Igualdade e Capacidade Contributiva

Páginas127-170
3. Igualdade e Capacidade Contributiva
3.1. Principais aspectos da igualdade tributária
Inicialmente, vale um breve retrospecto acerca de como o princípio
da iguald ade foi tratado nas constituições brasi leiras anteriores.
Na Constituição do Impér io de 1824, o princípio da i gualdade vinha pre-
visto no art. 179, inciso XIII, o qual assim d ispunha: “A Lei será igual para todos,
quer proteja, quer castigue, o recompensará em proporção dos merecimentos de cada
um”. Todavia, em decorrência dos privi légios existentes à época pa ra determina-
das pessoas, a ideia de ig ualdade destoava da noção de igua ldade traçada a parti r
das constitu ições seguintes, uma vez que, como bem aponta JOSÉ CRETELLA
JÚNIOR226, apenas a partir d a Constituição Federal de 1891 é que o princípio da
igualdade pa ssou a ter os contornos que atualmente possui:
[...]. Impõe-se a desigualdade de tr atamento, diante da peculia ridade
de determinad as situações. Traz a eiva de inconstituciona lidade, que
pode e deve ser arguid a perante o tribunal competente, toda lei que
estabelecer tratamento desigual para situações que não são desi-
guais, o que ocor re sempre que há privilégios ou prerrogat ivas, que
favorecem, absurdamente, determ inadas categorias, em det rimento
de outras. [...]. A Constituição do Império do Bra sil, art. 172, tratava
de modo desigual brasileiros e estrangeiros, fa lando, tão-só na ‘in-
violabilidade dos direitos civis e políticos dos cidadãos brasileiros’,
mas a Constituição de 1891, art. 72, equiparou os estrangei ros aos
brasileiros, pa ra efeitos assecuratórios à ‘inv iolabilidade dos direitos
concernentes à liberdade, à seg urança ind ividual e à propriedade’,
exting uindo também os privilégios de nobreza. O princípio de
igualdade perante a lei, constante da Constituição do Império, art.
179, inc. 13, era, no próprio texto constitucional, submetido a exce-
ções, ditadas pelo próprio regime monárquico e por motivos
226 CRETELLA J ÚNIOR, José. Comentár ios à Constituiç ão Brasileira de 1988, v. 1. Rio de
Janeiro: Forense Un iversitária, 1988, pp. 98-100.
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religiosos, pois a Ig reja tinha privi légios, não podendo, por exemplo,
ser eleito o não católico, art. 95, III, [...]. No Brasil, nem a religião,
nem a nobreza, nem o sexo, nem a convicção filosóf ica ou política,
serve de critério para o legislador ordinário estabelecer diferenças
entre categorias de c idadãos, a não ser pelo status, por traços caracte-
rísticos ou atributos especiais que tornem diferente a categoria
beneficiada.
Nesse sentido, é possível af irmar que somente na Constituição Federal
de 1891227, houve a previsão, pela primeira vez, da clássica fórmula “todos são
iguais perante a le i”, a qual foi repetida nas const ituições federais segui ntes228 e
se mantém até hoje.
A importância da igualdade é u nanimemente ressaltada pela doutri-
na229, da qual é exemplo o segu inte trecho de GERALDO ATALIBA:
227 Constituição Federa l de 1891: “Art.72 – A Constituição ass egura a bra sileiros e a
estrang eiros residentes no pai z a inviolabilidade dos d ireitos concernentes á lib er-
dade, á segur ança individua l e á propriedade, nos termos se guintes: [...] § 2º Todos
são iguaes per ante a lei. A Republica não admitte pr ivilegios de nasci mento, des-
conhece fóros de nobrez a, e exting ue as ordens honoríficas e xistentes e tod as as
suas prerogat ivas e regalias, bem como os t itulos nobiliar chicos e de conselho.”
228 Constituição Feder al de 1934: “Art. 113 – A Constit uição assegura a br asileiros e a
estrang eiros residentes no País a i nviolabilidade dos di reitos concernentes à liber-
dade, à subsistê ncia, à segura nça individua l e à propriedade, nos termos se guintes:
1) Todos são igua is perante a lei. Não haverá privi légios, nem distinçõ es, por mo-
tivo de nasci mento, sexo, raça, profissõ es próprias ou dos pais, c lasse social, r ique-
za, crenças re ligiosas ou idéias pol íticas.”
