Da prescrição na execução trabalhista

AutorMauro Schiavi
Ocupação do AutorJuiz titular da 19a Vara do Trabalho de São Paulo. Mestre e Doutor em Direito das Relações Sociais pela PUC/SP
Páginas83-98

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7.1. Conceito de prescrição

Segundo Pontes de Miranda94, "a prescrição é a exceção, que alguém tem, contra o que não exerceu, durante certo tempo, que alguma regra jurídica fixa, a sua pretensão ou ação. Serve à segurança e à paz públicas, para limite temporal à eficácia das pretensões e das ações".

Dispõe o art. 189 do Código Civil:

Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206.

Conforme o referido dispositivo legal, o Código Civil Brasileiro adota o conceito de prescrição como sendo a perda da pretensão que é, segundo Carnelutti, a exigência de

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subordinação do interesse alheio ao interesse próprio. Estando prescrita a pretensão, não se pode exigir em juízo o direito violado, tampouco invocá-lo em defesa, pois a exceção prescreve no mesmo prazo que a pretensão, segundo o art. 190 do Código Civil.

Segundo Carlos Roberto Gonçalves95, "o novo Código Civil, evitando essa polêmica, adotou o vocábulo ‘pretensão’ para indicar que não se trata do direito subjetivo público abstrato de ação. E, no art. 189, enunciou que a prescrição se inicia no momento em que há violação do direito". Prossegue o autor96: "Hoje predomina o entendimento, na moderna doutrina, de que a prescrição extingue a pretensão, que é a exigência de subordinação de um interesse alheio ao interesse próprio. O direito material, violado, dá origem à pretensão (CC, art. 189), que é deduzida em juízo por meio da ação. Extinta a pretensão, não há ação. Portanto, a prescrição extingue a pretensão, atingindo também a ação. O instituto que extingue somente a ação, conservando o direito material e a pretensão, que só podem ser opostos em defesa, é perempção".

A decadência consiste na perda do direito em razão da inércia de seu titular.

Ensinam Rodolfo Pamplona Filho e Pablo Stolze Gagliano97 que a decadência "consiste na perda efetiva de um direito potestativo, pela falta de seu exercício, no período de tempo determinado em lei ou pela vontade das próprias partes. Sendo, literalmente, que a extinção do direito é também chamada, em sentido estrito, consoante já se disse, de caducidade, não remanescendo qualquer sombra de direito em favor do titular, que não terá como exercer mais, de forma alguma, o direito caduco".

No processo do trabalho, destacam-se três prazos decadenciais típicos, quais sejam:

  1. 30 dias para instauração do inquérito judicial para apuração de falta grave, tendo havido a prévia suspensão do empregado;

  2. 2 anos para instaurar a ação rescisória, contados do trânsito em julgado da decisão;

  3. 120 dias para proposição do Mandado de Segurança, contados a partir da ciência do ato de autoridade praticado com ilegalidade ou abuso de poder.

Segundo a melhor doutrina, a prescrição extingue a pretensão e por via oblíqua o direito, enquanto a decadência extingue o direito e por via oblíqua a pretensão. O prazo decadencial pode ser fixado na lei ou pela vontade das partes (contrato), enquanto os prazos prescricionais somente são fixados em lei. O prazo decadencial corre contra todos, não sendo, em regra, objeto de suspensão, interrupção ou de causa impeditiva (art. 207 do CC), salvo as exceções do art. 208 do CC98; já a prescrição pode não correr contra algumas pessoas e pode sofrer causas de impedimento, suspensão ou interrupção.

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A prescrição, uma vez consumada, pode ser objeto de renúncia. A decadência é irrenunciável quando fixada em lei (art. 209 do CC).

Nesse diapasão, é relevante destacar a seguinte ementa:

Prescrição x decadência - Biênio para ajuizamento de reclamação trabalhista - Prazo prescricional - Reconhecimento. A distinção entre prescrição e decadência tem sido, desde longa data, objeto de inúmeros combates doutrinários, envolvendo juristas de renome, no escopo de se delinear, com exatidão, o campo de incidência de ambos institutos. Sob a égide do Código Civil revogado, firmou-se a clássica distinção de que a decadência extinguia o direito em si, ao passo que a prescrição extinguiria a ação. Entretanto, é verdade que a fórmula tradicional não era suficiente para explicar a complexidade do fenômeno, reclamando assim uma melhor definição daquelas hipóteses. Nesse contexto, adotou o legislador contemporâneo, nos termos do art. 189 do Novo Código Civil, a concepção de que "violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição", nos prazos definidos em lei, repetindo a sistemática já introduzida nos arts. 26 e 27 da Lei n. 8.078/90 - Código de Defesa do Consumidor. Vale dizer que, hodiernamente, encontra a prescrição seu melhor conceito enquanto causa de extinção temporal da pretensão de ver condenado o violador de um direito à sua justa reparação, distanciando-se, assim, da decadência, hipótese de extinção de um direito não reclamado no prazo legal. (TRT - 15ª R. - 2ª T. - RO n. 1484/2003.122.15.00-9 - rel. Luís Carlos C. M. S. da Silva - DJSP 18.6.04 - p. 18) (RDT n. 7 - julho de 2004)

Diante da sua importância para o direito do trabalho, a prescrição trabalhista está prevista no art. 7º, XXIX, da Constituição, que trata dos direitos fundamentais trabalhistas, tendo a seguinte redação:

(...) ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho.

