Direitos sucessórios do cônjuge e do companheiro no regime da separação de bens: breves anotações

AutorLuiz Paulo Vieira de Carvalho
Páginas557-581
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DIREITOS SUCESSÓRIOS
DO CÔNJUGE E DO COMPANHEIRO
NO REGIME DA SEPARAÇÃO DE BENS:
BREVES ANOTAÇÕES
Luiz Paulo Vieira de Carvalho
Mestrado e Pós-graduação em Ciências Jurídicas pela Faculdade de Direito da Univer-
sidade Clássica de Lisboa (Portugal). Professor e Conferencista Emérito da Escola da
Magistratura do Estado do Rio de Janeiro – EMERJ. Presidente da Comissão de Direito
de Família e Sucessões do Instituto dos Advogados Brasileiros-IAB; Vice-Presidente
da Comissão Nacional de Direito das Sucessões do Instituto Brasileiro de Direito de
Família – IBDFAM; Membro do Fórum Permanente de Direito de Família da Escola da
Magistratura do Estado do Rio de Janeiro-EMERJ; Membro do Fórum Permanente de
Direito Civil da Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro-EMERJ. Professor
Coordenador dos Cursos de Extensão de Direito de Família e de Direito das Sucessões
da Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro-EMERJ. Ex-Defensor Público
Geral do Estado do Rio de Janeiro. Autor das obras: Direito civil – Questões fundamen-
tais e controvérsias na Parte Geral, no Direito de Família e no Direito das Sucessões,
4. ed.: Impetus e Direito das Sucessões, 4. ed.: Gen/Atlas, além de inúmeros ensaios.
Advogado no escritório Vieira de Carvalho, Advocacia & Consultoria Jurídica, consultor
jurídico, parecerista e árbitro.
Sumário: 1. Introdução – 2. Cônjuge e companheiro consorciados pelo regime da separação legal
ou obrigatória – 3. Quanto ao cônjuge ou companheiro sobrevivente consorciados pelo regime
da separação convencional (Art. 1.687 e 1.725 do CC) – 4. Do Artigo 1.830 do CC. Interpretação
constitucional atual.
1. INTRODUÇÃO
Ab initio, é de se pontuar, inicialmente, que o direito à herança é cláusula pé-
trea (art. 5º, XXX da CRFB/88), sendo considerado como bem imóvel para efeitos
legais (80, II do CC), independentemente da natureza jurídica dos bens contidos no
monte hereditário, como também uma universalidade de direito (art. 91 do mesmo
diploma), nascendo no momento do decesso da pessoa física ou natural, quando
então a herança se transfere imediatamente aos herdeiros legais e testamentários do
hereditando como um bloco unitário, sem necessidade de quaisquer formalidades
(saisina, art. 1.8741 e art. 1.791, parágrafo único,2 do CC/202).
1. Art. 1.784 do CC: “Aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testa-
mentários”. A saisina (em latim) foi introduzida entre nós pelo Alvará Régio de 1754, verbis: “Comentando
o alvará de 9 de novembro de 1754, diz a autora que a sua importância é extremamente acentuada pelos
autores brasileiros, sendo ele a fonte do artigo 1.572 do nosso Código Civil; e que é o responsável pela
adoção da “saisine” no direito brasileiro. A origem do alvará, que introduziu a “saisine” no direito portu-
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Destarte, o legislador do Código Civil de 2002, no art. 1.829 e incisos,3 deter-
minou a ordem preferencial da vocação hereditária a favor dos herdeiros legítimos ou
legais, familiares mais próximos do hereditando (no CC/16, art. 1.603 e incisos),
porém, introduziu importantes alterações.
A primeira delas está expressa nos incisos I e II do art. 1.829. Pelo inciso I desse
artigo, como regra, passou o cônjuge sobrevivente e agora, sem mais discussões, ao
companheiro sobrevivente, 4a concorrer com os descendentes do autor da herança,
a depender, porém, do regime patrimonial de bens adotado pelo ex-casal ou imposto
pelo legislador. No inciso II na falta de descendentes, independentemente do regime
de bens, passou a concorrer com os ascendentes daquele, f‌igurando, por f‌im, soli-
tariamente no inciso III, recolhendo a herança legítima como único titular na falta
de tais descendentes e ascendentes. Já no inciso IV restou determinado que, na falta
de descendentes, ascendentes ou cônjuge sobrevivente em não havendo testamen-
to válido em sentido contrário (arts. 1.850 e 1.857 do CC), a herança defere-se aos
colaterais até o 4º grau (herdeiros facultativos). Inexistindo colaterais até o quarto
grau, e testamento válido, os bens hereditários são devolvidos ao Poder Público (art.
1.819 e ss. do CC).
Com a abertura da sucessão causa mortis, a herança, o monte, o acervo heredi-
tário, o espólio (sob o ponto de vista processual), representados por todo o conjunto
de bens, direitos e obrigações transmissíveis do falecido, mediante uma f‌icta iuris
denominada de droit de saisine, em francês, derivada gewere do direito alemão, é
por esse transferida imediatamente aos seus herdeiros legais e testamentários, sem
necessidade de qualquer formalidade (le mort saisit le vif).
Esta universalidade de direito (art. 91 do CC), como já dito, considerada bem
imóvel para efeitos legais, independentemente do tipo de bens que a compõem, se
móveis ou imóveis, e coisa indivisa até a partilha (arts. 80, inciso II, e 1.791, pará-
guês é obscura, mas, segundo a autora, teve funções práticas, para coibir a posse de terceiros nos bens da
sucessão. Como grande parte dos bens não entrava na comunhão, apesar de caber ao cônjuge sobrevivente
a função de cabeça de casal, com a posse e administração do acervo comum, os bens excluídos poderiam
entrar na posse de intrusos, o que levou o legislador a adotar a “saisine”, para que os herdeiros entrassem,
imediatamente, na posse dos mesmos, obviando àquele inconveniente”. Análise crítica efetuadas pelas
alunas Angela Silva e Maura Pereira dos Santos, durante o Curso de Doutorado da Faculdade de Direito da
UFMG sob a orientação do Professor Albertino Daniel de Melo, acerca da “la transmission d’hérédité en
droit français et en droit brésilien” de Ana Maria Villela, 1975, https://revista.direito.ufmg.br/index.php/
revista/article/view/785/732, pesquisa em 26.08.2021
2. Art. 1.791 do CC: “A herança defere-se como um todo unitário, ainda que vários sejam os herdeiros. Parágrafo
único. Até a partilha, o direito dos coerdeiros, quanto à propriedade e posse da herança, será indivisível, e
regular-se-á pelas normas relativas ao condomínio”.
3. Art. 1.829 do CC: “A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte: (Vide Recurso Extraordinário 646.721)
(Vide Recurso Extraordinário 878.694) I – aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente,
salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de
bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver
deixado bens particulares; II – aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge; III – ao cônjuge sobrevi-
vente; IV – aos colaterais.
4. RE’s 878.694 e 646.721, mais adiante pontuados.
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