente vinculada aos avanços da tecnologia, tornou-se genericamente aplicável a quase todos os segmentos do mercado laborativo, reduzindo os postos de trabalho e acentuando a produtividade deste, independentemente de adotar ou não a empresa, em sua inteireza, a matriz toyotista de gestão capitalista.

B) Terceirização Trabalhista

A fórmula da terceirização trabalhista permite a desconexão entre a relação socioeconômica de real prestação laborativa e o vínculo empregatício do trabalhador que seria correspondente com o próprio tomador de seus serviços.

Por essa fórmula, insere-se, no interior da relação efetiva entre trabalhador e seu tomador de serviços, uma empresa intermediária, chamada prestadora de

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serviços, que passa a responder pelo vín culo empregatício com o obreiro. Ao invés, portanto, da clássica sis temática pela qual o tomador de serviços habituais se enquadra como empregador da pessoa física que lhe presta serviços, separam-se, artificialmente, as relações, por meio da inserção, nessa seara, da empresa prestadora de serviços, que passa a deter o vínculo empregatício com o obreiro.

Registre-se distinção relevante entre terceirização trabalhista e terceirização empresarial (ou, conforme Márcio Túlio Viana, terceirização interna e externa)6.

Terceirização trabalhista (ora examinada) diz respeito ao men cionado processo de dissociação do vínculo socioeconômico de prestação laborativa em detrimento do respectivo vínculo jurídico-traba lhista, o qual se ata com a empresa chamada prestadora de serviços. Pela terceirização trabalhista, o efetivo tomador de serviços deixa de ser, por meio de ladina fórmula jurídico-administrativa, real em pregador do obreiro.

Já a...

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