O desafio da gestão de resíduos plásticos no âmbito do Estado Socioambiental de Direito

AutorAdriano Vidigal Martins
Ocupação do AutorProcurador do Estado de São Paulo - Mestre em Direito, Justiça e Desenvolvimento pelo IDP
Páginas11-75
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O desafio da gestão de resíduos plásticos no
âmbito do Estado Socioambiental de Direito
1.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Este capítulo analisa de que forma o sistema de produção
em larga escala adotado depois do advento da Revolução Indus-
trial e o modelo de consumo não sustentável contribuíram para
o agravamento da crise ecológica, que adquiriu patamar global.
Nesse contexto, será estudado como a geração excessiva e o des-
carte inadequado dos resíduos sólidos, em especial dos materiais
plásticos, estão inseridos nesse processo de redimensionamento da
degradação ambiental.
Inicialmente, será abordada a estrutura constitucional dos pa-
radigmas do Estado Liberal e Social e da respectiva positivação dos
direitos fundamentais de primeira e segunda gerações. Além disso,
será apresentado como, a partir da década de 1970 do século XX,
eclodiram movimentos sociais exigindo dos agentes estatais e dos
organismos internacionais providências concretas relativas à prote-
ção do meio ambiente.
Em um segundo momento, serão expostas as características
da sociedade de risco. Nessa conjuntura, será abordada a necessi-
dade da cooperação internacional no enfrentamento das degrada-
ções ambientais de proporções planetárias, com ênfase no princípio
ambiental da prevenção. Também será comentado sobre a temática
da globalização de capitais e sua repercussão na possibilidade de
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COMPETÊNCIA LEGISLATIVA MUNICIPAL, SUSTENTABILIDADE E POLÍTICAS...
imposição de medidas de proteção ao meio ambiente, bem como
as temáticas da sustentabilidade ecológica, da solidariedade e da
responsabilidade ambiental, enfatizadas no princípio do poluidor
pagador.
Por fim, discorre-se sobre os elementos conformadores do Es-
tado Socioambiental de Direito e das cidades sustentáveis delineados
na CF/1988, e como a PNRS e as leis municipais que determinam a
substituição do uso das sacolas plásticas comuns por ecológicas es-
tão inseridas nessa forma de organização estatal.
1.2 DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS CONCEPÇÕES LIBE-
RAIS E SOCIAIS DE ESTADO, DIMENSÃO GLOBAL DA
POLUIÇÃO POR PLÁSTICOS E INSTRUMENTOS PRE-
VENTIVOS DE DEGRADAÇÃO AMBIENTAL
A Revolução Industrial também se caracterizou pela mecani-
zação dos meios de produção e pelo desenvolvimento tecnológico
utilizado no processo produtivo, fatores que viabilizaram a produ-
ção em grande escala.1 Além de outros efeitos nocivos para o meio
ambiente, esse paradigma de produção também produziu lixo e
toxicidades em patamares industriais, tornando uma característica
distintiva do ser humano.2
Nesse sentido, nas economias europeias do século XIX os recur-
sos financeiros foram realocados para as indústrias e houve aumento
da demanda por produtos manufaturados, em virtude do crescimento
da renda da população, evento que propiciou a ascensão econômica da
classe social burguesa em detrimento da aristocracia rural.3
1 SERRA, Tatiana Barreto. Política de resíduos sólidos: gestão econômica,
responsável e ambientalmente adequada. São Paulo: Verbatim, 2015. p. 22-23.
2 MARQUES, Luiz. Capitalismo e colapso ambiental. 3. ed. Campinas:
Editora Unicamp, 2018. p. 196.
3 BAGNOLI, Vicente. Direito econômico e concorrencial. 7. ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2017. p. 25.
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Além da elevação econômica, a estruturação do Estado Libe-
ral4 possibilitou à burguesia a titularidade do poder político. Ao tra-
tar sobre esse fenômeno, Eros Roberto Grau afirma que, no Estado
Liberal, o monopólio do poder pertence à burguesia, “que assume o
controle do Estado.5
Nessa perspectiva, o Estado Constitucional se origina como
Estado Liberal e com fundamento nos valores da legalidade e da li-
berdade. Nesse ponto, registra-se que o direito à liberdade não se li-
mitava ao âmbito das relações econômicas do sistema capitalista, mas
também ao modo de exercício do poder político, que deveria sofrer
restrições legais e controles da sociedade e dos órgãos constituídos.6
Sendo assim, o Estado Liberal está relacionado com um modelo
político e econômico que resiste à sua intervenção nas relações do mer-
cado, que deve se autorregular de maneira eficiente por meio da lei da
oferta e da procura.7 Nessa concepção econômica, as relações mercantis
4 Assim, a definição de Estado Liberal: “Como vemos, o Estado de direi-
to (ou Estado constitucional) nasce como Estado liberal: abstencionista,
neutrón ou de mínima intervenção (inclusive legislativa), de modo a dei-
xar para a sociedade, formada pela soma de indivíduos moral e economi-
camente competentes, a definição e realização de seu projeto de sucesso
ou felicidade. Há uma nítida cisão entre a esfera pública e a privada, que
é normativa e teoricamente valorizada. Propunha-se, como ideologia, a
ser mais do que uma forma oca de ‘governo das leis’ (sua acepção formal
como reino da lei geral e abstrata). Ao contrário, cultuava-se a ideia, ain-
da que sob a fórmula de um ‘conceito essencialmente contestado, de um
governo justo, fundado em três eixos ou pilares: a legalidade, a separa-
ção dos poderes e os direitos individuais” (SAMPAIO, José Adércio Leite.
Teoria da Constituição e dos direitos fundamentais. Belo Horizonte:
Del Rey, 2020. p. 63).
5 GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988. 19.
ed. São Paulo: Malheiros, 2018a. p. 15.
6 MIRANDA, Jorge. Teoria do Estado e da Constituição. 5. ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2019. p. 44.
7 BAGNOLI, op. cit., p. 28.

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