O direito partidário

AutorEdson De Resende Castro
Ocupação do AutorPromotor de Justiça
Páginas27-61
Capítulo III
O DIREITO PARTIDÁRIO
“Os partidos têm decisivo e imprescindível papel nas organizações políticas contem-
porâneas, na difusão de ideias que alimentam o debate político e cumprem sempre
a arregimentação coletiva, seja para plebiscitos, referendo ou eleição, para os quais
funciona como elemento constante o sufrágio popular.23
1. Autonomia do direito partidário
Já é possível dizer que o Direito Partidário tem autonomia legislativa e cientíca
perante o Direito Eleitoral, embora se reconheça a acentuada proximidade desses dois
ramos do direito.
Porque não há eleição sem partidos políticos (exatamente porque não há
candidaturas isoladas24 – embora a candidatura sem partido, aos cargos disputados pelo
sistema majoritário {presidente, governador, senador e prefeito}, já tenha sido admitida
na nossa legislação, conforme art. 88, parágrafo único, c/c 94, § 1º, IV e 99, todos do
Código Eleitoral, não recepcionados pela CF, que impõe a liação partidária como
condição de elegibilidade25), o Direito Eleitoral convive diretamente com normas de
Direito Partidário.
Entretanto, com ele não se confunde, principalmente porque diversos os Órgãos
Jurisdicionais com competência para conhecer e decidir matérias de um e outro.
Deságuam na Justiça Eleitoral questões afetas diretamente ao pleito, sejam de ordem
administrativa, sejam de ordem jurisdicional. E dizem respeito à Justiça Comum as
questões internas dos partidos políticos, que não exercem inuência nos pleitos.
Se compete à Justiça Comum, em regra, o conhecimento e o julgamento das questões
meramente partidárias, cando à Justiça Eleitoral os conitos que dizem diretamente
com o pleito, a distinção entre um e outro é importante também pelo aspecto prático.
23 RIBEI RO, Fávila. Direito eleitoral, p. 12.
24 A Lei n. 13.488/2017 acrescentou o § 14 ao art. 11, da Lei n. 9.504/97, dispondo expres samente
que é vedada a candid atura avu lsa, ainda que o c andidato tenha  liação par tidária, reforç ando a
conclusão de que a escolha em c onvenção é condição de elegibi lidade, em complemento à lia ção
partidá ria. De outro lado, há Recurso Ext raordinário no STF (de n. 1054490), com repercussão gera l
reconhecida, quest ionando a necessidade de liaç ão partidária e de escol ha em convenção, condições
que contrariar iam o direito fundament al à elegibilidade. No TSE, de cisão proferida em 20.11.2018, no
AgR-Pet n. 060061420, rear mou que somente os liados escolhidos em convençã o partidária podem
concorrer a cargos ele tivos.
25 Exceção reser vada aos Milit ares, que têm express a vedação constit ucional à liaç ão partidá ria, art .
142, ao mesmo tempo em que lhes é gar antida a elegibilidade, ar t. 14, § 8º, daí que se candidatam por
um partido pol ítico, mas sem prévia liaç ão.
BOOK-DireitoEleitoral-11ED.2022.indb 27BOOK-DireitoEleitoral-11ED.2022.indb 27 28/04/22 09:2528/04/22 09:25
EDSON DE RESENDE CASTRO
28
2. O Partido Político
De acordo com a antiga Lei Orgânica dos Partidos Políticos (LOPP – art. 2º, da Lei
n. 5.682/71), os partidos políticos eram pessoas jurídicas de direito público interno, o
que revelava a nítida intenção de controle estatal na atividade partidária:
“Os partidos políticos, pessoas jurídicas de Direito Público interno, destinam-se a
assegurar, no interesse do regime democrático, a autenticidade do sistema represen-
tativo e a defender os direitos humanos fundamentais, denidos na Constituição.
Já com a Constituição Federal de 1988 (art. 17, § 2º), passaram os partidos políticos
a adquirir personalidade jurídica na forma da lei civil, cando, a partir de então,
assegurada sua natureza privada.
A atual LOPP (Lei n. 9.096/95), no seu art. 1º, dene o partido político como pessoa
jurídica de direito privado e mantém a conceitua ção anteriormente xada:
“O partido político, pessoa jurídica de direito privado, destina-se a assegurar, no
interesse do regime democrático, a autenticidade do sistema representativo e a
defender os direitos fundamentais denidos na Constituição Federal.
3. Criação e autonomia
Os Partidos Políticos, que com a constituição federal de 1988, art. 17, ganharam
autonomia para a denição de sua estrutura interna, organização e funcionamento, são
pessoas jurídicas de direito privado, com caráter nacional. Sua criação é complexa e está
prevista na Lei n. 9.096/95, chamada lei orgânica dos partidos políticos.
