A curatela

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A CURATELA
17.1 A TUTELA DOS INCAPAZES E AS REGRAS PROTETIVAS
O ordenamento jurídico se preocupa bastante com a tutela das pessoas inca-
pazes. E não poderia ser diferente, já que tal pessoa se encontra impossibilitada de
exprimir sua vontade de maneira válida e, por isso, “carece de proteção e não pode
f‌icar abandonado à própria sorte, sujeito à suas falhas e equívocos ou à inescrupulosa
exploração de terceiros”.1
Diante desse cenário, a própria lei def‌ine uma série de medidas aptas a amparar
a pessoa incapaz.
De acordo com o Código Civil, qualquer negócio jurídico será válido quando
praticado por agente capaz, se referir a um objeto lícito, possível, determinado ou
determinável e, ainda, se apresentar da forma prescrita ou não defesa em lei (art.
104). Caso o agente não seja capaz, o ordenamento jurídico impõe consequências
distintas, de acordo com o nível desta incapacidade (relativa ou absoluta). Assim, se
for praticado por pessoa absolutamente incapaz, o negócio jurídico correspondente
será nulo, enquanto que, se for realizado por relativamente incapaz, será anulável,
de acordo com os artigos 166, I e 171, I, ambos do Código Civil. Neste último caso,
o negócio: a) poderá ser conf‌irmado pelas partes, salvo direito de terceiros (art. 172,
CC); b) a incapacidade relativa de apenas uma das partes não pode ser invocada pela
outra em benefício próprio; c) a incapacidade relativa de apenas uma das partes não
aproveita aos cointeressados capazes, salvo se for indivisível o objeto do direito ou
da obrigação comum (art. 105, CC).
Em relação à prescrição, ela não correrá contra os absolutamente incapazes (isto
é, contra os menores de 16 anos de idade) e nem entre curatelados e seus curadores,
durante a curatela. Por outro lado, ela correrá contra os relativamente incapazes,
que terão ação contra os seus assistentes ou representantes legais, que derem causa
à prescrição, ou não a alegarem oportunamente (art. 195, CC).
Os prazos decadenciais também não correrão contra os absolutamente incapazes
(art. 198, I, 197, III e 208, CC). Já no caso dos relativamente incapazes, será de 4
1. NADER, Paulo. Curso de direito civil: Família. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 875.
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DIREITO DAS FAMÍLIAS E DO IDOSO • Patricia Novais calmoN
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anos o prazo de decadência para pleitear a anulação do negócio jurídico, contados
a partir do dia em que cessar sua incapacidade (art. 178, III, CC).
A capacidade para testar é aferida no momento de sua realização. As pessoas
incapazes e as que não estiverem em pleno discernimento não possuem capacidade
para testar. Tal regra é excepcionada ao maior de 16 anos, que é considerado relati-
vamente incapaz até o advento da maioridade (art. 1.860, CC), mas, mesmo assim,
pode testar. Porém, deve-se alertar que a incapacidade superveniente não invalida o
testamento, nem o testamento de incapaz (diferentemente do adolescente) se valida
com a superveniência da capacidade (art. 1.861, CC).
Além disso, o inventário pela via extrajudicial somente poderá se desenvolver
quando todos os herdeiros forem capazes. Da mesma forma, como o divórcio de
pessoa incapaz pode ser proposto por curador, ascendente ou irmão, também deverá
se processar necessariamente pela via judicial (art. 1.582, CC; art. 12 e 34, Res. 35,
de 24/04/2007, CNJ).
Caso o incapaz venha a receber doação, sendo ela pura, dispensa-se a aceitação,
pois o benef‌iciará (art. 543, CC). Ademais, como as dívidas de jogo não obrigam ao
pagamento, caso o incapaz curatelado as tenha voluntariamente adimplido, poderá
recobrar tais valores, direito que não é atribuído ao capaz (art. 814, CC).
Lado outro, ninguém pode reclamar o que, por uma obrigação anulada, pagou
a um incapaz, se não provar que reverteu em proveito dele a importância paga (art.
181, CC). Da mesma forma, o pagamento realizado a credor incapaz de quitar não
será válido, salvo se o devedor provar que em benefício dele se reverteu a quantia (art.
310, CC). Até mesmo como derivação de tal lógica, a consignação em pagamento
terá lugar somente quando o credor for incapaz de receber (art. 335, III, CC).
Além de tudo isso, o incapaz terá domicílio necessário, que corresponderá ao
do seu representante ou assistente (art. 76, parágrafo único, CC) e sua conf‌issão
não terá qualquer ef‌icácia, porque ele não pode dispor do direito a que se referem
os fatos confessados (art. 213, CC).
O incapaz poderá continuar o exercício de atividade empresarial quando devi-
damente assistido. Mas, nesse caso, deverá ser precedida de autorização judicial, que
avaliará as circunstâncias e os riscos da empresa, bem como a conveniência em sua
continuidade. Tal autorização pode ser posteriormente revogada pelo juiz, ouvido
seu representante legal, e, ademais, não f‌icarão sujeitos ao resultado da empresa os
bens que o incapaz já possuía, ao tempo da interdição, desde que estranhos ao acervo
da pessoa jurídica, devendo tais fatos constar do alvará que conceder a autorização.
É bastante claro que o incapaz não poderá exercer a administração da socie-
dade, devendo estar assistido de seu representante legal,2 e, em tais casos, o capital
2. CC, Art. 975. Se o representante ou assistente do incapaz for pessoa que, por disposição de lei, não puder
exercer atividade de empresário, nomeará, com a aprovação do juiz, um ou mais gerentes. §1º Do mesmo
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