Democracia e participação: o direito da pessoa com deficiência à educação e sua inclusão nas instituições de ensino superior

AutorFernanda Nunes Barbosa
Ocupação do AutorDoutora em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)
Páginas815-833
Democracia e participação: o direito da pessoa
com deficiência à educação e sua inclusão nas
instituições de ensino superior
Fernanda Nunes Barbosa*
Ninguém é sujeito na solidão e no isolamento, sempre se é
sujeito entre outros sujeitos: o sentido da vida humana não é
um monólogo, mas provém do intercâmbio de sentidos, da
polifonia coral. Antes de mais nada, a educação é a revela-
ção dos outros, da condição humana como um concerto de
cumplicidades inevitáveis.
Fernando Savater. O Valor de Educar.
1. Introdução
Como todo empenho humano, a tarefa de educar tem limites óbvios e
sempre cumpre apenas uma parte de seus melhores (ou piores) propósitos.
Isso, no entanto, não torna irrelevante sua orientação ou o debate sobre os
melhores métodos de realizá-la.1 O mesmo Freud que certa vez afirmou
haver três tarefas impossíveis de realizar (educar, governar e psicanalisar)
preferiu o governo inglês ao da Alemanha nazista e não renunciou à sua ta-
refa como psicanalista e instrutor de psicanálise.2
O otimismo, mais do que uma necessidade humana para sobreviver à
dureza da vida e ao inexorável destino final da morte, se constitui, para todo
* Doutora em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Mes-
tre em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Professora
Coordenadora do Curso de Direito da Faculdade Porto-alegrense (FAPA)/Laureate
International Universities.
1 SAVATER, Fernando. O Valor de Educar. Trad. Monica Stahel. 2ª ed. São Paulo:
Planeta, 2012, p. 15.
2 Ibidem, p. 15
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educador – a começar pelos pais –, em única saída possível para o exercício
da educação.3 Conforme refere Fernando Savater,
... educar é crer na perfectibilidade humana, na capacidade inata de apren-
der e no desejo de saber que a anima, é crer que há coisas (símbolos, técni-
cas, valores, memórias, fatos...) que podem ser aprendidas e que merecem
sê-lo, que nós, homens, podemos melhorar uns aos outros por meio do co-
nhecimento. De todas essas crenças otimistas, podemos muito bem descrer
privadamente, mas, se pretendemos educar ou entender em que consiste a
educação, não há outro remédio senão aceitá-las. Com verdadeiro pessimis-
mo pode-se escrever contra a educação, mas o otimismo é imprescindível
para estudá-la e para exercê-la. Os pessimistas podem ser bons domadores,
mas não bons professores.4
É esse otimismo, que acredita mesmo diante de todo tipo de dificuldade
– da socioeconômica5 à motivacional6, da geracional7 à intelectual –, unido
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3 A dimensão afetiva na elaboração da subjetividade e do conhecimento também é
apontada pela doutrina: “[...] a escola precisa promover o retorno ao afetivo, ao emo-
cional, às relações de carinho e os professores precisam tomar consciência da importân-
cia da afetividade para um bom desenvolvimento do processo de ensino e aprendiza-
gem (ENGERS, 2002, p. 299)”. ENGERS, Maria Emília Amaral; VITÓRIA, Maria
Inês Côrte. Desvelando a aprendizagem em cenários multiculturais. In: Educação Su-
perior e Aprendizagem. Maria Emília Amaral Engers; Marília Costa Morosini; Vera Lu-
cia Felicetti (Org.). Porto Alegre: EDIPUCRS, 2015, p. 65-85, p. 71.
4 SAVATER, Fernando, op. cit., p. 21.
5 Sobre a relação entre sociologia, psicologia e pedagogia e a necessidade de se neu-
tralizarem os fatores sociais de desigualdade cultural, veja-se BOURDIEU, Pierre;
PASSERON, Jean-Claude. Os Herdeiros: os estudantes e a cultura. Trad. Ione Ribeiro
Valle e Nilton Valle. Florianópolis: Ed. da UFSC, 2015, passim. O estudo dos autores
franceses, que data da década de 1960 (pouco antes do “Maio de 1968”), apontava,
naquela realidade, que: “De todos os fatores de diferenciação, a origem social é sem
dúvida aquele cuja influência exerce-se mais fortemente sobre o meio estudantil, mais
fortemente em todo caso que o sexo e a idade e sobretudo mais do que um ou outro
fator claramente percebido, como a afiliação religiosa por exemplo”. (BOURDIEU,
Pierre; PASSERON, Jean-Claude. Os Herdeiros: os estudantes e a cultura. Trad. Ione
Ribeiro Valle e Nilton Valle. Florianópolis: Ed. da UFSC, 2015, p. 27).
6 Muito se escreve hoje sobre o desinteresse das chamadas gerações Y/Geração do
Milênio (nascidos entre 1978-1990/1995) e Z/Gamers (nascidos a partir de
1990/1995). Fonte: http://www.bridgeresearch.com.br/dv_files/arqui-
vos/201211011424_dbarquivos.pdf. Acesso em 10 de abr. 2016. A despeito dessa im-
portante consideração, destaca-se o comentário de um aluno espanhol em estudo pu-
blicado no ano de 2005, o que aponta aos docentes a necessidade de repensar o seu

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