Extinção do Cargo de Delegado de Polícia na Argentina: Efeitos Negativos para a Sociedade, para o Ministério Público, para a Polícia Civil e para a Persecução Penal

AutorJoaquim Miranda
Ocupação do AutorPromotor de justiça em Minas Gerais. Mestre e Doutor em Direito. Professor e autor de obras jurídicas
Páginas113-130
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extinção Do cargo De DelegaDo
De Polícia na argentina: efeitoS
negativoS Para a SocieDaDe, Para o
miniStério Público, Para a Polícia civil
e Para a PerSecução Penal
Joaquim Miranda1
1. introDução
Entre as recentes controvérsias, no meio acadêmico e político brasi-
leiro, em torno da possível alteração legislativa para transferir ao Ministério
Público a gestão absoluta da investigação policial, a Argentina, dentre ou-
tros povos, se torna em verdadeiro e interessante paradigma para conside-
ração do tema no contexto brasileiro, dada a sua experiência pioneira na
região e os resultados apresentados até o momento.
Ali, após a consolidação da democracia, ressentido com os abusos
policiais praticados na época das repetidas ditaduras, o legislador houve
por bem conar ao Ministério Público, diretamente, a presidência de to-
das as investigações criminais, atividade que exerce com a ajuda da polícia
judiciária.
Na prática, o Promotor de Justiça argentino substitui a gura do De-
legado de Polícia, para todos os efeitos, desde a formação da opinio delicti
1 Promotor de Justiça em Minas Gerais. Mestre e Doutor em Direito. Professor e autor
de obras jurídicas.
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Garantias institucionais do delegado de polícia e o exercício da soberania estatal
até o encerramento das investigações policiais para o consequente ingresso
em juízo da respectiva ação penal.
Como veremos no presente artigo, a extinção do cargo de Delegado
de Polícia não resultou em medida ecaz, conquanto os índices de cri-
minalidade2 na Argentina seguem altos3 e o Ministério Público caminha
sobrecarregado e incapaz de atender às demandas que se lhe colocam diu-
turnamente.
A conclusão, portanto, é no sentido de que a gura do Delegado
de Polícia, prossional com a incumbência e a especialização exclusiva de
coordenar e dirigir as investigações policiais, mostra-se, lá e cá, convenien-
te, necessária, oportuna e imprescindível ao regular funcionamento do sis-
tema penal acusatório.
2. Da PerSecução Penal naS DemocraciaS
Com a consolidação do Direito, modernamente se acha absoluta-
mente banida qualquer ideia de vingança privada. Assim, em qualquer
democracia, no caso de surgimento de infração de ordem penal, o particu-
lar haverá que conar ao Estado a chamada persecução penal, conquanto
único detentor do jus puniendi.4
Qual seria, porém o sistema ideal de investigação criminal? Pelas
mãos do juiz de direito, diretamente, ou através de forças policiais, ou sob
a batuta do Ministério Público ou de outra instituição? A resposta a estas
indagações poderá indicar o grau de inclinação da persecução penal de um
Estado para o lado do Processo Acusatório ou do Processo Inquisitório.
2 V. https://data.unodc.org/#state:1 e notas a seguir.
3 “No culpemos tan solo al Congreso Nacional ni a los jueces ni a la policía: absoluta-
mente todo el sistema penal es altamente ineciente y fracasó.
Por eso, hoy, igual que antes, quien comete un delito tiene altísimas probabilidades de no
recibir castigo alguno. Toda generalización es odiosa y sin duda cada sector tiene muchas
explicaciones, argumentos y excusas para tratar de demostrar que las cosas son distintas.
Pero los números son categóricos. Y se condicen con la sensación de la sociedad de que
el delito no paga penas.” Adrián Ventura. (La Nación, 21/02/05)
4 BELLING, Ernst, apud TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. S.
Paulo: Saraiva, 2003, v.1 p. 26.
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