Bgh: mãe é quem dá à luz, logo, homem não pode ser mãe

AutorKarina Nunes Fritz
Páginas51-60
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BGH: MÃE É QUEM DÁ À LUZ,
LOGO, HOMEM NÃO PODE SER MÃE
A discussão em torno da identidade de gênero e do reconhecimento dos direitos das
pessoas transexuais tem trazido muitas questões para ref‌lexão do aplicador do direito.
Esse é, indubitavelmente, um dos temas mais palpitantes discutidos nos últimos anos,
pois envolve o reconhecimento da pessoa e da sua dignidade.
No Brasil, desde a histórica decisão do Supremo Tribunal Federal na ADI 4275/2018,
os transexuais podem mudar de nome sem se submeter à famigerada cirurgia de transge-
nitalização, através da qual o Estado, por meio da exigência, invadia injustif‌icadamente
o direito fundamental à integridade corporal e psíquica do indivíduo1. Porém, uma vez
alterado o gênero, uma das dúvidas que surgem é se o transexual poderá ter alterado seus
dados também nos documentos de seus descendentes, principalmente quando esses se
opõem à mudança.
Também discutido é se ele pode fazer constar no registro de nascimento de acordo
com seu novo nome e gênero quando contribuiu com material genético para a geração da
criança. Concretamente, se Pedro, nascido Maria, poderia constar com sua nova designa-
ção masculina como pai – e não como mãe – na certidão de nascimento da criança. E ao
contrário: se Maria, nascida Pedro, pode constar como mãe na certidão de nascimento,
embora tenha contribuído com material genético masculino para a concepção do novo ser.
Aqui no Brasil, a resposta à primeira vista seria positiva, pois o Conselho Nacional
de Justiça (CNJ), em sua atividade legiferante, retirou a obrigatoriedade de indicação
do pai e da mãe das certidões de nascimento, as quais passaram a contar apenas com um
campo neutro denominado “f‌iliação”. Lá, em tese, o transexual masculino, que nasceu
mulher e já alterou o gênero em seus documentos, pode ser incluído como um dos ge-
nitores após dar à luz a criança.
Na prática, tudo vem funcionando aparentemente bem, como dá notícia o caso do
famoso artista transexual Thammy Miranda, que, nascida mulher, tornou-se homem e
disse ter registrado o f‌ilho como “pai”2 do f‌ilho de sua esposa, embora o material gené-
tico masculino provenha de doador anônimo. Mas a verdade é que o CNJ, por meio do
Provimento 63/2017, art. 16, § 2o., retirou a indicação do genitor masculino e feminino
das certidões, de forma que hoje não se sabe claramente quem é pai ou mãe de alguém.
A Europa, contudo, tem sido mais prudente diante das mudanças e, embora
reconheça os direitos das pessoais transgênero há mais tempo, tem preservado a
milenar indicação do genitor paterno e materno nos documentos dos descendentes.
Na Alemanha, onde já se superou até o sistema binário de gênero, reconhecendo of‌i-
1. STF Plenário ADI 4.275, Rel. Min. Marco Aurélio, Rel. p/ Acórdão Min. Edson Fachin, j. 01.03.2018.
2. Thammy Miranda esclarece se será registrado como pai ou mãe na certidão de nascimento do f‌ilho. Site Uol, coluna
Pais e Filhos. Acesso: 12.12.2019.
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