Requisitos da constitucionalidade material das leis municipais que determinam a substituição das sacolas plásticas comuns por ecológicas

AutorAdriano Vidigal Martins
Ocupação do AutorProcurador do Estado de São Paulo - Mestre em Direito, Justiça e Desenvolvimento pelo IDP
Páginas133-192
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Requisitos da constitucionalidade material das
leis municipais... que determinam a substituição
das sacolas plásticas comuns por ecológicas
3.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Este capítulo analisa o tema aqui investigado com enfoque em
sua dimensão normativa, mais especificamente a partir de seu cotejo
com a discussão sobre normas, regras e princípios jurídicos.
Inicialmente, serão examinadas as diferenças entre as técnicas
de solução de conflitos de normas e de princípios. Em seguida, serão
abordadas as características dos princípios constitucionais e o méto-
do de resolução de conflitos de princípios colidentes.
Em um segundo momento, serão apresentados os elementos
que estabelecem a carga argumentativa do princípio da sustentabi-
lidade ecológica e os dados sobre a problemática ambiental da po-
luição decorrente de resíduos plásticos. Além disso, abordar-se-á a
estrutura do modelo de consumo sustentável e qual a sua relação
com as políticas de modificação do uso das sacolas plásticas (co-
muns por ecológicas).
Também serão analisados, a título exemplificativo, os as-
pectos da constitucionalidade material da Lei n. 7.281/2011, do
Município de Marília/SP, que determina a substituição do uso
das sacolas plásticas comuns por ecológicas, destacando os re-
quisitos fáticos do princípio da proporcionalidade (necessidade
e adequação).
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COMPETÊNCIA LEGISLATIVA MUNICIPAL, SUSTENTABILIDADE E POLÍTICAS...
Ademais, serão pesquisados os dispositivos de algumas leis
municipais que determinam a substituição do uso das sacolas plás-
ticas, apresentando suas diferenciações, como forma de contribuir
para uma visão mais abrangente sobre o tema investigado.
Por fim, será abordada a possível contribuição do diálogo entre
as instituições e a participação democrática no processo de julgamen-
to do Recurso Extraordinário n. 732.686/SP para a solução do tema.
3.2 COLISÃO DE PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS E
CARGA ARGUMENTATIVA DA SUSTENTABILIDADE
ECOLÓGICA
A norma jurídica se classifica, quanto à sua estrutura norma-
tiva, em regras e princípios. Com relação a tais conceitos, as normas
jurídicas constituem o gênero, que possuem os princípios e as regras
como espécies.1 O conjunto das normas jurídicas integra o ordena-
mento jurídico.2
O ordenamento jurídico constitui uma unidade sistemática,
pois é estruturado por meio de uma totalidade ordenada, constituí-
da por uma soma de dispositivos que apresentam relativa ordem3 e
coerência entre si.
Em virtude dessa estrutura sistêmica, a ordem estatal não coa-
duna com a presença de antinomias reais4 entre regras que possuem
o mesmo âmbito de validade. Essa situação se apresenta quando uma
conduta é permitida e proibida concomitantemente pelo mesmo or-
denamento jurídico.5 A título ilustrativo, a ordem estatal não pode,
simultaneamente e no mesmo espaço territorial, autorizar e proibir
o uso de sacolas plásticas comuns.
1 ALEXY, op. cit., p. 85-87.
2 BOBBIO, op. cit., p. 45.
3 Idem, p. 77.
4 “Chamamos de antinomias solúveis as aparentes; chamamos as insolúveis
de reais. Diremos, portanto, que as antinomias reais são aquelas em que o
intérprete é abandonado a si mesmo ou pela falta de um critério ou por um
conflito entre os critérios dados [...].” (Idem, p. 94, grifos nossos)
5 Idem, p. 85.
Requisitos da constitucionalidade material das leis municipais...
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De outra forma, o ordenamento jurídico se conforma com a
presença de antinomias aparentes entre suas normas, situação apre-
sentada quando as técnicas de resolução de conflitos normativos es-
tão previstas em seu próprio sistema.6 No ordenamento jurídico
brasileiro, a resolução das antinomias aparentes está prevista na Lei
de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB), ao prescre-
ver que a “lei posterior revoga a anterior quando expressamente o
declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule intei-
ramente a matéria de que tratava a lei anterior”.7 Nesse caso, o pró-
prio ordenamento jurídico fixou previamente as regras de resolução
de conflitos de normas no tempo, desde que essas normas possuam
idêntica posição hierárquica.
A antinomia aparente entre as regras se soluciona no campo
da validade, devendo o hermeneuta, no exercício de interpretação
das normas, considerá-las válidas ou inválidas. Consequentemente,
as regras consideradas válidas são aplicadas de maneira irrestrita e as
inválidas, retiradas do ordenamento jurídico.
Para resolver o problema da necessidade de coerência entre
as regras, o ordenamento jurídico instituiu critérios de solução de
conflitos entre regras jurídicas, que são as denominados regras de
colisão.8 Norberto Bobbio aponta a existência de três critérios de
solução de conflitos de regras: a) o critério cronológico; b) o critério
hierárquico; c) o critério da especialidade.
O critério cronológico é aquele em que, em caso de conflito
entre regras, prevalece a regra editada em data posterior, desde que
ambas possuam idênticos graus hierárquicos (lex posterior derogat
priori). Em relação ao critério hierárquico, no caso de conflito de
regras, prevalece a norma de nível hierárquico superior, mesmo que
editada em data anterior. Por fim, o critério da especialidade é aquele
6 Idem, p. 84.
7 BRASIL, 1942, art. 2º, § 1º.
8 MICHAEL, Lothar; MORLOK, Martin. Direitos fundamentais. Tradução
de António Francisco de Souza e António Franco. São Paulo: Saraiva, 2016.
p. 61.

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