A regra-matriz como esquema lógico de interpretação dos textos jurídicos

AutorAurora Tomazini de Carvalho
Páginas399-446
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A REGRA-MATRIZ COMO ESQUEMA LÓGICO
DE INTERPRETAÇÃO DOS TEXTOS JURÍDICOS
Aurora Tomazini de Carvalho
Doutora em Filosofia do Direito pela Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo – PUC-SP, Professora da Universidade
Estadual de Londrina-PR e dos Cursos de Pós-Graduação da
PUC-SP, IBET, FAAP e EPD, Pesquisadora do IBET e Advogada
1. Considerações iniciais
Sempre tive muita dificuldade de entender a razão prá-
tica do estudo da Lógica e de todas aquelas fórmulas, razão
pela qual não dei muita importância à disciplina nos anos de
Graduação. Essa dificuldade resultava da minha falta de com-
preensão a respeito do que é a Lógica e de como como ela atua
no processo de conhecimento, noção que só consegui visua-
lizar quando cursei a disciplina de Lógica Jurídica do Prof.
PAULO DE BARROS CARVALHO no Mestrado da PUC-SP.
A disciplina abriu meus horizontes, me fez entender a
importância da Lógica ao identificar as estruturas do pensa-
mento. Quando estudamos Lógica entendemos como são fei-
tas as associações do nosso intelecto ao conhecer as coisas e
validar tal conhecimento, porque trabalhamos com as formas
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LÓGICA E DIREITO
proposicionais da linguagem em que o conhecimento é cons-
tituído, o que nos deixa mais seguro em relação ao próprio
conhecimento e a maneira de interpretar outras linguagens.
Essa também foi minha sensação quando entrei em con-
tato pela primeira vez com o esquema lógico da regra-ma-
triz de incidência elaborado e pensado pelo Prof. PAULO
DE BARROS CARVALHO. Foi numa aula sobre Direito
Tributário da Profa. BETINA GRUPENMACHER, no Curso
de Especialização em Direito Empresarial da Universidade
Estadual de Londrina (em 2001). Cheguei um pouco atrasada
e me deparei com o esquema lógico da regra-matriz na lou-
sa, fiquei tentando entender aqueles símbolos e qual seria a
relação deles com a cobrança de tributos e num primeiro mo-
mento (justamente por não entender a função da Lógica) não
vi muito sentido em seu estudo. Me perguntei por diversas
vezes: “Pra que esse monte de símbolos?”, “Onde vou aplicar
isso?”. Foi só com o tempo que entendi a utilidade da regra
-matriz e o quanto ela facilita o trato com o direito. Mas dizem
que é assim, o conhecimento se sedimenta aos poucos e com o
tempo. Hoje, e digo isso com a convicção da prática, a primei-
ra coisa que faço diante de um texto jurídico é identificar a re-
gra-matriz de incidência, que funciona como um forte arsenal
para interpretação, delimitação da incidência e controle de
constitucionalidade/legalidade de qualquer textos legislados.
Assim, foi com grande honra que aceitei o convite dos
professores PAULO DE BARROS CARVALHO e LUCAS
GALVÃO DE BRITTO para escrever este artigo. Espero trazer
algumas elucidações para aqueles que têm a mesma sensação
que tinha e que ainda se perguntam: “Para que esse negócio
de Lógica Jurídica” ou “Para que estudar a Regra-Matriz de
Incidência?” “Onde vou aplicar estes conceitos?”1. Aproveito
para registrar aqui mais uma vez minha homenagem e agra-
decimento ao Prof. PAULO DE BARROS CARVALHO que
1. Essas questões podem ser mais profundamente analisadas no livro Curso de Teo-
ria Geral do Direito (o Constructivismo Lógico-Semântico) de minha autoria.
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A LÓGICA NO DIREITO
abriu minha visão com os horizontes da Lógica e da sua
Regra-Matriz de Incidência Tributária.
2. Que é e para que serve a Lógica?
A palavra “logica” pode ser empregada em dois sentidos:
(i) Ciência que se volta para as estruturas das linguagens; e (ii)
a linguagem formalizada que manifesta a estrutura de uma
linguagem. Enquanto ciência, a Lógica estuda as regras de
estruturação das diferentes linguagens que constituem nossa
realidade. Embora seja uma unanimidade entre os pensadores
dizer que a Lógica se preocupa com as categorias do pensa-
mento, ao empregarmos os pressupostos do Constructivismo
Lógico-Semântico e da Filosofia da linguagem de que a reali-
dade se constitui pela linguagem e que só conhecemos aquilo
que constituímos linguisticamente em nosso intelecto, o ob-
jeto da Lógica será sempre a linguagem. Assim, fala-se que
a lógica cuida das estruturas do pensamento, porque ela tra-
ta da estrutura das linguagens, inclusive daquela em que se
pauta o conhecimento. Estes são os ensinamentos de PAULO
DE BARROS CARVALHO, de que: “não há lógica na floresta,
no fundo dos oceanos ou no céu estrelado: torna-se impos-
sível investigarmos entes lógicos em qualquer outra porção
da existência real que não seja um fragmento de linguagem”2.
Neste sentido, a Lógica pressupõe sempre uma linguagem
que é seu ponto de partida seu objeto epistemológico.
Enquanto linguagem, a lógica é um sistema de signifi-
cação dotado de regras sintáticas rígidas, cujos signos apre-
sentam um e somente um sentido, que tem por função repre-
sentar as relações estabelecidas entre os termos, proposições
e argumentos de outra linguagem. É uma linguagem que
manifesta a estrutura proposicional de outra linguagem. Tal
estrutura é manifesta por meio daquilo que denominamos de
fórmulas lógicas.
2. Direito Tributário Linguagem e método, p. 10.
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