Reforma Trabalhista e Desconsideração da Personalidade Jurídica: Aspectos Processuais

AutorVivian Ferraz de Arruda Salvador
Páginas68-76
REFORMA TRABALHISTA E DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA: ASPECTOS PROCESSUAIS
Vivian Ferraz de Arruda Salvador(1)
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AdvogadaPesquisadoradoGETRABUSP
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(3) Ibdi., p. 140.
1. Introdução
Com a Reforma Trabalhista, instituída pela Lei n.
13.467/2017, o incidente de desconsideração da perso-
nalidade jurídica previsto na processualística civil foi incor-
porado ao processo do trabalho, sanando dúvidas que
pairavam sobre a aplicabilidade subsidiária desse instituto
civilista no ramo processual trabalhista.
Propõe-se, com o presente estudo, apresentar aspectos
do incidente de desconsideração da personalidade jurídica
e analisar os principais impactos de sua aplicação na sea-
ra do processo do trabalho, considerando, ainda, outras
importantes alterações e inovações recentemente introdu-
zidas na sistemática trabalhista que afetam, direta ou indi-
retamente, a responsabilidade dos sócios por obrigações
da pessoa jurídica que integram.
2. Personalidade jurídica
A pessoa jurídica não tem existência fora da seara jurí-
dica. O Direito admite a personalização de determinados
sujeitos de direito – que, na condição de despersonaliza-
dos, só poderiam praticar atos a que estivessem explicita
e juridicamente autorizados – para admitir-lhes a prática
de atos jurídicos em geral, com exceção daqueles a que
estejam expressamente proibidos(2).
É nesse sentido que o artigo 45, caput, do Código Civil
de 2002 dispõe que a existência legal das pessoas jurídicas
de direito privado inicia-se com a inscrição do ato constitu-
tivo no respectivo registro, precedida, quando necessário,
de autorização ou aprovação do Poder Executivo. Assim,
a pessoa jurídica adquire personalidade com a inscrição,
em registro próprio, de seus instrumentos constitutivos,
na forma da lei.
Como consequência dessa ficção jurídica, de sua persona-
lização, a pessoa jurídica não se confunde com as pessoas
que a compõem, de modo que a sociedade empresária tem
personalidade jurídica distinta e independente da de seus
sócios. A personalização confere à pessoa jurídica titulari-
dades negocial, processual e patrimonial, podendo, então,
como sujeito de direito autônomo, assumir um dos polos de
relações negociais, demandar e ser demandada em juízo
(capacidade processual) e responder com patrimônio pró-
prio, inconfundível e incomunicável com os bens individu-
ais de seus sócios, pelas obrigações que assumir(3).
Assim, como decorrência da autonomia patrimonial
da pessoa jurídica, o patrimônio particular de seus só-
cios não responde pelas dívidas da sociedade, salvo nos
casos previstos em lei, consoante dicção dos artigos
790, II, e 795 do CPC/2015, na mesma linha dos arti-
gos 592, II, e 596 do CPC/1973.
Observa-se que a norma processualista civil sujeita, de
modo excepcional, o patrimônio dos sócios à execução
por dívidas da sociedade, assegurando-lhes, por outro
lado, o direito de exigir que primeiro sejam executados os
bens da sociedade, devedora principal, na forma do art.
795, § 1º, do CPC/2015.
Nota-se, portanto, que a ordem processual civil brasileira
– assim como a trabalhista, conforme se verá – absorveu a
relativização da autonomia patrimonial da pessoa jurídica.
É nesta relativização que se pauta a teoria da desconsi-
deração da personalidade jurídica, por meio da qual se
supera a personalidade jurídica da sociedade, episódica e
temporariamente, para satisfazer o crédito do exequente,
mediante a sujeição do patrimônio dos sócios à execução.
3. As teorias da desconsideração da perso-
nalidade jurídica no direito brasileiro
A autonomia patrimonial da pessoa jurídica é, por vezes,
utilizada como subterfúgio para a realização de fraudes e
abusos de direito. Para coibi-las, a doutrina, notadamen-
te nos EUA, na Inglaterra e na Alemanha, desenvolveu,
a partir de decisões jurisprudenciais, a teoria da descon-
sideração da pessoa jurídica ou disregard doctrine, pela
qual se autoriza o Poder Judiciário a ignorar a autonomia
patrimonial da pessoa jurídica, episodicamente, sempre
que ela tiver sido utilizada indevidamente, e, com isso, a
responsabilizar, direta, pessoal e ilimitadamente, o sócio
por obrigação que, originariamente, cabia à sociedade, a
Livro - Reedição Nelson Mannrich.indb 68 30/08/2018 09:57:00

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