Subsistema político-administrativo da política nacional do audiovisual no Brasil

AutorEloiza Silva
Páginas103-157
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Capítulo 2
SUBSISTEMA POLÍTICO-ADMINISTRATIVO DA POLÍTICA
NACIONAL DO AUDIOVISUAL NO BRASIL
No capítulo antecedente, foram delimitados os referenciais teórico
e jurisprudencial desse estudo de caso, incluindo a jurisprudência que vem
sendo consolidada no âmbito do Tribunal de Contas da União (TCU)
pertinente à análise de conformidade da “Ancine+Simples” e que alcançou,
em maior ou menor medida, entes e órgãos públicos da Administração
Pública Federal formuladores e executores da Política Nacional do
Audiovisual, isto é, as instituições e respectivos agentes responsáveis pelas
escolhas de opções administrativas tais como aquelas que fundamentaram
a criação dessa metodologia simplificada.
Isso posto, serão apresentadas nesse tópico essas instituições
públicas estruturantes do ciclo de política pública (policy cycle) da política
setorial do audiovisual: Conselho Superior do Cinema (CSC), Comitê
Gestor do Fundo Setorial do Audiovisual (CGFSA), Agência Nacional do
Cinema (Ancine) e Secretaria Nacional do Audiovisual (SAV), com vistas
à construção de um quadro geral explicativo de suas prerrogativas formais
e de como elas, a partir de tais competências, atuam nesse ciclo e executam
tomadas de decisão. Para isso, reporta-se aqui ao contexto histórico recente
dessas instituições que foram impactadas, em maior ou menor intensidade,
pelos comandos de controle exarados pela Corte de Contas nos processos
TC n.º 014.483/2016-5; TC n.º 017.413/2017-6; TC n.º 011.908/2018-1; e
TC n.º 040.341/2019-4.
No que diz respeito ao suporte teórico, empregou-se a visão de
Celina Souza (2006, p. 21-22) acerca do neoinstitucionalismo, que, em
suma, compreenderia tanto as instituições como sendo constituídas por um
conjunto de regras formais e informais que moldam o comportamento dos
atores, quanto sobrelevaria a importância do papel dessas instituições para
decisão, formulação e implementação de políticas públicas.
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Tal qual, no presente estudo de caso, a observação das instituições
é uma escolha metodológica para compreensão da governança do setor
público responsável, especialmente, pelas políticas setoriais dirigidas ao
audiovisual em momento histórico recente, inclusive, no tocante a seus
mecanismos de gestão e controle de recursos públicos desembolsados.
Consoante tal enfoque, destaca-se também a visão da pesquisadora
Adelyne Maria Mendes Pereira (2014, p. 157) a respeito da ótica
neoinstitucionalista, a qual permitiria avaliações no nível meso da política
pública, isto é, no patamar no qual as instituições, concomitantemente,
influenciam e são influenciadas pelos atores sociais e políticos, assim como
proporcionaria análises de atores sociais em determinado contexto
histórico institucional e estatal.
Na ocasião em que discorrem sobre as escolas teóricas existentes
dedicadas à compreensão e à definição conceitual do que seja uma política
pública, Howlett, Ramesh e Perl (2013, p. 58) chamam a atenção para o
fato de que as melhores sínteses de modelos e teorias de “policy-making”
(formulação e/ou produção de políticas públicas) seriam derivações de
abordagens neoinstitucionais, porque tais referências agregariam tanto
variáveis ligadas a atores quanto a estruturas, além de abordarem o Estado
e as demais instituições participantes como entidades que afetam e
influenciam as preferências e escolhas dos atores.
Assim, consoante essa perspectiva de Howlett, Ramesh e Perl
(2013, p. 58), empregou-se aqui o conceito de subsistema político-
administrativo enquanto campo de forte interação entre atores, instituições
e ideias implicados em determinada policy-making, isto é, de campo de
intensa comunicação e relação, no qual atores e instituições, a partir de suas
escolhas e preferências, trabalham sobre determinado setor para resolução
de um problema público que tenha ingressado de maneira relevante na
agenda.
A partir de tais balizas teóricas e defronte ao presente caso sob
análise, tal conceito de subsistema seria também útil para a descrição das
instituições públicas que integram o setor de fomento público ao
audiovisual brasileiro e que, concomitantemente, têm sido afetadas pelos
problemas de prestações de contas e de accountability na metodologia
“Ancine+Simples”, expostos à opinião pública em função do exercício de
controle externo da parte de outra instituição relevante, o TCU.
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Outrossim, é importante assinalar que a perspectiva
neoinstitucionalista não é unívoca, mas sim ampla e composta por distintas
vertentes e abordagens conceituais. Destacando-se aqui, como as mais
representativas, as três escolas de pensamento retratadas pela análise de
Peter A. Hall e Rosemary C.R. Taylor (2003), que selecionam e retratam
os principais modelos expoentes do neoinstitucionalimo: institucionalismo
histórico, institucionalismo da escolha racional e institucionalismo
sociológico.
Relativamente aos seus aspectos comuns, em síntese, tais escolas
emergiram entre as décadas de 80 e 90 como oposição aos enfoques
behavioristas, hegemônicos nos EUA até a década de 70, e todas se
concentravam na abordagem de “como” as instituições poderiam moldar
as estratégias políticas e, assim, influenciar os resultados políticos. No
tocante aos aspectos distintivos, em resumo, é possível selecionar alguns
marcos característicos e singulares de cada modelo. Para o
institucionalismo da escolha racional, os atores agiriam de maneira
calculada e estratégica com vistas à maximização dos resultados de suas
escolhas preferenciais. Para o institucionalismo sociológico seria relevante
conhecer o “porquê” de as instituições adotarem e difundirem um
determinado conjunto de formas, procedimentos e símbolos. Por fim, para
o institucionalismo histórico, as instituições dariam forma às estratégias
dos atores, condicionando-os em suas preferências, escolhas e metas
dirigidas a determinada pauta política. (HALL; TAYLOR, 2003, p. 194).
Posto isso, sem adotar de antemão uma dessas escolas
neoinstitucionalistas, isoladamente, para o subsequente detalhamento das
instituições do subsistema político-administrativo impactado pelas
decisões da Corte de Contas relativas à metodologia “Ancine+Simples”,
optou-se pelo intercâmbio entre essas perspectivas com o objetivo de se
alcançar uma abordagem abrangente acerca dos órgãos colegiados (CSC e
CGFSA) e dos entes da Administração Pública direta (SAV) e indireta
(Ancine), que impulsionam o ciclo de política pública (policy cycle), em
âmbito nacional, da política setorial focalizada no desenvolvimento do
mercado audiovisual brasileiro. Colegiados e entes públicos cujo desenho
formal de interação institucional coordenada e complementar vem sendo
denominado pela literatura acadêmica especializada como “Tripé

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