A relevância da boa-fé

AutorRenata Cassia De Santana
Ocupação do AutorMestre em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2012)
Páginas171-190
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Pelo estudo dos capítulos anteriores, concluímos que se
dependesse somente da redação da legislação do ICMS, não ha-
veria debate sobre a boa-fé. Descumprida a obrigação principal
ou o dever instrumental, responderia o infrator, sem qualquer
chance de defesa. Até mesmo porque a nota fiscal tida como inábil,
ainda que presumidamente, faz prova somente em favor do Fisco,
a teor do disposto no parágrafo único do artigo 184 do RICMS/SP.
Essa atitude, entretanto, mais que ferir os princípios do
contraditório e da ampla defesa, como já comentamos, viola os
princípios da moralidade administrativa e da confiança, todos
eles representados por um único princípio, o da boa-fé, um dos
pilares para o fortalecimento do princípio constitucional da
segurança jurídica.
Mas não basta invocar o princípio, como quem preten-
de fazer valer seus direitos com base somente na aparência
de direito (“teoria da aparência”)126. Para que a boa-fé fique
126. RÁO, Vicente. Ato jurídico: “se a aparência de direito possui a força
de princípio, nem por isso, em sua aplicação, pode-se dispensar o emprego
da máxima cautela, à vista da delicadeza da matéria e da possibilidade de
causar prejuízo injusto ao direito alheio” (3. ed. São Paulo: Max Limonad,
1965, p. 247).
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RENATA CASSIA DE SANTANA
caracterizada, precisaremos recorrer a alguns requisitos. Esse
tem sido o maior desafio dos nossos Tribunais, como veremos
no próximo capítulo.
Para que nada se perca, comecemos pela expressão
“boa-fé”.
4.1 Acepções do termo “boa-fé”
Como não há no direito positivo uma definição do que
venha a ser “boa-fé”, tomaremos como base as acepções que
podem ser localizadas em qualquer dicionário de língua por-
tuguesa: retidão, confiança, pureza de intenções, lisura, hones-
tidade, entre outras, a noção da bona fides do Direito Romano,
representada pela palavra dada. Tomaremos também o ensi-
namento de alguns cientistas do Direito, como o civilista OR-
LANDO GOMES, especialista em Direito das Obrigações:
Agir de boa-fé significa comportar-se como homem
correto na execução da obrigação. Não é fácil caracteri-
zar o comportamento. Ao se prescrever que as partes de
uma relação obrigacional oriundas de contrato precisam
proceder de boa-fé, quer dizer que lhes cumpre observar
comportamento decente, que corresponda à legítima
expectativa do outro contratante. O devedor há de ajus-
tar sua conduta ao tipo abstrato presumido pela lei à
base dos “princípios da correção interindividual” que
se refletem amplamente na consciência comum127.
O Código Civil brasileiro, no seu artigo 422, chega a dispor
sobre a importância da boa-fé nos negócios (“os contratantes
são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como
em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé”), mas
127. Obrigações. 12. ed. rev. e atual. por Humberto Theodoro Jr. Rio de Ja-
neiro: Forense, 1999, p. 89-90.

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