A quê e a quem serve o trabalho das pessoas em situação de prisão? Reflexões desiguais e combinadas desde a economia política da pena

AutorCarla Benitez Martins
Ocupação do AutorProfessora de Direito Processual Penal e Criminologia na Universidade Federal de Goiás, Regional Jataí
Páginas345-358
Carla Benitez Martins1
1. Professora de Direito Processual Penal e Criminologia na Universidade Federal de Goiás, Regional Jataí. Bacharela em Direito pela
Universidade Estadual Paulista. Mestra em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina. Doutora em Direito pela Universida-
de Federal de Goiás. Secretária Nacional do Instituto de Pesquisa, Direitos e Movimentos Sociais (IPDMS).
2. REDE JUSTIÇA CRIMINAL. Agenda prioritária para 2016. Disponível em: oads/2016/07/
RedeJusticaCriminal-Agenda-Prioritaria-2016-FINAL-diagramada.pdf>. Acesso em: 10 maio 2019.
3. Ibidem.
4. No primeiro de janeiro um conf‌l ito entre facções resultou na morte de 56 pessoas em situação de prisão no Complexo Penitenciário
Anísio Jobim (Compaj), em Manaus, a maioria decapitados e com seus corpos esquartejados. No dia seguinte, mais 4 mortos em Ma-
naus, mas dessa vez na Unidade Prisional de Puraquequara. Em 4 de Janeiro, 2 pessoas foram mortas na Paraíba, no Presídio Romero
Nóbrega, em Patos. Em 6 de janeiro, 33 pessoas em situação de prisão foram mortas em uma rebelião na Penitenciária Agrícola de
Monte Cristo, em Boa Vista, Roraima. Em 8 de janeiro, mais 4 mortos em Manaus, dessa vez na Cadeia Pública Desembargador Rai-
mundo Vidal Pessoa. 14 de janeiro, mais um triste episódio, dessa vez localizado na Penitenciária Estadual de Alcaçuz, no Rio Grande
do Norte, foram 26 mortos em decorrência de uma rebelião e uma provável disputa entre o PCC e o Sindicato do Crime, todos foram
decapitados. No mesmo dia, houve 2 mortes em presídios de Santa Catarina e outras 2 em uma penitenciária na região metropolitana
de Curitiba. 4 dias depois, mais um morto no mesmo estado, mas na Penitenciária Estadual do Seridó. No início de abril mais 8 mortes
foram contabilizadas na Unidade Prisional de Puraquequara, em Manaus.
5. R EDE JUSTIÇA CRIMINAL. Agenda prioritária para 2016. Disponível em: s/2016/07/
RedeJusticaCriminal-Agenda-Prioritaria-2016-FINAL-diagramada.pdf>. Acesso em: 10 maio de 2019.
1. INTRODUÇÃO
Já é fato notório que o Brasil é recordista em índices de
encarceramento, e que isso vem combinado com um ritmo
elevado de ampliação das estruturas prisionais, ainda que
sem conseguir acompanhar a magnitude das prisões, ge-
rando um epidêmico quadro de superlotação.
Para sermos mais precisas, a população carcerária bra-
sileira, em junho de 2016, totalizava 726.712 pessoas,
passando do quarto para o terceiro lugar em termos de
população prisional do mundo – em números absolutos –,
ultrapassando a Rússia, ficando atrás apenas dos Estados
Unidos e China. Além do número total ser altíssimo, des-
taca-se que o encarceramento veio crescendo progressiva-
mente no país, fenômeno distinto do que parece ser uma
tendência nos outros países que o seguem no lamentável
ranking dos mais encarceradores. Nestes, “comparados os
anos de 2008 e 2013, os Estados Unidos reduziram em 8%
a taxa de aprisionamento, a China em 9% e a Rússia em
24%, segundo o Levantamento Nacional de Informações
Penitenciárias – INFOPEN”2, enquanto no Brasil houve o
“impressionante aumento de 33% de sua taxa de aprisiona-
mento em cinco anos, chegando hoje à média de quase 300
pessoas presas para cada cem mil habitantes”3.
Em paralelo a isso, como há tempos é sabido – e espe-
cialmente evidenciado no ano de 2017 com os massacres
em presídios de Manaus, Boa Vista e Natal, que resulta-
ram em mais de 125 mortes nas duas primeiras semanas do
ano –, o problema da superlotação das unidades prisionais
no país é calamitoso4. O sistema declara ter 368.049 vagas
e um déficit de 358.663 vagas. E, ao contrário do grande
veículo de ganho de votos por parte de políticos sensacio-
nalistas, não se trata de um problema de insuficiente cons-
trução de presídios:
Temos quase 2 presos por vaga. Diante deste dado
alguém poderia argumentar que a situação prisional é
precária porque houve negligência na construção de
presídios e abertura de novas vagas. No entanto, a rea-
lidade dos dados se impõe. O relatório do Depen infor-
ma que de 2000 a 2014 o número de vagas triplicou, e
mesmo assim o déficit do período mais do que dobrou!5
A quê e a quem serve o trabalho
das pessoas em situação de prisão?
Reflexões desiguais e combinadas
desde a economia política da pena 28

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