Vigência, eficácia e revogação das normas jurídicas

AutorAurora Tomazini de Carvalho
Páginas791-824
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Capítulo XVIII
VIGÊNCIA, EFICÁCIA E REVOGAÇÃO DAS
NORMAS JURÍDICAS
SUMÁRIO: 1. Vigência das normas jurídicas; 1.1. Vigência ple-
na e vigência parcial; 1.2. Vigência das normas gerais e abstratas
e das normas individuais e concretas; 1.3. Vigência das regras
introdutoras e das regras introduzidas; 2. Vigência no tempo e
no espaço; 2.1. Vigência no tempo; 2.2. Vigência no espaço; 3. Vi-
gência e aplicação; 4. Eficácia das normas jurídicas; 4.1. Eficácia
técnica; 4.1.1. Ineficácia técnica sob os enfoques sintático, se-
mântico e pragmático; 4.2. Eficácia jurídica; 4.3. Eficácia social;
5. Validade, vigência e eficácia; 6. Revogação das normas jurídi-
cas; 6.1. Sobre a revogação das normas jurídicas; 6.2. Efeitos da
revogação no direito.
1. VIGÊNCIA DAS NORMAS JURÍDICAS
Próximos ao conceito de validade estão os de vigência e
eficácia. Tão próximos que não é difícil verificar entre os au-
tores a confusão de definições e a troca de um por outro. Por
esta razão e também em decorrência do condicionamento ao
recorte promovido pelo jurista para o isolamento do objeto, há
uma grande divergência doutrinária a respeito do que são: va-
lidade, vigência e eficácia, o que acaba por causar um enorme
embaraço na compreensão do fenômeno jurídico.
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AURORA TOMAZINI DE CARVALHO
No capítulo anterior voltamos nossa atenção ao conceito
de validade e assim o fizemos definindo-o como sendo, não
um predicado adjetivante da norma jurídica, mas uma relação
de pertencialidade entre a regra e o sistema do direito positi-
vo, condição de sua existência enquanto norma jurídica. Nes-
te capítulo, nossa atenção volta-se à definição dos conceitos
de vigência e eficácia, que como já mencionamos, estão lado a
lado ao conceito de validade.
Diferentemente do que ocorre com a validade, a vigência é
tida como uma qualidade de certas normas jurídicas “que estão
prontas para propagar efeitos jurídicos, tão logo aconteçam, no
mundo fáctico, os eventos que elas descrevem”613. Nestes ter-
mos, ter vigência é ter força para irradiar efeitos jurídicos em
certo espaço territorial e temporal. A vigência é uma caracte-
rística das normas que estão aptas a serem aplicadas, nos di-
zeres e PAULO DE BARROS CARVALHO, significa o atributo
das normas que estão preparadas para incidir no mundo so-
cial, regulando deonticamente as condutas intersubjetivas”614.
É muito comum encontrarmos na doutrina jurídica defi-
nições que tratam a vigência como “o lapso temporal em que
a norma apresenta a característica de estar apta a propagar
efeitos jurídicos”. Devemos, no entanto, ressaltar que vigên-
cia não é um intervalo de tempo, mas sim a qualidade da nor-
ma apta a propagar efeitos jurídicos. A confusão se instaura
devido ao fato das regras apresentarem tal característica em
certo período de tempo durante sua existência no mundo ju-
rídico, mas não se mantém, pois uma coisa é a aptidão e outra
o lapso temporal em que aptidão é verificada.
Outro aspecto a ser ressaltado é que nem toda norma ju-
rídica é vigente. Há normas positivadas, existentes no mundo
do direito e, portanto, válidas, que ainda não dispõem desta
aptidão, pois não têm força para propagar as consequências
jurídicas prescritas em seus mandamentos, sendo suscetíveis
613. PAULO DE BARROS CARVALHO, Curso de direito tributário, p. 82.
614. Direito tributário, fundamentos jurídicos da incidência, p. 53.
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CURSO DE TEORIA GERAL DO DIREITO
de serem aplicadas. A vigência, assim, está diretamente rela-
cionada à prontidão da norma para incidir. As normas aptas
a serem aplicadas estão prontas para incidir e propagar os
efeitos que lhe são próprios. São, portanto, regras jurídicas
vigentes. As normas que não gozam desta qualificação, não
têm força para irradiar efeitos no mundo do direito e disci-
plinar as condutas por elas prescritas. São normas jurídicas
não-vigentes.
As normas jurídicas não têm vigência: (i) ou porque ainda
não a adquiriram; (ii) ou porque já a perderam.
Nos termos do artigo 1º da LICC (Decreto-lei 4.657/42),
“salvo disposição contrária, a lei começa a vigorar em todo o
país quarenta e cinco dias depois de oficialmente publicada”.
Isto significa dizer que, mesmo depois do seu ingresso no or-
denamento (que se dá com a publicação) a regra ainda não
tem aptidão para produzir os efeitos que lhe são próprios. So-
mente o terá (i.a) quarenta e cinco dias após; ou salvo disposi-
ção em contrário, quando: (i.b) o próprio documento norma-
tivo trouxer o prazo de entrada em vigor de seus enunciados
(geralmente ao final das disposições); ou (i.c) quando este é
fixado em diploma de superior hierarquia (como o princípio
constitucional da anterioridade em matéria tributária que
prescreve a entrada em vigor das normas instituidoras de
tributo no exercício financeiro seguinte a sua publicação ou
noventa dias após). Este lapso de tempo em que a norma já
pertence ao sistema, porém ainda não tem força para regular
as condutas humanas que prescreve, é denominado de vaca-
tio legis.
A vacatio legis é o tempo que o direito entende como ne-
cessário para que todos os membros da comunidade tomem
conhecimento das novas disposições nele introduzidas, antes
que elas passem a produzir efeitos jurídicos. No decurso deste
prazo a norma aguarda a data do início de sua vigência. Assim
sendo, ainda que se verifique o acontecimento descrito em
sua hipótese, não se propagam os efeitos jurídicos prescritos
em seu consequente, pois a regra não está apta a incidir.

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