Capítulo VI - Sentença Definitiva e Sentença Terminativa

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A Sentença no Processo do Trabalho
Capítulo VI
Sentença Denitiva e Sentença Terminativa
Sentença denitiva
Comentário
Na vigência do CPC de 1939, a expressão “sentença denitiva” era utilizada para
designar os pronunciamentos jurisdicionais que ingressavam no exame do mérito da causa.
O estatuto processual de 1973 abandonou essa nomenclatura, preferindo, originalmente,
conceituar a sentença como o ato pelo qual o juiz punha m ao processo, examinando, ou
não, o mérito da causa (art. 162, § 1.º). Posteriormente, esse Có digo reformulou o conceito
de sentença, para tê-lo como “o ato do juiz que implica algumas das situações previstas nos
arts. 167 e 269 desta Lei”. Essa reformulação se deu por obra do sincretismo realizado por
esse Código, consistente em trazer para o processo de conhecimento a clássica execução por
quantia certa, rotulando-a de cumprimento da sentença.
O art. 203, § 1.º, do CPC de 2015, conceitua a sentença como o pronunciamento, fundado
nos arts. 485 e 487, pelo qual o juiz “põe m à fase cognitiva do procedimento comum, bem
como extingue a execução”. Esse conceito, mutatis mutandis, corresponde ao reformulado
pelo art. 162, § 1.º, do CPC de 1973, pós-sincretismo, por assim dizer.
Conforme deixamos exarado em linhas transatas, a conceituação de sentença, enunciada
no art. 203, § 1.º, do CPC de 2015, não se ajusta ao processo do trabalho, pois, aqui, não houve
o sincretismo a que nos referimos: no processo do trabalho os processos de conhecimento
e de execução possuem autonomia procedimental.
O que se pode fazer é uma espécie de imbricação parcial do art. 203, § 1.º, do CPC de
2015, com o art. 162, § 1.º, do CPC de 1973 (pós-sincretismo), por forma a construir-se o
seguinte conceito de sentença: ato pelo qual o juiz põe m ao processo de conhecimento
— mediante resolução, ou não, do mérito — ou ao processo de execução ou aos embargos
do devedor.
Está lançada a sugestão.
A separação das sentenças em terminativas e denitivas, no Código de 1939, tinha
repercussões no campo dos recursos, pois o ataque a estas deveria ser feito por meio de
apelação (art. 820), ao passo que a impugnação àquelas era realizada mediante agravo de
petição (art. 846). O digesto processual de 1973, sob este aspecto, simplicou o sistema, ao
declarar que a sentença — tenha, ou não, examinado o mérito da demanda — será sempre
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Manoel Antonio Teixeira Filho
apelável (art. 513). A remissão que o referido artigo do CPC fazia aos arts. 267 e 269, do
mesmo texto, era extremamente elucidativa.
O CPC de 2015 também prevê a apelação da sentença (art. 1.009).
O que devemos, contudo, entender por mérito, para os efeitos processuais?
Estatuía o CPC de 1939, no art. 287, que “a sentença que decidir total ou parcialmente
a lide terá força de lei nos limites das questões decididas”, esclarecendo o parágrafo único
que se considerariam decididas todas as questões que constituíssem premissa necessária
da conclusão. Ao que tudo indica, o legislador daquele período se inspirou no Projeto que
Carnelutti apresentou à Subcomissão Real, presidida por Mortara.
Antes de Carnelutti, o substantivo lide possuía um signicado algo impreciso, pois ora
era empregado para designar o conito intersubjetivo de interesses, ora para identicar o
próprio processo, como método estat al de solução desses conitos. Decisiva foi a contribuição
desse eminente jurista, com vistas ao acertamento doutrinal da matéria, ao conceituar a lide
como o conito de interesses qualicado pela pretensão manifestada por uma das partes
(autor) e pela resistência oferecida pela outra (réu). Lide, em Carnelutti, é, portanto, a
pretensão resistida e insatisfeita.
Ao redigir a Exposição de Motivos do Código de Processo Civil de 1973, o Prof. Alfredo
Buzaid, consagrando o pensamento do ilustre jurista peninsular, cuidou de advertir que “o
projeto só usa a palavra lide para designar o mérito da causa” (Cap. II, n. 6), arrematando
ser a lide o objeto principal do processo, pois “nela se exprimem as aspirações em conito
de ambos os litigantes” (ibidem).
Coerente com essa orientação, o legislador inseriu no Código de 1973 a declaração de
que “a sentença que julgar total ou parcialmente a lide tem força de lei nos limites da lide
e das questões decididas” (art. 468), reproduzindo, assim, praticamente, a expressão literal
do art. 287 do Código de 1939, conquanto tenha deixado de repetir a regra constante do
parágrafo único deste dispositivo.
