Desafios contemporâneos à proteção territorial dos povos indígenas

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DESAFIOS CONTEmPORâNEOS
à PROTEçãO TERRITORIAl
DOS POVOS INDÍGENAS
Cumpre contextualizar a realidade indígena, na atualidade,
diante de presentes desafios, alguns recorrentes e outros que re-
presentam verdadeira novidade, e que trazem graves dificuldades à
proteção de suas terras e, consequentemente, ao seu pleno desenvol-
vimento dentro da sociedade brasileira.
Digno de nota destacar a existência de grande cobiça sobre
as terras indígenas, uma vez que abrangem cerca de 13% do total do
território brasileiro. Desse total, cerca de 98,5% das terras indígenas
está localizada na Amazônia Legal, em áreas que se constatam altís-
simos níveis de preservação ambiental (98%)282.
282 SANTILLI, Marcio & VALLE, Raul do. Muita terra para pouco fazendei-
ro. Disponível em: https://www.socioambiental.org/pt-br/blog/blog-do-isa/
muita-terra-para-pouco-fazendeiro. Acesso em: 10 de jun. 2020. De acordo
com o texto citado, enquanto as terras indígenas (13% do território) são ocu-
padas por cerca de 520 mil indígenas, os 67 mil maiores proprietários rurais
concentram uma área superior a 72% às terras indígenas, aspecto que revela
a falácia que representa dizer que no Brasil “há muita terra para pouco índio.
No mesmo sentido, apontando para a grave concentração de terras em favor
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POVOS INDÍGENAS E DIREITOS TERRITORIAIS
6.1 O DESAFIO DO DESENVOlVImENTISmO
ECONômICO
A proteção indígena tem encontrado, especialmente nas úl-
timas décadas, graves entraves de conciliação com a promoção e
fomento a políticas de desenvolvimento econômico nacional. O pro-
jeto desenvolvimentista levado a cabo no país tem exigido, necessa-
riamente, a utilização de recursos naturais de forma predatória e, em
razão das grandes evoluções tecnológicas atingidas nos últimos perí-
odos, torna-se possível o atingimento de áreas cada vez mais amplas,
de forma desordenada e espoliadora.
A mecanização da agropecuária tem permitido a exploração de
largas faixas de territórios e tem trazido graves impactos ao meio am-
biente e às populações do campo que não detêm o poderio econômico
ou acesso às tecnologias mais avançadas, tais como os pequenos agri-
cultores, as populações tradicionais, os quilombolas e os indígenas283.
A política desenvolvimentista adotada no período ditatorial
ainda é muito presente no pensamento da elite política dentro do
Estado e, da mesma forma que se deu àquela época, a forma atual de
garantir sua implementação passa, em várias situações fáticas, pelo
desrespeito aos direitos das populações indígenas284.
de poucos produtores rurais, estudo da OXFAM Brasil de 2019 aponta que
0,9% dos estabelecimentos rurais concentram cerca de 45% do total das áreas
rurais no país (OXFAM Brasil. Menos de 1% das propriedades agrícolas é
dona de quase metade da área rural brasileira. Disponível em: https://www.
oxfam.org.br/publicacao. Acesso em: 10 de jun. 2020).
283 DERANI, Cristiane. Direito ambiental econômico. São Paulo: Saraiva,
2008, p. 124. Cf. RIBEIRO, Os índios e a civilização: a integração das po-
pulações indígenas no Brasil moderno, cit., p. 380).
284 BRIGHENTI, op. cit., p. 23. “A tese central deste livro é que as doenças, a
morte e o sofrimento humano, que se desencadearam maciçamente sobre os
índios brasileiros nos últimos anos, são o resultado direto da política de de-
senvolvimento econômico dos governos militares do Brasil. Em termos mais
genéricos, pretendo demonstrar que a situação atual dos índios brasileiros se
vincula estruturalmente ao ‘milagre econômico’ do Brasil, muito aclamado,
mas pouco conhecido” (DAVIS, Shelton. Vítimas do milagre, cit., p. 15).
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