Um Olhar Lusitano sobre o Novo Art. 477-A da CLT: Modernização ou Mercantilização do Direito do Trabalho?

AutorJoão Leal Amado
Páginas25-32
UM OLHAR LUSITANO SOBRE O NOVO
ART. 477-A DA CLT: MODERNIZAÇÃO OU
MERCANTILIZAÇÃO DO DIREITO DO TRABALHO?
João Leal Amado
(1)
(1) Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra – Portugal.
(2) Que corresponde, na terminologia brasileira, à chamada “regra da porta aberta” – assim, MANNRICH, Nelson. Dispensa cole-
tiva e negociação coletiva prévia: novas diretrizes. Revista da Academia Nacional de Direito do Trabalho, n. 19, p. 101, 2011.
(3) Citada e exemplarmente sustentada por EPSTEIN, Richard A. In: Defense of the Contract at Will. University of Chicago Law
Review, v. 51, p. 947 e ss., 1984.
(4) Em Portugal, utiliza-se o termo “despedimento”, ao passo que no Brasil se usa “despedida” ou “dispensa”. Em qualquer ca-
so, está correto: o empregador despede ou dispensa o trabalhador, vale dizer, expele-o, expulsa-o da empresa, priva-o do emprego
(“manda-o embora”); já o trabalhador não pode despedir o empregador, pode, quando muito, demitir-se, sair da empresa, libertar-se
daquele vínculo de subordinação (“vai-se embora”). A lei portuguesa, todavia, se já utiliza o termo “despedimento”, ainda não aceita
a figura da “demissão”, preferindo refugiar-se em conceitos mais civilísticos (resolução, denúncia, etc.). Cremos que, sem prejuízo do
rigor técnico, seria preferível “laboralizar” a terminologia, tornando-a mais expressiva.
1. A PROTEÇÃO CONTRA O DESPEDIMENTO
ARBITRÁRIO OU SEM JUSTA CAUSA
É certo que a era da nova economia globalizada, dinâ-
mica, inovadora e ferozmente competitiva obedece à lógica
do efémero, do volátil e do imprevisível, sendo incompatí-
vel com o ideal do “emprego para toda a vida” que, de al-
gum modo, imperou no século passado. Daí, porém, não se
segue inexoravelmente que o ordenamento jurídico tenha
de contemporizar com despedimentos arbitrários, dispen-
sando o empregador de justificar a sua decisão extintiva e
isentando esta última do escrutínio judicial. Não parece,
pois, que se deva remeter a estabilidade no emprego para
a arca das velharias inúteis, optando por consagrar o prin-
cípio do despedimento livre ou ad nutum, segundo o qual,
free to hire, free to fire, permitindo-se que o empregador
despeça o trabalhador por qualquer razão, ou mesmo sem
razão.
A doutrina do employment at will(2), segundo a qual,
“men must be left, without interference to buy and sell
where they please, and to discharge or retain employees
at will for good cause or for no cause, or even for bad cause
without thereby being guilty of an unlawful act per se(3),
representa, sem dúvida, o grau máximo de flexibilidade la-
boral. Tem, porém, o sério inconveniente de abrir as portas
ao arbítrio patronal, instituindo a precariedade como traço
indelével de toda e qualquer relação de trabalho. Acresce
que aquela doutrina do employment at will é claramente
violadora da Convenção n. 158 da OIT (a exigência de
motivação do despedimento patronal encontra guarida no
art. 4º da Convenção), bem como da Carta dos Direitos
Fundamentais da União Europeia, cujo art. 30 estabelece
que todos os trabalhadores têm direito à proteção contra
os despedimentos sem justa causa.
Dir-se-ia, pois, que a estabilidade no emprego e a tutela
contra o despedimento arbitrário são valores a salvaguardar
e promover pelo ordenamento jurídico – valores, decerto,
não absolutos, mas também, cremos, não obsoletos. Daí
que a Constituição da República Portuguesa (CRP) esta-
beleça, no seu art. 53, que “é garantida aos trabalhadores a
segurança no emprego, sendo proibidos os despedimentos
sem justa causa ou por motivos políticos ou ideológicos”.
(CRFB) consagre, como um dos direitos dos trabalhado-
res, o de “relação de emprego protegida contra despedida
arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei comple-
mentar, que preverá indenização compensatória, dentre
outros direitos” (art. 7º, I)(4).
Os pilares constitucionais de ambos os países, quanto
a este ponto, são similares: a CRP proíbe os despedimen-
tos sem justa causa ou por motivos políticos ou ideológi-
cos, garantindo a segurança no emprego; a CRFB censura/
combate os despedimentos arbitrários ou sem justa causa,
dando expressão ao princípio da continuidade da relação

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