As aposentadorias do RPPS - regras de acesso, forma de cálculo e de reajustamento

AutorTatiana de Lima Nóbrega/Maurício Roberto de Souza Benedito
Páginas51-84
Capítulo 3
AS APOSENTADORIAS DO RPPS –
REGRAS DE ACESSO, FORMA DE
CÁLCULO E DE REAJUSTAMENTO
Este capítulo trata das espécies de aposentadoria dos RPPSs da União, do Estados,
do DF e do Municípios, cujas regras foram modificadas pela EC 103/2019, que promoveu
sua desconstitucionalização, atribuindo aos entes federativos autonomia para disporem
sobre elas.
Antes da vigência da EC 103/2019, as regras de acesso à aposentadoria, como cri-
térios de idade, tempo de contribuição, de serviço público etc., aplicavam-se aos RPPSs
dos entes federativos, que apenas as reproduziam ou faziam-lhes remissão em sua legis-
lação. Com a alteração promovida pela Emenda, veremos como os entes poderão dispor
sobre as regras de acesso e de cálculo dos proventos das aposentadorias de seus regimes
previdenciários. Limitar-nos-emos, entretanto, às aposentadorias normais, previstas no
§ 1º do art. 40 da CR/88, que são de três espécies: por incapacidade permanente para o
trabalho (I); compulsória (II); e voluntária (III).
As aposentadorias especiais, previstas nos §§ 4º-A, 4º-B, 4º-C e 5º do art. 40 da
CR/88, serão objeto de capítulo específico. No entanto, antes de examinarmos as espécies
de aposentadoria e o cálculo de seus proventos, cumpre fazermos uma retrospectiva, a
fim de verificarmos como a forma de cálculo e de reajustamento foi sendo modificada ao
longo do tempo pelo legislador constituinte reformador.
3.1 PROVENTOS DE APOSENTADORIA – FORMA DE CÁLCULO E REAJUSTAMENTO:
RETROSPECTIVA CONSTITUCIONAL
Quem entrou no serviço público federal, estadual, distrital ou municipal antes da
vigência da EC 41/03, ou seja, até 31 de dezembro de 2003, tinha direito, ao aposentar-se,
de receber proventos de aposentadoria com base na última remuneração do cargo efeti-
vo. É o que se chamava de direito à integralidade dos proventos.
Por esse direito, não importava o histórico contributivo do servidor, que poderia ter
passado boa parte de sua vida laborativa, por exemplo, contribuindo sobre uma remu-
neração baixa e, faltando pouco tempo para aposentar-se, passar em um concurso públi-
co para um cargo bem remunerado e ser aposentado com proventos correspondentes à
última remuneração desse cargo, mesmo não tendo contribuído o suficiente para tanto.
Exemplifiquemos com um servidor estadual que ingressou no serviço público em
um cargo técnico de nível médio e, após trinta anos contribuindo para esse cargo, passou
num concurso público para juiz estadual. Após cinco anos de efetivo exercício como
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magistrado, solicitou sua aposentadoria, que lhe foi concedida com proventos corres-
pondentes à integralidade de sua última remuneração como juiz, embora só tenha con-
tribuído cinco anos sobre essa remuneração e trinta anos sobre a remuneração do cargo
anterior, de valor consideravelmente mais baixo. Segundo Tavares (2004, p. 19-20):
Esse fato, que de forma alguma era isolado no serviço público, levava a uma injustiça do sistema,
pois conduzia à chamada solidariedade invertida. Como, teoricamente, as contribuições não foram
suficientes para sustentar o benefício de aposentadoria naquele patamar, o fundo era onerado por
solidariedade para garantir a aposentação, levando a que as contribuições pagas por servidores mais
humildes fossem utilizadas para o custeio desse benefício. E ainda: como tão só as contribuições do
grupo não eram suficientes, o Estado acabava sendo responsável pela cobertura do déficit, a partir
de ingressos públicos outros, principalmente fruto de arrecadação tributária, que deixava de ser uti-
lizada para outros fins, como o atendimento à saúde, à habitação, melhoria de estradas etc.
Essa era a realidade da previdência social do servidor público até 31 de dezembro de
2003, data de publicação da EC 41/2003, que pôs fim à integralidade dos proventos, uma
vez que esse direito contrariava o princípio do equilíbrio financeiro e atuarial, segundo o
qual as contribuições devem ser suficientes para o pagamento do benefício do servidor.
A partir da EC 41/2003, então, os proventos passaram a ser calculados pela médi a
das remunerações e dos salários de contribuição que serviram de base para contribuição
do servidor, isto é, para o cálculo dos proventos, deixou de ser considerado o valor da
última remuneração do servidor para ser considerada a média das remunerações recebi-
das no serviço público e dos salários recebidos na iniciativa privada, se for o caso, sobre
os quais houve a incidência da alíquota de contribuição previdenciária. Para o cálculo
dos proventos, entretanto, considerava-se a média das maiores remunerações, corres-
pondendo a 80% de todo o período contributivo desde julho de 1994 ou desde o início
da contribuição1.