Primeiramente, é preciso apresent ar seus estatutos a registro no Cartório de Registro
Civil das Pessoas Jurídicas do local de sua sede ( que, a partir da Lei n. 13.877/2019, no
que deu nova redação ao art. 8º, da Lei n. 9.096/95, não mais precisa ser na Capital
Federal), subscritos por pelo menos 101 fundadores, com domicílio eleitoral em nove
estados diferentes (1/3 dos estados da federação)26. Obtido o registro e a personalidade
jurídica, o partido em formação vai à busca do apoiamento de eleitores a que se refere
o art. 7º, § 1º, da Lei n. 9.096/95, colhendo assinaturas – durante no máximo dois anos,
conforme nova redação dada pela Lei n. 13.165/2015, contados a partir da aquisição da
personalidade jurídica, ou seja, do registro dos estatutos no Cartório de Registro Civil
das Pessoas Jurídicas: art. 7º, § 3º, da Res. TSE n. 23.571/2018 – de eleitores não liados
a partido político em número que corresponda a pelo menos 0,5% (meio por cento)
dos votos válidos dados na última eleição para a Câmara dos Deputados, distribuídos
por 1/3 ou mais dos Estados, com um mínimo de 0,1% (um décimo por cento) em cada
um deles:
Art. 7º...
§ 1º Só é admitido o registro do estatuto de partido político que tenha caráter
nacional, considerando-se como tal aquele que comprove, no período de dois anos,
o apoiamento de eleitores não liados a partido político, correspondente a, pelo
menos, 0,5% (cinco décimos por cento) dos votos dados na última eleição geral para a
26 Art. 8º, da Lei n. 9.096/95, com nova re dação dada pela Lei n. 13.877/2019.
BOOK-DireitoEleitoral-11ED.2022.indb 28BOOK-DireitoEleitoral-11ED.2022.indb 28 28/04/22 09:2528/04/22 09:25
TÍTULO I – NOÇÕES INTRODUTÓRIAS
CAPÍTULO III – O DIREITO PARTIDÁRIO
29
Câmara dos Deputados, não computados os votos em branco e os nulos, distribuídos
por um terço, ou mais, dos Estados, com um mínimo de 0,1% (um décimo por cento)
do eleitorado que haja votado em cada um deles. (destacam-se as expressões: “não
liados a partido político” [acrescentada pela Lei n. 13.107/2015] e “no período de
dois anos” [inserida pela Lei n. 13.165/2015])
Essas assinaturas de eleitores, lançadas nas listas de apoiamento, são levadas à
conferência e certicação nos Cartórios Eleitorais respectivos, para posteriormente
serem somadas no TRE, a m de se vericar o atingimento do mínimo de 0,1% naquele
Estado. Repetido esse procedimento em nove Estados, o apoiamento popular já pode
ser levado ao TSE, com requerimento de registro dos estatutos perante a Justiça
Eleitoral, a partir de quando a agremiação estará autorizada a participar do processo
eleitoral e receber recursos do Fundo Partidário. Esse procedimento de coleta de
assinaturas foi substancialmente alterado pelas Res. TSE n. 23.647 e 23.654, ambas
de 2021, que, alterando a Res. TSE n. 23.571/2018, instituíram sistema próprio “para
gerenciar o apoiamento mínimo de eleitoras e eleitores e submetê-los para validação nos
cartórios eleitorais” e a assinatura eletrônica. Registre-se, de pronto, que as assinaturas
de apoiamento à criação de partido político não implicam em liação dos eleitores
apoiadores, até porque a liação partidária só é possível após atendidas todas as etapas
de criação, o que se completa com o registro dos estatutos no TSE. A Resolução TSE
n. 23.571/2018 (que revogou a Res. TSE n. 23.465/2015) prevê minuciosamente todas
essas etapas de criação, inclusive o procedimento posterior de constituição e anotação
dos órgãos de direção nacional, estaduais e municipais do novo partido no TSE e nos
TRE’s e o credenciamento dos seus delegados. Frise-se que o partido político tem seus
estatutos registrados no TSE (até porque tem caráter nacional) e seus órgãos de direção,
com os nomes dos respectivos integrantes, são apenas comunicados à Justiça Eleitoral,
para efeito de anotação. Se essa comunicação disser respeito aos órgãos da direção
nacional, será dirigida ao TSE. Se relativa aos órgãos de âmbito estadual, municipal ou
zonal, é encaminhada ao TRE (art. 20, da Res. TSE n. 23.571/2018, e art. 10, § 1º, incisos
I e II, da Lei n. 9.096/95, acrescidos pela Lei n. 13.877/2019). De qualquer forma, a
criação de diretórios municipais, por exemplo, é ato que compete exclusivamente ao
partido político, cabendo o controle jurisdicional apenas na hipótese de inobservância
do estatuto. Criado o diretório municipal na forma prevista no estatuto, está ele apto a
participar do processo eleitoral, nas eleições municipais, dirigindo à Justiça Eleitoral o
pedido de registro das candidaturas.
O TSE, no REsp. Eleitoral n. 13.060-AL, relatado pelo Min. Eduardo Ribeiro (DJU
I 19/11/96, p. 45.088), teve oportunidade de decidir que “a comissão existe desde que
constituída na forma estabelecida no estatuto do partido. A comunicação ao Tribunal
Regional Eleitoral não condiciona sua existência. A falta dessa não impede o registro de
candidatura pelo partido”. Esse entendimento foi rearmado nos Ac.-TSE n. 17.081/2000
e 21.798/2004.
Questão relevante é a criação, pelo partido político, de comissões provisórias
estaduais e municipais no lugar de diretórios. Considerando que aquelas são cons-
tituídas e destituídas a qualquer momento, porque os seus integrantes não têm um
BOOK-DireitoEleitoral-11ED.2022.indb 29BOOK-DireitoEleitoral-11ED.2022.indb 29 28/04/22 09:2528/04/22 09:25

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT