Capítulo I - O Ofício de Julgar

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A Sentença no Processo do Trabalho
Capítulo I
O Ofício de Julgar
O homem — já o disse Aristóteles — é um ser gregário. Repugna, pois, em princípio,
à sua natureza a vida solitária e isolada. Os anacoretas e os eremitas constituem, por isso,
exemplos algo anômalos, no conjunto da espécie.
Não pretendemos, com essas considerações, iniciar um exame sócio-político dos motivos
que, agindo poderosamente sobre o espírito do ser humano, zeram-no procurar aproximar-se
do seu semelhante, seja para efeito de convivência permanente, de relacionamento fugaz ou
de intercâmbio. Em todo caso, sabemos que o homem primitivo se agrupou por um impe-
rativo de sobrevivência, como forma de defender-se de animais predadores, de indivíduos
hostis ou de outros grupos beligerantes. O ato de agrupar-se constituiu, portanto, o húmus
que, a partir de Aristóteles, iria fazer brotar, mais tarde, com Augusto Comte, a sociologia
cientíca, a cujo estudo se dedicaram, dentre outros, Gabriel Tarde (“Le Lois de l’Imitation),
defensor do nominalismo(42) e Émile Durkheim (“Les Règles de la Méthode Sociologique”),
ligado ao realismo sociológico(43) de Platão, sem omitirmos as preciosas contribuições de
Max Weber, Georg Simmel, e, mais recentemente, de Louis Recaséns Siches.
O homem, todavia, é um ser que possui interesses. Sob esse aspecto, pode-se dizer que
a sociedade é formada por uma complexa rede de interesses individuais, que são legalmente
pelo interesse coletivo ou público, sem que, com isso, aqueles sejam cancelados ou não
possam ser realizados. A vida em sociedade, com suas múltiplas inter-relações, não tardou,
porém, em provocar a coincidência de duas ou mais pessoas manifestarem interesses sobre
o mesmo bem ou utilidade da vida, sem que uma delas renunciasse a essa pretensão. Surge,
então, o conito de interesses, que, no início, era solucionado pelos próprios indivíduos nele
envolvidos (período da autotutela ou da autodefesa), passando, depois, a ser dirimido, em
caráter monopolístico, pelo Estado (Justiça Pública).
O conito intersubjetivo de interesses, que passou a ocorrer, com frequência, entre os
componentes do grupamento humano socialmente organizado, deu origem, nos tempos
modernos, à gura do juiz, a quem se incumbiu, institucionalmente, a tarefa de resolver,
com neutralidade, tais conitos. Em rigor, convencendo-se da inconveniência do sistema da
autotutela, os indivíduos, em determinado momento histórico, preferiram eleger árbitros,
conando-lhes o encargo de harmonizar os conitos em antagonismo.
(42) Posição teórica, em matéria de ontologia sociológica, consistente em negar maior substância ao social que,
assim, caria reduzido a quase apenas um mero nome. Melhor seria chamá-lo de relacionismo, pois sua tese é menos
radical que o nominalismo — Machado Neto e Machado Neto. Sociologia Básica. 8.ª ed. São Paulo: Saraiva, 1983. p. 73.
(43) Posição doutrinal, em ontologia sociológica, que atribui ao ser (onthos) da sociedade a substância de uma
coisa (res). Ibidem, p. 76.
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