Breves reflexões sobre o interesse de agir na tutela inibitória trabalhista

AutorEstêvão Mallet
Páginas223-234
BREVES REFLEXÕES SOBRE O INTERESSE DE
AGIR NA TUTELA INIBITÓRIA TRABALHISTA
ESTÊVÃO MALLET
(1)
(1) Professor de Direito do Trabalho da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, Doutor e Livre-Docente em Direito e
advogado.
(2) TRT – 10ª Reg., 3ª T., RO n. 00748-2011-020-10-00-3, Rel. Douglas Alencar Rodrigues, julg. em 28.08.2013 in DJET de 06.09.2013.
(3) GAIA, Fausto Siqueira. A tutela inibitória de ofício e a proteção do meio ambiente do trabalho – limites e possibilidades de atuação
jurisdicional. São Paulo: LTr, 2015. p. 81.
1. INTRODUÇÃO
Nos últimos tempos tem crescido, a olhos vistos, a
importância da tutela inibitória no processo do trabalho.
Se antes quase só havia pedidos de natureza ressarcitória,
como pagamento de valores não adimplidos durante a vi-
gência do contrato de trabalho, aos poucos se tornam mais
comuns pedidos deduzidos contra práticas ilegais, espe-
cialmente em ações civis públicas em que se busca evitar
a ocorrência do ilícito ou fazê-lo cessar, adequando-se a
conduta aos parâmetros normativos aplicáveis. Os pedidos
de pagamento de horas extras, por exemplo, ainda tão co-
muns no foro trabalhista – recorrentes mesmo –, começam
a conviver, lado a lado, com pedidos para que sejam respei-
tados os limites de duração do tempo de trabalho ou para
que cesse o descumprimento das normas sobre pausas ou
prestação de horas extras, em particular formulados pelo
Ministério Público do Trabalho. Um bom exemplo está em
precedente em que se registrou: “O ordenamento jurídi-
co brasileiro permite impedir que os ilícitos trabalhistas
perpetuem-se no tempo, evitando-se que a Administração
aja somente após a ocorrência do dano e também que ca-
da um dos lesados reclame individualmente a reparação
cabível. Demonstrada nos autos a prestação excessiva de
horas extraordinárias e a inobservância dos descansos le-
gais, fatos que acabam por acarretar a privação dos mo-
mentos de descanso e convívio social dos trabalhadores,
ampliando os riscos de acidentes e doenças ocupacionais
e também inviabilizando a geração de novos postos de tra-
balho, revela-se absolutamente necessária a adoção de me-
didas, com imposição de obrigações de fazer e não fazer,
sob pena de pagamento de multa diária (art. 84, § 4º, da
Lei n. 8.078/1990), para desestimular o reiterado descum-
primento das normas imperativas concernentes à jornada
de trabalho”(2). Ao invés do mero pagamento de um crédito
ou do simples ressarcimento por infração à lei, pedido em
ação individual, ajuizada depois de já extinto o contrato
de trabalho, passa-se a buscar, cada vez mais, que a lei não
continue a ser violada durante a vigência da relação jurí-
dica de emprego, para não se precisar reclamar, adiante, a
compensação financeira pelo ilícito.
É uma mudança de grande significado. Reparar a lesão,
com pagamento ou indenização, é quase sempre menos
adequado do que impedir a sua ocorrência, ao menos para
o titular do direito ou para o interesse público. Muitas ve-
zes, senão quase sempre, a reparação, quando não incom-
pleta e insuficiente, não compensa, de maneira efetiva, a
infração à lei, ainda que traga uma vantagem financeira.
No campo da medicina e segurança do trabalho percebe-
-se o ponto com grande nitidez. Não interessa tanto que o
empregado receba adicional de insalubridade, importando
mais que não seja exposto, sempre que possível, a condição
agressiva à sua saúde. Afinal, o pagamento do acréscimo sa-
mesmo de outro, mais elevado, que se venha a impor por
lei ou a negociar coletivamente – nem de longe compensa
o dano à integridade física do trabalhador. De igual modo,
impedir que acidentes aconteçam releva muito mais do que
reclamar compensação por todos aqueles que se verifica-
rem. Nenhuma indenização é suficiente para suplantar, de
maneira adequada, a vida perdida, a lesão incapacitante(3),
a intimidade devassada ou a honra conspurcada. Eis a razão
para a interdição ou o embargo preventivos, previstos no
É evidente, pois, a superioridade, teórica, prática e so-
cial, em muitos casos, da tutela inibitória. Mesmo assim,
ela não deixa de oferecer alguma dificuldade, em particular
no plano do interesse de agir, dificuldade que está a mere-
cer mais detida reflexão, diante de sua crescente utilização
e da pouca atenção que se costuma dedicar ao assunto.
2. O INTERESSE DE AGIR COMO CONDIÇÃO DA
AÇÃO
O Código de Processo Civil em vigor, no campo das
condições da ação, eliminou a referência, existente no

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