O Programa Cultura Viva e os Pontos de Cultura: a constituição de uma rede democrática de produção político-cultural

AutorGraciela Hopstein
Páginas47-65
O Programa Cultura Viva e os Pontos de Cultura: a
constituição de uma rede democrática de produção
político-cultural
Graciela Hopstein28
1. Pontos de partida
O Programa Cultura Viva foi implementado a partir do ano de 2004 durante
a gestão do Ministro Gilberto Gil (2004-2008) e representou uma autêntica re-
volução no âmbito das políticas culturais no Brasil. O Programa Arte, Cultura e
Cidadania implicou a instalação de uma política pública de caráter inovador que
não apenas conseguiu incluir novas concepções de cultura, de trabalho produtivo
e em rede, valorizando efetivamente as noções do público e de democracia, mas
também instalou novas dinâmicas políticas e produtivas a partir da inclusão dos
movimentos culturais na concepção e execução de estratégias e ações. De fato, pode-
se af‌irmar que trata-se de uma iniciativa que considera o trabalho dos movimentos
culturais como uma dinâmica política fundamental, tanto a partir de iniciativas de
diálogo, como de reconhecimento de identidades, da incorporação de múltiplos
atores, estratégias e dinâmicas para o planejamento e implementação de ações.
Enquanto política voltada para a juventude, o Cultura Viva tem a f‌inalidade
de estimular o protagonismo e a participação social, articulando associações da
sociedade civil, proporcionando-lhes o acesso a recursos públicos, facultando o
fortalecimento e reconhecimento de circuitos culturais com bases comunitárias e
associativistas. Trata-se, então, de um programa de acesso aos meios de formação,
criação, difusão e fruição cultural cujos parceiros imediatos são os agentes cultu-
rais, artistas, militantes e os jovens moradores das favelas29 (prioritariamente), que
28 Doutora em Política Social pela UFRJ. Consultora na área de políticas públicas, movimentos
sociais e no planejamento, gestão e avaliação de projetos sociais. Pesquisadora associada ao
Instituto Nupef. Professora do Curso de pós-graduação em Direito da Administração Pública
CEDAP/UFF.
29 De acordo co m a def‌inição do Observatório da Favelas, compreendemos que as favelas
constituem moradas singulares no conjunto da cidade, compondo o tecido urbano, estando,
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percebem a cultura como diversidade de linguagens, mas também como direitos,
comportamentos e economia.
O Cultura Viva conseguiu introduzir uma verdadeira mudança na concep-
ção da noção de cultura, que hoje é entendida como “modos de ser, fazer e viver”
e como o “eixo construtor de identidade e espaço de realização da cidadania30;
portanto, desde esta visão, a cultura deve ser entendida como um fenômeno vivo,
dinâmico, capaz de animar a vida econômica e simbólica das sociedades. Porém,
ao mesmo tempo, o Programa procura potencializar os dinamismos culturais lo-
cais ao promover a integração produtiva de jovens a partir de práticas produtivas
de caráter autônomo, construídas na base do trabalho compartilhado e em rede,
imprimindo-lhe uma autêntica dimensão pública e democrática. A dinâmica po-
lítica instalada pelo Cultura Viva implicou uma nova forma de atuação do Estado
e a concepção de um modelo de gestão baseado no diálogo e na interlocução com
os diversos grupos e coletivos que integram o movimento cultural no Brasil, e na
articulação institucional entre as diferentes instâncias públicas para formulação
de políticas integradas.
Concebida como uma rede orgânica de criação e gestão cultural, a implanta-
ção do Programa prevê a articulação com diversos atores presentes nos territórios
a partir de práticas associativas em nível local, regional e nacional, potenciando e
agregando recursos e novas capacidades a projetos e instalações presentes no tecido
social, com a f‌inalidade de ampliar possibilidades do fazer artístico e recursos para
uma ação contínua junto às comunidades.
O programa dos Pontos de Cultura é a ação prioritária do Cultura Viva. É o
espaço de articulação, se constituindo como referência de uma rede horizontal,
que atua como um mediador na relação entre o Estado e a sociedade, agregando
portanto, integrado a este, sendo, mas formando tipos de ocupação que não seguem aqueles
padrões hegemônicos que o Estado e o mercado def‌inem como sendo o modelo de ocupação
e uso do solo nas cidades (...) acreditamos que uma def‌inição de favela não deve ser construída
em torno do que ela não possui em relação ao modelo dominante de cidade. Pelo contrário,
elas devem ser reconhecidas em sua especif‌icidade sócio-territorial e servir de referência para a
elaboração de políticas públicas apropriadas a estes territórios (...) portanto, a favela deve ser
considerado como um território constituinte da cidade. Fonte: O que é favela, af‌inal? Dispo-
nível em: http:/ /www.observatoriode favelas.org.br/observatorio defavelas/acervo/view_text.
php?id_text=16. Acessado em 22.11.11.
30 Gil, G; Uma nova política cultural para o Brasil. Revista Rio de Janeiro número 15 (janeiro-
abril de 2005). Rio de Janeiro: UERJ/LPP/Fórum-Rio; 2005.

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