Constitu ição Federal de 1937: “Art. 122 – A Constituição a ssegura aos brasi leiros e
estrang eiros residente s no País o dire ito à liberdade, à seg urança i ndividual e à
propriedade, nos te rmos seguintes: 1º) todos são ig uais perante a lei;”
Constitu ição Federal de 1946: “Art. 141 – A Constituição asseg ura aos brasilei ros e
aos estrang eiros residente s no País a inviolab ilidade dos d ireitos concernentes à
vida, à liber dade, a segurança in dividual e à propriedade, no s termos seguintes: §
1º Todos são iguais perante a lei .”
Emenda Constituc ional n. 1/1969: “Art. 153. A Constituição ass egura aos brasilei-
ros e aos estra ngeiros residentes no País a i nviolabilidade dos di reitos concernen-
tes à vida, à lib erdade, à segu rança e à propriedade, nos têrmos seg uintes: § 1º
Todos são iguais pera nte a lei, sem distinç ão de sexo, raça, trabalho, c redo religio-
so e convicções polít icas. Será punido pela lei o pr econceito de raça.”
Constitu ição Federal de 1988: “Art. 5º Todos são iguais p erante a lei, sem dist inção
de qualquer natu reza, garantindo -se aos brasilei ros e aos estrangeiros res identes
no País a inviol abilidade do direito à v ida, à liberdade, à igua ldade, à segurança e
à propriedade, nos te rmos seguintes: [...].
229 A mais eminente d e todas as normas assecuratór ias de dire itos individua is é a
isonomia. Enu nciada no caput do art. 5º: ‘Todos são igua is perante a lei’ (ig ualda-
de formal, no sent ido kelseniano). E também no item I de sse dispositivo: ‘homen s
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3. Igualdade e capacidade contributiva
A igualdade é, as sim, a primeira base de todos os pr incípios consti-
tucionais e condiciona a própria função legislativa, que é a mais
nobre, alta e ampla de quanta s funções o povo, republicanamente,
decidiu cria r. A isonomia há de se expressar, portanto, em todas a s
manifestações de Estado, as quais, na sua maioria, se traduzem
concretamente em atos de aplicação da lei, ou seu desdobra mento.
Não há ato ou forma de expressão estata l que possa escapar ou
subtrair -se às exigências da igua ldade.
[...]
[...]. Toda violação da isonomia é uma violação aos princípios bá-
sicos do próprio sistema, ag ressão a seus mais caros f undamentos
e razão de nulidade d as manifestações estatai s. Ela é como que a
pedra de toque do regi me republicano230.
Especificamente quanto à igualdade tributár ia, cabe mencionar que,
do ponto de vista histórico, há duas grandes correntes doutrinár ias, que se
subdividem em diversas subcorrentes, cada qua l fundamentando ou justif i-
cando a igua ldade tributária de uma manei ra diferente.
Segundo ALCI DES JORGE COSTA231, a primei ra grande corrente dou-
trinária pode ser denominad a como “princípio do interesse” ou “princípio do
benefício”, a qual baseia-se na ideia de que, entre o Estado e os contribuintes,
há uma relação de prestação de ser viços, pelo primeiro, e pagamento de con-
traprestação, pelos seg undos. Subdivide-se nas segui ntes correntes:
1ª Subcorrente: Para uns, a ig ualdade tributária cons iste no sistema
que, para todos os cidadãos, est abelece uma relação entre o montan-
te de imposto pago e a soma dos serv iços gerais consumidos. Ou
seja, deve existir u ma ligação entre o imposto e a vantagem obtida
pelo contribuinte em su a relação com o Estado. Esta teoria identif ica
a economia pública com o sistema econômico-pr ivado, pretendendo
e mulheres são ig uais em di reitos e obrigaçõ es, nos termos desta Co nstituiç ão’
(igualdad e contenutística – di ria PONTES DE MIR ANDA). Sem isonomia, nen hu-
ma segura nça. Segur ança é pois um s ubrogado, na metali nguagem doutrinár ia,
dos disposit ivos constituciona is que a contemplam nas dobr as dos direitos e ga ran-
tias ind ividuais (l ingua gem-objeto). (BORGES, José Souto Maior. O princípio da
segurança jurí dica na criação e apli cação do tributo. Revista D iálogo Jurídico. Salva-
dor: CAJ – Centro de At ualização Jurídic a, n. 11, fevereiro, 2002. Dis ponível em:
www.direitopublico.com.br>. Acesso em: 08/05/2019).
230 ATALIBA, Geraldo. República e Constituição. São Paulo: Rev ista dos Tribunai s,
1985, p. 134.
231 COSTA, A lcides Jorge. Capacidad e Contributiva, in: Revista de Di reito Tributário n.
55, 1991, p. 298.
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