Introdução

AutorPedro H. C. Fonseca
Páginas1-30
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INTRODUÇÃO
Deixando de lado o tecnicismo jurídico, não há dif‌iculdade em admitir que o
processo, sobretudo o criminal, se traduz em um pré-constituído jogo em que há de
um lado a defesa e de outro a força decisória executiva do Estado. O MP enquanto
f‌iscal da lei e acusação, misturadas tais funções, junto ao magistrado, na prática
processual, representam uma força bruta contra o acusado/jurisdicionado/réu e a
Advocacia.
O Habeas Corpus desponta como poderoso instrumento em favor da defesa
relacionada à proteção de direitos fundamentais desde o procedimento investigativo
visando caminho para além do trânsito em julgado da ação penal.
Contra abusos em face da liberdade, sejam eles advindos de força policial ou
mesmo originados do próprio Judiciário com o aval do Ministério Público, a via
instrumental do Habeas Corpus revela aplicação de direitos e garantias individuais
gradualmente elevados à sua inerente natureza e condição de relevância no Estado
Democrático de Direito.
Sem dúvidas, o Writ confere vistas de proteção efetiva do positivado direito
fundamental da liberdade. É através do meio processual adequado que se viabiliza a
observância das normas estruturais do Estado Democrático de Direito à disposição
dos jurisdicionados pela carta constitucional. O Habeas Corpus é instrumento que
torna viável a aplicação das garantias e direitos individuais atingidos por afronta de
condutas de agentes do próprio Estado quando se trata de liberdade.
O Estado está submetido à ordem constitucional, prevalecendo a lei sobre as
instituições, sobretudo nos feitos processuais em que há atuação de agentes públicos.
A regra, a forma, o rito processual, são também garantias do jurisdicionado.
Nos termos do art. 1º, da Constituição da Federal, destaca-se que a República
Federativa do Brasil é formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e
do Distrito Federal, constituindo-se em Estado Democrático de Direito.
O fundamento de centro do Estado Democrático de Direito é a dignidade da
pessoa humana que não pode ser exercida na sua plenitude sem a garantia funda-
mental da liberdade, sob a proteção do Estado. Os agentes que representam o Estado
e violam o direito fundamental da liberdade, afrontam não só norma constitucional,
mas o próprio fundamento estrutural do Estado Democrático de Direito. É pela via
do Habeas Corpus que se fará a correção constitucional de uma conduta lesiva ao
direito de ir e vir, de forma que prevaleça o direito fundamental da liberdade em vigor.
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HABEAS CORPUS – TEORIA E PRÁTICA • Pedro H. C. FonseCa
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O ser humano pode ter a sua liberdade restringida de forma ilegal e incons-
titucional. Para haver a apreensão de alguém deverá o Estado se valer do f‌iltro da
teoria do delito, ou arranjar motivos absolutamente justif‌icáveis com fundamentos
estruturados com bastante profundidade, caso contrário, haverá afronta à ordem
constitucional merecendo imediato reparo, que pode ser carreado por via do Habeas
Corpus.
É importante registrar que o Advogado que manusear o remédio heroico deve
ter em mente a dogmática penal, pois de fato é a barreira onde se encontra funda-
mentos técnicos para evitar a prisão ou a manutenção da prisão ilegal, salvo se o
feito em específ‌ico tratar de questionamento exclusivamente fático. Lembro ainda
que é necessário a visita ao Direito Constitucional, pois a liberdade protegida pela
via do Habeas Corpus representa destacado direito fundamental.
Vamos à dogmática.
A dogmática penal, ou seja, os dogmas que constroem a consideração de um fato
na condição de crime que justif‌ica ao Estado a aplicação da sanção penal encarcerando
o jurisdicionado, ou mesmo a matéria fática impositiva de pena antecipada, deve ter
a luz constitucional do garantismo ofertado pelo Estado Democrático de Direito.
Sem isso, haverá violação à legalidade enquanto princípio norteador para validar e
dar legitimidade ao ato da prisão. O Habeas Corpus viabiliza a tese demonstrativa
da necessária soltura para f‌ins de análise judicial e cumprimento da ordem imposta
pelo Estado Democrático de Direito.
Por isso, não há condições de manusear um Habeas Corpus sem que o construtor
da tese aponte vias de estrutura dogmática plausíveis de admissão para destrancar
alguém.
Para além do viés constitucional estar inserido nas normas infraconstitucionais,
sobretudo o código de processo penal, há que considerar a política garantista também
inserida nas estruturas normativas e dogmáticas, a partir do Estado Democrático
de Direito; o neoconstitucionalismo; a legalidade enquanto princípio, com o objeto
tecnicista do bem jurídico conforme a natureza do direito de liberdade constitucional.
Não há como entender o poder do Habeas Corpus sem ver antes a ciência jurídica
que o respalda. Esse é o propósito deste livro – dar técnica ao leitor para construir
um Habeas Corpus estruturado pela adequada forma, técnica e dogmática assertiva
a cada caso concreto em alinhamento ao Estado Democrático de Direito.
1.1 ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO E O HABEAS CORPUS
O Habeas Corpus representa instrumento constitucional para assegurar o bem
jurídico liberdade, direito fundamental de consequente ef‌icácia do exercício da
dignidade da pessoa humana. A Constituição da República, no título I, “princípios
fundamentais”, art. 1º, prescreve que a República Federativa do Brasil é formada pela
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