As novas atribuições do administrador judicial na reforma do artigo 22 da lei de falências e recuperações judiciais
Autor | Ricardo de Moraes Cabezón |
Páginas | 53-70 |
AS NOVAS ATRIBUIÇÕES DO ADMINISTRADOR
JUDICIAL NA REFORMA DO ARTIGO 22 DA LEI
DE FALÊNCIAS E RECUPERAÇÕES JUDICIAIS
Ricardo de Moraes Cabezón
Doutorando pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Mestre em Di-
reitos Difusos e Coletivos pela Unimes. Especialista em Direito Processual pela Unip e
docência do Ensino Superior pela UFRJ. Professor universitário de curso de graduação
e pós-graduação em Direito. Advogado, Administrador Judicial. Sócio-administrador
da Cabezón Administração Judicial Eireli.
Sumário: 1. Introdução. 2. A reforma da Lei 11.101/2005. 2.1 O esquecimento do legislador.
2.2 As novas atribuições do administrador judicial insculpidas no artigo 22 da LFR. 2.2.1
As atribuições do administrador judicial incluídas no artigo 22 comuns aos procedimentos
recuperacionais e falenciais. 2.2.2 As atribuições do administrador judicial especícas
ao procedimento recuperacional contidas no artigo 22 da LFR. 2.2.3 As atribuições do
artigo 22 especícas ao processo falimentar aos administradores judiciais. 3. Conclusão.
4. Referências.
1. INTRODUÇÃO
O administrador judicial é um personagem indispensável ao sucesso e bom an-
damento dos procedimentos concursais, ao qual Trajano Miranda Valverde atribui a
natureza jurídica de “órgão auxiliar da justiça”,1 ou seja, de um elemento integrante
da estrutura processual recuperacional ou falimentar inerente à própria organização
judiciária.
Rubens Requião dedica a seguinte observação:
[...] sua importância é ressaltada pelos juristas, tendo Percerou e Desserteaux observado que é o órgão
essencial da falência, e ninguém, dentro do processo, tem um lugar comparável ao seu. Não há nada
de exagerado, acentua esses autores, em dizer que é sobretudo de seu valor e prossional que depende,
de fato, o sucesso da instituição.2
A nomenclatura utilizada para designar a pessoa3 que exerce o referido múnus pú-
blico passou por vários aprimoramentos não só do aspecto terminológico, como também
do cabedal de deveres e responsabilidades daqueles que desempenhavam tal mister.
1. VALVERDE, Trajano de Miranda. Comentários a Lei de Falências. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1955. v. II, p. 101.
2. REQUIÃO, Rubens. Curso de direito falimentar. Falência. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 1981. v. 1, p. 209.
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RICARDO DE MORAES CABEZÓN
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Inicialmente denominado “curador fiscal provisório”,4 passando a “síndico”5 e “co-
missário”,6 a atual nomenclatura “administrador judicial”78 surge na Lei 11.101/20059
para designar o agente nomeado a critério do juízo, presidente do procedimento10 nos
termos do artigo 2111 da Lei de Falências e Recuperações Judiciais (LFR) com expertise
na área jurídica, contábil, administrativa e/ou econômica, podendo inclusive ser pessoa
jurídica especializada, hipótese que ensejará escolher um profissional específico para
condução do processo que não poderá ser substituído sem autorização do magistrado.
A lei silencia-se quanto à possibilidade de nomear dois ou mais administradores
judiciais, porém, na prática, não é incomum que equipes se unam ou mesmo utilizem
uma Sociedade com Propósito Específico (SPE) apenas para determinado procedimento,12
devendo, contudo, a exemplo dos termos do parágrafo único do artigo 21 retrocitado,
ter um profissional responsável pelas obrigações e encargos assumidos em respeito ao
princípio da identidade física do responsável pela função.
Nesse sentido, em que pese o artigo 21 franquear ao juiz a possibilidade de nomear
advogados, contadores, economistas ou administradores, o bom andamento dos proce-
dimentos concursais, diante dos desafios impostos cotidianamente, exige o manejo de
diversas situações de distintos ramos e peculiaridades, demandando a busca por profis-
sionais ou equipes especializadas que reúnam várias expertises, tendo em vista que o exer-
cício da função exige conhecimento jurídico amplo (direito empresarial, consumerista,
5. Terminologia adotada no Decreto 917/1890, na Lei 859/1902, na Lei 2.024/1908 e no Decreto 7.661/1945 (apenas
na falência).
6. Nome usado pelo legislador para designar o auxiliar do juízo na concordata nos termos do Decreto 7.661/1945.
7. A despeito da atual terminologia que unificou o síndico e o comissário do Decreto 7.661/1945, João Pedro Scalzilli,
Luis Felipe Spinelli e Rodrigo Tellechea salientam que melhor seria se o legislador tivesse denominado “liquidante
judicial” na falência e “fiscal judicial” em virtude das distintas atribuições que desempenham nos dois procedi-
mentos (Recuperação de empresas e falência: teoria e prática da Lei 11.101/2005. São Paulo: Almedina, 2016. p.
158.).
8. Alfredo Luiz Kugelmas e Fabricio Godoy de Souza também salientam o descontentamento com a nova terminolo-
gia: “Nestes dez anos de vigência da lei, percebemos que foi na realidade um equívoco a alteração da denominação
de síndico e comissário para administrador judicial, uma vez que o profissional é invariavelmente confundido
com o sócio, diretor ou efetivo administrador da devedora. São inúmeras as confusões e transtornos causados aos
administradores judiciais e por isso sugere-se uma mudança para interventor judicial” (O papel do administrador
judicial na recuperação e na falência. In: ABRÃO, Carlos Henrique; ANDRIGHI, Fatima Nancy; BENETI, Sidnei
(Coord.). 10 anos de vigência da Lei de Recuperação e Falência (Lei n. 11.101/05). São Paulo: Saraiva, 2015. p. 219).
9. A despeito da nomenclatura, salienta Marcelo Barbosa Sacramone que “o administrador judicial apenas excepcio-
nalmente exerce as atividades de administração do devedor. Na recuperação judicial, a atividade de administração
ocorre excepcionalmente na hipótese de afastamento do devedor de suas funções até a eleição do gestor judicial
(art. 65, § 1.º). Na falência, apenas se for autorizada a continuidade provisória dos negócios do falido (art. 99, XI)”
(Comentários à Lei de Recuperações de Empresas e Falência. São Paulo: Saraiva Educação, 2018. p. 116).
10. Vide artigos 52, I, e 99, IX, da LFR.
11. LFR, artigo 21. “O administrador judicial será profissional idôneo, preferencialmente advogado, economista,
administrador de empresas ou contador, ou pessoa jurídica especializada.
Parágrafo único. Se o administrador judicial nomeado for pessoa jurídica, declarar-se-á, no termo de que trata o
art. 33 desta Lei, o nome de profissional responsável pela condução do processo de falência ou de recuperação
judicial, que não poderá ser substituído sem autorização do juiz.”
12. Segundo Marcelo Barbosa Sacramone, “embora a Lei, ao fazer menção a administrador judicial, sempre o faça no
singular, não há óbice à nomeação de mais do que um administrador judicial para a realização das atribuições no
mesmo processo” (Comentários à Lei de Recuperações de Empresas e Falência. São Paulo: Saraiva Educação, 2018.
p. 117), no entanto lembra que esse fato não pode ensejar prejuízo à massa ou a devedora em ônus financeiro
superior ao que já se prevê na lei, cabendo assim a partilha da remuneração fixada (Idem, p. 118).
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