Sendo assim, o direito posto, enquanto conjunto de prescrições jurídicas, num determinado espaço territorial e num preciso intervalo de tempo, será tomado como objeto da cultura, criado pelo homem para organizar os comportamentos intersubjetivos, canalizando-os em direção aos valores que a sociedade quer ver realizados: características fundamentais do constructivismo lógico- semântico

AutorFernanda Mara de Oliveira Macedo Carneiro Pacobahyba
Páginas211-246
LIVRO II
A HERMENÊUTICA JURÍDICO-TRIBUTÁRIA NO
“FUTURO QUE JÁ SE FAZ PRESENTE”238
238.
Aqui não se poderia deixar de citar a perspicácia de Thomas S. Kuhn, ao verificar os movi-
mentos de ruptura que ocorrem com as revoluções científicas. Nesse ponto, apesar de não ser sua
obra mais conhecida, “A revolução copernicana: a astronomia planetária no desenvolvimento do
pensamento ocidental” (KUHN, 2017) deixa patente que o homem passa a ter um “universo” abso-
lutamente distinto a partir da revolução empreendida por Nicolau Copérnico, em 1543. Nessa me-
dida, do mesmo modo que nos tempos correntes, “Copérnico viveu e trabalhou durante um perío-
do em que as rápidas mudanças na vida política, económica e intelectual preparavam as bases da
moderna civilização europeia e americana. A sua teoria planetária e a consequente concepção de
um universo centrado no Sol foram os agentes da transição da sociedade ocidental medieval para
a moderna, porque pareciam afectar a relação do homem com o universo e com Deus. Iniciada
como uma revisão muito técnica e altamente matemática da astronomia clássica, a teoria de Co-
pérnico tornou-se o foco das tremendas controvérsias de religião, filosofia e teoria social, que, du-
rante os dois séculos seguintes à descoberta da América, determinaram o teor do espírito moder-
no”. (KUHN, 2017, pp. 17-18). Ao tratar do “Novo Universo”, que corresponderia àquele que se
tem “construído” na atualidade, sobreleva a fecundidade das novas maneiras de ver o mundo em-
preendidas por Planck, Einstein e Bohr, e que se assemelham ao movimento de Copérnico: “Os
seus novos conceitos, e outros dos quais a revolução contemporânea depende, mostram paralelos
históricos muito próximos do conceito de Copérnico de uma Terra planetária. Concepções como o
átomo de Bohr e o espaço finito mas não limitado de Einstein foram introduzidas para resolver
problemas prementes numa única especialidade científica. Aqueles que as aceitaram, fizeram-no
inicialmente devido à imensa necessidade sentida na sua especialidade original e apesar dos seus
conflitos óbvios com o [o] senso comum, a intuição física e os conveitos básicos de outras ciências.
(...) toda a inovação fundamental numa especialidade científica transforma inevitavelmente as
ciências vizinhas e, mais lentamente, os mundos do filósofo e do leigo culto”. (KUHN, 2017, pp.
245-246). Por fim, em sua obra que já se tornou clássica, Kuhn (2013, pp. 201-202) assim resume a
“inauguração” desse mundo, com esteio nas revoluções científicas que se vão operando: “Guiados
por um novo paradigma, os cientistas adotam novos instrumentos e orientam seu olhar em novas
direções. E o que é ainda mais importante: durante as revoluções, os cientistas veem coisas novas
e diferentes quando, empregando instrumentos familiares, olham para os mesmos pontos já exa-
minados anteriormente. É como se a comunidade profissional tivesse sido subitamente
transportada para um novo planeta, onde objetos familiares são vistos sob uma luz diferente e a
eles se apregam objetos desconhecidos. Certamente não ocorre nada semelhante: não há
transplante geográfico; fora do laboratório os afazeres cotidianos continuam como antes. Não obs-
tante, as mudanças de paradigma realmente levam os cientistas a ver o mundo definido por seus
compromissos de pesquisa de uma maneira diferente. Na medida em que seu único acesso a esse
mundo dá-se através do que veem e fazem, poderemos ser tentados a dizer que, após uma revo-
lução, os cientistas reagem a um mundo diferente.” (destacado).
191
CAPÍTULO 7
“SENDO ASSIM, O DIREITO POSTO, ENQUANTO CONJUNTO
DE PRESCRIÇÕES JURÍDICAS, NUM DETERMINADO ESPAÇO
TERRITORIAL E NUM PRECISO INTERVALO DE TEMPO, SERÁ
TOMADO COMO OBJETO DA CULTURA, CRIADO PELO HOMEM
PARA ORGANIZAR OS COMPORTAMENTOS INTERSUBJETIVOS,
CANALIZANDO-OS EM DIREÇÃO AOS VALORES QUE A
SOCIEDADE QUER VER REALIZADOS”:239
CARACTERÍSTICAS FUNDAMENTAIS DO CONSTRUCTIVISMO
LÓGICO-SEMÂNTICO
A proposta deste capítulo é a apresentação inaugural de
apenas alguns dos elementos componentes do Constructivis-
mo Lógico-Semântico. Não se tem esse momento, entretanto,
como oportunidade para explanar os fundamentos da doutri-
na, dado que fugiria ao caráter de inovação e de abertura de
perspectivas que se espera em uma tese: para oferecer um ca-
ráter sistemático desta Escola, inúmeras obras perfazem esse
mister com maestria240.
Nessa medida, contudo, em razão da necessidade de en-
cadeamento lógico do texto, não se pode fugir daquilo que é
essencial ao CLS, sempre partindo de perspectivas menos
formais ofertadas por Paulo de Barros Carvalho e alcançando
elaborações mais arrojadas, à medida que o texto é trabalha-
do. Não se pode olvidar, por fim, que toda essa apresentação
também é restrita aos meios que possam interessar à inter-
pretação jurídico-tributária, como temática central desta tese.
Inicia-se, enfatizando um momento diferenciado para
o Direito Tributário e que representa o rompimento com a
239. “Palavras Introdutórias” à obra “Direito Tributário: fundamentos jurídicos da incidên-
cia” (CARVALHO, 2015, p. 28).
240. Para tanto, ofereçam-se as diversas referências constantes do final deste trabalho.

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