Completabilidade e direito privado: interação entre direito tributário e direito privado

AutorCharles William Mcnaughton
Ocupação do AutorMestre e Doutor em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP)
Páginas135-218
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3 ΧΟΜΠΛΕΤΑΒΙΛΙ∆Α∆Ε Ε ∆ΙΡΕΙΤΟ
ΠΡΙςΑ∆Ο: ΙΝΤΕΡΑ∩℘Ο ΕΝΤΡΕ ∆ΙΡΕΙΤΟ
ΤΡΙΒΥΤℑΡΙΟ Ε ∆ΙΡΕΙΤΟ ΠΡΙςΑ∆Ο
3.1 Colocação do problema
Duas ordens de problemas surgem quando se examinam
as relações entre o direito público e o direito privado. A pri-
meira é a da unidade do sistema jurídico, que é uma questão
epistemológica. A segunda refere-se à necessidade de deter-
minação do tipo de diálogo que as normas de direito público
travam com as normas de direito privado, que é um problema
de interpretação do dado jurídico.
Entre as soluções propostas para o questionamento acerca
da unidade, há aquela apresentada por Hans Kelsen, que aqui
adotamos, mediante o recurso da alusão à norma fundamental.
Por ter reconduzido o fundamento de validade da Constituição à
uma norma a priori e partindo da premissa de que qualquer nor-
ma positiva infraconstitucional retira seu fundamento de validade
da Constituição, o jusfilósofo estabeleceu um ponto de origem
comum a todas normas que compõem o ordenamento jurídico.193
193. KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. São Paulo: Martins Fontes,
1985, p. 207.
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CHARLES WILLIAM MCNAUGHTON
Com esse instrumento, estamos partindo de uma noção de uni-
dade do sistema jurídico brasileiro.
Ainda assim, podemos pensar em subsistemas, internos
ao direito positivo, tomando-os como conjuntos de normas
unificadas a partir de certos princípios comuns. Nessa ordem,
o conjunto de normas que regem as relações de índole privada
é um subsistema próprio do direito positivo brasileiro, assim
como o sistema jurídico tributário, também o é. Empregarei as
expressões “direito privado” e “sistema jurídico privado” para
indicar o conjunto de normas que regem as relações dos par-
ticulares e “direito tributário” ou “sistema jurídico tributário”,
para indicar o conjunto de normas que têm como núcleo aglu-
tinador o tributo. Apesar dessas nomenclaturas, utilizadas para
facilitar o discurso, registramos que ambos os segmentos nor-
mativos compõem uma unidade maior que é o direito e gozam
de autonomia apenas didática.194
Agora, essa unidade sistemática não implica a unidade
semântica porque o direito, expresso em linguagem técnica, é
passível de estar dotado de termos plurívocos.
É apenas por um estudo empírico, do conteúdo das nor-
mas jurídicas, que poderemos concluir se o signo “serviço”,
constantemente utilizado pelo direito privado, denota signifi-
cados comuns no âmbito do artigo 156, inciso III, da Constitui-
ção da República e na norma artigo 593 do Código Civil. Paulo
Ayres Barreto percebeu esse ponto com muita acuidade:
A proclamação da unidade do sistema normativo, com
o consequente reconhecimento de que se divide o estu-
do do direito em ramos apenas para fins didáticos, não
autoriza a conclusão de que conceitos e institutos pre-
vistos em um ramo do Direito possam ser, automática e
194. CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 25.ed. São
Paulo: Saraiva, 2013, p. 42.
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ELISÃO E NORMA ANTIELISIVA
infalivelmente, transplantados para outro ramo. É certo
que, diante da inexistência de óbices estabelecidos den-
tro do próprio sistema normativo, esse será o caminho
natural. Ocorre que tais óbices existem e devem ser ri-
gorosamente observados.195
Além desse exame semântico, caso concluído que o di-
reito tributário é de superposição – incide sobre conceitos
delineados por outros ramos – teremos de enfrentar outro
questionamento acerca da relação entre validade, eficácia no
direito civil e os respectivos efeitos tributários do ato jurídico.
Ao se examinar a relação entre sistema jurídico tributá-
rio e sistema jurídico privado, determina-se até que medida o
último influencia o âmbito material de competência inserto
na esfera tributária, eliminando-se potencial lacuna pragmá-
tica de se estabelecer a materialidade passível de ser tributa-
da pelos diversos entes tributantes. E também, delimita-se a
divisa que norteia a distinção entre elisão e evasão fiscal que
depende, diretamente, do campo de incidência das normas
tributárias.
Tratarei, em seguida, sobre a relação semântica que se
trava entre normas do sistema jurídico tributário e do sistema
jurídico privado.
Após tal exame, passarei a examinar a questão da vali-
dade e eficácia dos atos praticados no contexto do sistema ju-
rídico privado e sua relação com o direito tributário.
Finalmente, passarei pelo problema dos casos de requa-
lificação ou desqualificação que as autoridades podem em-
preender no campo tributário e buscarei relacioná-los com
195. BARRETO, Paulo Ayres. Elisão tributária, limites normativos. Tese
apresentada ao concurso de livre-docência do Departamento de Direito
Econômico e Financeiro da Faculdade de Direito da Universidade de São
Paulo. São Paulo: USP, 2008, p.165-166.

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