Os Tributos

AutorRicardo Lobo Torres
Ocupação do AutorProfessor Titular de Direito Financeiro da Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (aposentado)
Páginas361-416
CAPÍTULO XIX
Os Tributos
I – INTRODUÇÃO
1. CONCEITO DE TRIBUTO
O art. 145 da CF autoriza a União, os Estados, o Distrito Federal e
os Municípios a instituir os tributos que a seguir discrimina. O termo tri-
buto aparece ainda em outros dispositivos constitucionais: o art. 146, III,
a reserva à lei complementar a incumbência de estabelecer normas gerais
sobre definição de tributos; o art. 150 proíbe a exigência ou o aumento de
tributo sem lei (item I) e veda a cobrança de tributos retroativos (item
III) ou com efeito confiscatório (item IV); o art. 151 proíbe o tributo
não-uniforme e a concessão de isenções de tributos estaduais ou munici-
pais pela União; o art. 162 obriga a divulgação do montante de cada um
dos tributos arrecadados. O tributo, noção nuclear do Direito Constitu-
cional Tributário, é a categoria básica sobre a qual se edificam os sistemas
tributários e a partir da qual se firmam as diferenças para com as figuras
próximas do preço público, das multas, das custas e emolumentos e de
outros ingressos integrantes dos fenômenos da quase-fiscalidade, da ex-
trafiscalidade, da parafiscalidade ou da não-fiscalidade.
A Constituição não define o tributo. O CTN é que oferece a seguinte
definição: “tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda
ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilí-
cito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa ple-
namente vinculada” (art. 3º). Constitucionalizou-se, assim, a definição
codificada, até porque a CF 88 já a encontrou em vigor e não seria razoá-
vel concluir-se que a não tenha adotado.
Sucede que tal definição se faz apenas pelo gênero próximo, sem
atingir as diferenças específicas, donde se conclui que todos os elemen-
tos nela contidos são essenciais à noção de tributo, mas se adaptam tam-
bém a outras categorias de ingressos públicos (preços públicos, custas,
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contribuições sociais). De modo que as diferenciais características de-
vem ser buscadas na própria Constituição, daí resultando que o tributo:
é um dever fundamental, ao lado dos deveres militares e do serviço do
júri; limita-se pelos direitos fundamentais, através das imunidades e das
proibições de privilégio e de confisco previstos no art. 150, posto que
nasce no espaço aberto pela autolimitação da liberdade; obedece aos
princípios da capacidade contributiva (art. 145, § 1º) ou do custo-bene-
fício (art. 145, II e III) — aquele informa principalmente os impostos e
este, as taxas e as contribuições de melhoria — sendo-lhes a rigor estra-
nhos princípios como os da solidariedade social ou econômica; destina-se
a suportar os gastos essenciais do Estado ou as despesas relacionadas com
as atividades específicas do Estado de Direito, vedado o seu emprego
para suprir necessidade ou cobrir déficit de empresas, fundações ou fun-
dos (art. 167, VII, CF) e excluída do seu conceito a finalidade puramen-
te extrafiscal; emana do poder específico de legislar sobre tributo no mar-
co do poder distribuído pela Constituição (arts. 145, 148, 149, 150, I e
§ 6º, 153, 154, 155 e 156), inconfundível com o poder genérico de legis-
lar (art. 5º, II e 48).
Todas essas diferenças extraídas da CF são essenciais ao conceito de
tributo, não se podendo como tal considerar o ingresso que deles careça;
os elementos constantes da definição do art. 3º do CTN, constituciona-
lizada, são igualmente essenciais ao tributo, mas inespecíficos, de modo
que nem todo ingresso (= preço público, custas e emolumentos) que os
incorpore terá verdadeiramente natureza tributária. Sucede que o art.
149 da CF estendeu demasiadamente a noção de tributo, ao nela incluir
as contribuições econômicas, sociais, sindicais e profissionais, o que tor-
na necessário que se considerem alguns elementos que estariam melhor
fora do sistema tributário, como sejam o princípio da solidariedade so-
cial ou econômica e a finalidade não essencialmente pública; mas, desde
que o constituinte, afinado com as ideias estatizantes e de ampliação do
papel do Estado, colocou topograficamente aquelas contribuições espe-
ciais no bojo do sistema fiscal, não resta outra solução ao intérprete que
dilargar o conceito de tributo, que, mesmo amplíssimo, não chega a de-
sestruturar o Estado Fiscal, embora o torne obeso e ineficiente. Podemos
sintetizar assim a definição: Tr i b u t o é o dever fundamental, consistente em
prestação pecuniária, que, limitado pelas liberdades fundamentais, sob a
diretiva dos princípios constitucionais da capacidade contributiva, do
custo/benefício ou da solidariedade do grupo e com a finalidade principal
ou acessória de obtenção de receita para as necessidades públicas ou para
atividades protegidas pelo Estado, é exigido de quem tenha realizado o
fato descrito em lei elaborada de acordo com a competência específica ou-
torgada pela Constituição.
Ricardo Lobo Torres
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2. CLASSIFICAÇÃO DE TRIBUTO
A Constituição de 1988, a exemplo do texto anterior, é confusa no
classificar quantitativamente os tributos. A leitura do art. 145 pode levar
a se concluir pela classificação tripartida do tributo, que abrangeria os
impostos, as taxas e a contribuição de melhoria. A tripartição sempre go-
zou de grande prestígio entre os tributaristas. Impôs-se através do Códi-
go Tributário alemão de 1919, que por inspiração de Enno Becker colo-
cara ao lado do imposto (Steuer), as taxas (Gebühren) e as contribuições
(Beiträge). Todavia, diante das perplexidades causadas pelo fenômeno da
parafiscalidade, a Constituição de 1964, a Emenda 18/65, a Constitui-
ção de 1967, em sua redação originária e o CTN adotaram apenas par-
cialmente a divisão tricotômica, reduzindo a categoria das contribuições
à de melhoria. A partir da Emenda nº 1, de 1969, outras contribuições
ingressaram no rol dos tributos (art. 21, § 2º), critério ratificado pelo
texto em vigor. Assim sendo, para a classificação dos tributos terá que se
levar em conta o disposto nos arts. 148 e 149. Daí se conclui que a CF
adotou a divisão quadripartida: o tributo compreende o imposto, taxa,
a contribuição e o empréstimo compulsório. Parece-nos que as contribui-
ções sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse de ca-
tegorias profissionais ou econômicas, referidas no art. 149, devem se
amalgamar conceptualmente às contribuições de melhoria mencionadas
no art. 145, III, subsumindo-se todas no conceito mais amplo de
contribuições especiais. O empréstimo compulsório, previsto no art.
148, também compõe o conceito de tributo, como se verá adiante.
A classificação qualitativa permite distinguir os tributos em vincula-
dos ou não-vinculados e contributivos ou comutativos. Vinculados são os
tributos devidos em decorrência de uma prestação estatal em favor do
contribuinte; vinculadas são as taxas e as contribuições; não-vinculados, os
impostos. Tributo contributivo é o que encontra a sua justificativa primor-
dial na capacidade contributiva (= imposto); quando se basear no princí-
pio do custo/benefício ou da equivalência, como acontece com as taxas e
as contribuições, classificar-se-á como tributo comutativo ou retributivo.
II – IMPOSTOS
3. CONCEITO
A CF emprega a palavra imposto em diversas oportunidades, sem
contar a enumeração de cada uma de suas categorias no quadro da distri-
Curso de Direito Financeiro e Tributário
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