Os fundamentos teóricos e jurídicos para a proteção do meio ambiente

AutorEduardo Lima De Matos
Páginas3-36
CAPÍTULO 1
OS FUNDAmENTOS TEÓRICOS E JURÍDICOS
PARA A APROTEÇÃO DO mEIO AmBIENTE
1. O DIREITO, SUAS ACEPÇÕES E O ORDENAMENTO JURÍDICO
A compreensão e o entendimento do que vem a ser o direito, nas suas
várias acepções, é um tema objeto de intensos debates teóricos e losócos,
na busca de explicar, entender, classicar, sistematizar de fato o que consti-
tui todo o conjunto.
As aglomerações humanas começaram pequenas, unidas por costumes,
tradições, religião, língua e regras de convivência, que eram sucientes para
o tamanho dessas comunidades, contudo com o crescimento paulatino, re-
sultando no aumento populacional, conitos e necessidades, o conjunto an-
terior se mostrava insuciente para enfrentar todas as contendas, Berloffa
arma
De uma evolução natural das variadas formas de sociedade foram sur-
gindo grandes aglomerados de indivíduos coordenados na consecução
de ns identicados e especícos. Esta aglomeração de indivíduos fun-
dou-se principalmente em laços históricos, tradições características de
cada aglomeração, enraizadas por costumes e comportamentos locais.
(Berloffa, 2004, 54).
Esse evoluir trouxe consigo a existência de conitos internos e externos,
resolvidos durante longo tempo pelas regras religiosas, que se confundiam
muitas vezes com o próprio estado, como bem delineia Berloffa (2004), de-
monstrado cada vez mais na deciência de uma estrutura que garantisse ao
conjunto segurança, serviço e o atendimento das necessidades.
A teoria do estado, como disciplina autônoma, explica esse fenômeno,
a partir da compreensão do que é nação, estado, território, sociedade, povo,
leis, tradições, costumes, língua, enm, todo o conjunto que compõe a estru-
tura estatal responsável pela administração do interesse público.
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a crise hídrica: gestão participativa, descentralizada, pactuada e sustentável
eduardo lima de matos
A organização da convivência entre pessoas, que pressupõe regras, para
delimitar o raio de liberdade de cada componente e estabelecer dessa forma
a possibilidade de uma harmoniosa convivência, dentro de critérios preesta-
belecidos pela mesma comunidade, assim Realle conceitua
Direito é a ordenação heterônoma, coercível e bilateral atributiva das
relações de convivência, segundo uma integração normativa de fatos e
valores. (Reale, 1985, 22)
O direito passou a ser um instrumento para regular essa convivência,
com imposições, sanções, força, realçando valores dentro de um conjunto
heterogêneo. Claro que a história da humanidade comprovou que em parte
do tempo, o direito foi utilizado ou monopolizado por um grupo para sobre-
por seus interesses sobre os demais, resultando em injustiças, perseguições,
mortes e destruição, culminando com um dos maiores exemplos de reação
a essa dominação, a Revolução Francesa, movimento que rompeu com o
absolutismo e deagrou o repensar do papel do estado.
Essa ordem jurídica foi e continua sendo estudada, o poder que resulta
dela, o limite do exercício desse poder, são temas muito atuais, o que vem a
ser no Estado Brasileiro atual a Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF, um
limite claro e coercitivo ao exercício orçamentário e nanceiro por parte dos
gestores públicos, por isso arma Kelsen
Do que ca dito resulta que uma ordem jurídica, se bem que nem todas as
suas normas estatuam atos de coação, pode, no entanto, ser caracterizada
como ordem de coação, na medida em que todas as suas normas que não
estatuam elas próprias um ato coercitivo e, por isso, não contenham uma
prescrição mas antes conram competência para a produção de normas
ou contenham uma permissão positiva, são normas não autônomas, pois
apenas têm validade em ligação com uma norma estatuidora de um ato
de coação. (Kelsen, 1987, 62).
A coação foi e é um elemento presente na construção do direito para
garantia da sua ecácia e cumprimento das normas previstas, sem deixar de
vislumbrar que a existência de regras não afastará a possibilidade de coni-
tos, que sempre acontecerão dentro de um ambiente de convivência, apenas
o sistema trará a forma de resolução desses conitos.
Na verdade ao longo da evolução da humanidade, desde a sociedade pri-
mitiva aos dias atuais, foram muitos os percalços e tropeços, representando
em determinados momentos um grande retrocesso jurídico e democrático.
Por exemplo, a América Latina, nas décadas de sessenta e setenta,
passou por um grande retrocesso, como consequência da guerra fria das
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capítulo 1
os fundamentos teóricos e jurídicos para a aproteção do meio ambiente
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potências econômicas e militares, dentro do dicotomismo esquerda e direi-
ta, levando a diversos regimes autoritários nesse período, só retomando o
processo de redemocratização a partir da década de oitenta, existindo ainda
hoje regimes com muitas fragilidades institucionais e democráticas. Na ver-
dade, a reconstrução democrática ainda está em andamento, com o expurgo
do ordenamento jurídico autoritário.
O que é interessante observar, mesmo em regimes de exceção, existe um
ordenamento que rege o período autoritário, ele não segue sua lógica sem
normas, pelo contrário, esses regimes produzem também um ordenamento
de condução, que ainda hoje no Brasil é aplicado, com diversas normas sur-
gidas nesses períodos.
Outro dado sobre o regime de exceção no Brasil, foi o fato do regime
militar que perdurou no Brasil de 1964 a 1985 ter produzido diversas leis,
dentre elas, o Código Florestal (Lei 4771/1965) , o qual em termos de pro-
teção ambiental foi mais avançado que a atual Legislação Florestal atual,
produzida no pleno exercício democrático do poder, mas que no tocante a
proteção ambiental restou fragilizado pelos diversos interesse envolvidos na
elaboração da norma orestal.
Esses são os conitos que existem no estabelecimento do ordenamento
jurídico, como conjunto de normas que possibilitam a organização do esta-
do, de forma justa e democrática, por isso Bobbio diz
A complexidade de um ordenamento jurídico deriva do fato de que a
necessidade de regras de conduta numa sociedade é tão grande que não
existe nenhum poder (ou órgão) em condições de satisfaze-la sozinho.
Para vir ao encontro dessa exigência, o poder supremo, recorre geral-
mente a dois expedientes:
1) Recepção de normas já feitas, produzidas por ordenamentos diver-
sos e precedentes.
2) A delegação do poder de produzir normas jurídicas a poderes e
órgãos inferiores. (Bobbio, 1999, 38)
A ordenação da convivência em sociedade, dentro de um ambiente de
conitos de interesse, pressupõe a existência de um ordenamento jurídico,
que virá regular os interesses, a estrutura, a forma, a proteção de todos e
enm, organizar esse convívio dentro da divergência natural.
Regras novas e regras antigas, esse conjunto deverá ser harmonizado
para assegurar equilíbrio e efetividade, sempre diante da necessidade de
novas regras que o sistema delega para órgãos especícos, em razão até
da própria evolução humana. Exemplo desse fato, quatro décadas atrás não
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