Responsabilidade penal por dano ao meio ambiente

AutorMaria Luiza Machado Granziera
Páginas689-705
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RESPONSABILIDADE PENAL POR
DANO AO MEIO AMBIENTE
47.1 BREVE HISTÓRICO
Embora somente após a edição da Lei nº 6.938/81 se possa dizer que ficou definida
a responsabilidade penal por dano ao ambiente, normas de caráter penal já haviam sido
adotadas, de forma esparsa. Aponta-se o Código Criminal do Império, de 1830, que tipifi-
cava criminalmente o corte ilegal de madeira. A Lei nº 3.311, de 1886, definiu o crime de
incêndio. O Decreto nº 23.793/34 – Código Florestal – dividiu as infrações penais em cri-
mes e contravenções. O Decreto-lei nº 2.848/40 transformou em contravenções os crimes
contra as florestas, que posteriormente, em sua maioria, readquiriram o status de crimes,
pela Lei nº 9.605/98.1 A Lei de Proteção à Fauna – Lei nº 5.197, de 3-10-1967 –, em seu art.
27, fixava a contravenção da caça profissional, posteriormente transformada em crime.
Além disso, o Código Penal tipifica alguns crimes relacionados com o meio ambien-
te, embora de maneira indireta. O art. 165, que dispõe sobre dano em coisa de valor artís-
tico, arqueológico ou histórico, tipifica como crime:
Art. 165. Destruir, inutilizar ou deteriorar coisa tombada pela autoridade competente em virtude de
valor artístico, arqueológico ou histórico:
Pena – detenção, de seis meses a dois anos, e multa.
O art. 250 que prevê o crime de causar incêndio, expondo a perigo a vida, a integri-
dade física ou o patrimônio de outrem, fixa, como causa de aumento da pena de reclusão,
de três a seis anos, e multa, a ocorrência do incêndio em lavoura, pastagem, mata ou
floresta.2
O art. 259 consiste em crime de difusão de doença ou praga:
Art. 259. Difundir doença ou praga que possa causar dano a floresta, plantação ou animais de utilidade
econômica:
Pena – reclusão, de dois a cinco anos, e multa.
Modalidade culposa
Parágrafo único. No caso de culpa, a pena é de detenção, de um a seis meses, ou multa.
1. SANTOS, Celeste Leite dos; SANTOS, Maria Celeste Cordeiro Leite. Crimes contra o meio ambiente: responsabilidade e
sanção penal. 3. ed. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2002, p. 7.
2. Decreto-lei nº 2.848/40, at. 250, § 1º, II, h.
DIREITO AMBIENTAL • MARIA LUIZA MACHADO GRANZIERA
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47.2 A LEI DE CRIMES AMBIENTAIS
A Lei nº 9.605/98 veio completar o marco jurídico da proteção do meio ambiente,
7.347/85, que, somados às demais normas ambientais, conferem um vasto arcabouço, no
que se refere às normas de comportamento em relação aos bens ambientais, à responsabi-
lidade por danos ao ambiente e aos meios judiciais de tutela ambiental.
O entendimento das condutas e atividades lesivas ao meio ambiente como crimes
constitui, em princípio, uma alteração importante no ordenamento jurídico pátrio, em
favor do meio ambiente. É importante notar que sobre um mesmo dano aplicam-se três
tipos de responsabilidade – administrativa, civil e penal –, sendo que as duas primeiras es-
tão muito mais relacionadas com aspectos financeiros – aplicação de multas, indenização
etc. Entretanto, a responsabilidade criminal pelo dano ao meio ambiente afeta diretamente
a pessoa, que passa à condição de ré, o que significa uma verdadeira sanção social, além
da questão jurídica.
Talvez seja essa, de fato, a grande alteração ocorrida. “O estigma de um processo penal
gera efeitos que as demais formas de repressão não alcançam”. 3 Todavia, cumpre salientar
que a punibilidade na Lei de Crimes Ambientais está muito mais voltada à restrição de di-
reitos e à prestação de serviços à comunidade do que ao encarceramento da pessoa física.
Em que pese a importância de atribuir ao poluidor a responsabilidade penal, cabe
considerar que, em termos de gravidade de penas e valor de multas, pelo menos, essa
responsabilização ficou muito aquém do que seria necessário. Por exemplo, as maiores
penas – de reclusão4 – não ultrapassam cinco anos, e estão previstas para os delitos do art.
35, que tipifica, como crime, pescar mediante a utilização de: I – explosivos ou substâncias
que, em contato com a água, produzam efeito semelhante; II – substâncias tóxicas, ou outro
meio proibido pela autoridade competente” do art. 40, que estabelece como crime “causar
dano direto ou indireto às Unidades de Conservação, e do art. 54, que dispõe sobre “causar
poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à
saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa
da flora, no caso específico de ocorrência de uma das agravantes estabelecidas no § 2º5 do
citado dispositivo.
Comparando com outros crimes, para o furto qualificado, previsto no art. 155 do Có-
digo Penal, a pena é de reclusão de três a oito anos, se a subtração for de veículo automotor
que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior.6
3. FREITAS, Gilberto Passos de; FREITAS, Vladimir Passos de. Crimes contra a natureza (de acordo com a Lei nº 9.605/98).
9. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 33.
4. De acordo com o art. 33 do Código Penal – Decreto-lei nº 2.848/40 –, a pena de reclusão deve ser cumprida em re-
gime fechado – em estabelecimento de segurança máxima ou média –, semiaberto – colônia agrícola, industrial ou
estabelecimento similar – ou aberto em casa de albergado ou estabelecimento adequado. A de detenção, em regime
semiaberto ou aberto, salvo necessidade de transferência a regime fechado – redação dada pela Lei nº 7.209, de 11-
7-1984.
5. Forma qualificada aumenta a pena para até cinco anos: Lei nº 9.605/98, art. 54, § 2º, I: “Tornar uma área, urbana ou
rural, imprópria para a ocupação humana; II – causar poluição atmosférica que provoque a retirada, ainda que momen-
tânea, dos habitantes das áreas afetadas, ou que cause danos diretos à saúde da população; III – causar poluição hídrica
que torne necessária a interrupção do abastecimento público de água de uma comunidade; IV – dificultar ou impedir o uso
público das praias; V – ocorrer por lançamento de resíduos sólidos, líquidos ou gasosos, ou detritos, óleos ou substâncias
oleosas, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou regulamentos.
6. Decreto-lei nº 2.848/40, art. 155, § 5º, incluído pela Lei nº 9.426, de 1996.

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