O prazo mencionado, no citado artigo, aplica-se tanto ao empregado como ao empregador quando este for ingressar com uma reclamação trabalhista em face do empregado. Nesse sentido, advertem Irany Ferrari e Melchíades Rodrigues Martins99:

"Aplica-se o mesmo prazo prescricional previsto para os trabalhadores (arts. 7º, XXIX, da CF e 11 da CLT) ao empregador quanto à questão em discussão envolvendo confiito deste com o empregado ou ex-empregado, cuja matéria tem pertinência com o contrato de trabalho. A regra vale, portanto, para ambos, empregado e empregador, mesmo porque a competência no caso é da Justiça do Trabalho".

7.2. Da prescrição intercorrente

Chama-se intercorrente a prescrição que se dá no curso do processo, após a propositura da ação, mais especificamente após o trânsito em julgado, pois, na fase de conhecimento, se o autor não promover os atos do processo, o juiz o extinguirá sem resolução do mérito, valendo-se do disposto no art. 485 do CPC.

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Nesse sentido, ensinam Irany Ferrari e Melchíades Rodrigues Martins100:

A prescrição intercorrente é aquela a que se verifica no curso da execução, portanto, depois do trânsito em julgado da decisão. Sua aplicação tem por objetivo não só evitar a delonga do processo de execução, mas também estimular a parte credora se valer do seu direito.

Autores há que distinguem a prescrição intercorrente de prescrição da execução. Nesse sentido é a posição de Manoel Jorge e Silva Neto101:

Aqui, torna-se necessário informar que duas espécies de prescrição são mencionadas no contexto do processo trabalhista: a prescrição da execução e a prescrição intercorrente. A primeira conta-se a partir do trânsito em julgado da decisão. A segunda se refere à inércia prolongada da parte no curso da ação.

De nossa parte, estamos convencidos de que prescrição intercorrente e prescrição da execução são expressões sinônimas no processo do trabalho, pois, na fase de conhecimento, se houver inércia do reclamante, o Juiz do Trabalho extinguirá a relação jurídica do processo sem resolução de mérito (vide a respeito os arts. 732, 844, ambos da CLT, e 485, do CPC), não havendo espaço para reconhecimento de prescrição intercorrente. A prescrição intercorrente somente se verifica no curso da execução.

Sempre foi polêmica a questão da prescrição intercorrente no Processo do Trabalho, diante da natureza alimentar do crédito trabalhista e do princípio da irrenunciabilidade do crédito trabalhista.

Em favor da não aplicabilidade da prescrição intercorrente no Processo do Trabalho é invocado o argumento de que a execução é promovida de ofício pelo Juiz do Trabalho, nos termos do art. 878, da CLT, não havendo espaço para a aplicabilidade de tal instituto.

Além disso, também é possível invocar aqui o princípio protetor, visto sob o aspecto instrumental (igualdade substancial das partes no processo do trabalho), e a existência do jus postulandi da parte na execução trabalhista, como argumentos aptos a inviabilizar o reconhecimento da prescrição intercorrente no processo trabalhista.

Nesse sentido, a Súmula n. 114 do C. TST, in verbis:

Prescrição intercorrente. É inaplicável na Justiça do Trabalho a prescrição intercorrente.

Destacamos, no aspecto, as seguintes ementas:

PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. NÃO APLICÁVEL AO PROCESSO TRABALHISTA. O procedimento jurisdicional trabalhista sempre foi caracterizado pelo fato de que na execução não se inicia novo processo, mas apenas ocorre desdobramento da fase cognitiva, para o fito de cumprimento da res judicata. O art. 878 da CLT é de clareza solar ao estipular que dentre as várias formas, a execução trabalhista poderá ser promovida ex officio pelo próprio Juiz, em harmonia ao princípio do impulso oficial nas execuções trabalhistas. Não é por outro motivo que a

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mais alta Corte Trabalhista do país editou a Súmula n. 114, a qual sedimentou o entendimento majoritário de que não é aplicável a prescrição intercorrente, por incompatibilidade lógica e jurídica com o procedimento jurisdicional trabalhista. Finalmente, deve ser enfatizado que a par da dicção da regra trazida pelo art. 884, § 1º da CLT, questão em apreço somente poderia ser apreciada se invocada pela parte executada, e não ex officio. (TRT/SP - 01138199501902000 - AP - Ac. 4ª T. - 20080253630 - rel. Paulo Augusto Câmara - DOE 11.4.2008)

Prescrição intercorrente no processo do trabalho - Cabimento e pressupostos...

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