No entanto, a EC 41/2003 assegurou a integralidade da última remuneração (1)
àqueles que já percebiam seus benefícios previdenciários (ato jurídico perfeito); (2) aos
servidores que já haviam cumprido as regras de aposentadoria anteriormente vigentes
(direito adquirido); e (3) aos servidores que ingressaram no serviço público antes de
sua vigência (expectativa de direito), para quem houve a previsão de regras de transição,
pelas quais o direito à integralidade dos proventos foi mantido, desde que cumprido um
tempo maior de permanência no serviço público.
A EC 41/2003 também acabou com o direito à paridade dos proventos, pelo qual os
servidores, uma vez aposentados (e seus pensionistas), teriam direito a receber seus pro-
ventos de forma paritária à remuneração recebida pelo servidor em atividade. Assim, se o
servidor ativo tivesse reajuste, este teria de ser repassado aos aposentados e pensionistas,
além de qualquer vantagem de natureza genérica ou decorrente de evolução e reestru-
turação na carreira, que também teria de ser estendida ao aposentado ou pensionista,
1. Lei 10.887/2004, art. 1º: “No cálculo dos proventos de aposentadoria dos servidores titulares de cargo efetivo de
qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fun-
dações, previsto no § 3º do art. 40 da Constituição Federal e no art. 2º da Emenda Constitucional 41, de 19 de
dezembro de 2003, será considerada a média aritmética simples das maiores remunerações, utilizadas como base
para as contribuições do servidor aos regimes de previdência a que esteve vinculado, correspondentes a 80% (oi-
tenta por cento) de todo o período contributivo desde a competência julho de 1994 ou desde a do início da contri-
buição, se posterior àquela competência.”
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CAPÍTULO 3 • AS APOSENTADORIAS DO RPPS
mesmo não tendo havido contribuição para a percepção desses valores. Nesse caso, o
benefício previdenciário era indexado à remuneração do servidor ativo. Por essa razão,
ou seja, por afronta ao princípio do equilíbrio financeiro e atuarial, a paridade dos bene-
fícios previdenciários foi extinta pela referida Emenda. Vejamos o comentário de Vieira
(2004, p. 35) à época da recém-publicada EC 41/2003:
Assim, findou-se o princípio da paridade, passando para a mesma regra do RGPS, qual seja, o prin-
cípio da preservação do valor real dos benefícios. Uma vez que a preservação do valor real ficou
condicionada a critério jurídico, como consequência trará economia para os Regimes Próprios,
pois qualquer reajuste na remuneração do pessoal da ativa não ocasionará reajuste dos inativos
e pensionistas.
Ante o fim da paridade, os benefícios previdenciários passaram a ser reajustados
nos termos do § 8º do art. 40, com a redação conferida pela EC 41/2003, que assegura o
reajustamento dos benefícios para preservar, em caráter permanente, o seu valor real, de
acordo com critérios estabelecidos em lei.
A EC 41/2003, assim como fez quando extinguiu o direito à integralidade, asse-
gurou a paridade (1) àqueles que já percebiam seus benefícios previdenciários; (2) aos
servidores que já haviam cumprido as regras de aposentadoria anteriormente vigentes; e
(3) aos servidores que ingressaram no serviço público antes de sua vigência, para quem
houve a previsão de regras de transição, pelas quais o direito à paridade foi mantido, des-
de que cumprido um tempo maior de permanência no serviço público.
Assim, a partir de 31 de dezembro de 2003, data de publicação da EC 41/2003,
e até 13 de novembro de 2019, data de publicação da EC 103/2019, os proventos de
aposentadoria correspondiam à totalidade da média (integralidade da média, que não
se confunde com a integralidade da última remuneração do cargo efetivo), nos casos
de (1) aposentadoria voluntária por tempo de contribuição e idade; e (2) aposenta-
doria por invalidez decorrente de doença grave arrolada em lei do ente federativo,
de acidente em serviço e de moléstia profissional ou à proporcionalidade da média,
composta pela razão entre o tempo de contribuição do servidor e o tempo mínimo de
contribuição exigido (aposentadoria com proventos proporcionais ao tempo de con-
tribuição), no caso de aposentadoria voluntária por idade; aposentadoria compulsória;
e aposentadoria por invalidez em decorrência de acidente não caracterizado como em
serviço ou de enfermidades para as quais não se previam proventos correspondentes à
integralidade da média.
A EC 103/2019, por sua vez, desconstitucionalizou a forma de cálculo dos benefí-
cios previdenciários, atribuindo aos entes federados a competência para disporem sobre
essa matéria. No entanto, apenas para os servidores públicos da União, dispôs sobre a
forma de cálculo dos proventos de aposentadoria e de pensão, enquanto não editada
lei federal específica. Para os servidores públicos dos Estados, do DF e dos Municípios,
enquanto não editada a lei por suas Casas Legislativas, continuam valendo as mesmas
regras de cálculos vigentes antes da publicação da Emenda, ou seja, continuam válidas as
regras da EC 41/2003, reproduzidas em sua legislação interna.
Para a aposentadoria do servidor federal, a EC 103/2019 manteve, no cálculo dos
proventos, a média das remunerações e de salários que serviram de base para as contri-
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