Em diversos momentos, o CPC de 1973 utilizou o vocábulo lide, como ocorreu, por
exemplo, nos arts. 5.º (sentença declaratória incidental, sempre que se tornar litigiosa rela-
ção jurídica “de cuja existência ou inexistência depender o julgamento da lide”); 22 (conse -
quências processuais a serem suportadas pelo réu que, por não arguir em sua resposta fato
modicativo, impeditivo ou extintivo do direito do autor, “dilat ar o julgamento da lide”); 46,
I (quando houver, entre os litisconsortes, “comunhão de direitos ou de obrigações relativa-
mente à lide”); 47 (haverá litisconsórcio unitário — e, não necessário, como está aí dito, em
manifesta escorregadela técnica — quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação
jurídica material, “o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes”); 110
(quando o conhecimento da lide depender, necessariamente, da vericação da existência de
fato delituoso); 126 (cabe ao juiz, no julgamento de lide, aplicar as normas legais pertinentes);
132 (o juiz, titular ou substituto, que iniciar a audiência, concluirá a instrução, “julgando a
lide”); 325 (quando, da declaração incidental sobre a existência ou inexistência do direito
depender o julgamento da lide); 462 (superveniência de fato modicativo, impeditivo ou
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extintivo do direito, capaz de “inuir no julgamento da lide”); 470 (faz coisa julgada a resolu -
ção da questão prejudicial se a parte o requerer, o juiz for competente em razão da matéria “e
constituir pressuposto necessário para o julgamento da lide”); 475-G (veto à possibilidade de,
na liquidação, “dis cutir de novo a lide”); 798 (concessão de providência cautelar inominada
“antes do julgamento da lide”).
Por outro lado, a expressão “julgamento antecipado da lide” identicava a Seção V,
Título VIII, do Livro I.
Não foram raros, todavia, os casos em que o legislador fez uso do vocábulo mérito
(= lide). Nos arts. 267 e 269, v. g ., se encontravam enumeradas as situações em que o pro-
cesso seria extinto sem ou com pronunciamento acerca do mérito. Do art. 301 constavam as
alegações que o réu deveria expender antes de contestar o mérito. R eferência sobre o mérito
eram também encontradas nos arts. 249, § 2.º (decisão do mérito a favor da parte a que a
declaração de nulidade beneciasse = princípio doutrinário da proteção); 265, IV (casos em
que a sentença de mérito, para ser proferida, dependia de outros fatos); 284 (quando a petição
inicial apresentasse defeitos e irregularidades que pudessem dicultar o exame do mérito);
405, § 2.º, I (inquirição de pessoas impedidas, sempre que isso fosse necessário ao julgamento
do mérito); 459 (decisão concisa, quando ocorresse a extinção do processo sem exame do
mérito); 808 (cessação da ecácia da medida acautelatória quando o juiz declarasse extinto
o processo principal, com ou sem investigação do mérito); 866 (na justicação judicial, o
magistrado não poderia se pronunciar a respeito do “mérito” da prova).
Desse modo, embora o Código de 1973 tivesse procurado manter-se el ao critério
terminológico anunciado na Exposição de Motivos, segundo o qual o substantivo lide seria
sempre utilizado como signicante de mérito, a verdade é que, nos casos que acabamos de
apontar, o legislador deixa-s e apanhar em certos desc uidos.
O CPC de 2015, ao contrário dos de 1939 e de 1973, colocou de lado o vocábulo lide,
substituindo-o por mérito, conforme revelam, especialmente, os arts. 485, 486, 487, 488, 490,
493, 502, 508, 938, 966, caput e § 2.º.
Embora as considerações que até aqui expendemos tenham sido necessárias para a
exata compreensão das sentenças de mérito, reconhecemos que ainda não respondemos à
indagação formulada no início do Capítulo, no sentido de saber o que se deveria entender
por mérito, sob a óptica processual. Dediquemo-nos, pois, a essa resposta.
Cândido Dinamarco, em minuciosa pesquisa, separa em três grupos os autores que
se preocuparam em elaborar um conceito de mérito, a saber: a) os que o situam no plano
das questões ou do complexo de questões concernentes à demanda; b) os que se valem da
demanda ou de situação externa ao processo, mas a este trazida por meio da ação; c) espe-
cicamente, os que armam corresponder o mérito à própria lide.(55)
O que escreveremos a seguir constitui uma síntese do trabalho produzido pelo festejado
jurista.
(55) Fundamentos do Processo Civil Moderno. São Paulo: RT, 1986. p. 188.
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